PC - 0603405-74.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/11/2019 às 17:00

VOTO

Trata-se da prestação de HELDER GONÇALVES SALVÁ, candidato a deputado federal nas eleições do ano de 2018.

Após a análise técnica da prestação de contas, a Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI) apontou como não superadas as seguintes irregularidades, todas relacionadas a despesas realizadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC):

a) despesas não comprovadas com documentos fiscais, no montante de R$ 11.670,00;

b) pagamento ao fornecedor por meio de cheque não nominal, no valor de R$ 2.690,00;

c) não apresentação do comprovante de pagamento, referente à despesa contratada com fornecedor, na quantia de R$ 1.307,25.

Intimado, o candidato não apresentou esclarecimentos.

À análise.

Inicialmente, reconheço mera impropriedade relativa ao recebimento de recursos do FEFC na conta “Outros recursos”, pois esta é destinada apenas ao recebimento de doações para a campanha eleitoral. Ressalvo, entretanto: em si mesma, a mácula pode não ter relevo determinante, "desde que a movimentação financeira da conta bancária em questão esteja devidamente comprovada, ou seja, identificada a origem das receitas e o destino das despesas”, conforme bem apontado no Parecer Conclusivo da SCI.

Em relação ao primeiro apontamento, as despesas com o FEFC, cuja comprovação fora considerada irregular pelo órgão técnico (pois não comprovadas com documentos fiscais), são as seguintes:

Quanto à situação dos fornecedores arrolados, cabem considerações.

Tanto Michele Domingues Nunes quanto Hugo Leonardo Bozzetti Olioni, de acordo com as informações indicadas na prestação de contas, estão apontados como responsáveis pela Administração financeira da campanha, consoante se verifica em http://inter03.tse.jus.br/sitdoc/DownloadFile?id=d49fb46d-711c-4c25-9592-e530b37feef1&inline=true:

O pagamento de ambos ocorreu por meio da emissão de cheques nominais; entretanto, restou ausente a comprovação da regularidade da contratação, paga com recursos públicos.

O prestador não trouxe, v.g., o contrato de prestação de serviços firmado com Michele e Hugo, ou outro documento que comprovasse minimamente a contratação - e a despesa.

O regramento aplicável está assim delineado:

Art. 56. Ressalvado o disposto no art. 65 desta resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta, cumulativamente:

[...]

II - pelos seguintes documentos, na forma prevista no § 1º deste artigo:

[...]

c) documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Partidário e com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), na forma do art. 63 desta resolução;

c) documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Partidário e com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), na forma do art. 63 desta resolução; (Redação dada pela Resolução nº 23.575/2018)

Ao encontro da regra supramencionada vem o art. 63 da Resolução TSE n. 23.553/17, dispondo que a comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome do candidato, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

Por sua vez, o § 2º do mesmo artigo dispõe que, quando dispensada a emissão de documento fiscal, a comprovação da despesa pode ser feita por meio de recibo, desde que contenha a data de emissão, a descrição e o valor da operação ou prestação, a identificação do destinatário e do emitente pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ, endereço e assinatura do prestador de serviços.

Ou seja, decorre da dicção regulamentar ser imprescindível que os documentos que eventualmente substituam os documentos fiscais, nos estritos casos em que isso é possível, contemplem todos os requisitos acima descritos.

No caso dos autos, o prestador não juntou aos autos documentos que sanem as irregularidades apontadas pela SCI.

Ainda, em relação ao apontamento, chama atenção que 50% dos gastos da campanha tenham sido realizados com coordenadores de campanha, em especial incompatíveis com a dimensão da campanha promovida pelo candidato. Em reforço, trago à colação aresto do Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas:

ELEIÇÕES 2018. PRESTAÇÃO DE CONTAS. IRREGULARIDADE NA CONTRATAÇÃO DE DESPESAS. DÍVIDAS DE CAMPANHA NÃO ASSUMIDAS PELO PARTIDO. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL.

1. A existência de dívidas de campanha não assumidas pelo partido constitui irregularidade grave que acarreta, por si só, a desaprovação das contas.

2. De igual forma, constitui irregularidade grave a conduta do candidato de excluir da prestação de contas, sem justificativa plausível, despesas apontadas como irregulares no relatório preliminar de diligências.

2. A extrapolação do limite de gastos com locação de veículo também constitui irregularidade grave, ensejando a devolução do valor correspondente ao excesso ao Tesouro Nacional.

3. Devem ser tidas por irregulares as despesas com contratação de “administrador financeiro” e “locação de imóvel” quando incompatíveis com a dimensão da campanha promovida pelo candidato, devendo os respectivos recursos do Fundo Partidário ser restituídos ao Tesouro Nacional.

