PC - 0602818-52.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/11/2019 às 17:00

VOTO

Trata-se da prestação de contas apresentada por FERNANDO RODRIGUES LOPES, candidato ao cargo de deputado federal pelo Progressistas (PP), referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2018.

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria deste Tribunal, em exame preliminar, apurou (1) a ausência de peças obrigatórias; (2) a omissão de despesas, no valor de R$ 259.656,46; (3) a falta de comprovação de gastos realizados com recursos do Fundo Partidário; e (4) a devolução de cheques de campanha (ID 2779933).

Com a apresentação da prestação de contas retificadora, alguns dos apontamentos foram sanados, remanescendo irregularidades relativas às despesas omitidas, cujo registro posterior caracterizou, também, dívida de campanha não assumida pelo partido político.

Ainda, consignou-se no exame técnico (ID 3714883) que:

Para fins do art. 75 da Resolução TSE 23.553/2017, antes da emissão deste Parecer Conclusivo, foi dada oportunidade específica de manifestação ao prestador de contas, para a juntada de documentos e esclarecimentos sobre as irregularidades apontadas no Relatório de Exame de Contas (ID 2779933). Nestes termos, certifico que não há fatos novos neste Parecer Conclusivo.

Sigo a transcrever o parecer conclusivo, o qual, pela clareza, bem elucida a grave situação da contabilidade:

Foram identificadas despesas não declaradas pelo candidato que totalizam R$ 259.656,46, segundo informações obtidas pela Justiça Eleitoral por meio de circularização e notas fiscais eletrônicas disponibilizadas por Estados e Municípios.

Em manifestação, o prestador apresenta prestação de contas retificadora. O Extrato da Prestação de Contas Final retificado (ID 2989083) registra R$ 30.648,02 de receitas financeiras (R$ 30.000,00 de Fundo Partidário e R$ 648,02 de Outros Recursos), e R$ 224.087,42 de despesas.

Nessa nova composição consta, no Extrato de Prestação de Contas Retificado, dívida de campanha de R$ 193.440,05. Todavia, tal dívida, além de não abarcar a integralidade das notas fiscais emitidas, traz peculiaridades que a distingue do enquadramento da dívida prevista no art. 35 da Resolução

TSE n. 23.553/2017.

[...]

Em manifestação, o prestador retifica as contas parcialmente, pois declara como despesas não pagas o valor de R$ 193.440,05 conforme TABELA 2:

[…]

Portanto, ainda permanecem omitidas notas fiscais, que totalizam R$ 66.216,41, conforme TABELA 3:

[…]

A consulta ao portal da notas fiscal eletrônica, para averiguação de possíveis cancelamentos, revelou que as notas fiscais são válidas e estão ativas. Nenhum esclarecimento foi apresentado para a permanência da omissão de R$ 66.216,41, após a retificadora. Isso explica o motivo de o candidato ter lançado como dívida de campanha R$ 193.440,05 (R$ 259.656,46 – 66.216,41)

[..]

No caso em análise, foram omitidos R$ 259.656,46, cifra consideravelmente expressiva para ser esquecida, sem quaisquer esclarecimentos, que poderiam ter ocorridos quando da entrega da Prestação de contas Final, ou na retificadora.

Portanto, o caso em exame não configura eventuais débitos não quitados, são quase todas as despesas realizadas sem correspondência de receitas, em afronta a legislação que, no seu conjunto de regras, tem como cerne o trânsito pelas contas bancárias dos recursos auferidos e despendidos.

b) O regramento prescreve que aqueles débitos não quitados: “até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo parido político”. Chama atenção que o prestador sequer apresentou acordo formalizado de assunção da dívida de campanha, conforme art. 35 da Resolução, tampouco elaborou notas explicativas acerca desse assunto. Simplesmente lançou R$ 193.440,05 como dívida de campanha, pois apontado no relatório de exame das contas a omissão de notas fiscais.

Referida quantia não contempla todos os valores omitidos, como examinado no item 2.1 deste Parecer, e se quer há esclarecimentos acerca dessa diferença.

Na hipótese, a arrecadação de campanha totalizou R$ 38.198,02 e as despesas, R$ 231.637,42 (déficit de R$ 193.439,40, isso após a apresentação da retificadora), sendo que, ainda, o órgão técnico aponta a persistência de omissão de gastos no valor de R$ 66.216,41.

Quanto à omissão, é de anotar-se que o credor do candidato – NOSCHANG ARTES GRAFICAS LTDA. – interveio no processo, informando que ajuizou ação de cobrança contra o prestador, tendo em vista o não adimplemento das notas fiscais (ID 2143483).

