INQ - 4146 - Sessão: 03/03/2020 às 17:00

RELATÓRIO

A PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL requer o arquivamento de inquérito policial instaurado pela Superintendência Regional da Polícia Federal em Porto Alegre a partir de expediente encaminhado pela Promotoria de Justiça de Torres – RD n. 00914.00462/2017, para apurar a suposta prática do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do CE) por parte do atual Prefeito de Morrinhos do Sul, LUIZ EVALDT STEFFEN, do Secretário Municipal de Agricultura, PEDRO CARLOS DA ROSA, e do Secretário de Obras daquele município, VANILSON BOFF PINTO.

O órgão ministerial junto a esta instância requer o arquivamento do presente inquérito em virtude da ausência de justa causa para o desenvolvimento da investigação, uma vez que os fatos teriam ocorrido, em tese, entre janeiro e junho de 2017, em momento muito anterior, portanto, ao registro de candidatura para as eleições municipais de 2020 (fls. 141-146v.).

É o relatório.

VOTO

O inquérito policial subjacente foi instaurado para apurar a possível prática do crime de corrupção eleitoral, previsto no art. 299 do Código Eleitoral, em virtude de notícia anônima (fl. 08), que reportou cessão gratuita de maquinário e/ou serviços públicos, ocorrida no ano de 2017, por parte do Prefeito de Morrinhos do Sul, LUIZ EVALDT STEFFEN, do Secretário Municipal de Agricultura, PEDRO CARLOS DA ROSA, e do Secretário de Obras daquele município, VANILSON BOFF PINTO, como contraprestação por votos recebidos no pleito de 2016 e, ainda, objetivando cooptar votos nas futuras eleições municipais do corrente ano.

Acolho na íntegra o requerimento da d. Procuradoria Regional Eleitoral na manifestação das fls. 141-146v., cujos fundamentos ora adoto como razões de decidir:

(...)

II.2 – Da inexistência do fato relativo a “Danir”

A partir das diligências policiais apurou-se que após uma sessão da Câmara Legislativa, o cidadão Danir Borges Carlos (MDB) afirmou ter utilizado uma máquina de propriedade da Prefeitura Municipal durante oito dias em sua propriedade particular sem o recolhimento do valor hora/máquina aos cofres municipais.

A conversa foi gravada pelo vereador Bruno Lumertz Webber (PP) que a reproduziu para o vereador Osni Jacob Hendler (PSB). O episódio resultou na expedição, por quatro vereadores, de pedido de informações à Prefeitura Municipal (fls. 35-47) e na referência a esse fato, pelo último, durante entrevista concedida à Rádio MegaSul.

A notícia de fato anônima que deu azo à presente investigação indica como fonte de informação a aludida entrevista.

A Polícia Federal analisou a mídia entregue juntamente com a notícia de fato anônima, tendo produzido a Informação n. 73/2018-SR/PF/RS, com o seguinte teor (fl. 53):

"(…) a mídia contém dois arquivos de áudio de mesmo conteúdo, com 6min47segundos de gravação (…) Trata-se de uma gravação de uma entrevista do vereador Osni Hendler de Morrinhos do Sul, ao jornalista Júnior Guimarães, na rádio Megasul de três Cachoeiras (de acordo com a denúncia que acompanha o expediente). Na análise do material, procurando indícios de crime eleitoral, destaco o áudio contido entre os 35 segundos e o 1min06segundos da gravação, na qual o vereador informa que estaria conduzindo uma 'investigação pequena' e que eles (possivelmente os vereadores) teriam 'um pouco de prova' que o secretário de obras do município de Morrinhos do Sul/RS estaria executando obras de graça (sem recolhimento de hora/máquina para os equipamentos da prefeitura) para famílias que se comprometessem em votar nele para o pleito de 2020. Diz ainda o vereador que o secretário teria executado obras para 6 famílias dentro deste esquema."

Analisando-se as informações prestadas pela Prefeitura Municipal aos vereadores (fls. 35-47), não se constata a prática de crime eleitoral. Não se localizou qualquer registro de contato e/ou pagamento de hora/máquina por Danir Borges Carlos, não se podendo concluir pela ocorrência da prestação do serviço nem com pagamento nem que tenha ocorrido gratuitamente como contraprestação por voto em eleição passada ou futura.

Na verdade, ouvido, o cidadão Danir Borges Carlos, agricultor filiado ao MDB (mesmo partido do Prefeito Municipal), negou o fato. Explicou que realmente disse ter feito uso gratuito de maquinário municipal, mas que isso não ocorreu de fato, tendo apenas se exaltado durante discussão com vereadores da oposição (fl. 108):

"QUE o depoente afirma que a máquina Prefeitura de Morrinhos foi na propriedade, a fim de limpar o valo público; QUE é um valo onde passa água que vai para o arroz de várias propriedades (…) QUE para limpar o córrego a máquina teve que entrar na propriedade do declarante; QUE o declarante foi a Prefeitura de Morrinhos do Sul e solicitou a máquina para limpar o córrego, caso contrário não vem água (…) QUE a máquina da Prefeitura já trabalhou na propriedade do declarante, quando morreu uma vaca, sendo que não sabe quem era o operador (…) QUE não foi recolhidos os tributos quando foi usada a máquina para enterrar a vaca (…) QUE a máquina ficou parada na propriedade uns seis dias, pois estava estragada, estragou a concha, mangueira, na limpeza do valo; QUE o declarante disse que usou a máquina por oito dias, no momento em que discutia com políticos, na calçada, em frente à Câmara Municipal."

