INQ - 58254 - Sessão: 17/09/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de inquérito policial instaurado pela Delegacia da Polícia Federal sediada em Passo Fundo, por requisição da Promotoria Eleitoral local, para fins de apuração de eventual prática do crime de coação eleitoral (art. 300 do Código Eleitoral), ocorrido, em tese, em razão de notícia sobre a convocação de servidores e terceirizados vinculados à Secretaria Municipal de Saúde de Passo Fundo para participarem de reunião no dia 15.9.2016, às 18h30min, no comitê de coligação eleitoral, supostamente com o intuito de angariar votos em prol da candidatura à reeleição do então Prefeito LUCIANO AZEVEDO.

A Procuradoria Regional Eleitoral solicitou a este Egrégio Tribunal Regional Eleitoral que fixasse sua competência originária e determinasse o arquivamento do inquérito policial, com as ressalvas do art. 18 do CPP (fls. 76-78v.).

É o breve relatório.

VOTO

Senhora Presidente,

Eminentes colegas:

Inicialmente, anoto que, em decisão ocorrida no mês de maio de 2018, por maioria, o Supremo Tribunal Federal assentou nova interpretação a respeito da competência originária para processamento e julgamento de ação penal por prerrogativa de função, na Ação Penal Originária n. 937, para restringir sua aplicação apenas aos delitos praticados no exercício do cargo e com pertinência às funções exercidas, salvo se o feito encontrar-se em fase de alegações finais.

No caso dos autos, LUCIANO AZEVEDO tem contra si atribuído fato que caracteriza ilícito eleitoral, supostamente praticado enquanto ocupava o cargo de Prefeito de Passo Fundo (2016).

O candidato foi reeleito, de forma que se consolidou a competência deste Regional para o inquérito, porquanto os fatos em tese configuram crime eleitoral e um dos investigados ostenta a condição de prefeito. Ademais, há pertinência entre tais fatos e as funções desempenhadas pelo mandatário.

Realizada a investigação sobre o ocorrido, o representante do Ministério Público Eleitoral concluiu pela ausência de justa causa para a persecução penal, razão pela qual requer o arquivamento das peças de informação.

A conduta supostamente praticada envolveu a convocação de servidores e terceirizados vinculados à Secretaria Municipal de Saúde de Passo Fundo para participarem de reunião no dia 15.9.2016, às 18h30min, no comitê de coligação eleitoral, com o alegado intuito de angariar votos em prol da candidatura à reeleição do investigado.

E o d. Procurador Regional Eleitoral sublinha, em sua promoção, a fragilidade probatória de todos os relatos. Vejamos:

Analisando-se os elementos de prova, observa-se que apenas Lino Sabadin (identificado como Levino Angelo Sabadin Seguetto), trabalhador terceirizado da Secretaria Municipal da Saúde, entrevistado pelo Secretário de Diligências do Ministério Público na noite do evento referiu que “ele e os demais colegas teriam sido convocados pelos coordenadores da SMS” para estar na reunião (fls. 14 e 32).

Contudo, ouvida na mesma ocasião, Maria Davina dos Santos, servidora pública concursada, lotada na SMS, afirmou “estar no local por iniciativa própria, pois gosta do trabalho do Prefeito Municipal, e que não fora convocada” (fl. 14).

Caroline Goech, enfermeira, apontada na notícia de fato como a pessoa que teria encaminhado a convocação, ao tempo em que confirmou ter laborado em prol da campanha de LUCIANO AZEVEDO em 2016, disse não lembrar se divulgou a reunião de 15-09-16 nas redes sociais. Sobre o evento, declarou que “não tinha cunho eleitoral mas sim tinha por objetivo abordar temas relativos à saúde” e que “foram convidadas para participar do evento pessoas da área da saúde e também era aberta para a população em geral” (fl. 39).

As servidoras municipais Norma, Eliana e Talissa (as duas últimas concursadas), ouvidas pela Polícia Federal, disseram, de modo unânime, ter ficado sabendo da reunião por meio de terceiros, não tendo recebido convocação. Entenderam tratar-se de convite e compareceram em razão de interesse no assunto.

