RC - 385 - Sessão: 05/10/2020 às 14:00

RELATÓRIO                                

Trata-se de recursos criminais interpostos por MARTINHO DE BRUM, assessor parlamentar à época dos fatos, e SIDENEI GEHLING, conjuntamente, e por ALTAIR SOARES FONSECA, candidato eleito ao cargo de vereador nas eleições 2016, conhecido como “Caco do Posto”, em face da sentença do Juízo Eleitoral da 80ª Zona – São Lourenço do Sul – que julgou parcialmente procedente a denúncia oferecida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, para condenar os recorrentes como incursos nas sanções previstas nos arts. 288, caput, do Código Penal (associação criminosa) e 299 do Código Eleitoral (corrupção eleitoral), c/c art. 29, caput, do Código Penal (concurso de pessoas), em razão da prática dos seguintes fatos, assim descritos na peça acusatória:

1º FATO

 

Em datas não precisadas nos autos, mas desde o ano de 2014 até o de 2016, inclusive, em horários e locais diversos, dentre eles, no Posto Ipiranga, localizado na Rua Senador Pinheiro Machado, nº 333, nesta Cidade, os denunciados Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum, juntamente com uma funcionária da Clínica Radicom, não identificada, associaram-se, de modo estável e permanente, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes eleitorais – notadamente o crime de corrupção eleitoral, com vistas à obtenção de votos.

 

Ao agir, os denunciados Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum, em comunhão de esforços e vontades entre si, juntamente com uma funcionária da Clínica Radicom, não identificada, por diversas vezes (no mínimo seis), prometeram, ofereceram e deram vantagem para pessoas que necessitavam de exames médicos, fraudando a lista de atendimento do Sistema Único de Saúde, fins de obter votos para o primeiro, na condição de candidato a Vereador, e para o então candidato a Prefeito, Rudinei Harter – ambos concorrendo nas eleições municipais de 2016, no Município de São Lourenço do Sul.

 

O denunciado, candidato Altair Soares Fonseca (Caco do Posto) a vereador pelo PDT no Município de São Lourenço do Sul, o denunciado Martinho de Brum (assessor parlamentar do Deputado Giovani Cherini) e o denunciado Sidenei Gehling (pessoa com vínculo de proximidade com o referido parlamentar) eram os responsáveis pelo contato direto e pessoal com os eleitores que necessitavam de tratamento de saúde e, então, davam início ao processo de encaminhamento desses eleitores para atendimento médico através do SUS.

 

Aludido procedimento, porém, era realizado de modo absolutamente irregular (através de um esquema denominado “Fura Fila”), já que os denunciados utilizavam de vagas destinadas para terceiros (que não realizavam essas consultas) e, sem observância das regras legais (já que não havia o devido cadastramento do paciente e o prévio agendamento da Secretaria Municipal de Saúde), obtendo a marcação de consulta diretamente na clínica Radicom, em Porto Alegre (com auxílio de funcionário não identificado desse estabelecimento), em prazo bastante inferior àquele que os demais pacientes do SUS necessariamente tinham que se submeter.

 

O denunciado Martinho de Brum também tinha a responsabilidade de receber os eleitores beneficiados pelo esquema irregular no Município de Porto Alegre e, então, transportá-los até a Clínica Radicom para o atendimento médico.

 

Conforme demonstrado no presente expediente, os denunciados valiam-se do ilícito esquema de fraudar o procedimento regular de atendimento de pacientes junto ao SUS e, sistematicamente, agiam com evidente intuito eleitoral para proceder a esses “encaixes” de atendimento médico – seja porque todos os beneficiários ostentavam a condição de eleitores, seja porque nas conversas entabuladas sempre foram permeadas por uma finalidade específica de obtenção de voto para determinados candidatos ao pleito municipal de 2016 (in casu o denunciado Altair no sistema proporcional, e o Prefeito Rudinei Harter, no sistema majoritário).

 

Relevante enumerar algumas das diversas infrações penais praticadas pelos denunciados, restando patente nas narrativas a seguir transcritas o liame estável entre as condutas dos membros do esquema delitivo, conforme segue:

 

2º FATO

 

Durante o período compreendido entre o mês de junho 2015 e outubro de 2016, em hora e local não especificado, neste Município, os denunciados Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum, em convergência de esforços e conjugação de vontades, deram, ofereceram e prometeram vantagem pessoal – consistente no imediato atendimento médico através do SUS, quebrando a ordem cronológica de fila de espera – para Marlize Griesbach e para Inácio Becker, com a finalidade de obter o voto dos referidos eleitores.

 

No mês de junho de 2015, necessitando Marlize Griesbach fazer uma ressonância magnética de sua coluna, ao saber que o denunciado Sidenei dispunha de um convênio que fazia exames de forma rápida, contatou-o, sendo por ele encaminhada ao denunciado Altair, do Posto Ipiranga (Caco do Posto), sob a orientação de que deveria lhe entregar seus documentos, a requisição médica e pagar a importância de R$ 50,00, o que foi por ela atendido.

 

Na mesma oportunidade, Marlize providenciou, também junto ao denunciado Altair, o agendamento de um exame de ressonância magnética de tórax em favor de seu vizinho Inácio Becker, entregando-lhe seus documentos, a requisição médica respectiva, bem como os R$ 50,00 referentes ao exame.

 

Na sequência, o denunciado Sidenei ligou para Marlize, informando-a que os exames haviam sido agendados para o dia 25 de mesmo mês.

 

Então, os eleitores Inácio e Marilize se deslocaram até a cidade de Porto Alegre, onde o denunciado Martinho os recepcionou na rodoviária e os levou, juntamente com outras pessoas, até a Clínica Radicom, onde realizaram os exames.

 

Posteriormente, o denunciado orientou a Sidenei orientou Marlize a pegar os resultados dos exames com o codenunciado Altair ou com sua esposa “Carol”, que trabalhava no escritório do então candidato a Prefeito Rudinei Harter, mas o filho de Marlize acabou retirando-os na casa do denunciado Sidenei.

 

Perto das eleições de 2016, os denunciados Altair e Sidenei, acompanhados de uma pessoa, não identificada, de posse de uma lista, estiveram na casa de Marlize, pedindo votos para o primeiro, bem como para o candidato a Prefeito Rudinei, entregando-lhe santinho com a propaganda de ambos, em contrapartida ao auxílio prestado para a realização do exame médico.

 

Na mesma data, os denunciados Altair e Sidenei, acompanhados de uma pessoa, não identificada, também estiveram na casa de Inácio, com a mesma lista, ocasião em que Altair se identificou como sendo o “Caco do Posto” – pessoa que o havia auxiliado com o exame médico –, pedindo-lhe uma ajuda na campanha e entregando-lhe um santinho com sua propaganda. Os denunciados prometeram-lhe, ainda, que caso Altair se elegesse, poderiam auxiliá-lo ainda mais com exames.

