PC - 0602492-92.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/11/2019 às 17:00

VOTO

Inicialmente, ressalto que as circunstâncias do caso concreto evidenciam a razoabilidade do recebimento dos documentos juntados no ID 3417833, embora não tenham sido objeto de avaliação pelo órgão técnico.

Vejamos.

Em um primeiro aspecto, verifica-se que a prestadora de contas apresentou novos documentos em 04.7.2019, após a remessa dos autos ao órgão de análise, mas anteriormente à emissão do parecer técnico conclusivo, ocorrida em 05.7.2019 (ID 3427283). Assim, o órgão técnico teve conhecimento oportuno dos documentos mencionados, tanto assim que registrou expressamente a sua juntada no relatório emitido, embora não os tenha conhecido sob o fundamento de que oferecidos intempestivamente.

Em segundo, a nova documentação é representada por microfilmagens de cheques nominais emitidos pela candidata. Assim, trata-se de documentos simples, de fácil apreensão, aptos a esclarecer de imediato e prima facie as irregularidades em testilha, dispensando a avaliação técnico contábil especializada.

Por fim, referida prova, não consistindo em elemento essencial à formalização das contas, uma vez que não exigida expressamente pela Resolução TSE n. 23.553/17, somente pode ser obtida posteriormente, após a provocação da unidade técnica, por meio dos serviços de agências e correspondentes bancários, nem sempre tão céleres quanto os prazos procedimentais das contas de campanha.

Destaco, neste ponto, que a normatização das contas eleitorais prevê o diminuto lapso de três dias corridos para a apresentação de esclarecimentos e documentos requisitados pelo órgão técnico de análise, sob pena de preclusão (art. 72, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17). Por outro lado, a regulamentação do serviço de microfilmagens de cheques pagos ou liquidados do Banco Central prevê o prazo de até 5 dias úteis, contados da solicitação, para o fornecimento dos documentos pelas instituições bancárias (art. 14, inc. III, da Resolução BACEN n. 2.398/93).

Nesse contexto, entendo que as cópias das cártulas acostadas no ID 3417833 devem ser conhecidas e analisadas no presente julgamento.

Em relação ao mérito, o órgão técnico concluiu que parte das irregularidades constatadas nas contas não foram sanadas pela candidata por falta de apresentação das cópias de 16 cheques, identificando a contraparte beneficiária de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) no valor de R$ 5.860,00:

Entretanto, após a análise da documentação juntada pela candidata, verifico que parte dos pagamentos arrolados foram devidamente comprovados.

Os cheques nominais foram apresentados (ID 3232983, 3417983, 3418033 e 3418083) e, à exceção dos pagamentos realizados com o cheque n. 900100, no valor de R$ 50,00, pois o nome do beneficiário é diverso do contido no contrato de trabalho vinculado ao pagamento, e com os cheques n. 90093, de R$ 150,00, e n. 90086, no valor de R$ 1.800,00, que estão ilegíveis, impossibilitando a verificação do valor e do beneficiário.

Dessa forma, as operações carentes de comprovação quanto à forma de pagamento utilizada devem ser reduzidas para R$ 2.000,00, valor que resulta da soma dos três cheques que deveriam ter sido apresentados na forma nominal, de acordo com o art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17:

Art. 40. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 41 e o disposto no § 4º do art. 10 desta resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário; ou

III - débito em conta.

§ 1º O pagamento de boletos registrados pode ser realizado diretamente por meio da conta bancária, vedado o pagamento em espécie.

§ 2º É vedado o pagamento de gastos eleitorais com moedas virtuais.

Contudo, diversamente da conclusão da unidade técnica, a ausência de comprovação de que o pagamento foi efetuado pelo prestador por meio de cheque nominal ao fornecedor não enseja o recolhimento da equivalente quantia ao erário quando restarem comprovados os gastos por meio de outros documentos idôneos, como no caso sub examine.

O recolhimento aos cofres públicos é exigido apenas nas hipóteses em que se verificar o recebimento de recursos de fonte vedada ou de origem não identificada, ou, relativamente aos recursos do Fundo Partidário e/ou do FEFC, quando inexistir comprovação hábil de sua utilização ou seu emprego for considerado indevido, consoante dispõe o art. 82, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17, verbis:

Art. 82. (…).

