PC - 0602954-49.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/11/2019 às 17:00

VOTO

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria desta Casa, em parecer preliminar, apontou irregularidades na contabilidade de campanha, dentre as quais a falta de comprovantes relativos ao pagamento de todas as despesas realizadas com recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) (ID 2307183).

A candidata, em manifestação, juntou documentos e informou que os pagamentos foram realizados em dinheiro, ou seja, sem cheques ou transferências bancárias, tendo extrapolado o limite para constituição de fundo de caixa, mas que o pagamento das despesas foi comprovado, inexistindo má-fé (ID 2548983).

Em parecer conclusivo, a unidade de contas manteve a irregularidade consistente na ausência de comprovantes de pagamento de despesas realizadas com recursos públicos, em um total de R$ 42.050,00, ante a falta de cópia de cheques nominais ou transferências bancárias, e considerou sanados os demais apontamentos.

Com efeito, remanescem as falhas relativas à aplicação de verbas do Fundo Partidário e do FEFC na campanha.

A Resolução TSE n. 23.553/17 estabelece que os gastos financeiros somente podem ser realizados por cheque nominal, transferência bancária ou débito em conta:

Art. 40. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 41 e o disposto no § 4º do art. 10 desta resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário; ou

III - débito em conta.

A prestação de contas tem a finalidade de esclarecer e demonstrar a movimentação de recursos de campanha, permitindo que se identifiquem a origem das receitas e o destino das despesas, notadamente aquelas realizadas com recursos públicos, como o Fundo Partidário e o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Essa finalidade justifica todas as formalidades impostas aos candidatos, desde a arrecadação de recursos, passando pela realização de despesas, até a apresentação das contas de campanha.

Nessa linha de raciocínio, não basta que o prestador informe o destinatário de uma despesa específica ou apresente nota fiscal do serviço. O gasto deve ser realizado por meio de operações que permitam à Justiça verificar se os recursos financeiros efetivamente foram entregues aos credores informados.

Em relação ao cheque especificamente, o título precisa ser nominal, conforme expressa determinação normativa, porque isso garante sua efetiva entrega ao credor informado e permite identificar a cadeia de endossos.

De nada adiantaria exigir-se que a transação se faça por cheque nominal, se a Justiça Eleitoral não puder solicitar cópia do título, para averiguar se houve a sua efetiva emissão nominal ao credor informado na prestação de contas.

A Resolução TSE n. 23.553/17 admite que a Justiça Eleitoral requeira outros documentos aptos a esclarecer a movimentação financeira, além do rol de documentos obrigatórios, como se extrai do art. 56, § 2º, inc. II:

Art. 56.

§ 2º Para subsidiar o exame das contas prestadas, a Justiça Eleitoral poderá requerer a apresentação dos seguintes documentos, observado o que dispõe o § 1º deste artigo:

I - documentos fiscais e outros legalmente admitidos que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais;

II - outros elementos que comprovem a movimentação realizada na campanha eleitoral, inclusive a proveniente de bens ou serviços estimáveis.

Tal providência não tem relação com a presunção de má-fé do prestador. Trata-se de diligência para verificar se houve o efetivo cumprimento da norma: a emissão de cheque nominal ao fornecedor. A adequada demonstração dos gastos de campanha realizados com recursos públicos é ônus de todo candidato, por dever de transparência imposta pelo princípio republicano a todos que gerenciam ou utilizam verbas públicas.

Não se nega a possibilidade de endosso do título pelo fornecedor. Contudo, a microfilmagem dos cheques busca esclarecer se eles foram efetivamente emitidos de forma nominal e para o fornecedor da campanha. São esses fatos que devem ser confirmados com a prova. Eventual endosso posterior é irrelevante para a regularidade das contas.

Dessa forma, a ausência da cópia de cheque leva à não comprovação do gasto, tendo em vista (a) a finalidade da prestação de contas; (b) o dever de emissão de cheques nominais; (c) a possibilidade de requerimento de diligências adicionais, para além dos documentos de apresentação obrigatória; e (d) a natureza pública dos recursos utilizados.

Chama a atenção, neste feito, a circunstância de a candidata ter realizado o pagamento a seus fornecedores de campanha utilizando recursos do Fundo Partidário e do FEFC, da vultosa quantia de R$ 42.050,00 em dinheiro.

De fato, o saque de recursos para a realização de pequenas despesas é autorizado pelas normas de regência. Contudo, a constituição do Fundo de Caixa se limita a 2% do total de gastos contratados, vedada sua recomposição, nos termos do art. 41, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17:

Art. 41. Para efetuar pagamento de gastos de pequeno vulto, o órgão partidário e o candidato podem constituir reserva em dinheiro (Fundo de Caixa), desde que:

I - observem o saldo máximo de 2% (dois por cento) dos gastos contratados, vedada a recomposição.

Existe também limitação relativa ao valor de cada gasto a ser pago por meio do Fundo de Caixa, que não pode ultrapassar meio salário mínimo, nos termos do art. 42 do mesmo diploma normativo:

Art. 42. Para efeito do disposto no art. 41, consideram-se gastos de pequeno vulto as despesas individuais que não ultrapassem o limite de meio salário mínimo, vedado o fracionamento de despesa.

Parágrafo único. Os pagamentos de pequeno valor realizados por meio do Fundo de Caixa não dispensam a respectiva comprovação na forma do art. 63 desta resolução.

Na hipótese, como destacou o órgão técnico deste Tribunal, considerando que a prestadora contratou gastos com recursos públicos no valor total de R$ 51.646,25, a constituição do Fundo de Caixa estava limitada a R$ 1.032,93, sendo este o limite de gastos que poderiam ser realizados sem o uso de cheque nominal ao fornecedor ou transferência bancária.

Assim, do total de despesas realizadas com recursos públicos sem o uso de cheque ou transferência bancária – R$ 42.050,00 –, deve ser subtraído o valor do qual a candidata poderia dispor sem essas formalidades – R$ 1.032,93 –, resultando em uma movimentação irregular de R$ 41.017,07.

O montante de tais despesas realizadas irregularmente com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e do Fundo Partidário deverá ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 82, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17:

Art. 82.

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa de cópia digitalizada dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

Tendo em vista que as despesas irregulares com recursos do FEFC representam 77,36% das receitas arrecadadas, impõe-se a desaprovação das contas da candidata.

Ante o exposto, VOTO pela desaprovação das contas, com a determinação de recolhimento da quantia de R$ 41.017.07 ao Tesouro Nacional, e pela remessa de cópias dos autos ao Ministério Público Eleitoral com atribuições perante o domicílio eleitoral da candidata.