 

3º FATO

 

Entre o mês de março 2015 e outubro de 2016, em hora e local não especificado, neste Município, os denunciados Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum, em convergência de esforços e conjugação de vontades, deram, ofereceram e prometeram vantagem pessoal – consistente no imediato atendimento médico através do SUS, quebrando a ordem cronológica de fila de espera – para Paulo Roberto de Paula, com a finalidade de obter o voto do referido eleitor.

 

Na oportunidade, Paulo procurou sua vizinha Marlize Griesbach, que contatou os denunciados Altair e Sidenei, para que lhe providenciassem o agendamento de um exame de ressonância magnética do qual necessitava. Marlize entregou aos denunciados R$ 50,00 e os documentos de Paulo.

 

Na data marcada, Paulo se deslocou até a cidade de Porto Alegre, onde o denunciado Martinho o recepcionou na rodoviária e o levou, juntamente com outras pessoas, até a Clínica Radicom, onde realizou o exame.

 

Posteriormente, o denunciado Altair entregou o resultado do exame a Paulo Roberto de Paula, dizendo-lhe que era candidato a vereador e precisava de apoio.

 

Próximo das eleições de 2016, os denunciados Altair e Sidenei estiveram na casa de Paulo e lhe pediram uma “força”, para que o primeiro se elegesse Vereador, bem como para que Rudinei se tornasse Prefeito, sob a alegação de que o haviam auxiliado com o exame médico. Na oportunidade, entregaram-lhe um santinho e lhe mostraram uma lista contendo nomes de pessoas que estavam visitando.

 

4º FATO

 

Durante o período compreendido entre fevereiro e outubro de 2016, em hora e local não especificado, neste Município, os denunciados Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum, em convergência de esforços e conjugação de vontades, deram, ofereceram e prometeram vantagem pessoal – consistente no imediato atendimento médico através do SUS, quebrando a ordem cronológica de fila de espera – para Denis Fernando de Oliveira Bosenbecker, com a finalidade de obter o voto dos referidos eleitores.

 

Em fevereiro de 2016, Denis Fernando de Oliveira Bosembecker, ao saber que o denunciado Altair conseguia marcar exames médicos de forma rápida, procurou-o no Posto Ipiranga, onde trabalhava. Então, o denunciado o orientou a lhe pagar R$ 50,00 e a lhe entregar seus documentos, junto com a requisição médica, para que providenciasse o agendamento.

 

No mês de março do mesmo ano, Denis retornou ao Posto Ipiranga para entregar ao denunciado Altair a documentação necessária e inteirar-se sobre o procedimento para a realização do exame, ocasião em que denunciado Sidenei também se encontrava presente.

 

Em tal ocasião, o denunciado falou a Altair falou a Denis que pretendia se candidatar a Vereador e pediu-lhe para que nele votasse, dizendo-lhe que “uma mão lava a outra”.

 

No dia 03 de março de 2016, Denis deslocou-se até a cidade de Porto Alegre, sendo recepcionado pelo denunciado Martinho na rodoviária, que o levou, de carro, juntamente com Luiz Carlos Leal de Lima, também oriundo de São Lourenço do Sul, até a Clínica Radicom, onde realizou o exame.

 

Posteriormente, o denunciado Altair deixou o resultado do exame na casa de umas conhecidas de Denis, que o pegou no referido local.

 

Já no mês de setembro de 2016, o denunciado Altair, ao encontrar Denis na rua, pediu votos para si e para o candidato Rudinei, fazendo menção ao exame realizado.

 

5º FATO

 

Durante o período compreendido entre o mês de junho 2016 e outubro de 2016, em hora e local não especificado, neste Município, os denunciados Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum, em convergência de esforços e conjugação de vontades, deram, ofereceram e prometeram vantagem pessoal – consistente no imediato atendimento médico através do SUS, quebrando a ordem cronológica de fila de espera – para Irani Bosembecker, com a finalidade de obter o voto da referida eleitora.

 

No mês de junho de 2016, já sabendo que o denunciado Altair agendava exames, Irani Bosembecker entregou uma requisição médica de ressonância magnética de joelhos que necessitava fazer, junto com R$ 50,00, para o seu sobrinho Denis, que providenciou a marcação do exame junto ao denunciado Altair.

 

Na sequência, os denunciados Altair e Sidenei lhe telefonaram, informando-a da data agendada, tendo o segundo esclarecido, ainda, que uma pessoa iria aguardá-la na Capital.

 

Em 24 de junho de 2016, a eleitora Irani se deslocou até a cidade de Porto Alegre, sendo recepcionada pelo denunciado Martinho na rodoviária, que a levou, juntamente com outras pessoas, até a Clínica Radicom, onde realizou o exame.

 

Posteriormente, os denunciados e ligaram Altair e Sidenei a Irani, informando-a que o resultado do exame estava pronto e a orientaram a pegá-lo no Posto Ipiranga (local de trabalho de Altair) ou no escritório de Rudinei Harter, com a esposa de Altair, de nome “Carol”. Durante as ligações, os denunciados Altair e Sidenei solicitaram-lhe votos para Altair e Rudinei, alegando que assim poderiam continuar ajudando as pessoas com os exames.

 

Marlize Griesbach foi quem buscou o exame de Irani, sendo que, dentro do envelope, havia um santinho de Altair.

 

6º FATO

 

Durante o mês de junho 2016 e outubro de 2016, em hora e local não especificado, neste Município, os denunciados Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum, em convergência de esforços e conjugação de vontades, deram, ofereceram e prometeram vantagem pessoal – consistente no imediato atendimento médico através do SUS, quebrando a ordem cronológica de fila de espera – para Erno Krumereich, com a finalidade de obter o voto do referido eleitor.

 

No mês de junho de 2016, durante uma festa, Erno Krumereich comentou com o denunciado Sidenei que necessitava fazer um exame de ressonância magnética de sua coluna lombar, o qual se prontificou a marcá-lo rapidamente, pela importância de R$ 50,00.

 

Após combinarem os detalhes, o denunciado Sidenei encontrou Erno nas proximidades da loja Gordos e Magros-, onde recebeu seus documentos e a importância de R$ 50,00, que foi imediatamente depositada em uma conta.

 

Na sequência, o denunciado Sidenei telefonou a Erno, informando-o da data do exame.

 

No dia 20 de junho de 2016, Erno deslocou-se até a cidade de Porto Alegre, sendo recepcionado pelo denunciado Martinho na rodoviária, que o levou, de carro, juntamente com outras pessoas, também oriundas de São Lourenço do Sul, até a Clínica Radicom, onde realizou o exame.

 

Posteriormente, o resultado do exame foi deixado no Sindicato dos Trabalhadores Rurais, onde foi retirado pela esposa de Erno.

