RC - 29576 - Sessão: 13/12/2021 às 10:00

 

 

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra a sentença (fls. 1521-1547) que, julgando improcedente a denúncia, absolveu CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA da imputação da prática do crime previsto no art. 299 do CE e no art. 1º, caput, do Decreto-lei n. 201/67, c/c o art. 29, caput, do CP, ANA PAULA GARCIA HARTMANN em relação ao fato capitulado no art. 299 do CE, e ANA PAULA DA CRUZ quanto à acusação de incursão nos tipos do art. 299 do CE, c/c o art. 29, caput, e na forma do art. 71, caput, ambos do CP, todos com fundamento na atipicidade das condutas e na insuficiência de provas, nos termos do art. 386, incs. III e VII, do CPP.

Em suas razões recursais, o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL sustenta que a instrução probatória amealhada aos autos, produzida sob o contraditório judicial, é farta e demonstra a ocorrência dos ilícitos narrados na peça inicial. Assim, requer o conhecimento e o provimento do recurso, a fim de condenar os réus nos crimes imputados na denúncia (fls. 1550-1555v.).

CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA e ANA PAULA GARCIA DA CRUZ ofereceram contrarrazões, nas quais aduzem que a prova colhida durante o inquérito não autoriza a condenação dos réus, porque não confirmada na fase judicial. Argumentam que o conjunto probatório não mostra indício de compra e venda de votos. Ao final, pugnam pela manutenção da sentença absolutória (fls. 1558-1559).

Por sua vez, ANA PAULA GARCIA HARTMANN, em contrarrazões, assevera que nenhuma prova concreta foi produzida durante a fase judicial. Refere que, ao longo de toda a gravação telefônica que justificou a denúncia, não há menção à compra ou a qualquer outro favorecimento em troca de votos. Requer o desprovimento do recurso (fls. 1560-B-1566).

Em parecer, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso, com manutenção da sentença absolutória (fls. 1572-1583).

Renovada vista dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral para manifestação acerca de possível preliminar de não conhecimento do recurso em razão da preclusão consumativa (fl. 1587), o órgão ministerial reiterou o entendimento pelo conhecimento do apelo (fls. 1593-1595v.).

Determinada ao juízo de origem a remessa a esta instância do inquérito policial que deu base à acusação (fl. 1597 e verso), e aberta nova vista à Procuradoria Regional Eleitoral (fl. 1605), sobreveio parecer reiterando as manifestações anteriormente exaradas (fl. 1607).

É o relatório.

VOTO

 

Relator Substituto: Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos.

Relator original: Des. Silvio Ronaldo Santos de Moraes:

 

Da Admissibilidade

O Ministério Público Eleitoral foi intimado da sentença em 1º.10.2019 e o recurso foi interposto, por simples quota, na mesma data, na qual o agente ministerial consigna: “Interpõe-se apelação, requerendo-se, desde já, abertura de prazo para razões” (fl. 1.443v.). Posteriormente, no dia 04.10.2019, foram apresentadas as razões recursais (fl. 1.446).

Constata-se, portanto, que a interposição do apelo observou a sistemática prevista no art. 600 do CPP, conforme a qual a apelação é interposta por termo assinado nos autos, no prazo de 5 dias, correndo, após, o prazo de 8 dias para o oferecimento de razões, verbis:

Art. 600. Assinado o termo de apelação, o apelante e, depois dele, o apelado terão o prazo de oito dias cada um para oferecer razões, salvo nos processos de contravenção, em que o prazo será de três dias.

 

Entretanto, o recurso criminal eleitoral é regido por disciplina específica, não sendo admitida a aplicação subsidiária do art. 600 do CPP, pois o tema é integralmente regulado pelos arts. 266 e 362 do CE, pelos quais o recurso criminal eleitoral deve ser interposto por petição acompanhada de razões, no prazo de 10 dias, consoante a seguinte redação:

Art. 266. O recurso independerá de termo e será interposto por petição devidamente fundamentada, dirigida ao juiz eleitoral e acompanhada, se o entender o recorrente, de novos documentos.

 

(...)

 

Art. 362. Das decisões finais de condenação ou absolvição cabe recurso para o Tribunal Regional, a ser interposto no prazo de 10 (dez) dias.

 

Na hipótese dos autos, tendo em vista que as razões recursais foram oferecidas 8 dias após a apresentação do termo de interposição, não se mostra possível o conhecimento da correspondente peça, em virtude da preclusão consumativa, que impede o exercício do ato processual já ocorrido, ainda que tenha sido praticado de forma imperfeita.

Sobre a questão, assim discorre a doutrina de Freddie Didier Jr.:

A preclusão consumativa consiste na perda de faculdade/poder processual, em razão de essa faculdade ou esse poder já ter sido exercido, pouco importa se bem ou mal. Já se praticou o ato processual pretendido, não sendo possível corrigi-lo, melhorá-lo ou repeti-lo. A consumação do exercício do poder o extingue. Perde-se o poder pelo exercício dele.

 

Essa preclusão decorre da ideia de que não se deve repetir ato processual já praticado, encontrando fundamento normativo, para as partes, no art. 200 do CPC, que se refere à produção de efeitos imediatos com a prática de atos processuais pela parte, exaurindo-se o exercício do respectivo poder.

 

(Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. Vol. 1. 18º Ed. Salvador: Jus Podivm, 2016, p. 432.)

 

Por decorrência do não recebimento das razões que não acompanharam a interposição, não se pode, igualmente, admitir o recurso criminal carente de fundamentação específica sobre a inconformidade com o ato judicial, pois, com fundamento no princípio da dialeticidade, é imprescindível a exposição dos motivos pelos quais o recorrente ataca a decisão, delimitando a matéria devolvida ao Tribunal e permitindo o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa.

Tal deficiência atrai a aplicação da Súmula n. 26 do TSE, segundo a qual, "é inadmissível o recurso que deixa de impugnar especificamente fundamento da decisão recorrida que é, por si só, suficiente para a manutenção desta".

Seguindo essa direção, a jurisprudência do TSE exige a apresentação do recurso em petição única acompanhada de suas razões, reconhecendo a impossibilidade de conhecimento do recurso criminal eleitoral cujas razões são oferecidas em momento posterior ao ato de interposição.

Neste sentido, o seguinte julgado do STF:

PROCESSO PENAL ELEITORAL. RECURSO. RAZÕES. Ante o princípio da especialidade, o recurso, no âmbito da Justiça Eleitoral, há de ser interposto mediante petição fundamentada - artigo 266 do Código Eleitoral -, não cabendo a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal, ou seja, do disposto no § 4º do artigo 600, no que viabiliza a apresentação de razões posteriormente à formalização do recurso.

(HC 128873, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 18.04.2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-108 DIVULG 23.05.2017 PUBLIC 24.05.2017.)

 

Na mesma senda, está a consolidada jurisprudência do TSE:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CRIME DE TRANSPORTE IRREGULAR DE ELEITORES. ART. 11, III, DA LEI Nº 6.091/74. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO ELEITORAL CRIMINAL NÃO CONHECIDO. NÃO SE APLICA NO PROCESSO PENAL ELEITORAL O DISPOSTO NO ART. 600, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRECEDENTES DO TSE E DO STF. INCONSTITUCIONALIDADE DA NORMA INCRIMINADORA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS Nos 30/TSE E 282/STF. NÃO PROVIMENTO.

Histórico da demanda

1. Trata-se de agravo regimental manejado por Thiago de Gusmão contra decisão pela qual negado seguimento ao seu agravo de instrumento, porquanto alinhado o entendimento adotado pela Corte Regional à jurisprudência deste Tribunal Superior, aplicável ao caso a Súmula nº 30/TSE.

Da formalização e do prazo do recurso no processo penal eleitoral

2. O prazo para a interposição do recurso eleitoral criminal é de dez dias, conforme prescreve o art. 362 do Código Eleitoral, de modo que as razões do apelo devem acompanhar a respectiva petição de interposição. 3. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a faculdade processual prevista no art. 600, §4º, do Código de Processo Penal - direcionada ao recorrente no âmbito do processo penal comum - não se aplica ao processo penal eleitoral (AgR-REspe nº 23-52/SP, Rel. Min. João Otávio Noronha, DJe de 25.11.2014). (…)

(Agravo de Instrumento n. 21249, Acórdão, Relatora Min. Rosa Weber, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 115, Data 13.06.2018, Página 31-32.) Grifei.

 

Em amparo ao posicionamento, leciona a doutrina de Marcílio Nunes Medeiros, em anotação ao art. 266 do CE:

O recurso inominado deve ser interposto por meio de petição, acompanhada das respectivas razões recursais, que devem atacar especificamente os fundamentos da decisão impugnada. Não existe possibilidade de interposição por termo, com a juntada posterior das alegações, sob pena de inépcia recursal.

 

(Legislação eleitoral comentada e anotada. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 581, grifei.)

