PC - 4265 - Sessão: 18/12/2020 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de prestação de contas referente ao exercício financeiro de 2016 apresentada pelo órgão de direção estadual do PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), por intermédio de procurador constituído nos autos, cuja autuação também é integrada pelos dirigentes partidários responsáveis.

Realizadas as diligências solicitadas pelo órgão técnico, sobreveio parecer conclusivo pela desaprovação das contas em face das seguintes irregularidades: a) ausência de comprovantes relativos a gastos realizados com recursos do Fundo Partidário, no valor de R$ 6.220,00; b) recebimento de recursos de fonte vedada, na quantia de R$ 1.993,03; e c) recebimento de recursos de origem não identificada, no valor de R$ 4.986,38 (fls. 749-756).

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral exarou parecer pela desaprovação da contabilidade, determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 13.199,41, acrescida de multa de 20%,  e suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano (fls. 765-776).

Intimada, a agremiação partidária manifestou-se às fls. 785-797, requerendo novas diligências, novo prazo e, ainda, juntou os documentos de fls. 799 a 812. Posteriormente, apresentou comprovante do recolhimento de R$ 1.300,00, relativo ao recebimento de recursos de origem não identificada (fl. 826).

Deferidas parcialmente as diligências solicitadas (fl. 815), sobreveio nova petição do prestador requerendo que o TRE-RS interviesse junto ao Banrisul para que respondesse ofício enviado pelo partido (fls. 825), por meio do qual pedia que fossem identificados os doadores de recursos, o que restou indeferido.

Remetidos os autos à Secretaria de Auditoria Interna (SAI) para manifestação acerca do comprovante de depósito juntado aos autos, aquele órgão entendeu sanada parcialmente a falha e manteve o parecer pela desaprovação das contas, reduzindo-se o montante a ser recolhido ao Tesouro Nacional para R$ 11.899,41 (fls. 836 e 836v).

Alegações finais às fls. 847-850, nas quais o partido suscitou, preliminarmente, a necessidade de retorno dos autos à unidade técnica para análise dos documentos juntados às fls. 798-812 e, ainda, a ocorrência de cerceamento de defesa ante o indeferimento do pedido de remessa de ofício ao Banrisul, para identificação de doadores de recursos e para esclarecimentos quanto ao cargo de gerente adjunto da instituição.

No mérito, defendeu a regularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário e dos recursos apontados pela SAI como provenientes de fonte vedada e de origem não identificada.

Aberta nova vista dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral, a qual, entendendo sanada a falha relativa ao gasto com recursos do Fundo Partidário, emitiu parecer pela aprovação com ressalvas das contas e pelo recolhimento da quantia de R$ 5.679,41 ao Tesouro Nacional (fl. 852-861v).

Por fim, ainda, sobreveio aos autos petição da agremiação partidária (fl. 863), pela qual anexou declaração do Banrisul (fl. 864).

É o relatório.

VOTO

Cuida-se de prestação de contas anual do diretório estadual do PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), referente ao exercício financeiro de 2016.

Inicialmente, passo à análise das preliminares suscitadas pela agremiação em sede de alegações finais, as quais, já adianto, não merecem prosperar.

Quanto à primeira, relativa à necessidade de retorno dos autos à unidade técnica para análise da documentação juntada com a defesa, adianto que são documentos passíveis de conhecimento e análise pelo próprio julgador, sem necessidade de novo exame técnico. Nesse mesmo sentido, bem anotou a Procuradoria Regional Eleitoral, que “mostra-se correta a decisão do eminente Relator que, após o encerramento da produção de provas, delimitou a questão sobre a qual se fez necessária realização de novo exame por parte da Unidade Técnica” (fls. 854-5).

Em relação à segunda preliminar, de suposto cerceamento de defesa em decorrência do indeferimento de pedido formulado pelo prestador, requerendo envio de ofício ao Banrisul para que aquele banco identificasse os doadores de recursos e informasse a descrição do cargo de gerente, também não merece acolhida. Isso porque, conforme mencionado nos despachos de fls. 815 e 831, cabe aos responsáveis partidários a comprovação da movimentação financeira da agremiação à Justiça Eleitoral, para fins de instrução dos processos de prestação de contas.

