RE - 10858 - Sessão: 28/01/2020 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS) de São Gabriel/RS contra sentença que desaprovou sua prestação de contas referente às eleições gerais de 2018, em virtude da falta de abertura de conta bancária específica para a movimentação financeira de campanha, e determinou a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário por 6 (seis) meses.

Em seu recurso (fls. 48-55), o partido pugna, preliminarmente, (1) pelo reconhecimento de cerceamento de defesa, uma vez que não foi intimado, após a apresentação do parecer técnico conclusivo, para manifestação acerca das irregularidades, bem como (2) pela nulidade da sentença, por ausência de fundamentação. No mérito, aduz que o período de suspensão de repasse oriundo do Fundo Partidário deve ser mitigado, considerados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Efetua prequestionamento de dispositivos com vistas à eventual interposição para instância superior. Requer o recebimento do recurso, o acolhimento da matéria preliminar ou o provimento de mérito da irresignação, reformando-se a sentença e determinando-se o período de 1 (um) mês de suspensão de quotas do Fundo Partidário.

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo, pois interposto em 22.8.2019, observado o prazo estipulado pelo art. 88 da Resolução TSE n. 23.553/17.

Presentes os demais requisitos, merece conhecimento.

No caso dos autos, o recorrente teve suas contas relativas às eleições de 2018 julgadas desaprovadas, em razão da ausência de abertura de conta bancária específica para o recebimento de recursos de campanha exigida pelo art. 10 da Resolução TSE n. 23.553/17. A decisão determinou, ainda, a suspensão do recebimento de valores oriundos do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses.

Preliminarmente:

a) cerceamento de defesa

Conforme indicado no parecer da d. Procuradoria Regional Eleitoral, não se vislumbra, nos autos, cerceamento de defesa. Note-se que, diante da constatação de irregularidade concernente à ausência de abertura de conta específica de campanha, a agremiação foi intimada por meio de nota de expediente, para, no prazo de 3 (três) dias, apresentar manifestação.

E o prazo transcorreu in albis (fl. 39).

A Resolução TSE n. 23.553/17 prevê que só deverá haver nova notificação caso a unidade técnica tenha verificado falha em relação a qual não se tenha dado ao prestador de contas prévia oportunidade de manifestação ou complementação.

Cerceamento de defesa não ocorrido. Afasto a preliminar.

b) ausência de fundamentação

O recorrente alega que não foram indicados os parâmetros utilizados na aplicação da sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário (período de 6 meses), violando o disposto no art. 93, inc. IX, da Constituição Federal.

Contudo, a magistrada, ao proferir a sentença, reconheceu como grave a falha detectada na prestação de contas do partido, ensejando o juízo de desaprovação, conforme se extrai do julgado (fl. 43v.):

A falta de comprovação pela grei partidária quanto à abertura de conta bancária, a fim de comprovar a ausência de movimentação financeira de campanha, revela-se como falha grave a ensejar o juízo de desaprovação.

Assim, afasto a preliminar de ausência de fundamentação.

Mérito

Da não abertura de conta bancária específica de campanha

De acordo com o art. 10, § 2º, da Resolução TSE n. 23.553/17 é exigida expressamente a abertura de conta bancária específica destinada a registrar a movimentação financeira de campanha, independente de haver qualquer arrecadação e/ou movimentação de valores.

Art. 10. É obrigatória para os partidos políticos e os candidatos a abertura de conta bancária específica, na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil ou em outra instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil.

[…]

§ 2º A obrigação prevista neste artigo deve ser cumprida pelos partidos políticos e pelos candidatos, mesmo que não ocorra arrecadação e/ou movimentação de recursos financeiros, observado o disposto no § 4º.

A magistrada a quo, com base nesse dispositivo, concluiu que a falta de abertura de conta-corrente consiste em irregularidade apta a comprometer a confiabilidade dos registros contábeis, por impedir a averiguação da existência de transações financeiras, julgando desaprovadas as contas do partido e determinando a perda do direito ao recebimento de quotas do Fundo Partidário.