 

Colho, igualmente, o escólio de Rodrigo López Zilio:

Diversamente do que ocorre com a apelação do Código de Processo Penal (que contempla prazos autônomos para a interposição do termo recursal e, após, das razões; arts. 593 e 600, caput, do CPP), o prazo de 10 dias para o recurso criminal eleitoral é único – seja para o oferecimento do termo e das razões recursais. Vale dizer, no processo penal eleitoral existe a obrigação de a parte recorrente apresentar, em um mesmo momento, a petição e as razões do recurso, sob pena de preclusão.

 

(Crimes eleitorais. 4. Ed. Salvador: JusPodivm, 2020, p. 64, grifei.)

 

O entendimento também restou acolhido em julgados deste Tribunal Regional:

RECURSOS CRIMINAIS. PROCEDÊNCIA PARCIAL NA ORIGEM. CONDENAÇÃO POR FALSIDADE IDEOLÓGICA. ART. 299 DO CÓDIGO PENAL. PREFACIAL. NÃO CONHECIDO O RECURSO INTERPOSTO PELO ÓRGÃO MINISTERIAL. MÉRITO. INFORMAÇÃO INVERÍDICA EM DOCUMENTO PARTICULAR. TIPICIDADE DA CONDUTA IMPUTADA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Prefacial. No processo penal eleitoral, a apelação criminal eleitoral é regida por disciplina específica, prevista nos arts. 266 e 362 do Código Eleitoral, e deve ser apresentada no prazo de 10 dias, independentemente de termo, por petição fundamentada. O ato de interposição é concomitante à apresentação de razões, sob pena de preclusão consumativa. A jurisprudência dos Tribunais Superiores não excepciona nem mitiga o regramento, reconhecendo a impossibilidade de conhecimento das razões oferecidas em momento posterior ao pedido de recebimento do apelo. Inviável o processamento do recurso ministerial destituído de fundamentação específica quanto à matéria impugnada. Não conhecimento.

(...).

(TRE-RS – RC 34-47 – SANTO ANTÔNIO DA PATRULHA - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 21.07.2020) (Grifei.)

 

RECURSO CRIMINAL. REQUERIMENTO DE INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. INDEFERIMENTO. IRRECORRIBILIDADE DA DECISÃO IMPUGNADA. FORMA RECURSAL INADEQUADA. NÃO CONHECIDO.

1. Insurgência contra decisão do juízo a quo, que indeferiu requerimento formulado pelo Ministério Público Eleitoral postulando a instauração de incidente de insanidade mental da acusada.

2. Em tema de recursos no processo penal, o Código Eleitoral possui uma única previsão, contra a sentença condenatória ou absolutória, em seu art. 362. Por força do art. 364 do mesmo diploma legal, aplica-se a sistemática recursal do Código de Processo Penal (CPP) no processo criminal eleitoral, admitindo-se o manejo dos recursos penais nas hipóteses em que admitidos no CPP.

3. Irrecorribilidade das decisões não terminativas. Como a decisão impugnada é irrecorrível pela sistemática do código de processo penal, também não pode ser admitido o recurso contra a mesma decisão no processo penal eleitoral.

4. Forma recursal inadequada. Inaplicável no processo penal eleitoral a forma prevista no art. 600 do CPP. O art. 266 do Código Eleitoral contém previsão genérica a respeito da forma de interposição de recursos, exigindo a apresentação de petição devidamente fundamentada, já com as razões da irresignação.

5. Não conhecimento.

(TRE-RS - RC: 3072 - GUAÍBA - RS, Relator: GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 11.06.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 127, Data 12.07.2019, Página 9.) (Grifei.)

 

É também esse o entendimento de outros Tribunais Regionais:

RECURSOS CRIMINAIS. RECURSO DO PRIMEIRO RECORRENTE. NECESSIDADE DE APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES RECURSAIS NO MOMENTO DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO. ARTS. 266 E 268 DO CÓDIGO ELEITORAL. INAPLICABILIDADE DO DISPOSTO NO ART. 600 DO CPP. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. RECURSO DO SEGUNDO RECORRENTE. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. PEDIDO DE ALTERAÇÃO DO FUNDAMENTO DA ABSOLVIÇÃO PARA O INCISO IV DO ART. 386 DO CPP. AUSÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO NÃO COMPROVADA. ELEMENTOS PROBATÓRIOS QUE APONTAM PARA A POSSIBILIDADE DE PARTICIPAÇÃO NO ESQUEMA CRIMINOSO. DESPROVIMENTO DO RECURSO. Recurso do primeiro recorrente1. O recurso do primeiro recorrente foi interposto sem as respectivas razões, o que inviabiliza o seu conhecimento por este Tribunal, ainda que as razões tenham sido posteriormente apresentadas .2. As razões recursais devem ser apresentadas no momento da interposição do recurso criminal, sob pena de preclusão. Arts. 266 e 268 do Código Eleitoral. A faculdade de apresentação posterior das razões recursais, prevista no caput e no § 4º do art. 600 do CPP, não se aplica aos processos criminais de competência desta Justiça especializada, haja vista que o Código Eleitoral possui disposições específicas a esse respeito. Aplicação do princípio da especialidade. Jurisprudência do TSE. Precedentes do STF e do TRE/RJ. (...).

(TRE-RJ - RC: 668 CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ, Relator: CRISTINA SERRA FEIJÓ, Data de Julgamento: 25.02.2019, Data de Publicação: DJERJ - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-RJ, Tomo 049, Data 08.03.2019, Página 19/23.) Grifei.

 

Recurso criminal. Corrupção eleitoral. Art. 299 da Lei nº 4.737/65. Sentença absolutória. O art. 266 do Código Eleitoral que é aplicável às ações eleitorais preceitua que 'o recurso deve ser interposto por petição devidamente fundamentada' c/c o art. 362 que estabelece que os recursos eleitorais devem ser interpostos no prazo de 10 dias. Portanto, não há autorização para a apresentação posterior das razões recursais, conforme previsão contida no art. 600 do Código de Processo Penal, que deve ser aplicado aos feitos eleitorais de forma subsidiária, nos termos do art. 364 do Código Eleitoral. Assim, apresentação das razões recursais em data posterior a sua interposição ocorre a preclusão consumativa e, consequentemente, ausente o pressuposto objetivo de admissibilidade relacionado à regularidade formal do recurso apresentado. Não conhecimento do recurso.

(TRE-MG - RC: 4508 DIVINOLÂNDIA DE MINAS - MG, Relator: ANTÔNIO AUGUSTO MESQUITA FONTE BOA, Data de Julgamento: 07.12.2016, Data de Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Data 19.12.2016.) Grifei.

 

RECURSO CRIMINAL - ART. 11, INCISO III, DA LEI Nº 6.091/1974 - SENTENÇA CONDENATÓRIA - PEÇA DE INTERPOSIÇÃO DESACOMPANHADA DAS RAZÕES DE RECURSO - INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 600 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - NORMA SUBSIDIÁRIA E SUPLETIVA - OBSERVÂNCIA DOS ARTIGOS 266, 268 E 362 DO CÓDIGO ELEITORAL - RAZÕES QUE DEVEM SER APRESENTADAS CONJUNTAMENTE COM O APELO - OCORRÊNCIA DE PRECLUSÃO - AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO OBJETIVO DE ADMISSIBILIDADE RELATIVO A REGULARIDADE FORMAL - PRECEDENTES TSE E TRE/SP - RECURSO NÃO CONHECIDO.

(TRE-SP - RECC: 75740 SP, Relator: SILMAR FERNANDES, Data de Julgamento: 20.05.2014, Data de Publicação: DJESP - Diário da Justiça Eletrônico do TRE-SP, Data 27.05.2014.) Grifei.

 

Por sua vez, o douto Procurador Regional Eleitoral manifesta respeitável entendimento no sentido de que a preclusão consumativa se restringe às hipóteses em que há “segundo recurso interposto pela mesma parte, contra a mesma decisão” e no caso de “razões recursais apresentadas na forma do art. 600, § 4º, do CPP”, dispositivo que faculta o oferecimento de razões perante a instância superior (fls. 1.593-1.595v.).

Assim, conclui o órgão ministerial que, “presente na conduta do recorrente a boa-fé processual, tanto que oferecidas as razões dentro do prazo recursal e consoante deferimento do ato por parte do juízo a quo”.

Entretanto, entendo que a questão não envolve propriamente a apresentação ou não da peça perante o juízo apropriado ou a boa-fé do recorrente, bem como que a avaliação quanto à tempestividade da manifestação representa fator secundário diante da preclusão consumativa então operada.

Vale dizer, o caso em análise refere-se à impossibilidade de conhecimento das razões apresentadas pelo Ministério Público Eleitoral posteriormente à interposição do recurso, em decorrência da preclusão consumativa, uma vez que o ato no qual as razões deveriam ter sido encartadas já foi praticado, embora de forma irregular.

No aspecto, entendo que, quando o juízo a quo determinou a intimação do órgão ministerial para a apresentação de razões, a irregularidade formal do termo recursal já se encontrava irremediavelmente consumada.

