RE - 2175 - Sessão: 10/12/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por NEDY DE VARGAS MARQUES contra sentença que desaprovou as contas do MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO referentes à movimentação financeira do exercício de 2016, determinando a devolução ao Tesouro Nacional da quantia recebida de fontes vedadas (R$ 2.467,34), acrescida de multa de 10%, totalizando o montante de R$ 2.714,07.

Em suas razões, o recorrente sustenta que as contribuições consideradas de fonte vedada foram realizadas por pessoas físicas filiadas ao partido prestador das contas. Postula que os recursos sejam considerados regulares. Invoca a aplicação da Resolução TSE n. 23.546/17, em seu art. 12, inc. IV, § 1º, que passou a admitir contribuições de detentores de cargos demissíveis ad nutum, desde que filiados a partido. Requer o provimento do recurso para aprovação das contas.

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 875-881).

É o relatório.

VOTO

O apelo é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, motivo pelo qual dele conheço.

No mérito, o MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO teve suas contas partidárias relativas ao exercício de 2016 julgadas desaprovadas em razão do reconhecimento da seguinte irregularidade: doações realizadas por ocupantes dos cargos de confiança, enquadrados como fontes vedadas de recursos, no valor de R$ 2.467,34. Ainda, o montante foi acrescido de multa de 10%, totalizando o valor de R$ 2.714,07.

O recurso limita-se à discussão acerca da retroatividade da Resolução TSE n. 23.546/17, em seu art. 12, inc. IV, § 1º, que passou a admitir contribuições de detentores de cargos demissíveis ad nutum, desde que filiados a partido.

De acordo com o exame das contas, foram recebidas no exercício financeiro de 2016 receitas identificadas nos extratos bancários como oriundas de autoridades em exercício de cargo/emprego público, no valor total de R$ 2.467,34.

No ponto, ficou consignado na sentença o reconhecimento das doações para a agremiação provenientes de fonte vedadas, com a aplicação da Resolução TSE n. 23.464/15. Com acerto a decisão a quo, pelos fundamentos que passo a expor.

É incontroverso que os cargos comissionados ocupados pelos doadores ao tempo das doações inserem-se no conceito de autoridade pública prevista no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, com a redação vigente ao tempo dos fatos, conforme regulamentação insculpida no art. 12, inc. IV e § 1°, da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(…)

XII – autoridades públicas.

(…)

§2º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso XII do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

De fato, o originário art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, coibia aos partidos o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(…)

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

Tal entendimento foi solidificado na Resolução TSE n. 23.464/15, cujas disposições disciplinam o exercício financeiro de 2016:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

IV – autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso IV do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

(…)

No pertinente à aplicação retroativa das disposições previstas pela Lei n. 13.488/17 e Resolução TSE n. 23.546/17, em seu art. 12, inc. IV, § 1º, é pacífico o entendimento de que as prestações de contas são regidas pela lei vigente à época dos fatos – tempus regit actum, em prol, resumidamente, dos princípios da isonomia e da segurança jurídica.

Assim, a prestação de contas, do exercício de 2016, é regulada pela Resolução TSE n. 23.464/15, em seu art. 12, inc. IV, § 1º, conforme bem delineado na sentença recorrida.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. DIRETÓRIO ESTADUAL DE PARTIDO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXECUÇÕES. INVIÁVEL O PARCELAMENTO MEDIANTE DESCONTOS DOS REPASSES DO FUNDO PARTIDÁRIO. POSSIBILIDADE COM RECURSOS PRÓPRIOS. ART. 44 DA LEI 9.096/95. RESOLUÇÃO TSE N. 21.841/04. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012.

1. As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15 ao art. 37 da Lei 9.096/95 não se aplicam às prestações de contas partidárias de exercícios anteriores. A nova redação dada retirou a suspensão de quotas do Fundo Partidário e estabeleceu exclusivamente a imposição de multa de até 20% sobre o valor a ser recolhido. Tratando-se de prestação de contas do exercício financeiro de 2012, devem ser observadas as normas de direito material previstas na Resolução TSE n. 21.841/04.

2. Irretroatividade da Lei n. 13.488/17, in casu, por ser processo de exercício anterior a sua vigência. Obediência aos princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica.

3. Agremiação condenada a recolher valores ao Fundo Partidário e ao Tesouro Nacional. Possibilidade de parcelamento. Vedado o uso de recursos do Fundo Partidário na medida em que o art. 44 da lei 9.096/95 prevê hipóteses taxativas de sua aplicação.

4. Negado provimento. (TRE-RS, PC n. 6380, Acórdão de 31.01.2018, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS.)

Na situação dos autos, as doações ocorreram no exercício financeiro de 2016, nos termos do Parecer Conclusivo de fls. 835-838.

Dessarte, sendo contribuições anteriores ao dia 06.10.2017, observa-se a redação original do art. 31 da Lei n. 9.096/95, bem como os comandos do art. 12, inc. IV e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, os quais vedavam as contribuições, ainda que oriundas de filiados. Assim, a nova disposição não cabe ser aplicada à hipótese porque ocorridas antes da sua vigência.

Nessa linha de raciocínio, aliás, já há precedente deste Tribunal, cuja relatoria coube ao Des. Federal João Batista Pinto Silveira:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS PROCEDENTES DE FONTES VEDADAS. DETENTORES DE CARGOS DEMISSÍVEIS AD NUTUM. IRRETROATIVIDADE DA LEI N. 13.488/17. DUPLO TRATAMENTO JURÍDICO DAS DOAÇÕES DE PESSOAS FÍSICAS EXERCENTES DE CARGOS DE CHEFIA E DIREÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. RETIFICAÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. REDUÇÃO DAS PENALIDADES DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DE MULTA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Recebimento de recursos procedentes de fontes vedadas. É proibido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da Administração direta ou indireta, quando ostentarem a condição de autoridades. No caso dos autos, identificado o recebimento de doações de recursos financeiros de ocupantes de funções de direção e chefia.

2. Irretroatividade da Lei n. 13.488/17. 2.1. Posicionamento, deste Tribunal, pela aplicação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 em sua redação original, devido à irretroatividade de novas disposições legais, ainda que mais benéficas ao prestador de contas, em homenagem aos princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica. 2.2. Duplo tratamento jurídico das doações de pessoas físicas exercentes de cargos de chefia e direção na Administração Pública, em decorrência da sucessão legislativa. Devido ao fato de a Lei n. 13.488/17 ter entrado em vigor no dia 06.10.2017, cumpre aplicar, em relação às contribuições anteriores a esta data, a redação original do art. 31 da Lei dos Partidos Políticos, bem como as prescrições do art. 12, inc. IV e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, as quais vedavam as contribuições ainda que provenientes de filiados a partidos políticos. Todavia, as contribuições realizadas a partir de 06.10.2017 devem observar o disposto no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95 em sua nova redação, que ressalva a licitude dos auxílios pecuniários quando advindos de filiados a partidos políticos.

[...]

Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 14-74. Relator Des. João Batista Pinto Silveira. Julgado em 04.02.2019, unânime.)

Assim, é de ser mantida a sentença nos seus exatos termos.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.