PC - 0602968-33.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/11/2019 às 17:00

VOTO

Conforme consta nos autos, após os procedimentos de exame, a unidade técnica observou, nos extratos bancários da conta “Outros Recursos”, dois depósitos sucessivos em dinheiro realizados pelo mesmo doador, na mesma data, cuja soma ultrapassa o limite legal para depósitos em espécie,  previsto no art. 22, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.553/17, conforme o seguinte quadro:

De fato, o conjunto de operações em tela não está sob o manto do art. 22, inc. I e § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17, consoante o qual as doações financeiras acima de R$ 1.064,10 devem ser realizadas por meio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário, com a obrigatória identificação do primeiro:

Art. 22. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

[…].

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

Embora os depósitos glosados, isoladamente, não tenham excedido o valor de R$ 1.064,10, o conjunto de transações alcançou a cifra de R$ 1.500,00. Neste aspecto, o art. 22, § 2º, da multicitada resolução, estipula que as doações sucessivas, realizadas por um mesmo doador, em uma mesma data, devem ser somadas para fins de aferição do limite regulamentar, verbis: “O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia”.

O escopo da norma é possibilitar o cruzamento de informações com o Sistema Financeiro Nacional de modo a permitir que a fonte declarada seja confirmada por meio dos mecanismos técnicos de controle da Justiça Eleitoral.

Nessa senda, destaco a elucidativa explanação lançada pelo órgão técnico de análise em seu parecer conclusivo:

O valor recebido em desacordo com a norma, sob a forma de depósito em dinheiro, impossibilita o cruzamento de informações com o sistema financeiro nacional, obstando a aferição da exata origem do recurso recebido. O CPF identificado nos depósitos em espécie, apenas identifica o depositante, mas não atesta a fonte de origem desse dinheiro, exatamente porque não saiu de uma conta bancária, inviabilizando o rastreamento conta-conta. A regra, portanto, é a transferência eletrônica; depósito em dinheiro é facultativo apenas para valor abaixo de R$ 1.064,10 e desde que não configure doação sucessiva, sendo suficiente o CPF para referida situação.

Em sua primeira manifestação, o prestador buscou sanear o apontamento por meio da apresentação dos comprovantes de depósitos identificados com o CPF de Andrei Lotermann (ID 2907383 e 2907433), bem como do espelho de rendimentos do doador (ID 2907483), demonstrando sua capacidade econômica para a contribuição.

Entretanto, sobre a prova produzida, é firme o posicionamento do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o mero depósito identificado é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato bancário:

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DEPÓSITO. ART. 18, §§ 1º E 3º, DA RES.-TSE 23.463/2015. PERCENTUAL EXPRESSIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. A teor do art. 18, §§ 1º e 3º, da Res.-TSE 23.463/2015, doações de pessoas físicas para campanhas, em valor igual ou superior a R$ 1.064,10, devem ser obrigatoriamente realizadas por meio de transferência eletrônica, sob pena de restituição ao doador ou de recolhimento ao Tesouro Nacional na hipótese de impossibilidade de identificá-lo.

2. Na espécie, é incontroverso que os candidatos, a despeito da expressa vedação legal, utilizaram indevidamente recursos financeiros R$ 5.000,00, o que corresponde a 16% do total de campanha oriundos de depósito bancário, e não de transferência eletrônica, o que impediu que se identificasse de modo claro a origem desse montante.

3. A realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua efetiva origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes, com destaque para o AgR-REspe 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018.

4. Concluir em sentido diverso especificamente quanto à alegação de que as irregularidades não comprometeram a lisura do ajuste ou de que houve um erro formal do doador demandaria reexame do conjunto probatório, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

5. Inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois se trata de falha que comprometeu a transparência do ajuste contábil. Precedentes.

6. Descabe conhecer de matéria alusiva ao desrespeito aos princípios da isonomia e legalidade (art. 5º, caput e II, da CF/88), porquanto cuida-se de indevida inovação de tese em sede de agravo regimental.

7. Agravo regimental desprovido.

(TSE – AgR-REspe n. 251-04, Relator Min. Jorge Mussi, julgado em 19.3.2019, publicado no DJE, Tomo 66, de 05.4.2019, pp. 68-69.)

Após o parecer técnico conclusivo, o candidato acostou o extrato bancário do doador indicado nos autos, no qual se verifica, no dia 11.9.2018, a compensação de cheque de R$ 1.500,00, em relação ao qual formula a alegação de que teria sido descontado com terceiros para a realização da operação financeira em testilha (ID 3668183 e 3668233).

Quanto ao ponto, não se olvida que este Tribunal tem arrefecido o rigor de disposições normativas quando o prestador, por outros meios, atinge o fim colimado pela norma, qual seja, a demonstração segura da origem dos recursos, mormente, por meio do oferecimento de comprovantes de saque em dinheiro da conta-corrente do doador e imediatos depósitos em dinheiro na conta de campanha, demonstrando que a operação de transferência bancário restou meramente decomposta em um saque seguido incontinenti de um depósito na mesma data.

Na hipótese dos autos, porém, os comprovantes não permitem que se estabeleça uma relação entre a movimentação financeira observada no extrato bancário e o depósito em espécie na conta eleitoral.

Com efeito, constata-se que a compensação do cheque na conta do apontado doador, no valor de R$ 1.500,00, ocorreu apenas em 11.9.2018, ou seja, posteriormente ao aporte de recursos na conta bancária do candidato, realizado em 10.9.2018, não sendo possível tomar aquela transação como origem da verba depositada.

Em realidade, o extrato bancário referente ao mês de setembro do suposto doador não apresenta nenhuma operação de saque em dinheiro que lhe poderia conferir a disponibilidade do montante em espécie para oferecimento em doação ao candidato, em qualquer data.

Dessarte, a ausência de comprovação segura do doador caracteriza o recurso como de origem não identificada, cujo valor correspondente, ou seja, R$ 1.500,00, deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 22, § 3º, e 34, caput, ambos da Resolução TSE n. 23.553/17.

Por outro lado, a irregularidade relatada é a única mácula vislumbrada nas contas e representa apenas 2,76% das receitas declaradas (R$ 54.250,00).

Desse modo, o montante revela-se inexpressivo frente ao conjunto da contabilidade, de forma que se mostra adequado, mediante a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, afastar o severo juízo de desaprovação das contas, a fim de aprová-las com ressalvas, na esteira da jurisprudência deste Tribunal Regional:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES DE 2016. VEREADOR. LIMITE DE GASTOS COM ALIMENTAÇÃO. DIVERGÊNCIA QUANTO À AUTORIA DAS DOAÇÕES. IRREGULARIDADES INFERIORES A 10% DA ARRECADAÇÃO. PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. Gastos com alimentação que excedem em 3,2% o limite de despesas dessa natureza e divergência entre os dados do extrato bancário e as declarações de doações registradas no balanço contábil que expressam 3,57% dos recursos arrecadados. Falhas que, somadas, representam menos de 10% dos recursos utilizados na campanha, não prejudicando a confiabilidade das contas. Incidência do princípio da proporcionalidade. Provimento parcial. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE n. 41060 PORTO ALEGRE - RS, Relator: MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Data de Julgamento: 25.6.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 112, Data: 27.6.2018, p. 6.)

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas de JORGE GILMAR AMARAL DE OLIVEIRA, com base no art. 77, inc. II, da Resolução TSE n. 23.553/17, e pela determinação de recolhimento da quantia de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 22, § 3º, e 34, caput, da mesma resolução.