Ademais, além dos prazos próprios previstos pela Resolução TSE. n. 23.464/15 para a instrução dos autos e atendimento de diligências, o prazo requerido pelo partido para envio de ofício à instituição bancária e aguardo das respectivas respostas foi deferido, conforme se verifica à fl. 734.

Assim, não há se falar em nulidade por cerceamento de defesa, pois, como bem manifestou a Procuradoria Regional Eleitoral, verbis, “no processo de prestação de contas, o ônus da prova incumbe ao gestor da movimentação financeira da agremiação, que deve comprovar a regular arrecadação e aplicação dos recursos, não cabendo a transferência do referido ônus à Justiça Eleitoral”.

Já na questão de fundo, a SAI, em seu parecer técnico conclusivo (fls. 749-756), consignou que todos os créditos declarados pelo partido transitaram integralmente pela conta bancária, sendo a quantia de R$ 1.175.958,48 oriunda do Fundo Partidário, da qual foram gastos R$ 1.110.266,80.

Concluída a análise da contabilidade, a unidade técnica destacou a movimentação de recursos em desacordo com as disposições da Resolução TSE n. 23.464/15, as quais passo a analisar individualmente.

Ausência de comprovação da efetiva prestação de serviços pagos com recursos do Fundo Partidário, nos valores de R$ 700,00 e R$ 5.220,00, totalizando a quantia de R$ 6.220,00 (item 2.1):

Trata-se do recibo de pagamento n. 048, no valor de R$ 700,00, emitido por Luis Fabiano Duarte, e da nota fiscal n. 00041, no valor de R$ 5.520,00, da empresa Rodger Cemim Timm (fls. 798 e 801). A SAI entendeu que não bastavam o recibo e a nota fiscal para comprovar a efetiva realização do serviço, tendo o partido, em atenção a tal apontamento, apresentado, com a defesa, fotografias de evento em que o primeiro fornecedor realizou o serviço de sonorização, e o segundo, o de captação de imagem, foto e vídeo.

Aliás, na foto acostada à fl. 802, o prestador aponta, com seta e escrita à caneta, a foto do próprio Rodger Cemim filmando o evento.

Assim, na esteira do entendimento da Procuradoria Regional Eleitoral, considero comprovado o gasto e sanada a falha relativa à utilização de recursos do Fundo Partidário no valor de R$ 6.220,00.

Do recebimento da quantia de R$ 1.993,03, oriunda de fonte vedada (item 3.1.2):

No ponto, o partido suscita a inconstitucionalidade do termo autoridade, do art. 31,  inc. II, da Lei n. 9.096/95, ao argumento de que violaria os seguintes dispositivos: art. 5º, caput e inc. II; art. 17, § 1º; art. 19, inc. III, e art. 37, todos da Constituição Federal. Ainda, defende a aplicação da alteração produzida pela Lei n. 13.488/17, a qual autoriza a contribuição de autoridades desde que filiados e, por fim, pleiteia a incidência do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, introduzido pela Lei n. 13.831/19, que concedeu anistia às devoluções, cobranças ou transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições feitas, em anos anteriores, por servidores públicos ocupantes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político.

Sem razão.

A constitucionalidade da expressão “autoridades públicas” prevista no art. 31, inc. II, da Lei 9.096/95 já foi objeto de análise por parte desta Corte e, também, pelo Tribunal Superior Eleitoral, segundo o qual não há inconstitucionalidade em relação ao termo 'autoridade', pois toda lei goza de presunção de constitucionalidade, sendo que a única ação na qual houve questionamento do termo, a ADI n. 5.494, foi extinta sem resolução do mérito, em razão da alteração introduzida pela Lei n. 13.488/17, que excluiu o referido termo do dispositivo citado (Agravo de Instrumento n. 7067, Acórdão, Relator Min. Sérgio Banhos, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 27, Data: 07.02.2020, pp. 39-40).

