REl - 0600474-19.2024.6.21.0023 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/06/2025 00:00 a 13/06/2025 23:59

VOTO

As contas foram desaprovadas porque o valor limite para uso de recursos próprios ao cargo de vereador no município em que concorreu o recorrido era de R$ 1.598,51, mas o candidato utilizou autofinanciamento de R$ 4.255,00, excedendo em R$ 2.656,49 o limite legal disposto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

No recurso sustenta-se que a sentença foi equivocada e desproporcional, uma vez que o recorrente não teria tido a intenção de burlar a legislação eleitoral, e em razão de a irregularidade ter decorrido de um erro contábil devido ao contador orçar os valores de maneira uniforme.

O recorrente busca a aprovação das contas ou, alternativamente, a redução da multa para 30% do valor excedente, em vez dos 100% determinado pelo juízo de origem, por aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, falta de potencialidade para influenciar o resultado do pleito e de abuso de poder econômico.

Verifico, nas contas, que houve pagamento de honorários contábeis no montante de R$ 850,00, quantia que deve ser excluída do limite de autofinanciamento, em face do precedente do egrégio Tribunal Superior Eleitoral, relatado pelo excelentíssimo Ministro Ricardo Lewandowski, publicado em 27.10.2022:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. APROVAÇÃO. CÁLCULO DO LIMITE PARA O AUTOFINANCIAMENTO. GASTOS COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO ART. 23, § 2º-A DA LEI 9.504/1997. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Infirmados os fundamentos da decisão de inadmissibilidade, é de se prover o agravo para julgamento do recurso especial.

2. Hipótese em que o candidato ultrapassou o limite de uso de recursos próprios para quitar despesas com serviços advocatícios.

3. Nos termos dos arts. 18-A, parágrafo único; 26, § 4º; 27, § 1º; e 100-A, § 6º, todos da Lei 9.504/1997, os honorários advocatícios são despesas eleitorais que não compõem o teto global de gastos de campanha.

4. A interpretação sistemática do art. 23, § 2º-A da Lei das Eleições exclui os honorários advocatícios e contábeis pagos pelo candidato do cálculo do limite de 10% para o autofinanciamento de campanha.

5. Recurso especial a que se nega provimento.

(TSE, AREsoEl n. 0600430-41.2020.6.24.0060, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, DJE, 27/10/2022).

 

Ressalto que o entendimento de que “despesas com honorários advocatícios e contábeis não se sujeitam ao limite de autofinanciamento” vem sendo adotada pelos demais Tribunais Regionais Eleitorais:

ELEIÇÕES 2024. RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESAPROVAÇÃO. IRREGULARIDADE GRAVE. EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE DE AUTOFINANCIAMENTO. MULTA. PROVIMENTO PARCIAL.

I. CASO EM EXAME

1. As contas de campanha dos candidatos aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito no Município de Inajá/PR, nas Eleições de 2024, foram desaprovadas pelo Juízo da 091ª Zona Eleitoral, com a aplicação de multa de 100% sobre o valor excedente do limite de autofinanciamento e determinação de recolhimento de R$ 25.354,64 ao Tesouro Nacional.

2. Os recorrentes argumentam que os valores relativos a honorários advocatícios, contábeis e administrativos, no total de R$ 5.600,00, não estariam sujeitos ao limite de gastos e pedem a dedução desse montante para reformar a sentença, com aprovação das contas ou redução da multa.

3. A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo parcial provimento do recurso, para reduzir a multa aplicada.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

4. Há duas questões em discussão: (i) saber se as despesas com honorários advocatícios, contábeis e administrativos devem ser excluídas do limite de autofinanciamento; (ii) avaliar a proporcionalidade da multa aplicada.

III. RAZÕES DE DECIDIR

5. O artigo 23, §10, da Lei nº 9.504/1997 e o artigo 25, §1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019 estabelecem que despesas com honorários advocatícios e contábeis não constituem doação de bens ou serviços estimáveis em dinheiro e, portanto, não estão sujeitas ao limite de gastos de campanha.

6. No caso, os recorrentes comprovaram o gasto de R$ 2.500,00 com tais despesas, sendo deduzido esse valor da base de cálculo, o que reduz o excesso para R$ 10.007,32.

7. A extrapolação do limite de autofinanciamento (63% do permitido e 10,42% dos recursos totais da campanha) configura irregularidade grave, justificando a desaprovação das contas, conforme precedentes desta Corte (TRE-PR 0600259-67 e 0600301-41).

8. Contudo, a multa prevista no artigo 27, §4º, da Resolução TSE nº 23.607/2019 deve ser dosada proporcionalmente às circunstâncias do caso, sendo razoável sua fixação em 60% do valor excedido, reduzindo-se o montante para R$ 6.004,39.

IV. DISPOSITIVO E TESE

9. Recurso conhecido e parcialmente provido para manter a desaprovação das contas e reduzir a multa para R$ 6.004,39.

Tese de julgamento: "Despesas com honorários advocatícios e contábeis não se sujeitam ao limite de autofinanciamento. Não obstante, a extrapolação significativa desse limite configura irregularidade grave e enseja a desaprovação das contas, sendo a multa proporcional ao excesso constatado."

Dispositivos relevantes citados: Lei nº 9.504/1997, artigos 23, §10, e 27, §4º; Resolução TSE nº 23.607/2019, artigos 25, §1º, e 27, §1º.

Jurisprudência relevante citada:

TSE, REspe nº 0600402-75.2020.6.25.0018, julgado em 11.05.2023.

TRE-PR, RE nº 0600259-67.2020.6.16.0170.