Dessa forma, o error in procedendo no processamento do recurso em primeiro grau não tem o condão de vincular o juízo de prelibação pelo Tribunal, que deve analisar os requisitos de admissibilidade do ato inicial de interposição em conformidade com as normas pertinentes à espécie.

Consoante bem elucida a lição de Eugênio Pacelli de Oliveira:

No juízo recorrido, isto é, no qual se proferiu a decisão a ser impugnada, é feito um juízo de prelibação, para que somente sejam remetidos à instância superior os recursos que, a exame provisório, ostentem viabilidade de apreciação. Esse exame é feito, então, pelo próprio órgão responsável pela decisão.

 

Evidentemente, esse juízo de prelibação, que funciona mais como um filtro quanto à pertinência e ao cabimento do recurso, não vincula nem poderia vincular o órgão jurisdicional competente para o seu exame. A competência para o julgamento do recurso é do tribunal de hierarquia superior, daí por que ele não poderia se encontrar vinculado a qualquer decisão do juiz de origem. Relembre-se: a matéria atinente aos requisitos de admissibilidade do recurso pode e deve ser conhecida de ofício, tal como ocorre com os pressupostos processuais e com as condições da ação.

 

(Curso de Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 1.157, grifei.)

 

Assim, diante do não oferecimento de razões recursais na forma e no tempo devidos, ou seja, no momento da interposição recursal, operando-se a preclusão consumativa para a posterior prática do ato, impõe-se o não conhecimento do recurso interposto, em razão da irregularidade formal.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo não conhecimento do recurso.

 

 

DESTACO.

 

 

(Decisão: Em regime de discussão, pediu vista o Des. Gerson Fischmann. Julgamento suspenso.)

 

PROCESSO: RC 295-76.2016.6.21.0133

PROCEDÊNCIA: TRIUNFO

RECORRENTE(S) : MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL.

RECORRIDO(S) : CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA, ANA PAULA GARCIA HARTMANN E ANA PAULA DA CRUZ

SESSÃO DE 23-11-2021

 

 

 

Des. Eleitoral Gerson Fischmann:

 

VOTO-VISTA

 

Submeto a julgamento o presente voto-vista, nos autos do recurso criminal interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra a sentença que julgou improcedente a denúncia oferecida contra CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA, ANA PAULA GARCIA HARTMANN e ANA PAULA DA CRUZ, absolvendo os ora recorridos da imputação da prática dos crimes previstos no art. 299 do CE e no art. 1º, caput, do Decreto-lei n. 201/67, c/c o art. 29, caput, e art. 71, ambos do CP, com fundamento na atipicidade das condutas e na insuficiência de provas, nos termos do art. 386, incs. III e VIII, do CPP.

O então relator do feito, Desembargador Silvio Ronaldo Santos de Moraes, que recentemente deixou esta Corte em razão do término do biênio como magistrado eleitoral, apresentou voto, destacando para votação, em separado, a preliminar de não conhecimento do recurso por falta de impugnação dos fundamentos da sentença e preclusão consumativa.

O voto condutor entendeu ser inaplicável, na Justiça Eleitoral, a sistemática prevista no art. 600 do CPP, a qual permite que a apelação seja interposta por termo nos autos, no prazo de 5 dias, correndo, após, o prazo de 8 dias para o oferecimento das razões.

Conforme consta dos autos, na hipótese em apreço, o Ministério Público Eleitoral foi intimado da sentença em 1º.10.2019, e o recurso foi interposto, por simples termo, na mesma data, na qual o agente ministerial consigna: “Interpõe-se apelação, requerendo-se, desde já, abertura de prazo para razões” (fl. 1.443v.).

Após 8 dias, em 04.10.2019, dentro do prazo de interposição de 10 dias previsto no art. 362 do Código Eleitoral, foram apresentadas as razões recursais perante o primeiro grau de jurisdição (fl. 1.446), conforme procedimento previsto no art. 600 do CPP.

A forma de interposição vai de encontro à regra específica disposta nos arts. 266 e 362 do CE, segundo a qual o recurso criminal eleitoral deve ser interposto por petição concomitantemente acompanhada de razões, no prazo de 10 dias, sem possibilidade de apresentação de razões em prazo posterior.

Preceitua o artigo 266 do Código Eleitoral que “o recurso independerá de termo e será interposto por petição devidamente fundamentada, dirigida ao juiz eleitoral e acompanhada, se o entender o recorrente, de novos documentos”. Segue-se o artigo 268, dispondo que “nenhuma alegação escrita ou nenhum documento poderá ser oferecido por qualquer das partes, salvo o disposto no art. 270”.

Por essa razão, o então relator destacou a preliminar de não conhecimento do recurso, reportando-se ao entendimento sobre o tema já consolidado na doutrina e na jurisprudência do STF, TSE e desta Corte, por acórdão de minha relatoria, que assentou a impossibilidade de conhecimento do recurso sem a apresentação de razões no momento da interposição.

Pedi vista dos autos para melhor análise da preliminar.

Ao revisitar a matéria e refletir com maior profundidade sobre a situação posta em debate, na qual as razões foram apresentadas dentro do prazo de interposição do recurso, mas em data posterior, alcancei a conclusão de que a mera aplicação do princípio da especialidade para que o apelo não seja conhecido vai de encontro aos princípios do duplo grau de jurisdição, da proporcionalidade e da razoabilidade.

Não se desconhece que as normas processuais comuns somente são aplicáveis ao processo-crime eleitoral se houver lacuna na disciplina da matéria, mas é certo também que, no âmbito do processo eleitoral, vige o art. 219 CE. De acordo com esse dispositivo: “Art. 219. Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo”.

In casu, a irregularidade formal no momento de interposição não trouxe qualquer prejuízo ao processo, pois as razões recursais foram apresentadas perante o primeiro grau e dentro do prazo recursal, sem prejudicar a tramitação do feito.

Não se trata de hipótese de apresentação de razões somente na instância superior, isso é, nesta Corte Regional, faculdade prevista no art. 600, § 4º, do CP para o processo criminal comum, mas tão somente de apresentação de razões, dentro do prazo recursal de 10 (dez) dias, em momento posterior ao da interposição de termo declarando a vontade de recorrer.

É bem verdade que no processo penal eleitoral existe uma obrigação de a parte recorrente apresentar, em um mesmo momento, a petição e as razões do recurso, sob pena de preclusão. Todavia, considerando que as razões foram trazidas aos autos dentro do decêndio previsto na lei, não se mostra razoável, neste caso concreto, o não conhecimento do recurso, medida que se afigura desproporcional à irregularidade formal cometida pelo órgão recorrente.

Este novo olhar que faço sobre a matéria conduziu à conclusão de que é possível o conhecimento das razões oferecidas em data posterior à do termo declarando a intenção de recorrer, desde que dentro do prazo de interposição, por ausência de prejuízo, merecendo prevalecer a instrumentalidade das formas em detrimento do formalismo processual.

Cumpre referir que idêntico posicionamento foi adotado pela ilustre Procuradoria Regional Eleitoral, ao apontar a possibilidade de conhecimento das razões, uma vez que a preclusão consumativa só ocorreria quando há “segundo recurso interposto pela mesma parte, contra a mesma decisão”, ou na hipótese de as razões serem apresentadas perante a instância superior, “na forma do art. 600, § 4º, do CPP” (fls. 1.593-1.595v.).

Acompanho, assim, o entendimento ministerial de que “presente na conduta do recorrente a boa-fé processual, tanto que oferecidas as razões dentro do prazo recursal e consoante deferimento do ato por parte do juízo a quo”.

Não desconheço que há, na esfera eleitoral, entendimentos que comungam da sempre respeitável posição do eminente relator. Todavia, cada vez é preciso ver o processo como instrumento da realização do direito material; não obstante relevantes as regras processuais, até para assegurar a paridade de armas, porque a busca da justiça só pode ser aceita se definidas as regras do jogo com igualdade de oportunidades, tenho que é preciso dar uma certa largueza à compreensão de regras formais quando absolutamente inexistente qualquer prejuízo ao processo.

Nosso ordenamento convive há muito tempo com o principio da fungibilidade, em que se admite recurso incabível desde que interposto no prazo e que não constitua erro grosseiro. Aí está um exemplo de superação do formalismo em busca de uma exegese compatível com a realidade.

Claro que não deve haver interpretação que conduza a uma situação de absurdo ou disparidade; todavia, a aplicação da literalidade da lei, ainda que venha assim sendo praticada, não pode ser um inibidor eterno a ponto de congelar a compreensão e o entendimento da norma legal, sob pena de estancar a evolução do pensamento. Já se vão tempos imemoriais em que o juiz era “la bouche de la loi”. O direito moderno estrutura-se em técnicas de hermenêutica que buscam dar, de modo sistêmico, uma aplicação da regra legal em consonância com seu tempo e seus valores.