4. Contas desaprovadas, com determinação de devolução de recursos ao Tesouro Nacional.

(TRE/AM, PC n. 0601662-03.2018.6.04.0000, Acórdão de 23.5.2019, Rel. Juíza Federal ANA PAULA SERIZAWA SILVA PODEDWORNY.) (Grifei.)

Assim, como não houve a comprovação da utilização dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), dentro das hipóteses permitidas, permanece a falta, no valor total de R$ 11.670,00, cabendo a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

De outra sorte, em relação ao segundo apontamento, o exame técnico indicou pagamento ao fornecedor denominado Gráfica Imperial, por meio de cheque não nominal, no valor de R$ 2.690,00.

A disposição normativa assim determina:

Art. 40. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 41 e o disposto no § 4º do art. 10 desta resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário; ou

III - débito em conta.

[…]

Consta nos autos a imagem da ordem de pagamento em http://inter03.tse.jus.br/sitdoc/DownloadFile?id=485129f5-0be7-4820-af7d-9e5b8f1a4b3c&inline=true:

Dessa maneira, o gasto está comprovado: foi utilizado para pagar material de campanha (serviços de impressão de santinhos), nos termos da nota fiscal de serviço, com valor correspondente de compensação no extrato da conta-corrente. Apenas houve a emissão sem a indicação do beneficiário, o que viola as disposições do art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17, de forma que não se fala de ausência de comprovação da despesa ou de aplicação de recursos.

Nesse contexto, não incide determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, pois a norma de regência prescreve a providência sempre que se verificar o recebimento de recursos de fonte vedada ou de origem não identificada e a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida:

Art. 82. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 33 e 34 desta resolução.

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa de cópia digitalizada dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

Portanto, diante da demonstração da aplicação dos recursos do FEFC com o comprovante do gasto mediante a nota fiscal de serviço, é indevida a imposição de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, embora subsista a mácula relativa à ausência de prova da regularidade do meio de pagamento.

Finalmente, no que diz respeito ao terceiro apontamento realizado pela Unidade Técnica, foi verificado que o prestador não apresentou comprovante de pagamento referente à despesa com o fornecedor Organizações Risul Editora Gráfica Ltda., em 27.9.2018, no valor de R$ 1.307,25.

Todavia, ao analisar a falha apontada, nota-se que o candidato arrolou a despesa com o fornecedor Organizações Risul Ed. Gráfica, tendo sido elencada em http://inter03.tse.jus.br/sitdoc/DownloadFile?id=0e0c52a3-ba01-4020-9039-0fdfaed535fc&inline=true (fl. 5 de 6 das despesas da prestação de contas), mediante a Nota Fiscal Fatura n. 68326, no valor de R$ 1.307,25, que pode ser visualizada em http://inter03.tse.jus.br/sitdoc/DownloadFile?id=3d34e883-3cc8-4c0e-8c1a-3b8954c9f2c0&inline=true:

Ademais, em anotação realizada na nota fiscal, é possível identificar que o pagamento teria sido feito através do cheque de n. 000006, do Banco Bradesco, na data de 06.10.2018 (ID 536983), sendo o dado confirmado pelo extrato da conta-corrente, consoante se verifica em http://inter03.tse.jus.br/sitdoc/DownloadFile?id=485129f5-0be7-4820-af7d-9e5b8f1a4b3c&inline=true:

E, muito embora o cheque tenha sido apresentado em 27.9.2018 e "devolvido", a cártula foi reapresentada e compensada, tendo sido demonstrada sua utilização para pagamento de publicidade de campanha, com nota fiscal de serviço e valor correspondente de compensação.

Assim, dá-se a mesma circunstância do apontamento anterior, em que a irregularidade verificada envolve apenas os meios de pagamento utilizados, regulados pelo art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17, e não a comprovação das próprias despesas ou a aplicação dos recursos, de maneira que não há que se falar em ordem de recolhimento de valores.

Em conclusão, são irregulares:

(1) a ausência de comprovação de despesas realizadas com recursos do FEFC, no valor total de R$ 11.670,00, cabendo a imposição de recolhimento do valor ao Tesouro Nacional;

(2) os pagamentos de gastos eleitorais nos valores de R$ 2.690,00 e de R$ 1.307,25, com afronta ao disposto no art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17, sem a necessidade de ordem de recolhimento.

As falhas atingem o montante de R$ 15.667,25 e correspondem a 71,2% do total das receitas de campanha (R$ 22.000,00), o que inviabiliza a aplicação dos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade.

Por derradeiro, consigno que os presentes autos virtuais encontram-se à disposição da Procuradoria Regional Eleitoral para, assim desejando, extrair cópia da documentação que entenda pertinente.

Ante o exposto, com fundamento no art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17, VOTO pela desaprovação das contas de HELDER GONÇALVES SALVÁ, com a determinação de recolhimento do valor de R$ 11.670,00 (onze mil, seiscentos e setenta reais) ao Tesouro Nacional.