Percebe-se, nos autos, que, inicialmente, o PPS de São Gabriel, após intimado por estar omisso, apresentou seus registros contábeis na data de 24.01.2019 e declarou não ter auferido receitas ou declarado gastos em contas que foram apresentadas zeradas (fls. 09-24).

O feito, assim, recebeu o rito próprio das contas prestadas (fl. 31 e v.).

Gizo que o prestador, diretório municipal de partido político, não participou da campanha eleitoral de 2018, por se tratar de eleições gerais, nas quais não há a disputa dos cargos de vereador e de prefeito.

Ora, em se tratando de órgão partidário, é possível aceitar o argumento de que, excepcionalmente, o PPS de São Gabriel não tenha participado do pleito. Os partidos são órgãos permanentes, diferentes da figura do candidato, cujo único propósito é disputar as eleições.

Tal distinção fática - o âmbito de atuação partidária e o de realização de campanhas eleitorais - torna crível a ausência do PPS de São Gabriel nas eleições de 2018.

Por óbvio, diferente seria o raciocínio se as contas fossem de órgão municipal em pleito municipal, âmbito de atuação direta da agremiação, o qual demandaria o seu natural envolvimento ou, ainda, se fossem referentes ao exercício financeiro da agremiação, no qual há inequívocos gastos com a manutenção ordinária do partido.

Os gastos de campanha, diferentemente, são pontuais e excepcionais, quando ocorrentes.

Portanto, entendo que a regra de abertura de conta bancária há de ser interpretada com equidade e sofrer temperamento em situações como a dos autos, ao menos para afastar o juízo de desaprovação ou determinações de suspensão de repasse de verbas oriundas do Fundo Partidário, como asseverado em sentença.

Ora, o órgão partidário municipal declarou (de maneira verossímil) não ter arrecadado ou aplicado recursos em prol de campanha eleitoral que transcende aos seus interesses imediatos.

Ou seja, prestou contas, conferindo obediência ao mandamento constitucional insculpido no art. 17, inc. III, da CF.

Em termos rigorosos, a irregularidade praticada pelo prestador foi deixar de abrir conta bancária específica, a qual seria inócua, vale lembrar.

Dito de outro modo, a falta de abertura de conta-corrente por diretório municipal em eleições gerais não há de ter, por corolário lógico, a desaprovação das contas, que pode ocorrer a depender das circunstâncias fáticas do caso.

A rigor, ela equivaleria à ausência de movimentação financeira.

Trago à colação precedente desta Casa que, analisando as contas de órgão partidário estadual, relativas a eleições municipais, aprovou-as com ressalvas, ainda que ausente conta bancária específica:

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. SERVIÇOS DE ADVOCACIA E CONTABILIDADE. UTILIZADOS PARA APRESENTAÇÃO DAS CONTAS. AUSÊNCIA DE CONTA BANCÁRIA ESPECÍFICA. AGREMIAÇÃO SEM PARTICIPAÇÃO NO PLEITO. ELEIÇÕES 2016. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. O uso de serviços advocatícios e de contabilidade para elaboração e apresentação das contas não são despesas de campanha, conforme dispõe o art. 29, § 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

2. A ausência de abertura de conta bancária específica para as eleições é irregularidade que, por si só, é apta a ensejar a desaprovação das contas. No entanto, ausentes indícios de participação do partido no pleito, adequado o entendimento de aprovação das contas com ressalvas, nos termos do parecer conclusivo da unidade técnica do Tribunal.

Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, PC n. 210-04.2016.6.21.0000, Relator Des. Eleitoral Jamil Andraus Hanna Bannura, julgado em 18.10.2017.) (Grifei.)

Na mesma senda, de minha relatoria, vide o RE n. 76-65.2018.6.21.0142, julgado na sessão ocorrida em 11.6.2019.

Entendo, por tais razões, que a irregularidade não tem o condão de comprometer as contas prestadas, ressaltando inexistir indício de participação do diretório nas eleições de 2018. Dadas as peculiaridades deste caso, a inexistência de conta bancária constitui-se em impropriedade formal, não ensejando a desaprovação das contas do órgão partidário.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas relativas às eleições de 2018 do PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS) de SÃO GABRIEL e afastar a determinação de suspensão de repasse de quotas oriundas do Fundo Partidário.