A legislação eleitoral prima pela celeridade e, certamente, a imposição de que as razões sejam apresentadas no momento da interposição tem este viés. Contudo, no caso concreto, não houve absoluta e rigorosamente nenhum prejuízo à referida celeridade, uma vez que as razões foram trazidas rigorosamente dentro do prazo. Pergunta-se: qual a diferença entre a situação dos autos e uma situação em que o recurso, com as razões, fosse interposto no derradeiro dia do prazo? Penso que rigorosamente nenhuma!

Veja-se que, após a juntada do termo declarando a intenção de recorrer, o juízo a quo determinou a intimação do órgão ministerial para a apresentação de razões, induzindo a parte a crer que o procedimento estava adequado. Com a vênia do entendimento do relator, entendo que o error in procedendo no processamento do recurso no âmbito do primeiro grau prejudicou o recorrente, levando-o a crer na regularidade da conduta adotada.

Com esses fundamentos, peço vênias para divergir do julgamento da matéria preliminar e VOTAR pelo conhecimento do recurso interposto, superando a mera irregularidade formal do modo de interposição.

Devolvo os autos à relatoria, para julgamento do mérito.

 

Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes:

Acompanho o voto do Relator pelo não conhecimento do recurso.

 

Des. Eleitoral Amadeo Henrique Ramella Buttelli:

Acompanho o voto divergente para conhecer do recurso.

 

Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle:

Acompanho o voto divergente para conhecer do recurso.

 

(DECISÃO: Após o voto do relator, acompanhado pelo Des. Oyama, não conhecendo do recurso, e dos votos dos Des. Gerson Fischmann,  Amadeo Buttelli e Luís Alberto Aurvalle, que o conheciam, pediu vista o Des. Moesch. Julgamento suspenso).

 

 

PROCESSO: RC 295-76.2016.6.21.0133

PROCEDÊNCIA: TRIUNFO

RECORRENTE(S) : MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL.

RECORRIDO(S) : CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA, ANA PAULA GARCIA HARTMANN E ANA PAULA DA CRUZ

SESSÃO DE 13-12-2021

 

Des. Francisco José Moesch:

 

VOTO-VISTA

 

Trago a julgamento o voto-vista nos autos do recurso criminal interposto pelo Ministério Público Eleitoral contra a sentença que julgou improcedente a denúncia oferecida em desfavor de CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA, ANA PAULA GARCIA HARTMANN e ANA PAULA DA CRUZ, absolvendo os ora recorridos da imputação da prática dos crimes previstos no art. 299 do CE e no art. 1º, caput, do Decreto-lei n. 201/67, c/c art. 29, caput, e art. 71, ambos do CP, com fundamento na atipicidade das condutas e na insuficiência de provas, nos termos do art. 386, incs. III e VIII, do CPP.

A questão em debate refere-se à preliminar de admissibilidade do recurso criminal, destacada pelo então relator do processo, Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, cujo voto entendeu pelo não conhecimento do apelo.

Na hipótese, o Ministério Público Eleitoral foi intimado da sentença em 1º.10.2019 e, seguindo a regra prevista no art. 600 do CPP, interpôs o recurso criminal eleitoral na mesma data, por quota, requerendo a abertura de prazo para o oferecimento de razões (fl. 1.443v.), as quais foram protocoladas apenas no dia 04.10.2019 (fl. 1.446).

O ilustre Relator, referenciando abalizada doutrina e jurisprudência, considerou inobservado o regramento específico previsto no art. 266 do Código Eleitoral, que exige a interposição do recurso por petição fundamentada, concluindo, assim, pelo não conhecimento das razões apresentadas em ato posterior, em razão da irregularidade formal e da preclusão consumativa, “uma vez que o ato no qual as razões deveriam ter sido encartadas já foi praticado, embora de forma irregular.”

Com efeito, é de se reconhecer que, nesta jurisdição eleitoral, há regramento específico no tocante à interposição de recurso porquanto, na forma dos art. 266 e 362 do Código Eleitoral, o recurso criminal independe de termo e deve ser interposto por petição fundamentada, dirigida ao Juiz Eleitoral, no prazo de 10 (dez) dias a contar da intimação da decisão final de condenação ou absolvição.

Cabe observar que o Código Eleitoral (Lei n. 4.737/65) é posterior ao Código de Processo Penal (Decreto-Lei n. 3.689/41), ou seja, o legislador optou por criar um sistema recursal específico, prestigiando a celeridade no processo criminal eleitoral, ao invés de adotar a sistemática então prevista na legislação processual penal comum.

Portanto, diante da previsão expressa na legislação eleitoral, está consolidado o entendimento que afasta a aplicação supletiva da regra do art. 600 do CPP, em relação a possibilidade de interposição de apelação, por termo, com a oferta das razões posteriormente, inclusive na instância superior, conforme bem exposto no voto prolatado pelo Des. Eleitoral Silvio Ronaldo.

Todavia, a controvérsia em tela está na circunstância em que a interposição e a apresentação de razões, ainda que em atos não concomitantes, ocorrem no prazo de 10 dias previsto no art. 362 do Código Eleitoral, tal como na hipótese concreta.

Conforme o posicionamento então defendido pelo Relator, os arts. 266 e 362 do Código Eleitoral revelam a intenção do legislador de que ambos os atos ocorram de maneira concomitante e unificada, de modo que a interposição de recurso criminal sem as respectivas razões acarreta a imediata preclusão consumativa, sendo desimportante que o magistrado a quo tenha, por equívoco, deferido prazo na forma do art. 600 do CPP, pois o ato irregular já estava irremediavelmente consumado.

Todavia, rogando vênia ao respeitável entendimento, acompanho a divergência inaugurada pelo Des. Eleitoral Gerson Fischmann, pois entendo que, ainda quando as razões tenham sido oferecidas após o termo de apelação, tendo havido o aperfeiçoamento do recurso dentro do prazo legal, não existe óbice ao seu conhecimento.

No ponto, dispensando desnecessária tautologia, colho o seguinte excerto do voto divergente:

É bem verdade que no processo penal eleitoral existe uma obrigação de a parte recorrente apresentar, em um mesmo momento, a petição e as razões do recurso, sob pena de preclusão. Todavia, considerando que as razões foram trazidas aos autos dentro do decêndio previsto na lei, não se mostra razoável, neste concreto, o não conhecimento do recurso, medida que se afigura desproporcional à irregularidade formal cometida pelo órgão recorrente.

 

Este novo olhar que faço sobre a matéria conduziu à conclusão de que é possível o conhecimento das razões apresentadas em data posterior ao do termo declarando a intenção de recorrer, desde que dentro do prazo de interposição, por ausência de prejuízo, merecendo prevalecer a instrumentalidade das formas em detrimento do formalismo processual.

 

Com efeito, uma vez que o termo de apelação, exteriorizando o propósito de recorrer, e as respectivas razões, delimitando a matéria impugnada, foram apresentadas dentro do prazo legalmente concedido à parte, não houve comprometimento mínimo ao regular curso processual, ao devido processo legal ou à análise do apelo pelo juízo ad quem.

Assim, por aplicação dos princípios da instrumentalidade das formas e da razoabilidade, tenho que as circunstâncias não inibem o conhecimento do recurso.

DIANTE DO EXPOSTO, acompanho a divergência em relação à matéria preliminar e voto pelo conhecimento do recurso, com devolução dos autos ao Relator para o julgamento de mérito.

É como voto, Senhor Presidente.

 

Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos (Relator Substituto):

 

Superada a preliminar de não conhecimento do recurso, passo ao exame do mérito.

 

 

Do Mérito

Inicialmente, registro que o presente processo é originário da cisão, em primeira instância, da Ação Penal n. 20.64.2015.6.21.0133, em que denunciados 45 réus pela prática de condutas envolvendo corrupção eleitoral nas eleições de 2012 no Município de Triunfo, estando delimitado aos réus Ana Paula Garcia Hartmann, Ana Paula da Cruz e Carlos Gilberto Rodrigues de Souza.

No mérito, a denúncia (fls. 72v. e 91-97) imputa aos recorrentes as condutas tipificadas nos arts. 299 do Código Eleitoral e 1º, caput, do Decreto-Lei n. 201/67, da forma assim discriminada: Ana Paula Garcia Hartmann: duas vezes art. 299, caput, do Código Eleitoral, combinado com o art. 29, caput, e na forma do art. 71, caput, ambos do Código Penal (56° e 58º fatos); Ana Paula da Cruz: art. 299, caput, do Código Eleitoral (57° fato); e Carlos Gilberto Rodrigues de Souza: art. 299, caput, do Código Eleitoral (15° fato) e art. 1º, caput, inc. I, do Decreto-Lei n. 201/67, combinado com o art. 29, caput, do Código Penal (16° fato).