 

Lá por 20 de setembro de 2016, já em campanha eleitoral, os denunciados acompanhados de uma pessoa não identificada, foram Sidenei e Altair, até a casa de Erno, onde conversaram com sua esposa – Selma Krumereich – pedindo-lhe voto para “Caco” (Altair), que concorria a vereador, por terem ajudado Erno na obtenção do exame.

 

A denúncia foi recebida em 13.3.2018 (fl. 1198), citando-se os recorrentes (fls. 1214-1215; 1216-1216; fls. 1282-1282), os quais apresentaram defesa e arrolaram testemunhas (fls. 1222-1225; fls. 1228-1235; fls. 1286-1292 e 1296).

Durante a instrução, foram juntados documentos – objeto de diligência requerida pelo Ministério Público e deferida pelo juízo a quo (fls. 1209-1212); ouvidas dezesseis testemunhas, homologada a desistência da oitiva de outra; e, ao final, os réus foram interrogados (fls. 1452-1454, 1510 e mídia da fl. 1513).

Os recorrentes apresentaram alegações finais (fls. 1540-1545; fls. 1546-1552).

Sobreveio sentença de parcial procedência da denúncia, na qual o magistrado assentou que a autoria e a materialidade dos crimes previstos no art. 299 do Código Eleitoral, art. 288, c/c o art. 29 e art. 71, todos do Código Penal, restaram comprovadas, concluindo que os corréus, juntamente com uma funcionária da Clínica Radicom, não identificada nos autos, atuaram em associação criminosa e prometeram, ofereceram e deram vantagem para pessoas que necessitavam de exames médicos, fraudando a lista de atendimento do Sistema Único de Saúde - SUS, para obter votos para Altair Soares Fonseca, vulgarmente conhecido como “Caco do Posto”, na condição de candidato a vereador, e para o então candidato a prefeito, Rudinei Harter, que concorriam nas eleições de 2016 do município de São Lourenço do Sul (fls. 1554-1581).

A condenação fixada para ALTAIR e SIDENEI foi a seguinte: a) pela associação criminosa, a 01 ano e 03 meses de reclusão, em regime aberto; e b) pela corrupção eleitoral, a 01 ano, 04 meses e 15 dias de reclusão, também em regime aberto, bem como a 06 dias-multa. Em razão da continuidade delitiva entre os seis crimes de corrupção eleitoral, foi aplicada uma pena, aumentada em 1/3, resultando em 01 ano e 10 meses de reclusão. Em virtude do concurso material entre a associação criminosa e a corrupção eleitoral, ALTAIR e SIDENEI restaram condenados ao total de 03 anos e 01 mês de reclusão, em regime aberto, e 30 dias-multa (no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente à época do fato, corrigido pelo IGP-M). As penas privativas de liberdade foram substituídas por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária (03 salários-mínimos).

O recorrente MARTINHO foi condenado às seguintes penas: a) pela associação criminosa, a 01 ano e 06 meses de reclusão, em regime aberto; e b) pela corrupção eleitoral, a 01 ano e 09 meses de reclusão, também em regime aberto, bem como a 08 dias-multa. Devido à continuidade delitiva entre os seis crimes de corrupção eleitoral, foi aplicada uma pena, aumentada em 1/3, resultando em 02 anos e 04 meses de reclusão. Em razão do concurso material entre a associação criminosa e a corrupção eleitoral, MARTINHO restou condenado ao total de 03 anos e 10 meses de reclusão, em regime aberto, e 40 dias-multa (no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente à época do fato, corrigido pelo IGP-M). As penas privativas de liberdade foram substituídas por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária (03 salários-mínimos).

Em suas razões, MARTINHO DE BRUM e SIDENEI GEHLING declaram que os fatos narrados na denúncia não representam a verdade. Sustentam que não concorreram como candidatos e que as condutas apuradas ocorreram fora do período eleitoral. Alegam a inexistência de pedido de votos ou qualquer vantagem econômica em troca do encaminhamento de exames médicos. Afirmam o desconhecimento sobre a forma de funcionamento de marcação de consultas e a ausência de dolo. Referem que os procedimentos hospitalares foram realizados em virtude de eventuais lacunas no sistema de saúde e da demanda reprimida de atendimentos. Asseveram a falta de intuito de associação para o cometimento de crimes. Invocam o princípio da presunção da inocência. Postulam a reforma da sentença e a consequente absolvição, com fulcro no art. 386, incs. III ou VII, do CPP, em razão da ausência de provas; e, no caso de entendimento diverso, requerem que as penas sejam aplicadas no patamar mínimo (fls. 1605-1610).

ALTAIR SOARES FONSECA interpõe recurso, afirmando que a condenação baseou-se em provas ilícitas devido à falta de autorização judicial para a realização de gravação ambiental. Pondera que o juízo a quo considerou a oitiva de pessoas que são reconhecidamente seus inimigos políticos, e que as testemunhas jamais mencionaram seu nome e não confirmaram o pedido de votos em troca do fornecimento de serviços médicos. Aduz a ausência de prova do dolo específico necessário à condenação e refere não ter obtido qualquer vantagem econômica por intermédio do encaminhamento de consultas e exames. Requer a reforma da sentença e a consequente absolvição com fulcro no art. 386, incs. III ou VII, do CPP e, subsidiariamente, a fixação da pena mínima (fls. 1611-1616).

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, em contrarrazões, alegou a intempestividade do recurso interposto por SIDENEI GEHLING, requerendo, preliminarmente, o não conhecimento do apelo em relação ao acusado e, no mérito, a manutenção da sentença condenatória (fls. 1621-1631).

Os autos foram remetidos com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pelo não conhecimento do recurso interposto quanto a SIDENEI GEHLING e, no mérito, pelo desprovimento dos recursos e determinação de execução provisória da pena (fls. 1647-1653).

Intimados para manifestação sobre o parecer ministerial de segundo grau, os recorrentes não ofereceram petição.

É o relatório.

 

 

VOTO                    

1. Preliminares

Inicialmente, passo ao exame das preliminares suscitadas.

 

a) Preliminar de intempestividade do recurso criminal interposto conjuntamente por Sidenei Gehling e Martinho de Brum, quanto a Sidenei Gehling

Assiste razão aos órgãos do Ministério Público Eleitoral de primeira e segunda instâncias ao apontar que o apelo não comporta conhecimento no tocante a Sidenei Gehling.

Do exame dos autos, observa-se que a sentença condenatória foi publicada no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral em 27.5.19 (fl. 1584), e que, posteriormente, o réu Sidenei Gehling foi intimado pessoalmente em 5.6.19 (fl. 1590), enquanto Martinho de Brum foi intimado pessoalmente em 8.7.19 (fl. 1640v.).

Assim, considerando que o recurso foi interposto de forma conjunta no dia 27.6.19 (fl. 1605), verifica-se que, em relação a Sidenei, o apelo é intempestivo, pois já havia escoado, em muito, o prazo recursal de 10 dias previsto no art. 362 do Código Eleitoral.

