PC - 0603515-73.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/11/2019 às 17:00

VOTO

Inicialmente, não conheço da petição e dos documentos apresentados após a conclusão dos autos para julgamento, e indefiro o pedido de retirada de pauta para concessão de novo prazo ao prestador e reexame das contas.

Após a emissão do parecer técnico conclusivo e da manifestação ministerial, o prestador juntou aos autos 95 páginas contendo extensa documentação fiscal contendo diversos documentos, tais como cópias de cheques, contratos, notas fiscais, extratos, etc.

Tendo em vista a intempestividade da diligência, os novos dados apresentados devem ser desconsiderados.

O processo de prestação de contas possui etapa própria e específica para a realização de diligências e apresentação de documentos, qual seja, a manifestação acerca do parecer para expedição de diligências, de que trata o art. 72 da Resolução TSE n. 23.553/17.

Cuida-se de oportunidade de manifestação preclusiva, como se extrai claramente do art. 75 do referido diploma, o qual somente autoriza nova manifestação após o parecer conclusivo caso a parte não tenha sido intimada para se manifestar oportunamente sobre a falha apontada:

art. 75. Emitido parecer técnico conclusivo pela existência de irregularidades e/ou impropriedades sobre as quais não se tenha dado oportunidade específica de manifestação ao prestador de contas, a Justiça Eleitoral intimá-lo-á para, querendo, manifestar-se no prazo de 3 (três) dias contados da intimação, vedada a juntada de documentos que não se refiram especificamente à irregularidade e/ou impropriedade apontada.

Este Tribunal tem reconhecido o caráter preclusivo das oportunidades de manifestação em prestação de contas, não admitindo manifestações intempestivas, especialmente quando causem tumulto processual, como se verifica pela seguinte ementa:

AGRAVO DE INSTRUMENTO RECEBIDO COMO AGRAVO INTERNO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. JULGAMENTO CONJUNTO. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. DECISÃO QUE INDEFERIU PEDIDO DE PRORROGAÇÃO DE PRAZO PARA MANIFESTAÇÃO SOBRE PARECER TÉCNICO. REQUERIMENTO DILATÓRIO SEM JUSTIFICATIVA PERTINENTE. DESPROVIMENTO. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS.

Aplicação do princípio da fungibilidade para receber o agravo de instrumento como agravo interno, por ser o apelo cabível contra decisões monocráticas proferidas pelos membros do Tribunal, conforme o caput do art. 115 do Regimento Interno do TRE-RS. Irresignação contra o indeferimento de pedido de prorrogação do prazo para manifestação sobre o parecer técnico de exame das contas.

Pedido dilatório desprovido de justificativa. Após manifesta desídia no atendimento às intimações da Justiça Eleitoral, o candidato pretendia reabrir a instrução e provocar novo exame técnico de documentos apresentados a destempo, comprometendo com isso a efetividade do processo. Não conhecimento.

Entendimento pela irregularidade na utilização de valores advindos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e do Fundo Partidário, diante da inexistência de registros fiscais referentes à totalidade dos gastos efetuados, conforme exigido pelo art. 63 da Resolução TSE n. 23.553/17. Falha que impede a fiscalização da Justiça Eleitoral sobre os recursos públicos aplicados na campanha.

Recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

Desprovimento do recurso. Desaprovação das contas.

(PC n. 0601971-50.2018.6.21.0000, Rel. Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos, DJERS de 09.8.2019.)

Na hipótese, a complementação dos documentos apresentados nas contas após o parecer conclusivo e a manifestação ministerial, além de sua intempestividade, causa evidente tumulto processual, demandando a realização de nova perícia técnica sobre as informações prestadas, impondo a reabertura da marcha processual.

Assim, dada a preclusão da oportunidade de apresentar novos documentos e o tumulto processual causado, caso as novas informações fossem admitidas, deixo de conhecer dos documentos e da retificação de contas juntados aos autos após a conclusão do processo para julgamento, e indefiro o pedido de retirada de pauta.

No mérito, após a realização dos procedimentos técnicos e da análise dos documentos e esclarecimentos prestados, a Secretaria de Controle Interno e Auditoria deste TRE emitiu parecer conclusivo pela desaprovação das contas, em razão das seguintes irregularidades: (a) omissão de despesas, apurada por meio de identificação de notas fiscais informadas pela Secretaria da Receita Estadual; (b) irregularidades com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) - (b.1) ausência de prova do pagamento de despesas realizadas com recursos do FEFC; (b.2) falta de provas da efetiva realização de despesas pagas com recursos do FEFC; (b.3) pagamento de passagens sem prova do vínculo dos beneficiários com o candidato; (b.4) despesa com serviço não previsto em resolução; (b.5) registro de diferentes pagamentos para a mesma nota fiscal.

Passo à analise individualizada das falhas.

(a) Omissão de Despesas

A Secretaria de Controle Interno apurou a existência de notas fiscais eletrônicas registradas na Secretaria da Receita Estadual alusivas a serviços e bens fornecidos ao prestador no valor total de R$ 2.037,97, mas que não foram declaradas na prestação de contas.