Inicialmente, sublinho que não há prescrição a ser reconhecida. A denúncia foi recebida em 08.11.2018 (fl. 1.284), assim, não transcorreu o prazo prescricional de 8 anos previsto no art. 109, inc. IV, do CP, quando a pena máxima do crime imputado não excede a 4 anos, em relação ao tipo do art. 299 do Código Eleitoral, tampouco o prazo de 16 anos, previsto no art. 109, inc. II, do CP, quando a pena máxima do crime não excede a 12 anos, na hipótese do tipo do art. 1º, caput, inc. II, do Decreto-lei n. 201/67.

Passo, então, ao exame da pretensão recursal deduzida pelo Ministério Público Eleitoral em relação a cada recorrido.


 

ANA PAULA DA CRUZ

Conforme consta na inicial, Ana Paula da Cruz solicitou e recebeu, para si, serviços destinados à instalação do fornecimento de energia elétrica na sua residência, com a intermediação de Ana Paula Garcia Hartmann, funcionária da empresa Certaja, em troca do voto para o candidato a prefeito Marcelo Essvein e para o candidato a vereador José Valmir de Oliveira.

O fato foi deduzido na denúncia nos seguintes termos:

57º FATO – ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local, a denunciada ANA PAULA DA CRUZ, solicitou e recebeu, para si, serviços destinados ao fornecimento de energia elétrica na sua residência, para dar votos em favor dos candidatos a Prefeito Marcelo Essvein e Vereador José Valmir de Oliveira.

 

A sentença combatida concluiu, em síntese, que a prova dos autos não revela de forma suficiente o elemento subjetivo exigido pelo tipo penal do art. 299 do Código Eleitoral, ou seja, o oferecimento ou promessa de voto ou abstenção em troca de vantagens ou benefícios, entendendo, assim, pela improcedência da ação penal.

Verificando o acervo probatório, tenho que o decreto absolutório não merece reparos. Vejamos.

O principal lastro acusatório é a interceptação telefônica que teve por alvo o candidato José Valmir de Oliveira (PA.00918.00072/2012), cujos trechos relevantes para o deslinde do processo foram bem destacados na sentença:

Dia 21.08.2012 (fl. 131 do PA.00918.00072/2012):

 

VALMIR liga e conversa com ALINE e diz que é sobre a energia elétrica na Vila Tieta e dos Morenos e que iriam pagar, pois está com o CHICO (prefeito). KARINE afirma que VALMIR deveria ligar para ANA PAULA, de Taquari, que já estaria sabendo e fornece o telefone 3653-6600)

 

Dia 23.08.2012 (fl. 132 do PA.00918.00072/2012):

 

VALMIR liga para CERTAJA e conversa com ANA PAULA, a fim de resolver o negócio da luz, questionando-a sobre a forma de pagamento, se em cheque ou em boleto. VALMIR diz que seria na forma uma mais duas. ANA PAULA afirma que isto deve ser no nome de uma das pessoas beneficiadas. ANA PAULA afirma que irá sair na fatura da energia. ANA PAULA cita, como exemplo o nome Marcia da Mota Lopes. VALMIR passa o telefone para CHICO (PREFEITO). CHICO conversa com ANA PAULA e afirma que o cheque seria dele não poderia dar pro LUIZ e ficar a coisa aberta. ANA PAULA afirma que não pode fazer isto. ANA PAULA informa que cada pessoa entrou em contato com eles e negociou de forma diferente, mas VALMIR afirmou que seria feito pela PREFEITURA. CHICO afirma que é ele quem pagará. ANA PAULA sugere se não tinha como dividir e dar o dinheiro para as pessoas. CHICO afirma que poderia dar a entrada a vista e deixava dois cheques na CERTAJA, ficando no nome deles porém cheque dele. ANA PAULA afirma que pode ela não pode fazer e diz que passará pro gerente financeiro. […]

 

Dia 23.08.2012 (fl. 132 do PA.00918.00072/2012):

 

VALMIR recebe ligação de ANA PAULA e esta informa que seria delicado a questão de cheques, somente com o presidente. VALMIR sugere pagamento por boleto. Valmir em conversa com CHICO acerta que poderá receber os boletos. ANA PAULA afirma que precisa de um nome para lançar no boleto.

 

Dia 23.08.2012 (fl. 133 do PA.00918.00072/2012):

 

VALMIR liga para a cooperativa CERTAJA e em conversa com ANA PAULA, fornece o nome de ANA PAULA DA CRUZ. ANA PAULA pergunta como VALMIR fará, se dará uma entrada de mil. VALMIR diz que dará uma entrada de R$ 900,00 e duas de R$ 1.000. ANA PAULA diz que fará título a receber e quando estiver pronto ligará para ANA PAULA dar entrada e negociar a rede. […]

 

Dia 23.08.2012 (fl. 133 do PA.00918.00072/2012):

 

VALMIR conversa com ANA PAULA, da CERTAJA, e esta refere que a mulher indicada não queria aceitar aquele acordo e que ela não se estressaria por isto. VALMIR informa que ela, a pessoa indicada, estava nervosa e que tinha aceitado sim a emissão dos boletos. ANA PAULA, da CERTAJA, conversa com a senhora e informa os riscos do não pagamento, ou seja, do nome dela ir pro SPC, pois ela não estava negociando com VALMIR ou CHICO, porém a referida senhora afirma que pode fazer.

 

Na fase do inquérito policial, a recorrida narrou o seguinte:

[...] QUE há cerca de três meses a depoente e mais nove moradores do mesmo bairro foram até a COOPERATIVA CERTAJA solicitar instalações de energia elétrica pelo PROGRAMA LUZ PARA TODOS; QUE na CERTAJA, unidade TRIUNFO, foi dito aos moradores que não existia a possibilidade de se beneficiarem do PROGRAMA LUZ PARA TODOS; QUE aos moradores foi dado um orçamento em torno de quase nove mil reais para a instalação de energia elétrica em todas as dez casas; QUE cerca de um mês após elaborado o orçamento todos os moradores manifestaram interesse na instalação de energia elétrica, e através de contato com a funcionária ANA PAULA, da unidade de TAQUARI, cada morador assinou uma espécie de contrato junto à cooperativa; QUE segundo a CERTAJA, daqueles cerca de nove mil reais a cooperativa arcaria com aproximadamente R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e o restante seria pago por cada interessado, no valor de R$ 298,00 (duzentos e noventa e oito reais) mais uma pequena taxa de R$ 20,00 (vinte reais), pode tudo ser parcelado; QUE há pouco mais de um mês foi procurada por sua vizinha de mesma rua, de nome MÁRCIA, a qual disse que haveria possibilidade ou promessa de que o candidato a vereador JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA iria pagar todo o saldo que não seria coberto pela CERTAJA, ou seja, aproximadamente quatro mil reais; QUE até o momento o candidato JOSÉ VALMIR não apareceu para fazer o pagamento, tendo a depoente já pago a primeira mensalidade da dívida da instalação e estando muito preocupada pois não tem condições financeiras para pagar as demais prestações; QUE por volta do dia 18 de setembro a depoente chegou em sua residência e constatou que haviam fixado uma placa de propaganda do candidato JOSÉ VALMIR junto com o candidato a prefeito MARCELINHO na cerca da propriedade da depoente; QUE a placa ainda está no local, pois a depoente não quis arrumar mais nenhuma confusão; QUE não sabe dizer se os demais moradores também colocaram placa em sua residência [...].


 

Em seu interrogatório sob o contraditório judicial, Ana Paula Cruz confirmou o relato prestado diante da autoridade policial, que, há cerca de três meses, dirigiu-se à Cooperativa Certaja, com mais três vizinhos, para solicitar instalações de energia elétrica pelo Programa Luz Para Todos. Atendidos, foi-lhes dito que não existia a possibilidade de se beneficiarem do programa. Assim, como alternativa, a cooperativa encaminhou-lhes um orçamento de aproximadamente nove mil reais para a instalação de energia elétrica nas dez casas interessadas, dos quais, cerca de cinco mil reais seriam pagos pela cooperativa e o restante seria dividido entre cada morador. Relatou que José Valmir, nos meses antes do pleito, ofereceu-lhe ajuda com a documentação e com os procedimentos para a instalação da rede elétrica e que “provavelmente” custearia as despesas não cobertas pela cooperativa. Asseverou que ela e seus vizinhos tentavam há meses a instalação sem sucesso. Disse que falou com seus vizinhos e que eles se comprometeram a ajudar a pagar as despesas, sendo que muitos não pagaram. Afirmou que José Valmir não cumpriu a promessa e que, como a dívida era em seu nome, arcou com os gastos sozinha, tendo cerca de cinco vizinhos auxiliado no pagamento. Referiu que não fez campanha para o candidato e que este não lhe pediu votos ou apoio político, mas que, em 18 de setembro, foram afixadas placas de propaganda de Marcelo e José Valmir na cerca da sua propriedade.

Ouvidas em juízo, as testemunhas Cleber Jesus da Luz Silva e Eliane de Souza Silva, vizinhos da ré, confirmaram a instalação da rede elétrica em nome e às expensas de Ana Paula Cruz, razão pela qual ainda detêm uma dívida com ela.