Portanto, acolho a prefacial e não conheço do recurso criminal quanto a Sidenei Gehling.

 

b) Preliminar de ilicitude da prova que ampara a sentença condenatória

O recorrente Altair Soares Fonseca sustenta ser ilícita a gravação ambiental que acompanha o recurso, afirmando que a condenação se baseou em provas ilícitas devido à falta de autorização judicial para a realização de gravação ambiental.

A preliminar não prospera.

Com a inicial foram juntadas aos autos as mídias das fls. 608 e 620, que contêm gravações ambientais de áudio e vídeo de conversas travadas entre Altair e pacientes beneficiados com o esquema criminoso de realização de exames custeados pelo SUS em troca de votos (degravações acostadas às fls. 219-227 e 632-656).

Conforme referido na sentença, o TSE possui entendimento firmado no sentido de que é lícita a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, sem o consentimento dos demais e sem autorização judicial, em ambiente público ou privado, quando inexiste causa legal de sigilo ou de reserva de conversação (RESPE n. 42448, Rel. Min. Og Fernandes, DJE 27.2.2020).

Além disso, observa-se que os eleitores responsáveis pelo registro das conversas, Denis Fernando de Oliveira Bosenbecker e sua tia, Irani Bosenbecker, foram ouvidos em juízo como testemunhas, e que a defesa não apresentou contradita nem requereu a realização de suas oitivas na condição de informantes.

De fato, a gravação ambiental, mormente a audiovisual, tem o objetivo de retratar os fatos ocorridos, não recebendo o filtro seletivo e subjetivo e, no caso concreto, não foi apontada a realização de montagens ou edições que comprometessem a prova.

Portanto, afasto a preliminar.

 

2. Mérito

Os fatos narrados nos autos envolvem o esquema delitivo denominado amplamente pela imprensa, no ano de 2016, como “Fura Fila do SUS”, e foram examinados por esta Corte na sessão de 19.9.2017, quando do julgamento do recurso eleitoral interposto na ação de impugnação de mandato eletivo AIME 236-53, da relatoria do Dr. Eduardo Augusto Dias Bainy (DEJERS de 22.9.2017), ocasião em que o Tribunal manteve a sentença que desconstituiu o mandato de suplente de vereador conferido a Altair Soares Fonseca.

Nesta assentada, os mesmos fatos estão sendo analisados sob a ótica do Direito Penal Eleitoral, tendo em vista que o princípio da independência entre as instâncias possibilita que uma determinada conduta seja, ao mesmo tempo, enquadrada como ilícito civil, administrativo e penal.

A sentença acolheu em parte a denúncia, tão somente em virtude da falta de menção à continuidade delitiva pelo órgão acusatório, e considerou que, desde o ano de 2014 até outubro de 2016, os corréus Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum associaram-se (1º fato) com a finalidade de praticar o delito de corrupção eleitoral em relação a seis eleitores: Marlise Karow Griesbach e Inácio Becker (2º fato), Paulo Roberto de Paula (3º fato), Denis Fernando de Oliveira Bosenbecker (4º fato), Irani Bosembecker (5º fato) e Erno Krumereich (6º fato).

O crime eleitoral teria sido praticado mediante entrega de vantagem consistente na realização de exames médicos de imagenologia – agendados por meio de fraude à lista de atendimento do Sistema Único de Saúde – para fins de obtenção de votos nas eleições municipais de 2016 do município de São Lourenço do Sul, e os recorrentes foram considerados como incursos nas penas previstas no art. 299 do Código Eleitoral, art. 288, c/c o art. 29 e art. 71, todos do Código Penal:

Código Eleitoral

 

Corrupção Eleitoral

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena – reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

 

Código Penal

 

Associação Criminosa

Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes: (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013)

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013)

Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de criança ou adolescente. (Redação dada pela Lei nº 12.850, de 2013)

 

Do Concurso De Pessoas

Art. 29. Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

 

§ 1º Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

 

§ 2º Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

 

Crime continuado

Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

 

Parágrafo único. Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

 

Estabelecidas essas premissas, passo ao exame dos fatos narrados.

 

a) 1º Fato – Associação Criminosa (art. 288 do Código Penal)

Inicialmente, consigno que o caderno probatório traz prova farta e incontestável acerca do cometimento da fraude na ordem cronológica de atendimento do Sistema Único de Saúde - SUS por intermédio da associação deliberada dos agentes à prática da ação tipificada no art. 299 do Código Eleitoral.

Nos termos da denúncia, eleitores de São Lourenço do Sul procuravam o réu Altair, conhecido como “Caco do Posto”, junto ao posto de combustíveis Ipiranga, assim como os corréus Sidenei Gehling e Martinho de Brum, e mediante pagamento da quantia de R$ 50,00 obtinham, através do contato destes com uma funcionária da clínica de diagnóstico por imagem Radicom, situada em Porto Alegre, a realização de exames médicos custeados pelo Sistema Único de Saúde  - SUS em tempo recorde, especialmente ressonância nuclear magnética, sem cadastro prévio e sem espera na fila de atendimento do sistema público de saúde.

Após o pagamento, os eleitores dirigiam-se até Porto Alegre, momento em que eram recebidos pelo corréu Martinho de Brum, que os transportava até a clínica Radicom, credenciada pela Secretaria Municipal da Saúde ao SUS somente para pacientes da capital, e não para moradores de São Lourenço do Sul.

Todos os seis eleitores ouvidos em juízo foram uníssonos ao afirmar que possuíam requisição médica para a realização de exame de imagem e que obtiveram agendamento e atendimento pelo SUS, de forma mais rápida, após entrega da quantia de R$ 50,00 e contato com os denunciados Altair Soares Fonseca, Sidenei Gehling e Martinho de Brum (fls. 1452-1454, 1510 e mídia da fl. 1513).

Foram também colacionados aos autos os respectivos resultados dos exames médicos obtidos de forma mais rápida, por meio do esquema criminoso, por três pessoas dentre as apontadas como beneficiárias: Marlise Karow Griesbach (fl. 1211), Irani Bosembecker (fls. 407-408 e 411-412) e Erno Krumereich (fls. 437-439).

Essas condutas foram apuradas por intermédio de prova documental de auditoria realizada pelo Sistema Único de Saúde e juntada aos autos (fls. 130; 407-408; 411-412; 419-421; 437-439; 1210-1211), assim como pelo resultado da quebra do sigilo bancário dos corréus, ocasião em que se confirmou o pagamento da importância de R$ 50,00 por cada exame realizado, bem como pelos comprovantes dos depósitos bancários do valor nas contas dos réus Sidenei e Martinho (fls. 348-349 e 466-470).

O Relatório expedido pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS (fls. 525-538) aponta ter sido detectado, no período compreendido entre agosto de 2015 e setembro de 2016, “encaminhamentos de usuários do SUS de São lourenço do Sul/RS para exames de imagem em unidade de radiologia não regulada para o município”, em tempo de espera inferior à média de 12 (doze) meses para as pessoas regularmente cadastradas.