Embora inaplicável a alteração legislativa ao exercício financeiro em exame, oportuno referir que a exclusão do termo “autoridade” anteriormente previsto no inc. II do art. 31, não ocorreu para permitir a contribuição dos servidores cujo cargos se enquadravam nesse conceito, mas porque foi incluído pela mesma Lei n. 13.488/17 o inc. V, que veda o recebimento de doação de “pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político”.

Ou seja, se antes a vedação se restringia ao recebimento de contribuições de servidores considerados autoridades, agora é aplicável a qualquer ocupante de cargo demissível ad nutum, seja ou não autoridade, ressalvadas apenas as doações de filiados.

Quanto à aplicabilidade das alterações introduzidas pela Lei n. 13.488/17, o Tribunal Superior Eleitoral firmou a orientação de que as disposições nela contidas devem incidir sobre fatos ocorridos a partir da data da sua entrada em vigor, como se extrai da seguinte ementa:

RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DOAÇÃO. DETENTORES DE MANDATO ELETIVO. NORMA DO ART. 31, II, DA LEI 9.096/95, VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO LEGAL. DESPROVIMENTO.

1. A Corte Regional Eleitoral reformou a decisão do juiz de primeiro grau que desaprovou as contas do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores, em virtude do recebimento de doações provenientes de vereadores, os quais, segundo o magistrado eleitoral, seriam fontes vedadas por estarem inseridos no conceito de "autoridades públicas", a que aludia o inciso II do art. 31 da Lei 9.096/95, vigente à época dos fatos.

2. Na redação original da norma, o referido dispositivo estabelecia a proibição do recebimento pelas agremiações partidárias de recursos provenientes de "autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38".

3. Em 6.10.2017, foi publicada a Lei 13.488, que suprimiu o termo "autoridades" do inciso II do art. 31 da Lei 9.096/95.

4. A norma insculpida no inciso II do art. 31 da Lei 9.096/95 foi objeto da ADI 5494, proposta pelo Partido da República, na qual se arguiu a inconstitucionalidade do termo "autoridade", para fins do recebimento pelos partidos políticos de contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, de qualquer natureza. Diante da alteração legislativa posterior, que excluiu o termo que motivou a propositura da ação direta de inconstitucionalidade, a ADI 5494 foi extinta sem resolução do mérito, por perda de objeto, com base nos arts. 485, VI, do CPC e 21, IX, do RISTF, em decisão monocrática publicada em 14.6.2018.

5. Considerando tratar-se de direito material de natureza não penal e observando-se o princípio da irretroatividade, o dispositivo legal deve ser aplicado aos fatos ocorridos durante a sua vigência, segundo o princípio tempus regit actum, à luz do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

6. Em várias oportunidades, este Tribunal, ao analisar a mens legis do art. 31, II, da Lei 9.096/95, manifestou-se no sentido de vincular a vedação legal disposta no referido dispositivo aos critérios voltados ao interesse público, notadamente aos princípios constitucionais da Administração Pública atinentes à legalidade, moralidade e impessoalidade.

7. Esta Corte, procedendo à interpretação do art. 31, II, da Lei 9.096/95, na sua redação original, firmou o entendimento de que os ocupantes de cargos em comissão que exerçam funções de chefia ou direção não poderiam realizar doação às agremiações, para se evitar a utilização de cargos públicos como moeda de troca ou que os recursos públicos recebidos por tais agentes a título de remuneração fossem direcionados para financiar os partidos políticos, de forma indireta. Precedentes.

8. A vedação imposta pela norma, ao proibir doações feitas por autoridades públicas, teve o objetivo de obstar a partidarização da administração pública e de manter a preservação do interesse público contra eventuais abusos.

9. Tal entendimento não se aplica aos detentores de mandato eletivo, que são eleitos de acordo com a vontade popular e estão sujeitos à perda do cargo somente nas hipóteses restritas previstas em lei, desde que observados os princípios do contraditório e da ampla defesa.

10. Diante da ausência de afronta ao inciso II do art. 31 da Lei 9.096/95, vigente à época dos fatos, deve ser mantido o acórdão do Tribunal Regional Eleitoral que aprovou a prestação de contas do partido, inicialmente desaprovadas unicamente em razão do recebimento de doações advindas de vereadores.

Recurso especial a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 5079, Relator Min. Admar Gonzaga, DJE de 19.12.2018.) (Grifei.)

