E.Dcl. - 1640 - Sessão: 07/10/2019 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração, com pedido de atribuição de efeitos infringentes, opostos pelo PROGRESSISTAS (PP) de Gramado, contra o acórdão que deu parcial provimento ao recurso do embargante, mantendo a desaprovação das contas da agremiação, relativas ao exercício financeiro do ano de 2016, a ordem de recolhimento do valor de R$ 249.665,25 ao Tesouro Nacional, e reduziu o prazo de suspensão do repasse de verbas do Fundo Partidário para o período de 10 (dez) meses (fls. 563-570).

Em suas razões (fls. 574-579), traz debate acerca dos arts. 9º e 10 do CPC, c/c o art. 948 do mesmo diploma processual civil, para sustentar que o acórdão embargado feriu o princípio da não surpresa, tendo-se em vista que “em nenhum momento foi dada oportunidade aos embargantes para que se manifestassem a respeito de eventual inconstitucionalidade da norma” (fl. 575). Na sequência, aduz que a decisão objeto dos aclaratórios foi omissa em dois momentos: (1) ao negar vigência à Resolução TSE n. 23.472/16, notadamente ao art. 2º, § 3º, do normativo, e (2) ao não realizar o “enquadramento jurídico das funções glosadas nas hipóteses de autoridade”, pois é necessária “a prova acerca da natureza da função exercida por cada contribuinte”, e entende que o ônus da prova acerca da função exercida “não pode ser atribuído à grei partidária, mas sim ao próprio órgão fiscalizador”. Requer o provimento do recurso, com a atribuição de efeitos modificativos e o prequestionamento da matéria, a fim de que seja reformada a decisão embargada, aprovando-se as contas.

É o relatório.

VOTO

Os embargos, tempestivos, estão a merecer conhecimento, haja vista ter ocorrido o preenchimento de todos os pressupostos recursais.

À análise.

1. Princípio da não surpresa e notícia de declaração de inconstitucionalidade incidental.

O embargante aduz que, ao se manifestar, no acórdão, sobre o art. 55-D da Lei n. 9.096/95, em redação dada pela Lei n. 13.831/19, este Tribunal violou o princípio da não surpresa, insculpido no CPC, pois “em nenhum momento foi dada oportunidade aos embargantes para que se manifestassem a respeito de eventual inconstitucionalidade da norma”.

Argumento de inviável acolhida. Senão, vejamos.

Esta Corte apenas se deteve na pretensa aplicação do art. 55-D ao caso dos autos porque foi expressamente provocada pelo próprio embargante, em 2 (duas) oportunidades: primeiro, na petição constante às fls. 516-517v. e, na sequência, na peça acostada à fl. 526-526v.

Nos dois casos, aliás, após a manifestação derradeira, sob a forma escrita, da Procuradoria Regional Eleitoral.

Ora, este Tribunal somente se manifestou, no corpo do acórdão ora embargado, sobre o art. 55-D, exatamente porque o PROGRESSISTAS de Gramado invocou a aplicação do dispositivo duas vezes e, portanto, o entendia constitucional. Os arts. 9º, 10 e 948 do CPC foram obedecidos, pois também a Procuradoria Regional Eleitoral teve oportunidade de manifestação, na sessão de julgamento. Foram ouvidos a parte e o Ministério Público.

Insólita situação. O próprio embargante provocou a manifestação jurisdicional da qual entende ter lhe sido tolhido o direito de não ser surpreendido.

Inviável.

2. Omissão quanto à Resolução TSE n. 23.472/16.

O ponto alegado não se trata, propriamente, de omissão.

Como referido pelo próprio embargante, o acórdão assentou que não deve ser aplicada a norma mais benéfica, de maneira fundamentada. Cito trecho da decisão (fls. 566v.-567):

Assim, para o exame das contas, deve-se considerar o texto do art. 31 da Lei n. 9.096/95, e seus incisos, vigente ao tempo do exercício financeiro de 2016, sem a posterior alteração legislativa.

Nesse tocante, observo que este Tribunal, ao apreciar a aplicação da Lei n. 13.488/17, que facultou as doações de filiados a partidos políticos mesmo que ocupantes de cargos demissíveis ad nutum na administração direta ou indireta, mediante juízo de ponderação de valores, sedimentou o posicionamento pela irretroatividade das novas disposições legais, ainda que eventualmente mais benéficas ao prestador de contas, tendo preponderado os princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica.

Ademais, convém gizar que o invocado art. 2º, § 3º, da Resolução TSE n. 23.472/16, que o embargante teme seja tornado “letra morta”, não trata de retroatividade, mas, sim, de mitigação do princípio da anterioridade, técnica para aplicar, desde já, dispositivo legal cuja aplicabilidade ocorreria apenas no futuro – no caso específico, “no exercício seguinte”.

Não se trata de retroação, portanto. Desnecessária manifestação da Corte sobre o comando regulamentar, pois periférico ao caso dos autos. Inexistente a omissão.

3. Omissão quanto à natureza jurídica dos cargos glosados.

No ponto, o embargante entende que, ao não realizar o “enquadramento jurídico das funções glosadas nas hipóteses de autoridade”, a necessária “prova acerca da natureza da função exercida por cada contribuinte” não teria sido construída, de maneira que o ônus da prova acerca da função exercida “não pode ser atribuído à grei partidária, mas sim ao próprio órgão fiscalizador”.

Pois bem.

O procedimento de prestação de contas é, eminentemente, declaratório, circunstância sobre a qual parece não haver divergência.

No caso dos autos, em 31.7.2017, a unidade técnica do juízo de 1º grau salientou a existência de “pessoas físicas que exerceram cargos de chefia e direção no exercício de 2016”, conforme resposta dada pela Secretaria de Administração do Município de Gramado (Ofício n. 337/2017) (fl. 306), e juntou, aos autos, a discriminação pormenorizada dos cargos, acompanhada do período de exercício, nome completo, número de CPF e valor doado pelos servidores tidos como chefes e diretores.

Como agiu o embargante?

Na primeira oportunidade, rebateu exclusivamente em tese o ponto (fls. 352-363), sem a juntada de um documento, ou qualquer outro meio de prova que refutasse as conclusões do parecer preliminar, aliás corroborado no parecer conclusivo (fls. 366-367).

Ora, a classificação dos cargos baseia-se em ofício do próprio Poder Executivo de Gramado. Prova entendida suficiente e idônea na sentença, e também por este Tribunal.

Não pode o embargante, para além de deixar de cumprir ônus que lhe incumbia no momento da instrução do feito (demonstrar equívoco nas conclusões contábeis sobre as quais se alicerçou a sentença), posteriormente intentar impor “tarifamento” de prova a este Tribunal, indicando que somente por esta ou aquela forma é que se poderia concluir pela doação ilícita.

Inviáveis alegações, também aqui. Note-se que o precedente referido pelo embargante na fl. 578 – o AI n. 6176, Relator Min. Admar Gonzaga, assinala que o “Tribunal a quo […] examinou de forma criteriosa as tabelas enviadas pelos próprios órgãos da administração [...]”.

Ora, exatamente como procedido pela magistrada, na origem.

Por fim, quanto ao pedido de prequestionamento, ressalto que o art. 1.025 do CPC estabelece que se consideram “incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”.

DIANTE DO EXPOSTO, voto por desacolher os embargos de declaração.