Além disso, dentre os arquivos de áudio e vídeo contidos na mídia da fl. 408 há duas gravações ambientais de vídeo registradas pelo próprio interlocutor Denis Fernando de Oliveira Bosenbecker (referido no 4º fato), com duas conversas, a primeira travada somente com Altair Soares Fonseca (dia 2.3.2016) a respeito de atendimento de saúde para o interlocutor, e a outra com os corréus Altair Soares Fonseca e Sidenei Gehling (dia 19.4.2016), acerca de atendimento para a tia de Denis, Irani Bosembecker.

Nessas gravações, os recorrentes confirmam que realizariam agendamento de exame médico de imagem em troca de “cinquenta pila” – R$ 50,00, inclusive fornecendo o transporte até a clínica, situada em Porto Alegre, por intermédio do acusado Martinho de Brum.

Também restou suficientemente confirmada pela prova referida, aliada ao resultado da quebra do sigilo bancário dos acusados encartada nas fls. 539-547, que, para a realização do serviço médico de forma mais rápida, era exigido dos beneficiários o pagamento da quantia de R$ 50,00 (cinquenta reais), conforme se verifica dos diversos depósitos dessa exata quantia nas contas bancárias de Martinho e de Sidenei. A cobrança dos pagamentos era efetuada por Altair (Caco), que repassava os valores para Sidenei Gehling e Martinho de Brum.

Portanto, concluo ter sido suficientemente comprovada a associação consciente e voluntária dos recorrentes com a finalidade de praticar o crime de corrupção eleitoral, devendo ser mantida a condenação.

 

b) 2º, 3º e 6º Fatos – Corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral) – eleitores Marlise Karow Griesbach, Inácio Becker, Paulo Roberto de Paula e Erno Krumereich

É preciso ter presente que os recorrentes foram condenados pelo delito de corrupção eleitoral (art. 299, CE), crime formal e doloso, e de associação criminosa (art. 288, CP), delito autônomo (Cunha, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal: Parte Especial. Arts. 121 ao 361. 7. ed. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 624).

O TSE assentou que a corrupção eleitoral é um crime contra a liberdade do voto, sendo o voto livre o seu bem juridicamente tutelado (HC 3.160, Rel. Min. Luciana Christina Guimarães Lóssio, DJE 3.4.2014). Na sua forma ativa, o delito refere-se às condutas de “dar, oferecer ou prometer” dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, “para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção”.

Assim, “para a perfeição do crime é preciso que a causa da conduta esteja relacionada diretamente ao voto, isto é, obter ou dar voto, bem como conseguir ou prometer abstenção de voto. Caso contrário, atípica será a conduta” (Gomes, José Jairo. Crimes e processo penal eleitorais. São Paulo: Atlas, 2015, p. 56).

Dessa forma, a premissa essencial para que a conduta se amolde ao tipo de corrupção eleitoral é a de que a vantagem seja oferecida em troca do voto e a este condicionada.

Entretanto, quanto ao 2º e 3º fatos, relativos ao agendamento de exames para os eleitores Marlise Karow Griesbach, Inácio Becker e Paulo Roberto de Paula, observa-se, pela análise da denúncia e do caderno probatório que a fundamenta, que a vantagem – consistente no agendamento de exame de saúde – foi fornecida, no ano de 2015, sem vinculação alguma ao voto.

Não há evidência alguma de que, na época do contato com os eleitores, no ano de 2015, o acusado se apresentasse como futuro candidato a vereador.

Idêntica circunstância ocorre com o eleitor Erno Krumereich, envolvido no 6º Fato, pois toda a prova contida nos autos demonstra que a finalidade de captar seu voto não foi expressada pelos acusados de forma concomitante à entrega do benefício.

Conforme se observa da denúncia e das declarações prestadas na fase extrajudicial e em juízo (gravadas na mídia da fl. 1513), para esses quatro eleitores o pedido de voto foi feito pessoalmente, por Altair e Sidenei, muito depois da realização dos exames, perto das eleições de 2016, quando os acusados compareceram aos endereços de Marlise, Inácio, Paulo Roberto de Paula e Erno Krumereich pedindo votos para as candidaturas de Altair ao cargo de vereador e de Rudinei Harter, que não figura como parte no feito, ao cargo de prefeito.

Veja-se que o exame de Marlise Karow Griesbach é datado de 3.8.2015 (fl. 1211) e que ela confirmou, perante o Ministério Público Eleitoral e em juízo, ter agendado o atendimento em junho de 2015, declarando que somente em data próxima às eleições os acusados compareceram em sua residência pedindo votos.

Inácio Luiz Becker também declarou que, em 2015, entregou a Marlise Karow Griesbach o valor de R$ 50,00 para que esta providenciasse o agendamento de um exame e que, em Porto Alegre, foi recepcionado por Martinho de Brum. Afirmou não ter tratado do atendimento diretamente com os acusados Altair e Sidenei e que somente após os fatos os acusados compareceram na sua residência solicitando votos, em data próxima das eleições de 2016.

Paulo Roberto de Paula disse que, em março de 2015, solicitou que Marlise Karow Griesbach agendasse um exame de saúde por meio do denunciado Sidenei Gehling, pagando-lhe o valor de R$ 50,00, e que, na data do atendimento, foi recepcionado na Rodoviária de Porto Alegre pelo corréu Martinho de Brum. Narrou que o resultado do exame foi entregue por Altair, e que somente após esses fatos, perto do pleito de 2016, recebeu a visita de Altair em sua casa, o qual lhe pediu “uma força”.

Erno Krumereich, por sua vez, foi categórico ao afirmar que realizou o exame das fls. 437-439 (ressonância nuclear magnética), por intermédio de Sidenei, pagando-lhe a quantia de R$ 50,00. Posteriormente, encontrou-se em Porto Alegre com o corréu Martinho para a realização do atendimento, mas narrou que não conhece Altair e que “nunca houve pedido de voto ou de outra contrapartida” que não fosse o valor cobrado. A testemunha referiu que sua esposa, Selma, recebeu a visita de Sidenei e de outra pessoa em sua casa somente “por volta de 20 de setembro”, durante a campanha eleitoral, ocasião em que pediram apoio e voto para a campanha de vereador.

De igual modo, Selma Krumereich contou que somente após a realização do exame pelo SUS, no período anterior às eleições, Altair e Sidenei estiveram em sua casa, ocasião em que estavam com uma lista “para ajudar Caco”, que era candidato, na campanha, o qual dizia ser apoiado pelo Deputado Estadual Giovani Cherini.

Assim, muito embora a acusação afirme que os agendamentos de exames foram realizados em contrapartida ao voto desses quatro eleitores, todo o conjunto probatório aponta que a menção ao pleito foi efetuada muito tempo depois e que, no momento da concessão da dádiva, não havia qualquer evidência do propósito de aliciamento de eleitores em prol de determinado partido ou candidato.

