PC - 0602047-74.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/11/2019 às 17:00

VOTO

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria deste Tribunal, em seu exame técnico (ID 2687333), apurou – dentre outras falhas que ao final restaram sanadas – a existência de omissão de despesa na prestação de contas, revelada pela identificação de nota fiscal eletrônica emitida contra o CNPJ do candidato, conforme quadro abaixo:

O candidato, a tal respeito, manifestou-se asseverando que “não efetuou o pagamento da despesa eleitoral acima descrita, bem como não reconhece a emissão desta Nota Fiscal e, por tal razão não efetuou o lançamento” (ID 2786183).

A unidade técnica, em parecer conclusivo, juntou o referido documento fiscal e, entendendo que houve recebimento de recursos de origem não identificada para adimplemento do gasto, opinou pela desaprovação das contas e pelo recolhimento de valores aos cofres públicos (ID 3174883).

Após nova manifestação do candidato, que insistiu em não reconhecer a despesa (ID 3257133), sobreveio o derradeiro parecer técnico conclusivo, o qual, afastando as demais inconsistências previamente apontadas, persistiu glosando o gasto não contabilizado, razão por que opinou pela desaprovação e pelo recolhimento de R$ 250,75 ao Tesouro Nacional (ID 3979083).

Pois bem.

O órgão técnico, ao realizar, no âmbito do Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE-Web), os cruzamentos entre a documentação apresentada pelo candidato e notas fiscais eletrônicas e extratos eletrônicos disponibilizados pelo TSE, informações de receitas e gastos de campanha de outros prestadores, informações de órgãos públicos e demais conferências, localizou a seguinte nota fiscal eletrônica, em que figuram como prestador de serviços a empresa FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA. e como tomador de serviços ELEICAO 2018 PAULO HENRIQUE SOARES NICHELE DEPUTADO ESTADUAL:

Tal documento fiscal não restou declarado na prestação de contas, e, mais que isso, mesmo após a SCI tê-lo revelado, a despesa que ocasionou a sua emissão não foi reconhecida pelo candidato.

Em face disso, o órgão técnico, deduzindo que o gasto eleitoral foi quitado por meio de recursos de origem não identificada, opinou pelo recolhimento ao erário da quantia equivalente.

Com razão.

Nessa linha, em recente precedente, esta Corte fixou que as despesas omitidas na prestação de contas caracterizam recursos de origem não identificada, já que foram ou serão pagas com recursos que deixarão de transitar pelas contas de campanha e se submeter ao controle da Justiça Eleitoral, o que atrai a imposição de recolhimento do valor equivalente ao Tesouro Nacional. Tal julgamento, de relatoria do Desembargador Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, ocorrido em 02.9.19, nos autos da PC n. 0602006-10, foi assim ementado:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL PELA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. OMISSÃO DE DESPESAS. PERCENTUAL RELEVANTE. RECOLHIMENTO DO VALOR IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Omissão de despesas. Identificadas duas notas fiscais não registradas na prestação de contas do candidato. Ausência de manifestação do prestador durante o processo.

2. As despesas omitidas na prestação de contas foram pagas com valores não individualizados nos registros financeiros, caracterizando-se como recursos de origem não identificada. Falha grave, que representa 13,34% da arrecadação na campanha eleitoral, ensejando a desaprovação das contas. Recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

3. Desaprovação. (Grifou-se.)

O caso dos autos é similar ao precedente citado, de forma que a busca pela uniformização da jurisprudência dos Tribunais recomenda que encontre a mesma solução.

O candidato, mesmo após cientificado quanto à existência da nota fiscal não declarada, não logrou comprovar erro em sua emissão, logo a omissão detectada pela unidade técnica constitui falha, que deve ser levada em consideração por ocasião do julgamento das contas.

Nesse passo, a inconsistência observada nas contas, consistente na omissão de despesa de R$ 250,75, representa apenas 1,69% do total da arrecadação declarada (R$ 14.880,00), revelando-se inexpressivo o montante frente ao conjunto da contabilidade, de modo que se mostra adequado, mediante a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, afastar o severo juízo de desaprovação das contas, a fim de aprová-las com ressalvas, na esteira da jurisprudência do egrégio TSE:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRÍNCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data: 29.9.2017.) (Grifei.)

Noutro giro, não obstante as contas devam ser julgadas aprovadas com ressalvas, pelas razões esposadas acima, restou verificado pela unidade técnica forte indício de omissão de gasto na prestação de contas, e, por via transversa, de receita, fato que, em tese, constitui o delito tipificado no art. 350 do Código Eleitoral:

Art. 350. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais:

Pena - reclusão até cinco anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa, se o documento é público, e reclusão até três anos e pagamento de 3 a 10 dias-multa se o documento é particular.

Parágrafo único. Se o agente da falsidade documental é funcionário público e comete o crime prevalecendo-se do cargo ou se a falsificação ou alteração é de assentamentos de registro civil, a pena é agravada.

Assim, devem ser remetidas cópias digitalizadas destes autos ao Ministério Público Eleitoral, a fim de apurar eventual ilícito criminal.

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas de PAULO HENRIQUE SOARES NICHELE, com base no art. 77, inc. II, da Resolução TSE n. 23.553/17, com a determinação do recolhimento de R$ 250,75 ao Tesouro Nacional e pela remessa de cópia digitalizada dos autos ao Ministério Público Eleitoral que atua perante o domicílio do candidato.