Norma Rheinheimer Salini Laurentino, enfermeira, contratada da Secretaria Municipal de Saúde de 2013 a jan/2018, disse que “em relação a reunião ocorrida em 15/09 no diretório da coligação em frente ao colégio IE, informa que tomou conhecimento por outras pessoas que comentaram sobre a reunião; QUE não foi imposta a participação, tendo a declarante participado pelo fato de que seriam tratados assuntos relacionados à saúde; QUE a reunião era aberta ao público em geral, tendo participação de pessoas de diversas áreas”. Na ocasião, “estavam presentes os candidatos da coligação mas não chegaram a discursar apenas os coordenadores colocaram planos de melhorias na rede de saúde”. Norma ainda referiu que, durante o período eleitoral de 2016, “também foi em reuniões em outros locais quando o assunto era de seu interesse” (fl. 50).

Eliana Sardi Bortolon, psicóloga, servidora pública municipal concursada, disse que “em relação à reunião ocorrida em 15/09 no diretório da coligação em frente ao colégio IE, informa que foi feito um convite a todos, tendo a declarante tomado conhecimento através de outras pessoas”. Referiu que “não foi imposta a participação, tendo a declarante participado por interesse próprio”. Esclareceu que “na reunião foi tratado de propostas da coligação para a saúde da população, havendo pessoas que trabalhavam em vários locais e envolvidas com a saúde”. De acordo com Eliana, “pelo que lembra teve a presença dos candidatos que apenas apresentaram propostas, mas os candidatos nada falaram, apenas outras pessoas” (fl. 52).

Talissa Tondo, servidora pública municipal concursada, lotada na Secretaria Municipal de Saúde na época do fato, disse, a respeito da reunião ocorrida em 2016, que “foi feito um convite a todos, tendo a declarante tomado conhecimento através de outras pessoas”. Mencionou “que não foi imposta a participação, tendo (…) participado por interesse próprio”. Disse, ainda, “que na reunião foi tratado de propostas da coligação para a saúde da população, havendo pessoas que trabalhavam em vários locais e envolvidas com a saúde, mas assuntos de forma geral; que pelo que lembra a declarante falou um pouco sobre a sua área, o prefeito falou um pouco sobre a proposta dele, sobre o planejamento, em nenhum momento falando de votos ou pedindo votos”. Por fim, reiterou que “não foi obrigada a comparecer na reunião, não houve convocação, tampouco se sentiu coagida a votar em qualquer candidato” e acrescentou que “não escutou falar de que tenha ocorrido qualquer tipo de coação com qualquer colega ou conhecido” (fl. 68).

Nesse contexto, considerando que: (i) a suposta mensagem convocando os servidores públicos municipais e terceirizados da Secretaria Municipal de Saúde de Passo Fundo a tomar parte na reunião do dia 15-09-16 não aportou aos autos; (ii) a pessoa apontada como autora da mensagem afirmou não lembrar se divulgou a reunião pelas redes sociais; e (iii) quatro servidoras públicas municipais, três das quais concursadas, negaram terem sido convocadas para reunião, conclui-se pela inexistência de elementos para o oferecimento de denúncia.

Conquanto fosse possível a continuidade da investigação mediante a identificação e oitiva de todos os servidores públicos lotados na Secretária Municipal de Saúde na época do fato, a medida se mostraria pouco eficaz diante das quatro negativas que já constam nos autos.

Conforme o exposto, a única prova do dolo de coação eleitoral reside no depoimento de Lino Sabadin (identificado como Levino Angelo Sabadin Seguetto), trabalhador terceirizado da Secretaria Municipal da Saúde. Entrevistado pelo Secretário de Diligências do Ministério Público na noite do evento, referiu que “ele e os demais colegas teriam sido convocados pelos coordenadores da SMS” para estar na reunião (fls. 14 e 32).

As demais pessoas ouvidas (Caroline, Norma, Eliana e Talissa) negaram a ocorrência de tal convite.

Ainda, o referido texto convocatório, por SMS, sequer aportou nos autos, e a pessoa apontada como autora da mensagem afirmou não lembrar se divulgou a reunião pelas redes sociais.

Dessa forma, uma vez ausentes provas que constituam subsídios mínimos para a instauração da ação penal, e esgotadas as investigações sobre os elementos de que até aqui se têm notícia, concluo que o pleito de arquivamento por ausência de justa causa para a denúncia, tal como requerido pelo próprio dominus litis da persecução criminal, deva ser atendido.

ANTE O EXPOSTO, acolho integralmente a promoção ministerial e VOTO por fixar a competência deste Tribunal para o julgamento do feito e determinar o arquivamento do expediente, com a ressalva do disposto no art. 18 do Código de Processo Penal e no art. 11 da Resolução TSE n. 23.363/11.

É como voto, Senhora Presidente.