Em fase de cumprimento de diligências, o prestador admitiu a veracidade desses gastos e informou que as despesas foram realizadas com recursos do Fundo de Caixa. Todavia, aludido fundo foi integralmente empregado para o pagamento de outras despesas, como apontou o parecer conclusivo:

Em sua manifestação (ID 2177383), o prestador alega que “estes valores foram efetivamente pagos em dinheiro na campanha eleitoral, conforme FUNDO DE CAIXA, no valor de R$ 5.000,00” e junta “parte dos documentos localizados”. Ocorre que, analisando os gastos registradas pelo prestador no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE-Cadastro), as despesas relacionadas neste item não foram declaradas pelo prestador. Registre-se que o prestador admite a realização dessas despesas em sua manifestação. O fundo de caixa, de fato constituído, foi utilizado, conforme o Relatório de Despesas disponibilizado pelo SPCE-Web, para o pagamento de despesas diversas das aqui relacionadas.

A existência de notas fiscais de fornecimento de bens e serviços não declaradas na prestação de contas, especialmente quando confirmadas pelo prestador, sem os correspondentes recursos de campanha arrecadados para fazer frente a tais despesas, indicam subsistirem recursos de origem não identificada, pois, a toda evidência, tais gastos foram pagos com recursos que não passaram pelo controle da Justiça Eleitoral.

Por caracterizar recurso de origem não identificada, o montante equivalente deverá ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 34 da Resolução TSE n. 23.553/17:

art. 34. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

(b) Irregularidades com o FEFC

(b.1) falta de juntada de cheques nominais de pagamento de despesas realizadas com o FEFC:

O parecer conclusivo apontou que o candidato não apresentou a cópia microfilmada dos cheques nominais utilizados para pagamento de despesas realizadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), no total de R$ 131.236,05.

Registrou o órgão técnico:

Em consulta ao extrato bancário eletrônico, disponibilizado pelo TSE no site http://divulgacandcontas.tse.jus.br , não é possível identificar cheque nominal ou transferência bancária aos fornecedores acima individualizados.

Cabe referir que cumpre ao prestador comprovar o pagamento da despesa com cheque nominal ou comprovante de transferência bancária, conforme art. 40 da Resolução TSE nº 23.553/2017, sob pena de recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores não comprovados.

Em relação aos cheques, a Resolução TSE n. 23.553/17 estabelece que os gastos financeiros somente podem ser realizados por cheque nominal, transferência bancária ou débito em conta:

Art. 40. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 41 e o disposto no § 4º do art. 10 desta resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário; ou

III - débito em conta.

A prestação de contas tem a finalidade de esclarecer e demonstrar a movimentação de recursos de campanha, permitindo que se identifique a origem das receitas e o destino das despesas, notadamente aquelas realizadas com recursos públicos, como o Fundo Partidário e o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Essa finalidade justifica todas as formalidades impostas aos candidatos, desde a arrecadação de recursos, passando pela realização de despesas, até a apresentação das contas de campanha.

Nessa linha de raciocínio, não basta que o prestador informe o destinatário de uma despesa específica ou apresente nota fiscal do serviço. O gasto deve ser realizado por meio de operações que permitam à Justiça verificar se os recursos financeiros efetivamente foram entregues aos credores informados.

Em relação ao cheque, especificamente, o título precisa ser nominal, conforme expressa determinação normativa, porque isso garante sua efetiva entrega ao credor informado e permite identificar a cadeia de endossos.

Entretanto, diversamente da conclusão da área técnica, a ausência de cópia de cheque ao fornecedor ou de transferência bancária identificando o beneficiário não enseja o recolhimento ao erário, quando restarem comprovados os gastos por meio de documentos idôneos, como na hipótese vertente.

À luz do § 1° do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17, tal providência é exigida apenas nos casos em que se verificar o recebimento de recursos de fonte vedada ou de origem não identificada, ou, relativamente aos recursos do Fundo Partidário e/ou do FEFC, quando inexistir comprovação hábil de sua utilização ou seu emprego for considerado indevido.

Nesse sentido, colaciono recente acórdão desta Corte, da lavra do Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL PELA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS ORIUNDOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). DEMONSTRADA APLICAÇÃO DOS RECURSOS PÚBLICOS. INDEVIDA A IMPOSIÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

A natureza pública dos recursos oriundos do FEFC estabelece ao prestador o dever de assegurar a demonstração da sua correta aplicação, com obediência aos ditames legais e regulamentares, que exigem, dentre outras prescrições, a identificação do real beneficiário na própria transação bancária.

Tratando-se da contratação individual de pessoas físicas para serviços de distribuição de material de campanha, em que dispensada a emissão de documento fiscal, os gastos estão comprovados por meio da juntada dos correspondentes recibos de pagamento, na forma facultada pelo § 2º do art. 63 da Resolução TSE n. 23.553/17. Irregularidade quanto ao meio de pagamento utilizado, em desacordo ao disposto no art. 40, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Nesse contexto, diante da demonstração da aplicação dos recursos públicos com os recibos acostados, é indevida a imposição de recolhimento ao Tesouro Nacional. A falha corresponde a 36,08% do total das despesas de campanha, inviabilizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, impondo o juízo de reprovação das contas.