As demais testemunhas ouvidas, o repórter Giovani Grizotti e o delegado Kleber Bicas, não lograram esclarecer pontos relevantes para a análise dos fatos.

Portanto, não se constata, da prova oral produzida ou do conteúdo das interceptações telefônicas realizadas, o especial fim de agir exigido para a caracterização do tipo penal de corrupção eleitoral.

O crime em questão, em sua modalidade passiva, cujo bem jurídico tutelado é o livre exercício do voto, consuma-se com o ato de “solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer vantagem”, desde que imbuído pelo dolo específico de “dar voto” ou “promoter abstenção”, consoante a descrição do art. 299 do Código Eleitoral.

Sobre o elemento subjetivo reclamado pelo tipo, leciona a doutrina de José Jairo Gomes:

Há previsão de elemento subjetivo do tipo, assim expresso: “para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção”. Destarte, para a perfeição do crime é preciso que a causa da conduta esteja relacionada diretamente ao voto, isto é, obter ou dar voto, bem como conseguir ou prometer abstenção de voto. Caso contrário, atípica será a conduta.

 

(Crimes e processo penal eleitorais. São Paulo: Atlas, 2015, p. 56.)

 

Nessa toada, as circunstâncias fáticas advindas dos autos revelam a mera participação do vereador Valmir e do prefeito Pedro Francisco nas intermediações para a instalação de energia elétrica, incluindo a oportunista colocação de placas de propaganda eleitoral na propriedade da eleitora, o que não configura prova cabal de que a promessa de auxílio teve como contrapartida o seu voto para determinado candidato.

Conforme a sedimentada jurisprudência do TSE, para a caracterização do crime do art. 299 do Código Eleitoral não bastam as evidências de recebimento de benesses ou promessa de vantagem, ainda que realizadas com o intuito indireto de autopromoção ou propaganda eleitoral pelo candidato, sendo indispensável a demonstração, por prova segura e robusta, do dolo específico de dar ou prometer o seu voto em contrapartida ao benefício ofertado.

Nesse sentido, destaco os seguintes julgados:

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. AUSÊNCIA DE DOLO ESPECÍFICO. NÃO CONFIGURAÇÃO. NECESSIDADE DE INCURSÃO NO ACERVO PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. No caso, o TRE de origem, soberano na análise das provas, concluiu que não ficou demonstrado o dolo específico do crime de corrupção eleitoral (art. 299 do CE), consubstanciado na finalidade eleitoral, pelo fornecimento de medicamento a eleitor. 2. Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, é necessária a ocorrência de dolo específico, consistente no especial fim de obter ou dar voto, conseguir ou prometer abstenção. Precedente: AgR-AI 7497-19/RJ, Rel. designado Min. DIAS TOFFOLI, DJe 23.2.2015. 3. Para se alterar a conclusão do Tribunal Regional quanto à existência ou não de dolo específico, seria necessário o reexame do conjunto probatório dos autos, o que não é possível em Recurso Especial, de acordo com o enunciado sumular 24 do TSE. 4. Agravo Regimental a que se nega provimento.

(TSE - AI: 4244 MARAU - RS, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Julgamento: 17.10.2017, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 10.11.2017.)

 

ELEIÇÕES 2006. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO PENAL. ART. 299 DO CE. DOLO SPECÍFICO. NECESSIDADE. CONDICIONAMENTO DE REALIZAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS E ODONTOLÓGICOS À OBTENÇÃO DE VOTO. NÃO COMPROVAÇÃO. INVIABILIDADE, EM ÂMBITO EXTRAORDINÁRIO, DE SE ALTERAR A CONCLUSÃO DO TRE DO AMAZONAS. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Para a configuração do crime de corrupção eleitoral, é necessária a ocorrência de dolo específico, consistente no especial fim de obter ou dar voto, conseguir ou prometer abstenção. Precedentes. 2. Na espécie, o Tribunal de origem, soberano na análise das provas, concluiu pela ausência do dolo específico de condicionar a prestação de serviços médicos e odontológicos à promessa votos. 3. A jurisprudência desta Corte Superior é pacífica quanto à impossibilidade de se alterar a conclusão do Tribunal Regional Eleitoral quanto à existência ou não de dolo específico. 4. Agravo Regimental desprovido.

(TSE - RESPE: 99847141120086040000 MANAUS - AM, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Julgamento: 09.02.2017, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 57, Data 23.03.2017, Página 26.)

 

Nessa toada, bem concluiu a sentença ao entender não caracterizada a tipicidade da conduta, ante a ausência de comprovação do elemento subjetivo exigido pelo tipo penal:

Assim, não cabe aqui perquirir a intenção implícita do agente da modalidade ativa do tipo. É necessário apurar se o acusado pelo delito na modalidade passiva entendeu a possível intenção do corruptor ativo e a ela quis aderir, seja na forma de solicitação ou recebimento de suposta vantagem, situação que não foi demonstrada de forma cabal nos autos.

 

Desta forma, fica evidente a ausência do elemento subjetivo específico do crime, consistente na solicitação de dinheiro, dádiva ou outra vantagem com o fim especial de dar o voto ou prometer abstenção. Isto posto, inexistindo a demonstração do dolo específico necessário à adequação típica, resta afastada a materialidade do delito.

 

 

Portanto, vê-se que a instrução probatória não logrou ofertar um juízo de segurança e certeza da versão apresentada na denúncia em relação do dolo específico de dar ou prometer o voto, inviabilizando a expedição de um decreto condenatório em desfavor da recorrida.

Dessa forma, impõe-se a manutenção da sentença que entendeu pela insuficiência de provas quanto ao elemento subjetivo do tipo, absolvendo Ana Paula da Cruz, com fulcro no art. 386, incs. III e VII, do CPP.

 

CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA

O Ministério Público Eleitoral narra que Carlos Gilberto Rodrigues de Souza foi procurado por Marcelo Essvein e Telmo José, candidatos a prefeito e vice-prefeito, respectivamente, a fim de lhe oferecerem determinados serviços públicos de lavragem de terras, condicionando o préstimo à instalação de uma placa de propaganda eleitoral na propriedade do eleitor. Assim, no dia seguinte, o eleitor procedeu à colocação da propaganda eleitoral em sua propriedade, obtendo o serviço da prefeitura na mesma data.

Da narrativa vertida da denúncia, consta o seguinte:

15º FATO – ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local, o denunciado CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA solicitou e recebeu, para si, serviços de lavragem de terras, abertura de uma estrada e manutenção de uma pista de rodeio, para dar voto em favor dos candidatos a Prefeito Marcelo Essvein e a Vice-Prefeito Telmo José Borba de Azeredo.

 

16º FATO – ART. 1º, “CAPUT”, II, DO DECRETO-LEI N.º 201/67:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local, os denunciados PEDRO FRANCISCO TAVARES, Prefeito de Triunfo/RS, HUMBERTO DE CAMPOS KUHN, Secretário de Viação, Transporte e Trânsito de Triunfo/RS, TELMO JOSÉ CARLOS GILBERTO RODRIGUES DE SOUZA, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, utilizaram e desviaram, indevidamente, em proveito deles, bens e serviços públicos do Município de Triunfo/RS, consistentes em máquinas automotores e na operação desses equipamentos por servidores públicos municipais.

 

A participação do recorrido nas condutas imputadas foi discriminada da seguinte forma (fls. 725v. e 73):

Na ocasião, o candidato a Prefeito MARCELO ESSVEIN, acompanhado do candidato a Vice-Prefeito TELMO JOSÉ, procurou o eleitor CARLOS GILBERTO e, cientes de que ele necessitava de determinados serviços públicos, MARCELO 'o abraçou e pediu que fosse ajudado a ser eleito, dizendo então que os serviços de lavragem solicitado seria prestado pela prefeitura, além da pista de rodeio e da abertura de uma estrada', 'bastando para isso colocar uma placa de propaganda eleitoral em sua propriedade, e que então o serviço seria executado”.

 

No dia seguinte, no turno da manhã, conforme ajustado, em demonstração pública do compromisso assumido e de apoio político, o eleitor viabilizou a instalação, na propriedade dele, de placas de propaganda eleitoral do PDT e do candidato a Prefeito MARCELO ESSVEIN [...].


