RC - 368 - Sessão: 10/12/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de agravo em execução penal interposto por OTÁVIO AUGUSTO FONTES, visando à reforma da decisão que indeferiu o pedido de extinção da punibilidade. Sustenta que houve o cumprimento integral de condições da suspensão condicional do processo, tendo em vista ter realizado a totalidade de horas determinadas em relação à prestação de serviços à comunidade. Ademais, aduz que a falta de apresentação mensal junto ao Cartório não pode ensejar nova medida de prestação de serviços à comunidade, sob pena de bis in idem, tendo cumprido parte substancial do acordo. Postula a declaração de extinção da punibilidade (fls. 263- 268).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo desprovimento do agravo.

É o relatório.

VOTO

O recurso é adequado (art. 197 da Lei de Execução Penal) e tempestivo.

Denunciado pelo crime previsto no art. 324, § 1º, do Código Eleitoral, o agravante aceitou a suspensão condicional do processo nos seguintes termos: a) prestação de serviços à comunidade, pelo período de 6 meses, à razão de 5 horas semanais; b) proibição de ausentar-se da Comarca por mais de 30 dias; c) comparecimento mensal em juízo, até o dia 15 de cada mês (fl. 142).

Foi certificado à fl. 146 que o agravante não compareceu em juízo no prazo assinalado. Intimado para apresentar justificativa, o benefício foi revogado (fl. 168) e o processo seguiu seus termos com a prolação de sentença condenatória.

Ocorre que restou demonstrado nos autos que o agravante cumpriu a totalidade das horas de prestação de serviços à comunidade (fls. 250 e 256) e que a informação anterior (fls. 181-190) estava equivocada.

Diante do cumprimento da prestação de serviços à comunidade, o Ministério Público Eleitoral com atuação no 1º grau postulou a extinção da punibilidade do agravante (fl. 258).

O pedido foi indeferido à fl. 259 porque, apesar do cumprimento da prestação de serviços à comunidade, o agravante não compareceu mensalmente em juízo, o que teria admitido à fl 174. Contra esse indeferimento é a insurgência.

Postula o agravante a aplicação da teoria do adimplemento substancial das condições impostas na suspensão condicional do processo.

Com razão.

Como nos ensina Bruno Preti de Souza:

A substancial performance teve origem no direito inglês, no século XVIII, com o objetivo de superar os exageros do formalismo exacerbado na execução dos contratos em geral. Adimplemento, em sentido estrito, indica cumprimento da obrigação. Por vezes, também é chamado de pagamento, implemento, solução, satisfação, quitação. A teoria do adimplemento substancial analisa a obrigação em seu aspecto essencial, e não secundário, examinando, no caso concreto, se a obrigação foi cumprida em seus pontos relevantes, importantes, essenciais, não valorizando elementos de somenos importância.

Referida teoria avalia, portanto, o grau de "descumprimento" da obrigação em toda sua extensão, e não de maneira isolada ou com base na literalidade de certas condições impostas, atuando como instrumento de equidade diante da situação fático-jurídica subjacente, permitindo soluções razoáveis e sensatas, conforme as peculiaridades do caso. (Disponível em: <http://www.lex.com.br /doutrina_25815629_A_TEORIA_DO_ADIMPLEMENTO_SUBSTANCIAL_NO_DIREITO_PENAL.aspx>, acesso em 21 out. 2019.)

Como se percebe, o instituto tem origem no Direito Civil, mas tem sido acolhido em relação ao Direito Penal, inclusive pelo Tribunal de Justiça deste Estado:

RECURSO CRIME. AMEAÇA. ART. 147 DO CP. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. DESCUMPRIMENTO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE Embora certa a possibilidade de revogação da suspensão condicional do processo mesmo após o seu termo final, se comprovado que o motivo da revogação ocorreu durante no período de prova, quando descumpridas as condições impostas, não menos certo é que, na espécie, houve substancial adimplemento das condições e, tratando-se de hipótese de revogação facultativa do benefício, ficava a critério da Magistrada revogá-la ou não. RECURSO MINISTERIAL IMPROVIDO.

(TJ-RS - RC n. 71003990355 RS, Relatora: Cristina Pereira Gonzales, Data de Julgamento: 12.11.2012, Turma Recursal Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 13.11.2012.)

Assim, quando o descumprimento de alguma das condições impostas na suspensão condicional do processo revelar-se insignificante frente ao que foi adimplido, imperiosa a declaração da extinção da punibilidade do agente.

Na espécie, o agravante prestou 120 horas de serviços à comunidade, no Albergue Municipal e Secretaria Municipal de Trânsito (fl. 250), apenas deixando de comparecer em juízo, mensalmente.

Por oportuno, novamente transcrevo Bruno Preti de Souza:

Exemplo: a determinado sujeito é concedido "sursis processual", com imposição de determinadas obrigações. Após o cumprimento de 90% das obrigações impostas, o sujeito deixa de cumprir apenas uma, consistente no comparecimento em juízo pela última para justificar suas atividades. Não comparece. É intimado para justificar o descumprimento. Não justifica. O benefício então é revogado, e é dada continuidade à ação penal. Não seria crível determinar a extinção da punibilidade ante o "adimplemento substancial" das condições impostas? Não foi cumprida a finalidade essencial do instituto beneficiador? (Disponível em: <http://www.lex.com.br/doutrina_25815629_A_TEORIA_DO_ADIMPLEMENTO_SUBSTANCIAL_NO_DIREITO_PENAL.aspx>, acesso em 21 out. 2019.)

Ademais, na espécie, o próprio Ministério Público Eleitoral postulou a extinção da punibilidade do agravante.

Dessarte, tenho por dar total provimento ao agravo interposto.

De outro vértice, constata-se que o agravante efetuou o pagamento de multa a que foi condenado. Contudo, como consequência do cumprimento da suspensão condicional do processo, deve ser restituída a importância ao agravante (fl. 271).

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do agravo interposto, ao efeito de declarar extinta a punibilidade do agravante e determinar, de ofício, a restituição do valor recolhido a título de multa.