TRE-PR, RE nº 0600301-41.2020.6.16.0098.

(TRE/PR, REl n. 0600465-85.2024.6.16.009, Relator Desembargador Eleitoral Guilherme Frederico Hernandes Denz, DJE, 11/12/2024, grifei)

 

Constato que os serviços de contabilidade estão devidamente contabilizados, conforme comprovante de ID 45824265 e registro no extrato da prestação na quantia de R$ 850,00.

Por conseguinte, afasto o valor de R$ 850,00 destinado a despesas de honorários contábeis do limite de autofinanciamento com recursos próprios, e suprimo o pagamento da quantia irregular de R$ 2.656,49, resultando na irregularidade de R$ 1.806,49.

As demais justificativas apresentadas no recurso não possuem força suficiente para modificar a decisão recorrida, pois o art. 45, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 expressamente prevê que a candidata ou o candidato é solidariamente responsável com o administrador financeiro com a(o) profissional de contabilidade pela movimentação financeira e contábil de sua campanha

A irregularidade constatada configura descumprimento objetivo da legislação eleitoral, independentemente da intenção do recorrente. O argumento de que o erro decorreu de um equívoco contábil, e não de uma conduta dolosa, não afasta a responsabilidade do candidato, uma vez que a norma eleitoral estabelece limites rígidos para o autofinanciamento, cuja inobservância acarreta consequências jurídicas automáticas.

Além disso, a alegação de que o valor envolvido é reduzido não altera o fato de que houve extrapolação do limite legal, sendo irrelevante a existência ou não de influência no resultado do pleito. A jurisprudência citada nas razões não garante que a sanção possa ser afastada, pois a norma é clara ao prever a penalidade de multa no valor do excesso, independentemente do montante.

A quantia irregular (R$ 1.806,49) representa 42,44% da receita total do candidato (R$ 4.255,00), e o valor do excesso não é reduzido, pois superior ao parâmetro de R$ 1.064,10 que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais, o que não permite a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

De acordo com a jurisprudência: “Em prestação de contas cuja irregularidade envolver valores reduzidos, inferiores a R$ 1.064,10 ou a 10% da arrecadação, é admitida a aprovação com ressalvas, em observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.” (TRE/RS, REl N. 0600724-60.2024.6.21.0085, Relator Desembargador Eleitoral Nilton Tavares da Silva, DJE, 13.02.2025).

Assim, os fundamentos expostos não são suficientes para afastar a desaprovação das contas.

Quanto ao pedido de redução da penalidade de 100% aplicada para multa de 30% sobre o excesso, faz-se necessário indagar se a fixação da pena de multa no máximo legal é adequada, razoável e proporcional à infração praticada.

É indiscutível que a reprimenda deve ser aplicada a partir de critério justo e objetivo, a fim de manter a igualdade de condições financeiras entre os concorrentes aos cargos eletivos e a observância das regras de autofinanciamento de campanha. Porém, deve-se ter presente que a norma refere “multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso”, demandando arbitramento que respeite os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, este último, em sentido estrito.

O limite de doações com recursos próprios era de R$ 1.598,51, equivalente ao percentual de 10% do limite de gastos para o cargo de vereador (R$ 15.985,08). Suprimindo-se o valor referente aos honorários de contador (R$ 850,00), o candidato utilizou valores pessoais de R$ 3.405,00 (R$ 4.255,00 – R$ 850,00), que equivalem ao percentual de 21,29% sobre R$ 15.985,08.

Foi superada em R$ 1.806,49 a quantia própria que poderia aplicar na campanha, diante do decote do valor de serviços contábeis (R$ 850,00), o que representa um distanciamento de 112,99% do limite de gastos com recursos próprios para o cargo de vereador (R$ 1.598,51).

Assim, parece razoável fixar a multa no patamar máximo de sancionamento de 100% da quantia em excesso, considerando que a infração praticada é de 112,99%, mais do que o dobro do que poderia ser aplicado.

O candidato possuía um limite claro para o autofinanciamento de sua campanha, estabelecido em R$ 1.598,51, mas acabou utilizando um valor quase duas vezes maior, ultrapassando esse limite em R$ 1.806,49. Esse excesso representa um acréscimo de 112,99% acima do permitido, o que demonstra uma infração significativa às regras eleitorais.

A gravidade dessa irregularidade não está apenas no descumprimento formal da norma, mas também em seus potenciais impactos. O autofinanciamento excessivo pode comprometer a igualdade entre os candidatos, desequilibrando a disputa ao permitir que alguém disponha de mais recursos próprios do que o limite imposto pela legislação. Ainda que a quantia, isoladamente, possa parecer relativamente pequena, a Justiça Eleitoral impõe restrições rigorosas exatamente para evitar que diferenças financeiras individuais interfiram de maneira desproporcional no processo eleitoral.

Além disso, ao extrapolar mais do que o dobro do permitido, o candidato não apenas ignora uma regra objetiva, mas também compromete a transparência e a fiscalização das contas de campanha. A legislação busca garantir que todos os candidatos sigam parâmetros uniformes, evitando que alguém obtenha vantagem indevida por meio de recursos financeiros superiores ao teto legal.

Portanto, merece unicamente reforma da sentença para excluir o valor dos honorários contábeis, no montante de R$ 850,00 do limite de autofinanciamento, mantendo-se a desaprovação das contas e a multa de 100% sobre a quantia excedente de R$ 1.806,49.

Em face do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso unicamente para excluir o valor dos honorários contábeis, no montante de R$ 850,00, do limite de autofinanciamento, mantendo-se a desaprovação das contas e a multa de 100% sobre a quantia excedente de R$ 1.806,49.