 

Ouvido em sede de investigação policial, Carlos Gilberto Rodrigues de Souza prestou as seguintes declarações:

[...] QUE MARCELINHO, candidato a prefeito, foi até a casa do declarante acompanhado do candidato a vice-prefeito TELMO e em conversa com o declarante o abraçou e pediu que fosse ajudado a ser eleito, dizendo então que os serviços de lavragem solicitado seria prestado pela prefeitura, além da pista de rodeio e da abertura de uma estrada; QUE MARCELINHO questionou se o declarante tinha protocolo e diante de confirmação disse que o declarante poderia ficar tranquilo, bastando para isso colocar uma placa de propaganda eleitoral em sua propriedade, e que então o serviço seria executado na mesma semana, a lavra da terra e a pista de rodeio; QUE no dia seguinte pela manhã chegou até a casa do declarante um caminhão responsável pelo transporte de propaganda eleitoral, sendo que na casa do declarante foram colocadas três placas [...] além de uma bandeira vermelha e branca do partido PDT, nº 12; [...] QUE colocadas as placas pelo turno da manhã, de tarde já apareceram dois tratores para lavrarem as terras do declarante [...] QUE MARCELINHO então disse que em relação a pista deveria ser feito um novo protocolo e com a segunda via o declarante deveria ir até a secretaria de transportes entregar para BETINHO, secretário de transportes, para que o serviço fosse executado no mesmo dia; QUE o declarante foi até a Prefeitura, em seguida mostrou o protocolo para BETINHO, tendo este dito que iria passar informação para o encarregado das máquinas; QUE no dia seguinte a conversa com BETINHO, foi mandado uma patrola até o sítio do declarante, tendo sido executados cinco horas de serviços; [...] QUE pelo que sabe, esses serviços da Prefeitura, com o uso de máquinas, está sendo prestado apenas aos agricultores que apoiam os candidatos a vereador LINO e FÁBIO, desde que coloquem as placas dos candidatos [...].

 

Em seu interrogatório judicial, o réu Carlos Gilberto confirmou que os candidatos Marcelinho e Telmo compareceram à sua casa e prometeram arrumar a terra com serviços e equipamentos da prefeitura, bastando, para tanto, a colocação de uma placa de propaganda eleitoral na propriedade. Carlos Gilberto afirmou ter deixado instalar a placa, mas que, tendo em vista que os trabalhos não foram executados no tempo esperado, arrancou a placa do candidato Marcelinho. Asseverou, ainda, que as promessas não foram em troca de votos.

De todo o acervo probatório produzido, apenas o relato do próprio réu é capaz de confirmar a versão acusatória, porém sem menção ao dolo específico de dar ou prometer o voto em troca dos serviços em sua propriedade rural.

Deveras, tanto na descrição contida na denúncia quanto na narrativa deduzida pelo réu, o que se vislumbra é a obtenção de serviços públicos condicionada à cessão de espaço na propriedade para a colocação de placa de propaganda eleitoral, o que não se confunde, no contexto revelado pela instrução, sequer implicitamente, com a mercancia do voto.

Novamente, assim como a sentença recorrida, não verifico a existência de provas suficientes para a caracterização do especial fim de agir descrito no art. 299 do Código Eleitoral, cuja configuração exige a comprovação acima de qualquer dúvida de que o recorrido tivesse o propósito de “dar voto” ou “prometer abstenção” como contrapartida ao serviço ofertado.

No aspecto, remeto-me aos fundamentos doutrinários e jurisprudenciais externados na análise da conduta imputada à recorrida Ana Paula da Cruz, no tópico anterior, a respeito do elemento subjetivo do crime de corrupção eleitoral passiva, evitando, assim, desnecessária tautologia.

Portanto, não demonstrado o elemento subjetivo do tipo, no sentido de que a promessa de benesse ocorreu em contraprestação ao voto ou abstenção, essencial à configuração do tipo penal do art. 299 do Código Eleitoral, não merece reparos a sentença que concluiu pela atipicidade da conduta imputada a Carlos Gilberto.

Em relação ao 16º fato descrito na denúncia, o Ministério Público Eleitoral alega que Carlos Gilberto, em concurso de agentes com Pedro Francisco Tavares, então Prefeito de Triunfo, e outros, teria desviado e utilizado, indevidamente, em seu proveito, bens e serviços públicos daquele município, consistentes em máquinas automotoras e, na operação destes equipamentos, servidores públicos municipais, incorrendo assim no tipo penal previsto no art. 1º, inc. II, do Decreto-Lei n. 201/67.

Sobre a possibilidade de responsabilização de recorrido na condição de partícipe da empreitada, em suposta comunhão com o prefeito, cabe invocar a jurisprudência do STF, no sentido de que “os crimes do art. 1º do Decreto-Lei 201/67 são próprios dos prefeitos, mas é viável participação de terceiros, na forma do art. 29 do CP" (STF - Inq 3204/SE, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 23.06.2015).

Entretanto, a prova dos autos não revela como teria ocorrido o ajuste prévio entre o recorrido e o gestor público, assim como não apontou nenhum indício do dolo específico de obter vantagem indevida, em proveito próprio, sobre bens, rendas ou serviços públicos.

Os elementos carreados apenas dão conta que Carlos Gilberto teria consentido com a colocação de placas de propaganda e que tal conduta lhe teria sido imposta como condição à prestação dos serviços de lavragem de terras e abertura de estradas pela Prefeitura.

Por outro lado, não há prova segura de que tais serviços foram efetivamente executados. Da mesma forma, não é possível atestar se o recorrido não faria jus aos serviços independentemente da tolerância à propaganda eleitoral afixada em sua propriedade ou que, sem ter direito à prestação, tenha aceitado os benefícios de forma consciente de que os recebia indevidamente.

Desse modo, igualmente, deve ser confirmada a sentença no ponto em que concluiu pela inexistência de provas relativas ao crime previsto no art. 1º, inc. II, do Decreto-Lei n. 201/67, absolvendo o réu, com fundamento no art. 386, inc. VII, do CPP.


 

ANA PAULA GARCIA HARTMANN

De acordo com a versão acusatória, o candidato a vereador José Valmir e Ana Paula Garcia Hartmann prometeram e deram aos eleitores Ana Paula da Cruz e Eleoni da Silva Soares serviços de instalação de rede de energia elétrica em troca de votos em favor do candidato a prefeito Marcelo e ao próprio José Valmir.

Os fatos em tela restaram assim expostos na denúncia:

56º FATO – ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL:

No período compreendido entre agosto e setembro de 2012, em Triunfo/RS, os denunciados JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, PEDRO FRANCISCO TAVARES, ANA PAULA GARCIA HARTMANN e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e deram, para a eleitora Ana Paula Cruz, serviços destinados ao fornecimento de energia elétrica na residência dela, para obter-lhe votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO e a Vereador JOSÉ VALMIR.

 

58º FATO – ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local, os denunciados JOSÉ VALMIR DE OLIVEIRA, PEDRO FRANCISCO TAVARES, ANA PAULA GARCIA HARTMANN e MARCELO ESSVEIN, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, prometeram e deram, para a eleitora Eleoni da Silva Soares, serviços destinados ao fornecimento de energia elétrica na residência dela, para obter-lhe votos em favor dos candidatos a Prefeito MARCELO e a Vereador JOSÉ VALMIR.

 

O Ministério Público Eleitoral especificou a participação da ora recorrida nos seguintes termos:

O candidato a Vereador JOSÉ VALMIR articulou com ANA PAULA GARCIA, funcionária da Cooperativa de Geração de Energia e Desenvolvimento Taquari Jacuí ¿ CERTAJA, o fornecimento desses serviços a eleitores das referidas localidades, serviços esses que seriam custeados pelo então Prefeito PEDRO FRANCISCO TAVARES [...] (fl. 92).

 

A tese acusatória está amparada na interceptação do telefone de José Valmir de Oliveira, cujos trechos mais relevantes constam reproduzidos na sentença:

Dia 21/08/2012 (fl. 131 do PA.00918.00072/2012):

VALMIR liga e conversa com ALINE e diz que é sobre a energia elétrica na Vila Tieta e dos Morenos e que iriam pagar, pois está com o CHICO (prefeito). KARINE afirma que VALMIR deveria ligar para ANA PAULA, de Taquari, que já estaria sabendo e fornece o telefone 3653-6600)

 

Dia 23/08/2012 (fl. 132 do PA.00918.00072/2012):

VALMIR liga para CERTAJA e conversa com ANA PAULA, a fim de resolver o negócio da luz, questionando-a sobre a forma de pagamento, se em cheque ou em boleto. VALMIR diz que seria na forma uma mais duas. ANA PAULA afirma que isto deve ser no nome de uma das pessoas beneficiadas. ANA PAULA afirma que irá sair na fatura da energia. ANA PAULA cita, como exemplo o nome Marcia da Mota Lopes. VALMIR passa o telefone para CHICO (PREFEITO). CHICO conversa com ANA PAULA e afirma que o cheque seria dele não poderia dar pro LUIZ e ficar a coisa aberta. ANA PAULA afirma que não pode fazer isto. ANA PAULA informa que cada pessoa entrou em contato com eles e negociou de forma diferente, mas VALMIR afirmou que seria feito pela PREFEITURA. CHICO afirma que é ele quem pagará. ANA PAULA sugere se não tinha como dividir e dar o dinheiro para as pessoas. CHICO afirma que poderia dar a entrada a vista e deixava dois cheques na CERTAJA, ficando no nome deles porém cheque dele. ANA PAULA afirma que pode ela não pode fazer e diz que passará pro gerente financeiro. [...]