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa de cópia digitalizada dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

Nesse sentido, destaco recentes arestos desta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. CONHECIMENTO PARCIAL DA DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA. PRECLUSÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. GASTOS COM RECURSOS ORIUNDOS DO FUNDO ESPECIAL PARA FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC) EM DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA. FALHAS AS QUAIS TOTALIZAM 34,80% DOS VALORES AUFERIDOS NA CAMPANHA ELEITORAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

(…).

3. Ausência de cheques nominais emitidos para os pagamentos efetuados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, em desacordo com o disposto no art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17. Embora apresentados documentos - notas fiscais e recibos de prestação de serviço – comprovando as despesas realizadas, permanece a inobservância do meio de pagamento estipulado para os gastos eleitorais, configurando mácula grave na contabilidade. Comprovada a aplicação dos recursos do FEFC, descabe o comando de recolhimento ao erário.

4. Irregularidades as quais representam 34,80% de impacto sobre a receita de campanha.

5. Desaprovação.

(PC n. 0602477-26, Rel. Des. El. Roberto Carvalho Fraga, julgado em 03.10.2019.)

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS ORIUNDOS DO FUNDO ESPECIAL PARA FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

(…).

2. A ausência de prova da emissão de cheque nominal ao fornecedor não enseja o recolhimento ao erário quando restarem demonstrados os gastos mediante documentos idôneos, conforme estabelece o art. 63 da Resolução TSE n. 23.553/17. Esse dispositivo prevê que a comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de lançamento, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário, ou dos contraentes, pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

3. Na hipótese, o órgão técnico apontou que todos os gastos estão comprovados por intermédio de notas fiscais. Demonstrada a devida aplicação dos recursos do FEFC na campanha eleitoral, por meio de documentação idônea, incabível a imposição de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

4. Falha que representa 12,52% de impacto sobre a receita de campanha, viabilizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

5. Aprovação com ressalvas.

(PC n. 0602644-43, Rel. Des. El. Gerson Fischmann, julgado em 15.10.2019.)

Portanto, diante da demonstração da devida aplicação dos recursos do FEFC na campanha eleitoral, por meio de documentação idônea, incabível a imposição de recolhimento de valores ao erário, em face da ausência de previsão legal dessa consequência em relação à falha no meio de pagamento utilizado.

Ultimada a análise do ajuste contábil, tem-se que a irregularidade apurada nestes autos cinge-se à soma de R$ 2.000,00, equivalente a apenas 3,9% do total de receitas declaradas (R$ 51.100,00).

Desse modo, o montante revela-se inexpressivo frente ao conjunto da contabilidade, de forma que se mostra adequado, mediante a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, afastar o severo juízo de desaprovação das contas, a fim de aprová-las com ressalvas, na esteira da jurisprudência do egrégio TSE:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRÍNCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data: 29.9.2017.) (Grifei.)

Na mesma linha, destaco a seguinte ementa deste Tribunal Regional:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES DE 2016. VEREADOR. LIMITE DE GASTOS COM ALIMENTAÇÃO. DIVERGÊNCIA QUANTO À AUTORIA DAS DOAÇÕES. IRREGULARIDADES INFERIORES A 10% DA ARRECADAÇÃO. PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. Gastos com alimentação que excedem em 3,2% o limite de despesas dessa natureza e divergência entre os dados do extrato bancário e as declarações de doações registradas no balanço contábil que expressam 3,57% dos recursos arrecadados. Falhas que, somadas, representam menos de 10% dos recursos utilizados na campanha, não prejudicando a confiabilidade das contas. Incidência do princípio da proporcionalidade. Provimento parcial. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE n. 41060 PORTO ALEGRE - RS, Relator: MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Data de Julgamento: 25.6.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 112, Data: 27.6.2018, p. 6.)

Por fim, autorizo a Procuradoria Regional Eleitoral a enviar cópia dos presentes autos eletrônicos ao Ministério Público Eleitoral com atribuição junto ao primeiro grau de jurisdição, visando a apuração de eventual prática de infração penal, sendo desnecessária a intervenção da Justiça Eleitoral para a medida.

Diante do exposto, VOTO pela aprovação das contas com ressalvas das contas de DIONE ELISA DE AVILA DIAS, com fundamento no art. 77, inc. II, da Resolução TSE n. 23.553/17.