Desaprovação.

(TRE-RS, PC n. 0602655-72.2018.6.21.0000, Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, julgado em 05.9.2019, publicado no DEJERS em 10.9.2019.)

Portanto, considerando terem sido juntados aos autos os respectivos comprovantes de pagamento (contratos, notas fiscais e recibos) no valor de R$ 131.236,05, há demonstração da devida aplicação dos recursos por meio de comprovantes idôneos, sendo incabível a imposição de recolhimento de valores ao erário, em face da ausência de previsão legal dessa consequência.

(b.2) Falta de comprovação da efetiva despesa:

Não houve, ainda, a prova da efetiva contratação de 02 despesas, uma no valor de R$ 12.000,00 e outra no montante de R$ 1.000,00.

O candidato, em manifestação, afirma estar dispensado de apresentar as notas fiscais das despesas, mas tal dispensa não encontra respaldo nas normas de regência.

O art. 56, inc. II, al. "c", da Resolução TSE n. 23.553/17 exige a apresentação das notas fiscais alusivas a gastos realizados com recursos do FEFC, in verbis:

art. 56. Ressalvado o disposto no art. 65 desta resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta, cumulativamente:

II - pelos seguintes documentos, na forma prevista no § 1º deste artigo:

c) documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Partidário e com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), na forma do art. 63 desta resolução, à exceção daqueles já encaminhados à Justiça Eleitoral, na forma do art. 50, § 1º-A, desta resolução;

Tais documentos são de apresentação obrigatória também na prestação de contas simplificada, como se extrai do art. 67, § 5º, da Resolução TSE n. 23.553/17:

art. 67.

§ 5º Na hipótese de utilização de recursos provenientes do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), além das informações transmitidas pelo SPCE, na forma do caput, o prestador de contas deverá apresentar os respectivos comprovantes dos recursos utilizados, na forma do disposto no § 1° do art. 56 desta resolução.

Assim, consideram-se não comprovadas as aludidas despesas.

(b.3) Pagamento de transporte a terceiros:

Apontou a Secretaria de Controle Interno que foram utilizados recursos do FEFC para o pagamento de passagens a terceiros no valor total de R$ 335,00 sem prova do vínculo dos beneficiários com o candidato.

Despesas com transporte e deslocamento do candidato ou de pessoal a serviço da campanha são espécies de gastos eleitorais expressamente previstos no art. 37, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.553/17.

A importância da comprovação de que os terceiros beneficiados possuem vínculo com o candidato reside no fato de evitar a apropriação ou o desvio de recursos públicos – provenientes do FEFC – para finalidades distintas da campanha eleitoral.

As circunstâncias do caso, todavia, não permitem vislumbrar indícios de desvio de recursos públicos. Vê-se que foram realizados pequenos gastos, de R$ 50,00, em diferentes dias, todos com a devida identificação do fornecedor do serviço e documento fiscal pertinente. Ademais, os gastos individualmente considerados são condizentes com valores de passagens de ônibus e, considerados globalmente, mostram-se razoáveis para uma campanha de âmbito estadual.

Assim, tenho por afastar a irregularidade apontada, diante das peculiaridades do caso concreto.

(b.4) Despesa realizada em finalidade não eleitoral:

O parecer conclusivo indicou, ainda, que houve um gasto de R$ 450,00 com recursos do FEFC na confecção de uma “chave canivete citroen codificada”.

Tal despesa não guarda relação com gastos de campanha e não encontra correspondente previsão no elenco de gastos eleitorais do art. 37 da Resolução TSE n. 23.553/17.

Trata-se, portanto, de gasto irregular com recursos públicos.

(b.5) Existência de dois registros para a mesma nota fiscal:

Constam na prestação de contas dois registros de pagamentos de R$ 122,00, um em espécie e outro por meio de cheque, associados à mesma nota fiscal.

Diante da ausência de explicação por parte do prestador, considera-se que um desses registros de despesa não está comprovado, pois não foi apresentado o seu correspondente comprovante.

Dessa forma, consideram-se irregulares os pagamentos de despesas no total de R$ 144.808,05, realizadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Tal valor se soma aos R$ 2.037,97 que caracterizam recursos de origem não identificada, totalizando R$ 146.846,02, o qual representa 70,5% do total de recursos declarados na prestação de contas.

Do montante em questão, a quantia de R$ 15.609,97 deverá ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 82, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17:

art. 82.

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa de cópia digitalizada dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

Ante o exposto, preliminarmente não conheço dos novos documentos juntados pelo prestador após a conclusão do feito para julgamento, indeferindo o pedido de retirada de pauta, e no mérito VOTO pela desaprovação das contas, com a determinação de recolhimento da quantia de R$ 15.609,97 ao Tesouro Nacional.