O fato de Danir ser correligionário do Prefeito Municipal afasta a hipótese de corrupção eleitoral, já que se presume que vote de acordo com sua filiação partidária, não havendo razão para que seja promovida sua cooptação. Além disso, Danir, sua esposa e seu filho, ouvidos separadamente, negaram ter recebido oferta de troca de horas-máquina por seus votos (fls. 102, 105 e 108).

Os elementos de informação até o momento coletados são suficientes para que se conclua pela inocorrência de crime eleitoral, devendo o inquérito policial ser arquivado quanto à hipótese investigativa acima descrita.

II.3 – Da ausência de justa causa para a continuidade da investigação quanto ao fato relativo a “Gabriel”

Analisando-se o teor da notícia de fato anônima, constata-se a narrativa do fato envolvendo o munícipe “Gabriel” se deu, tal qual o do fato envolvendo “Danir”, com base, exclusivamente, no teor da entrevista concedida pelo vereador Osni Jacob Hendler (PSB) à rádio Megasul.

Ouvido, Osni Jacob Hendler (PSB) declarou não lembrar do que havia dito na ocasião. Limitou-se a mencionar gravação efetuada pelo vereador Bruno Lumertz Webber (PP), sobre o fato relativo a “Danir” (fl. 30).

Bruno Lumertz Ebber (PP), por sua vez, também se limitou a falar sobre a gravação envolvendo “Danir”, nada referindo acerca de “Gabriel” (fl. 26).

Em suma, a notícia de fato anônima foi feita com base em algo que se ouviu dizer, cuja pessoa que supostamente teria dito, não lembra o que disse.

Nesse contexto e considerando, ainda, que nenhum das pessoas ouvidas nos presentes autos relatou ter presenciado qualquer fato concreto, específico, de oferta de benesse em troca de voto, afigura-se irrazoável prolongar-se o presente procedimento investigativo a fim de que seja procedida a identificação e à oitiva do tal “Gabriel”.

Logo a investigação deve ser arquivada no ponto em razão da inexistência de elementos mínimos para o desenvolvimento de uma hipótese investigativa.

II. 4 – Da ausência de justa causa para a continuidade da investigação quanto à suposta corrupção eleitoral visando ao pleito de 2020

O art. 299 do Código Eleitoral considera crime, punível com reclusão de um a quatro anos e cinco a quinze dias-multa, “dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita”.

Rodrigo López Zilio observa que o tipo penal “não possui um marco delimitativo temporal que lhe restrinja a incidência. Com efeito, já que um dos verbos nucleares do tipo penal é a promessa ou a solicitação, explica SUZANA DE CAMARGO GOMES, 'não há necessidade de que a conduta típica ocorra em data próxima à eleição'.” (Crimes Eleitorais, 3ª ed., Salvador, Jvs Podium, 2017, p. 19).

Contudo, o autor adverte da problemática que surge “quando a ação é levada a efeito fora do ano eleitoral ou, mesmo, em período significativamente anterior ao registro das candidaturas ou da convenção partidária”. Isso porque, “em tese, essa circunstância, por si só, não exclui a possibilidade de cometimento do crime do art. 299 do CE, conquanto a ação penal restará fadada ao insucesso se, eventualmente, o corruptor não efetuar o registro de sua candidatura” (op. cit., pp.19-20).

Aplicando-se ao presente caso, tem-se que, conquanto seja possível a apuração de crime de corrupção eleitoral cuja execução teve início antes mesmo do registro da candidatura do suposto autor do fato, somente haverá justa causa para o início da investigação de crime eleitoral a partir do registro da candidatura.

Considerando que os fatos sob apuração teriam, em tese, ocorrido nos primeiros seis meses do mandato de Prefeito Municipal, ou seja, jan a jun de 2017, e as próximas eleições municipais terão lugar somente em 2020, não se vislumbra justa causa para o desenvolvimento da investigação em relação a essa hipótese investigativa, impondo-se o seu arquivamento.

Portanto, no que concerne à descrição fática atrelada ao suposto cometimento do crime previsto no art. 299 do Código Eleitoral, comungo do entendimento de que o inquérito policial deve ser arquivado, em razão da existência de elementos indicativos da inocorrência de crime eleitoral com relação a um dos fatos reportados, bem como da ausência de justa causa para a continuidade da investigação quanto aos demais, nos termos do parecer do órgão ministerial.

Dessarte, é de ser acolhido o pedido de arquivamento.

E, por derradeiro, quanto ao pedido acessório do Procurador Regional Eleitoral de envio de cópia parcial do presente expediente à Promotoria de Justiça de Torres, entendo suficiente determinar que os autos permaneçam à sua disposição para a obtenção das cópias que entender necessárias.

Diante do exposto, VOTO pelo arquivamento do expediente relativamente aos fatos imputados com base no art. 299 do Código Eleitoral a LUIZ EVALDT STEFFEN, PEDRO CARLOS DA ROSA e VANILSON BOFF PINTO, com a ressalva do disposto no art. 18 do Código de Processo Penal.