Se a intenção de postular a candidatura e o objetivo de angariar o voto foram manifestados em momento diferente ao da entrega do benefício, apenas em data próxima à eleição, tem-se que a vantagem, consistente no agendamento de exames pelo SUS de forma mais rápida, foi fornecida em troca de R$ 50,00, não havendo qualquer prova no sentido de que essa negociação tenha ocorrido em contrapartida ao voto ou que estivesse a este direcionada.

Para os eleitores Marlize Griesbach, Inácio Becker, Paulo Roberto de Paula e Erno Krumereich, os acusados limitaram-se a fazer uma visita no ano de 2016, em data próxima das eleições, para pedir votos para a candidatura proporcional de Altair Soares da Fonseca e majoritária de Rudinei Harter e relembrar benesses concedidas no ano de 2015, não havendo prova de que nesta oportunidade o pedido de votos, ou de “uma força”, tenha sido acompanhado das ações “dar, oferecer, prometer” uma vantagem.

Então, apesar de a denúncia narrar que os denunciados providenciaram o agendamento e a realização dos exames médicos para estes eleitores com o objetivo de obter o voto, tal finalidade não se fez presente no momento da entrega do benefício, o qual foi fornecido sem menção a qualquer candidatura, que sequer era postulada.

Ainda, no ano de 2016, ao apresentar a candidatura de vereador de Altair aos eleitores Marlize Griesbach, Inácio Becker, Paulo Roberto de Paula e Erno Krumereich, os acusados não praticaram o crime de corrupção eleitoral, pois a vantagem foi concedida em data muito anterior, sendo apenas rememorada, e porque, ao tempo da entrega no benefício, no ano de 2015, não foi expressada a finalidade de obtenção do voto.

O TSE possui firme jurisprudência no sentido de que o delito de corrupção eleitoral não se perfectibiliza com a mera entrega de um benefício. Exige-se, para sua consumação, o dolo específico, caracterizado pela intenção de obter a promessa de voto do eleitor (Habeas Corpus n. 463, Rel. Min. Luiz Carlos Madeira, DJ 3.10.2003).

Dessa forma, ainda que seja desnecessário um pedido expresso de votos, bastando a evidência do propósito de aliciamento de eleitores em prol de determinado partido ou candidato, no caso dos autos sobressai demasiadamente comprovado que o agendamento do exame médico não foi realizado em contrapartida ao voto.

Dessarte, tenho por seguramente comprovado que, nos 2º, 3º e 6º Fatos, a menção ao pleito de 2016 e a finalidade eleitoral deram-se de forma diferida no tempo, após o momento da entrega do benefício, não sendo cabível compreender que o dolo específico se apresente a posteriori, depois da prática das condutas de “dar, oferecer ou prometer”.

Cito, a propósito, precedente deste Tribunal:

Ação penal. Corrupção eleitoral. Art. 299 do Código Eleitoral. Coação no curso do processo. Art. 344 do Código Penal. Prefeito e vice. Eleições 2012.

Competência da Justiça Federal para o processamento do delito tipificado no art. 344 do Código Penal. Rejeição da denúncia.

Fatos relacionados a oferecimento de benesses em troca de voto - oferta de dinheiro e distribuição de moradias.

Ausente o elemento subjetivo consistente na finalidade específica de obter o voto do eleitor com a promessa de vantagem, impõe-se reconhecer a atipicidade de um dos fatos atinentes ao delito de corrupção eleitoral. Absolvição sumária.

Acolhida a promoção ministerial de arquivamento do feito em relação a um dos fatos de corrupção eleitoral envolvendo distribuição de moradia.

Presença dos requisitos formais e substanciais para o acolhimento da exordial. Justa causa para prosseguimento da ação penal evidenciada diante dos indícios de materialidade e de autoria. Imputação de crime cuja pena mínima possibilita o oferecimento da suspensão condicional do processo, no fato remanescente.

Recebimento.

(Ação Penal de Competência Originária n 135214, ACÓRDÃO de 24/11/2014, Relator DR. HAMILTON LANGARO DIPP, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 215, Data: 26.11.2014, p. 9.)

 

Com essas considerações, ausente o elemento subjetivo consistente na finalidade específica de obter o voto do eleitor no momento da entrega da vantagem, impõe-se reconhecer a atipicidade delitiva quanto aos 2º, 3º e 6º Fatos, que tratam da corrupção do voto dos eleitores Marlise Karow Griesbach, Inácio Becker, Paulo Roberto de Paula e Erno Krumereich, razão pela qual a sentença deve ser reformada nesse ponto, dando-se parcial provimento aos recursos, para o fim de serem absolvidos os recorrentes, com fundamento no art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal (não constituir o fato infração penal).

Ressalto que, por força do disposto no art. 580 do Código de Processo Penal, a presente decisão alcança o réu Sidenei Gehling, ainda que mantido o não conhecimento do recurso interposto em virtude de sua intempestividade: “No caso de concurso de agentes (Código Penal, art. 25), a decisão do recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros”.

 

c) 4º e 5º Fatos – Corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral) – eleitores Denis Fernando de Oliveira Bosenbecker e Irani Bosembecker

Diferentemente do que ocorre quanto aos 2º, 3º e 6º Fatos, há prova segura e extreme de dúvidas da corrupção do voto de dois eleitores, Denis Fernando de Oliveira Bosenbecker (4º Fato) e Irani Bosembeckerreich (5º Fato).

Embora, nas razões recursais, os recorrentes neguem a prática dos fatos e sustentem a fragilidade do caderno probatório, verifica-se a existência de farta prova a apontar, de forma extremamente segura, o cometimento do delito de corrupção eleitoral consistente na negociação do voto desses dois eleitores para a realização de exames médicos pelo SUS de forma mais rápida, fora da espera na ordem cronológica do sistema de saúde e em clínica não cadastrada para atendimento de pacientes provenientes da cidade de São Lourenço do Sul.

De início, tem-se as gravações ambientais registradas na mídia da fl. 408, que apresentam as conversas travadas entre Denis Fernando de Oliveira Bosenbecker e os recorrentes Altair Soares Fonseca e Sidenei Gehling, nos dias 2.3.2016, sobre a realização de um exame para Denis, acostado na fl. 1210, e em 19.4.2016, na qual se tratou do atendimento para a tia de Denis, Irani Bosembecker. Em ambas, Altair apresenta-se como candidato a vereador no pleito vindouro, que aconteceria em outubro, e pede votos para a sua candidatura e do prefeito Rudinei Harter enquanto acerta os detalhes da realização dos exames médicos.

Nessas gravações, os recorrentes confirmam que fariam o agendamento de exame médico de imagem em troca da quantia de R$ 50,00 e demonstram, de forma incontroversa, que a finalidade do atendimento é eleitoral e focada na candidatura postulada.

