RC - 1380 - Sessão:

VOTO REVISOR

Revisei os autos atentamente e concordo integralmente com a conclusão alcançada pelo nobre relator no sentido de afastamento da matéria preliminar e de manutenção da sentença absolutória.

Deveras, da análise da mensagem veiculada pelo recorrente em sua rede social, percebe-se a referência a documentos distribuídos por terceiros nos quais consta a informação de que o ex-prefeito e seu vice, este último então candidato à prefeitura, têm uma “dívida ativa” com o município, devida “por causa de irregularidades em seus governos”.

Seguem-se, na postagem, diversas apreciações pessoais acerca dessa informação, tais como “esse documento é um atestado de incompetência” e “vote em quem não engana”.

Não se extrai da alusão uma afirmação direta e objetiva sobre fatos precisos e contundentes visando atingir a honra alheia, elemento indispensável para a configuração do crime de difamação eleitoral. O que se constata, em realidade, é uma imputação imprecisa sobre débitos com a prefeitura decorrentes de supostas irregularidades na gestão passada do município.

Além disso, como bem analisado no voto do eminente relator, a prova oral produzida nos autos demonstrou ser de conhecimento comum que os supostos ofendidos Walter e Matias eram devedores do município de Sede Nova em razão de falhas administrativas, quando estiveram à frente da Prefeitura, reconhecidas pelo Tribunal de Contas do Estado.

A exteriorização em tela traduz uma perspectiva pessoal sobre fatos protagonizados pelos então prefeito e seu vice, já conhecidos pela comunidade.

Por certo, a democracia assenta-se no debate de posições políticas diversas, no qual a participação do cidadão é essencial para a construção de uma vontade eleitoral adequadamente livre, crítica e informada.

Diante disso, entendo que a mensagem não extrapola os limites da liberdade de manifestação e opinião do eleitor sobre dados públicos e relevantes da história funcional dos mandatários, servindo de contexto às razões pelas quais devem ou não ser agraciados com o voto, o que lhe destitui o animus difamandi exigido pelo tipo penal eleitoral.

Com efeito, a postagem, muito embora externe um juízo crítico demeritório contundente e exagerado, direciona-se à atuação do homem público por um fato não manifestamente inverídico, não extrapolando, por isso, os contornos admitidos para a crítica política no contexto das eleições.

Consoante aponta a doutrina de Luiz Carlos dos Santos Gonçalves: “A divulgação de um fato desabonador, não criminoso, mas verdadeiro, atende ao interesse público na máxima transparência daquele que pretende ocupar cargos eletivos.” (Crimes eleitorais e processo penal eleitoral. 2. ed. São Paulo: Atlas, p. 86).

Nessa linha, o TSE tem reiteradamente afirmado a ampla liberdade de manifestação de pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet, de modo que a intervenção da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados por cidadãos comuns é absolutamente excepcional (AgR-REspe n. 110-93/SP, Rel. Min. Luiz Fux, j. em 28.11.2017).

Na mesma senda, ao julgar o mérito da ADI n. 4451, de relatoria do Min. Alexandre de Moraes, DJE de 06.3.2019, a Suprema Corte decidiu que:

O direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. Ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional.

A premissa aqui exposta ganha especial vulto na esfera penal, ultima ratio do Estado de Direito, que tem base nos princípios da ofensividade e da intervenção mínima, a exigir da ação uma intolerável agressão à dignidade pessoal alheia ou à regularidade das eleições, as quais não vislumbro no caso concreto.

Na mesma ordem de ideias, uma vez que a conduta não desborda dos limites estabelecidos para a liberdade de manifestação de pessoas naturais em matéria político-eleitoral na internet (art. 57-J da Lei n. 9.504/97), tenho que a publicação não representa “propaganda eleitoral” para os fins da elementar exigida pelo art. 39, § 5º, inc. III, da Lei n. 9.504/97, uma vez que não é vedado ao eleitor manifestar sua preferência ou repúdio a candidatos em redes sociais no dia da eleição.

Destarte, é firme o posicionamento do TSE no seguinte sentido:

(…) manifestações de apoio, ainda que expressas, ou revelações de desejo pessoal que determinado candidato seja eleito, bem como as críticas ácidas que não transbordem para a ofensa pessoal, quando emanadas de pessoas naturais que debatem política na internet, não devem ser consideradas como propaganda eleitoral.

(TSE - RESPE: 798220166260099 Pompéia/SP 6762017, Relator: Min. Antonio Herman De Vasconcellos E Benjamin, Data de Julgamento: 28.6.17, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico - 02.8.17 - pp. 259-261.)

Do exposto, os contornos do caso concreto revelam que se trata de mensagem divulgada de modo espontâneo e legítimo por eleitor em apoio a candidato de sua preferência, plenamente protegida pela liberdade de expressão.

Com essas considerações, diante da atipicidade do fato em análise, acompanho inteiramente o ilustre relator.