Pois bem.

O total descompasso entre a arrecadação e os gastos, somado à omissão de despesas detectadas por meio de circularização, como apontado pela Procuradoria Regional Eleitoral (ID 3984133), evidencia a gravidade do estratagema utilizado pelo candidato, ainda que se cogite na quitação da dívida assinalada. Decerto, tal atitude nada mais é do que o uso de recursos à margem da contabilidade oficial de campanha, em prejuízo aos demais candidatos que conduziram suas atividades dentro das normas de arrecadação e gastos durante o processo eleitoral. 

Em forma de tabela, a individualização das irregularidades é melhor estampada. Senão, vejamos:

Gizo que a omissão de despesas ofende frontalmente, e com gravidade, o disposto nos arts. 16 e 56, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.553/17.

Nestes autos, as despesas não declaradas à Justiça Eleitoral – e comprovadas por notas fiscais localizadas em procedimento de circularização (instituições bancárias e fisco) – perfazem R$ 66.216,41, valor cuja origem não é identificada, pois inviável apurar de onde vieram (ou virão) os recursos utilizados para o pagamento dessas contratações.

Já a dívida de campanha reconhecida pelo prestador de contas, e que não atendeu ao disposto nos §§ 2º, 3º e 4º do art. 35 da Resolução TSE n. 23.553/17, atingiu o montante de R$ 193.440,05.

Não quitada no prazo regulamentar, e ausente o reconhecimento da dívida, deve ser reconhecida, igualmente, aqui, a caracterização de recurso de origem não identificada, posição adotada pela jurisprudência e que determina o recolhimento de valores ao erário.

Nessa linha, ementas de julgado deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. DOAÇÕES FINANCEIRAS REALIZADAS DE FORMA DISTINTA DA OPÇÃO DE TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO DA QUANTIA IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Depósitos sucessivos em dinheiro, constando como doador informado o próprio prestador, cujo valor ultrapassou o limite diário para depósitos em espécie, contrariando a previsão contida no art. 22, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.553/17, que estabelece que as doações financeiras por pessoas físicas, acima de R$ 1.064,10, sejam efetuadas mediante transferência eletrônica.

2. Emissão de notas fiscais contra o CNPJ do candidato e a correspondente ausência de registro de tais despesas na prestação de contas, demonstrando indícios de omissão de gastos eleitorais, em desacordo com os arts. 16 e 56, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.553/17. Valores considerados como de origem não identificada, devido à impossibilidade da apuração da origem dos recursos que foram utilizados para o pagamento das referidas despesas.

3. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS, PC n. 0602114-39.2018.6.21.0000, Rel. Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, julgado em 17.9.2019.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL PELA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DÍVIDA DE CAMPANHA. IRREGULARIDADE NA UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). RECURSOS PRÓPRIOS EM MONTANTE INCOMPATÍVEL AO PATRIMÔNIO. RECOLHIMENTO DA QUANTIA IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

[...]

2. Não atendidos os requisitos para reconhecimento da dívida de campanha, previstos no art. 35, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17. A dívida de campanha, não quitada no prazo regulamentar, não assumida pelo partido político, ou cuja cobrança seja renunciada pela credora, vem sendo considerada como recurso de origem não identificada pela jurisprudência, ensejando seu recolhimento ao erário.

3. Os valores oriundos do FEFC não utilizados não constituem sobras de campanha.

4. Utilização de recursos próprios em valor incompatível com o patrimônio declarado pelo prestador por ocasião de seu registro de candidatura.

5. Prestação de contas não revestida de confiabilidade e transparência. Falhas graves, as quais ensejam o juízo de desaprovação e o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

6. Desaprovação.

(Prestação de Contas n 060296141, ACÓRDÃO de 09.9.2019, Relator GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data: 12.9.2019.) (Grifou-se.)

Assim, com fundamento no art. 82 da Resolução de regência, deve ser determinado  o recolhimento de R$ 259.656,46 ao Tesouro Nacional, caracterizados como RONI.

No caso dos autos, sequer é possível cogitar da aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, notadamente porque o montante das irregularidades supera, em muito (mais de seis vezes), o valor da arrecadação de campanha, sendo impositiva a desaprovação das contas.

Ante o exposto, VOTO pela desaprovação das contas de FERNANDO RODRIGUES LOPES, candidato ao cargo de deputado federal pelo Progressistas (PP), referentes à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2018, com base no art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17, com a determinação de recolhimento da quantia de R$ 259.656,46 (duzentos e cinquenta e nove mil, seiscentos e cinquenta e seis reais e quarenta e seis centavos) ao Tesouro Nacional.