Os eleitores beneficiados foram ouvidos perante a Promotoria de Justiça Eleitoral e em juízo, e confirmaram a negociação do voto em troca dos exames.

Denis Fernando de Oliveira Bosenbecker afirmou ter procurado o denunciado "Caco do Posto", no posto de combustíveis Ipiranga, em duas oportunidades, em março e abril de 2016, primeiro para a realização de um exame para si próprio e, posteriormente, para sua tia Irani. Em ambas as ocasiões, encontrou-se com Altair e Sidenei, e após, em Porto Alegre, com Martinho, que o levou de carro até a clínica para ser atendido. Ocorre que, no momento em que conversou com Caco sobre o exame, o acusado apresentou-se como pré-candidato a vereador, dizendo que “uma mão lava a outra”, demonstrando de modo incontestável que o assistencialismo estava sendo realizado com o manifesto propósito de obter a vitória nas urnas.

Irani Bosembecker, tia de Denis, tratou do seu atendimento por telefone com o recorrente Sidenei e, após, encontrou-se com Martinho em Porto Alegre, sendo que, em junho de 2016, antes da entrega do resultado, Altair pediu seu apoio na disputa ao cargo de vereador, fornecendo até mesmo um "santinho" de sua propaganda eleitoral dentro do envelope em que estava o laudo médico.

Desse modo, para os dois eleitores, está perfeitamente delineada a presença do elemento subjetivo que caracteriza o crime de corrupção eleitoral, pois para ambos os agraciados houve a vinculação do auxílio médico com a candidatura de Altair na eleição que se avizinhava.

Veja-se que, ao conceder o benefício e apresentar a candidatura, a finalidade eleitoral apresenta-se ao eleitor de forma clara, sendo desnecessário o pedido de voto, porque o objetivo de obtenção do sufrágio fica por demais claro ao beneficiário da ajuda. Tanto é assim que Denis, embora reconheça a ausência de pedido de voto, afirma que Altair tratou do exame mencionando a candidatura à vereança, e que “um ajuda o outro”, “uma mão lava a outra”.

Destaco que os depoimentos desses dois eleitores, tanto em juízo quanto na fase extrajudicial, mostraram-se coesos e sem contradições, não havendo motivo justificado para que se entenda pelo comprometimento da prova.

Ademais, a prova documental juntada aos autos, consistente nos exames médicos realizados e em dados da auditoria do próprio Sistema Único de Saúde, corrobora a tese da acusação.

Portanto, correta a sentença ao concluir que a prova produzida é segura ao demonstrar o cometimento dos dois crimes, devendo ser mantida a sentença neste ponto.

 

3. Dosimetria da pena

O quantum de penalização fixado na sentença deve ser redimensionado do seguinte modo:

a) Recorrentes Altair Soares Fonseca e Sidenei Gehling

No tocante ao crime de associação criminosa (art. 288, CPP), para os recorrentes Altair Soares Fonseca e Sidenei Gehling a pena foi estabelecida em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão, devendo ser indeferido o pedido recursal de redução ao patamar mínimo de um ano, mantendo-se a exasperação de três meses pela avaliação negativa da vetorial do art. 59 do Código Penal relativa às consequências do delito.

Luiz Regis Prado leciona que as consequências do crime são “os desdobramentos, não necessariamente típicos, advindos da conduta do agente, reveladores da danosidade decorrente do delito cometido” (Comentários ao Código Penal: doutrina, jurisprudência selecionada, leitura indicada. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 285). Na mesma linha, Guilherme de Souza Nucci define tais consequências como “o mal causado pelo crime, que transcende ao resultado típico” (Código Penal comentado. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 232).

No caso dos autos, está absolutamente correto o juízo sentenciante ao considerar que as consequências do crime praticado pelos réus são nefastas, na medida em que, se associando com outras pessoas, agiram “’furando’ a fila do Sistema Único de Saúde para agendamento e realização de consultas e exames, prejudicando incontáveis pessoas que buscam no Estado um dos mais básicos direitos constitucionais, que é a saúde”.

Quanto ao crime de corrupção eleitoral (art. 299, CE), ora reconhecido no tocante aos Fatos 4 e 5, a pena definitiva fixada a Altair Soares Fonseca e Sidenei Gehling foi de 01 ano, 04 meses e 15 dias de reclusão para cada fato, devendo ser também indeferido o pedido de redução ao patamar mínimo de 1 ano previsto no art. 284 do Código Eleitoral, pois correta a exasperação do quantum em 04 meses e 15 dias por valoração negativa das consequências do crime, na forma explicitada na sentença recorrida.

A pena de multa foi igualmente fixada em prazo razoável e proporcional de 06 dias-multa para cada fato, no valor mínimo legal (um trigésimo do salário-mínimo vigente à época do fato), e permanece sem alteração.

Relativamente à continuidade delitiva (art. 71, CP), a pena restou aplicada em 01 (um) ano e 10 (dez) meses de reclusão, devido ao aumento de 1/3 por condenação dos acusados pelos 2º, 3º, 4º, 5º e 6º Fatos.

Em razão do provimento parcial do recurso, o quantum comporta redução, para aumento de 1/6 em virtude da manutenção da condenação apenas relativamente aos 4º e 5º Fatos, seguindo-se a proporção estabelecida pelo STJ e reproduzida na decisão: 1/6 de aumento quando forem praticadas duas infrações; 1/5 para três; 1/4 para quatro; 1/3 para cinco; 1/2 para seis; e 2/3 para sete ou mais ilícitos (HC 265.385/SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 24.4.2014), restando em 01 (um) ano e 07 (meses) meses e 07 (sete) dias de reclusão.

Não há reparos quanto à conclusão de que o reconhecimento do concurso material heterogêneo previsto no art. 62 do Código Penal (crimes cometidos mediante mais de uma ação) entre os crimes de associação criminosa e de corrupção eleitoral impõe a soma das penas pelo critério do cúmulo material.

Desse modo, as penas em definitivo restam fixadas em: 02 (dois) anos, 10 (dez) meses e 07 (sete) dias de reclusão e 12 dias-multa (art. 72, CP).

Fica igualmente mantido o regime inicial de cumprimento aberto (art. 33, § 2º, al. “c”, CP), e a substituição da pena privativa de liberdade na forma estabelecida na sentença:

Da substituição da pena privativa de liberdade:

Presentes as condições do art. 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade aplicada por duas restritivas de direito (art. 44, §2º, CP), devendo o apenado: 1) submeter-se, pelo período da condenação, à prestação de serviços à comunidade (art. 46, CP), na forma a ser definida pelo juízo da execução. A medida poderá ser cumprida em menor tempo, mas não em menos da metade da pena de privativa de liberdade fixada (art. 46, §4º, do CP); 2) efetuar prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários-mínimos nacionais vigentes à data do último fato, a ser atualizado até a data do pagamento, e ser depositado na conta das penas alternativas da Comarca de São Lourenço do Sul.