 

Dia 23/08/2012 (fl. 132 do PA.00918.00072/2012):

VALMIR recebe ligação de ANA PAULA e esta informa que seria delicado a questão de cheques, somente com o presidente. VALMIR sugere pagamento por boleto. Valmir em conversa com CHICO acerta que poderá receber os boletos. ANA PAULA afirma que precisa de um nome para lançar no boleto. Dia 23/08/2012 (fl. 133 do PA.00918.00072/2012): VALMIR liga para a cooperativa CERTAJA e em conversa com ANA PAULA, fornece o nome de ANA PAULA DA CRUZ. ANA PAULA pergunta como VALMIR fará, se dará uma entrada de mil. VALMIR diz que dará uma entrada de R$ 900,00 e duas de R$ 1.000. ANA PAULA diz que fará título a receber e quando estiver pronto ligará para ANA PAULA dar entrada e negociar a rede. [...]

 

Dia 23/08/2012 (fl. 133 do PA.00918.00072/2012):

VALMIR conversa com ANA PAULA, da CERTAJA, e esta refere que a mulher indicada não queria aceitar aquele acordo e que ela não se estressaria por isto. VALMIR informa que ela, a pessoa indicada, estava nervosa e que tinha aceitado sim a emissão dos boletos. ANA PAULA, da CERTAJA, conversa com a senhora e informa os riscos do não pagamento, ou seja, do nome dela ir pro SPC, pois ela não estava negociando com VALMIR ou CHICO, porém a referida senhora afirma que pode fazer.

 

Interrogada em juízo, Ana Paula Garcia Hartmann esclareceu o modo de encaminhamento dos pedidos à cooperativa e disse que não tinha decidido sobre a viabilidade dos projetos, cuja palavra final cabia ao setor financeiro da cooperativa. Afirmou que não tem relação com os demais réus e que seu contato com eles ocorreu apenas em função dos projetos de instalação de energia no loteamento, como parte de seu trabalho na cooperativa. Asseverou que seguiu estritamente as diretrizes da atividade profissional, conforme as regras determinadas pelo seu empregador, sem realizar concessões ou exceções.

Conforme bem apontou a sentença recorrida, a ré “respondeu com convicção e coerência a todas as perguntas feitas pelo Ministério Público Eleitoral, discorrendo sobre detalhes do serviço e confirmando algumas informações que ela mesma transmitiu nas ligações interceptadas à época dos fatos”.

Além disso, as testemunhas de defesa Jairo Fernandes de Aguiar, Simone Martins, Sabrina da Silva, Deise Ferreira e Enoque Dutra confirmaram as declarações da ré quanto ao processo de trabalho e à forma de atendimento das solicitações na empresa. Disseram, em acréscimo, que Ana Paula tinha autonomia para negociar a instalação de energia, mas, depois, o processo era repassado ao setor financeiro da cooperativa. Referiram que era comum que as negociações fossem realizadas com um único representante da comunidade e que a ré não vota nem mantém envolvimento político com o Município de Triunfo. Por fim, declararam que a empresa não tem a possibilidade de, arbitrariamente, instalar ou negar a instalação de linhas elétricas para qualquer cliente.

Neste ponto, transcrevo a judiciosa análise da prova procedida pela sentença, a qual adoto como razões de decidir:

Da análise dos elementos carreados aos autos, evidencia-se a ausência de vínculo objetivo ou subjetivo entre a ré Ana Paula Garcia Hartmann e os demais denunciados. Não há provas ou indícios aptos a demonstrar que a ré possuía algum interesse político em sua atuação nos fatos em tela.

 

Pelo contrário, de todo o exposto, fica claro que a ré estava apenas cumprindo seus deveres profissionais conforme as regras definidas pela sua empregadora. Ana Paula Garcia Hartmann é funcionária da empresa CERTAJA, concessionária do serviço de energia elétrica com atuação na região de Triunfo, exercendo suas funções na sede da empresa em Taquari, local onde possuía domicílio eleitoral na época dos fatos.

 

Com efeito, o envolvimento de Ana Paula Garcia Hatmann ocorreu na qualidade de funcionária da cooperativa Certeja, não havendo elementos mínimos no sentido de que a instalação da rede de distribuição de energia na comunidade teve como condicionante a promessa de voto dos eleitores em certo candidato, ou mesmo que a participação da recorrida visou, subjetivamente, a este específico fim.

Na linha da jurisprudência do TSE, a condenação pelo crime eleitoral previsto no art. 299 do CE deve amparar-se em prova robusta pela qual se demonstre, de forma inequívoca, a prática de todos os elementos do fato criminoso imputado:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. CRIME ELEITORAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. CONDENAÇÃO AFASTADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. REVALORAÇÃO DA MOLDURA FÁTICO-PROBATÓRIA DELINEADA NO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE NESTA SEARA ESPECIAL. PRECEDENTES. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. NECESSIDADE DE PROVAS ROBUSTAS DA PRÁTICA DE TODOS OS ELEMENTOS DO FATO CRIMINOSO. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A revaloração jurídica dos fatos delimitados no acórdão regional é admissível nesta seara Especial, sem que isso contrarie o teor da Súmula nº 24 do TSE. Precedentes.

2. A condenação pelo crime eleitoral previsto no art. 299 do CE deve amparar-se em prova robusta pela qual se demonstre, de forma inequívoca, a prática de todos os elementos do fato criminoso imputado aos réus (AgR-Respe nº 47570/SP, Rel. designado Min. Admar Gonzaga, DJe de 13.12.2018; AI nº 651-17/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 20.3.2017; REspe nº 5695-49/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 10.4.2015), o que não se verificou no caso dos autos.

3. Na hipótese vertente, os elementos fático-probatórios delineados no aresto regional são frágeis e, justamente por isso, insuficientes para comprovar, de forma hialina, a oferta/entrega de dinheiro aos eleitores com a finalidade de obter-lhes os votos, na ocasião visita à casa da família. Diante disso, reputa-se acertado o acórdão da Corte de origem que afastou a condenação dos ora agravados pela prática do crime de corrupção eleitoral.

4. Os argumentos expendidos no agravo interno são insuficientes para modificar a decisão objurgada.

5. Agravo interno a que se nega provimento.

(AI n. 060011970/SC, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 02.06.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 113, Data 09.06.2020.)

 

ELEIÇÕES 2012. AGRAVOS REGIMENTAIS. AGRAVOS. RECURSOS ESPECIAIS. PREFEITO. AÇÃO PENAL. CORRUPÇÃO ELEITORAL. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA ACERCA DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA DO DELITO, BEM COMO DO DOLO ESPECÍFICO DO CANDIDATO. PROVIMENTO.

1. A condenação, no que tange à alegada transgressão ao art. 299 do Código Eleitoral, baseou-se em prova testemunhal frágil e discrepante.

2. A dúvida a respeito do que teria efetivamente ocorrido já seria bastante para conduzir à absolvição, pois a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é firme no sentido de que ‘a condenação deve amparar-se em prova robusta pela qual se demonstre, de forma inequívoca, a prática de todos os elementos do fato criminoso imputado aos réus’ (AgR-REspe 52-13, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJe de 14.3.2017).

3. Para a caracterização do crime previsto no art. 299 do Código Eleitoral, não basta desqualificar a versão defensiva sobre quem estaria dirigindo o veículo no momento do acidente, sendo necessário demonstrar que o pagamento do conserto teve por finalidade a corrupção eleitoral.

4. No caso, não houve a comprovação do dolo específico, isto é, que o pagamento do conserto do veículo teria por finalidade a compra dos votos, tendo a condenação sido baseada na presunção de que não haveria razão plausível para o então candidato a prefeito ter arcado com os custos do conserto.

5. A condenação merece ser revista, haja vista a ausência de prova robusta acerca da materialidade e da autoria do delito, bem como do dolo específico do candidato consistente na finalidade de obter ou dar voto ou prometer abstenção mediante entrega ou promessa de benesse ou vantagem a eleitor , necessário para a configuração do crime de corrupção eleitoral.

[...].

(AgR-Respe n. 47570/SP, Rel. desginado Min. Admar Gonzaga, DJe de 13.12.2018.)

 

Dessarte, entendo que o caderno probatório carreado aos autos não tem o condão de comprovar a mercancia do voto, cuja prova deve ser robusta, envolvendo a especial finalidade de obtenção do sufrágio em contrapartida aos favores ou promessas de vantagens, razão pela qual reputo acertada a sentença que julgou improcedente a ação penal em desfavor de Ana Paula Garcia Hartmann pela prática do crime eleitoral prescrito no art. 299 do Código Eleitoral.

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral, mantendo integralmente a sentença que julgou improcedente a ação penal proposta contra Ana Paula Garcia Hartmann, Carlos Gilberto Rodrigues de Souza e Ana Paula da Cruz, com fulcro no art. 386, incs. III e VII, do CPP.

 

Demais julgadores de acordo com o voto do Relator Substituto.