                         b) Recorrente Martinho de Brum

No tocante ao crime de associação criminosa (art. 288, CPP), para o recorrente Martinho de Brum a pena foi estabelecida em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão.

Inicialmente, entendo que deve ser indeferido o pedido recursal de redução ao patamar mínimo de um ano, mantendo-se a exasperação de três meses pela avaliação negativa da vetorial do art. 59 do Código Penal relativa às consequências do delito, na forma da sentença, aplicando-se ao acusado a mesma conclusão adotada para os recorrentes Altair Soares Fonseca e Sidenei Gehling.

Contudo, deve ser afastada a valoração negativa da circunstância judicial atinente à culpabilidade, assim considerada na sentença:

1ª Fase

A culpabilidade, como grau de reprovação da conduta, exacerbou o normal para o delito em espécie. O réu era, ao tempo do crime, assessor parlamentar de Deputado Federal, pessoa sobre a qual recai maior responsabilidade e expectativa de conduzir a máquina pública com probidade e idoneidade. Não registra antecedentes (fl. 1525/1526). A conduta social, aferida no meio familiar, no ambiente de trabalho e no relacionamento do réu com outros indivíduos, não foi desabonada. A personalidade do réu não pode ser aferida. O motivo do crime – obtenção de vantagem por via de corrupção – é inerente ao tipo penal. As circunstâncias executórias do delito foram normais à espécie. As consequências do crime praticado pelo réu são nefastas na medida em que, associando-se com outras duas pessoas, agiu “furando” a fila do Sistema Único de Saúde para agendamento e realização de consultas e exames, prejudicando incontáveis pessoas que buscam no Estado um dos mais básicos direitos constitucionais, que é a saúde. Não há informação de a vítima – o povo – ter contribuído para o fato.

Diante das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP (a culpabilidade do réu e as consequências do crime foram valoradas negativamente), fixo a pena-base no mínimo legal (1 ano de reclusão), acrescida de 2/8 sobre o termo médio entre as penas máxima e mínima cominada ao delito (sendo 1/8 para cada circunstância judicial negativa), equivalente a 03 meses cada circunstância, restando em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de reclusão, a qual torno definitiva diante da ausência de outras causas de oscilação de pena.

 

A acepção de culpabilidade como fundamento da pena diz respeito “ao juízo de censura, de reprovação da conduta típica e ilícita praticada pelo agente imputável” (PRADO. Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro. 7. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. v. 1. p. 517).

No caso dos autos, embora a qualificação do acusado Martinho de Brum mencione que na época dos fatos trabalhava como assessor parlamentar do Deputado Giovani Cherini, no curso do processo não foi feita qualquer referência quanto à sua atuação ou ingerência em maior grau no funcionamento do Sistema Público de Saúde que pudesse qualificar sua conduta como mais reprovável em relação à atuação dos demais agentes.

Em verdade, na há menção alguma sobre o uso do cargo de assessor para o cometimento da prática delitiva que pudesse justificar a conclusão de exasperação por uma maior potencial consciência da ilicitude ou exigibilidade de conduta diversa de modo diferenciado quanto aos demais recorrentes.

Assim, afasto a exasperação referente à culpabilidade, tornando a pena definitiva em quantum idêntico ao dos demais acusados: em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão, devendo ser indeferido o pedido recursal de redução ao patamar mínimo de um ano, mantendo-se a exasperação de três meses pela avaliação negativa da vetorial do art. 59 do Código Penal relativa às consequências do delito, na forma já explicitada.

Quanto ao crime de corrupção eleitoral (art. 299, CE), ora reconhecido no tocante aos Fatos 4 e 5, a pena definitiva fixada na sentença foi de 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão para cada fato, devido à valoração negativa de duas circunstâncias judiciais referentes à culpabilidade e às consequências do crime.

Esse prazo deve ser redimensionado pelos mesmos fundamentos já delineados, restando reduzida para 01 ano, 04 meses e 15 dias de reclusão para cada fato, afastada a exasperação quanto à culpabilidade.

Também aqui fica indeferido o pedido de redução ao patamar mínimo de 1 ano previsto no art. 284 do Código Eleitoral, pois correta a exasperação do quantum em 04 meses e 15 dias por valoração negativa das consequências do crime.

Guardando proporcionalidade, a pena de multa estabelecida de 08 dias-multa para cada fato deve ser reduzida para 06 dias-multa para cada, mantido o valor mínimo legal (um trigésimo do salário-mínimo vigente à época do fato).

Relativamente à continuidade delitiva (art. 71, CP), a pena restou aplicada em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão devido ao aumento de 1/3 por condenação do acusado pelo 2º, 3º, 4º, 5º e 6º Fatos, mas também em razão do provimento parcial do recurso e da aplicação do art. 580, CPP, o quantum comporta redução, para aumento de 1/6 em virtude da manutenção da condenação apenas relativamente aos 4º e 5º Fatos, restando definitiva em 01 (um) ano e 07 (meses) meses e 07 (sete) dias de reclusão.

Não há reparos quanto à conclusão de que o reconhecimento do concurso material heterogêneo previsto no art. 62 do Código Penal (crimes cometidos mediante mais de uma ação) entre os crimes de associação criminosa e de corrupção eleitoral impõe a soma das penas pelo critério do cúmulo material.

Desse modo, as penas em definitivo restam fixadas em: 02 (dois) anos, 10 (dez) meses e 07 (sete) dias de reclusão e 12 dias-multa (art. 72, CP).

Ficam igualmente mantidos o regime inicial de cumprimento aberto (art. 33, § 2º, al. “c”, CP) e a substituição da pena privativa de liberdade na forma estabelecida na sentença.

Por fim, devido à ausência de custas e emolumentos no âmbito dos processos criminais eleitorais, afasto a condenação neste ponto.

Rejeito, também, o pedido de execução provisória da pena requerido pela Procuradoria Regional Eleitoral, com base no mais recente entendimento firmado pelo Plenário  do Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADCs n. 43, 44 e 54, sobre a impossibilidade de execução da pena pelo simples exaurimento das instâncias ordinárias (Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 7.11.2019).

Ante o exposto, acolho a preliminar de intempestividade do recurso criminal interposto por SIDENEI GEHLING, rejeito a alegação de ilicitude da prova condenatória e, no mérito, VOTO pelo parcial provimento dos recursos criminais, estendendo a decisão para o réu SIDENEI GEHLING, por aplicação do disposto no art. 580 do Código de Processo penal, e reduzindo as penas definitivas fixadas para ALTAIR SOARES FONSECA, SIDENEI GEHLING e MARTINHO DE BRUM para 02 (dois) anos, 10 (dez) meses e 07 (sete) dias de reclusão e 12 dias-multa, individualmente, afastados a condenação ao pagamento de custas e o pedido de execução provisória da pena, nos termos da fundamentação.