Este Regional, perfilhando-se ao entendimento da Corte Superior, tem decidido pela incidência da legislação vigente à época em que efetivadas as doações, como ilustram as ementas abaixo transcritas:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. SUSPENSÃO DO REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 31 DA LEI N. 9.096/95. LEI N. 13.488/17. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. IRRETROATIVIDADE. PREQUESTIONAMENTO. APLICAÇÃO. REJEIÇÃO.

Adoção da tese que prevalece neste Regional, a qual aplica a legislação vigente à época dos fatos, em relação à alteração legislativa do art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, com a redação dada pela Lei n. 13.488/17. Irretroatividade. Embargos destituídos de fundamento, sem a presença de qualquer das hipóteses previstas em lei para o seu manejo, nos termos do disposto nos arts. 275, caput, do Código Eleitoral e 1.022 do Código de Processo Civil. Aplicação do disposto no art. 1.025 do Código de Processo Civil para fins de prequestionamento. Rejeição.

(TRE-RS, RE n. 94-32, RELATOR DES. ELEITORAL JORGE LUÍS DALL'AGNOL, julgado na sessão de 28.2.2018.) (Grifei.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses. (Grifei).

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 14-97, Relator DES. ELEITORAL LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN, julgado na sessão de 04.12.2017.) (Grifei.)

Logo, em virtude do entendimento consolidado pelo Tribunal Superior Eleitoral e por este Regional, inviável a aplicação retroativa das alterações legislativas sobre a matéria.

No que tange à anistia referida no art. 55-D da Lei n. 9.096/95, introduzida pela Lei n. 13.831/19, este Regional, por ocasião do julgamento do RE n. 35-92.2016.6.21.0005, de relatoria do Des. Eleitoral GERSON FISCHMANN, publicado no DEJERS de 23.8.2019, acolheu o incidente suscitado pela Procuradoria Regional Eleitoral, declarando a inconstitucionalidade formal e material do mencionado dispositivo, cujo acórdão restou assim ementado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. MATÉRIA PRELIMINAR ACOLHIDA. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95, INCLUÍDO PELA LEI N. 13.831/19. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA E DE FONTE VEDADA. PORCENTAGEM REPRESENTATIVA DAS IRREGULARIDADES DIANTE DA TOTALIDADE DOS RECURSOS ARRECADADOS NO PERÍODO. AFASTADA A APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE DESAPROVAÇÃO. REDUZIDO O PERÍODO DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. AFASTADA A CONDIÇÃO DE QUE A SANÇÃO SUBSISTA ATÉ QUE OS ESCLARECIMENTOS SEJAM ACEITOS PELA JUSTIÇA ELEITORAL. PROVIMENTO PARCIAL. 1. Incidente de inconstitucionalidade suscitado pelo Procurador Regional Eleitoral. 1.1. O art. 55-D da Lei n. 9.096/95, norma legal objeto do aludido incidente, incluído pela Lei n. 13.831/19, assinala a anistia das devoluções, cobranças ou transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições efetuadas, em anos anteriores, por servidores públicos os quais exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político. Ausência de notícia de que tenha havido oferecimento dos dados relativos à previsão de estimativa de impacto orçamentário e financeiro quando da tramitação da proposta legislativa prevendo a renúncia da receita. Omissão que afronta a exigência constitucional incluída pela EC n. 95/16 no art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A legislação infraconstitucional igualmente exige seja comprovado o impacto orçamentário e financeiro à concessão de benefício que gere a diminuição de receita da União, nos termos do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal e arts. 114 e 116 da Lei n. 13.707/18. 1.2. A anistia das verbas consideradas como oriundas de fontes vedadas - benefício instituído em causa própria e sem qualquer finalidade pública subjacente - atenta ao princípio da moralidade administrativa e desvirtua a natureza jurídica do instituto. 1.3. Vício de inconstitucionalidade formal e material. Acolhimento da preliminar. Afastada, no caso concreto, a aplicação do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19. (Grifei.)

Desse modo, seguindo a orientação firmada por esta Corte no julgamento do precedente citado, afasto a incidência do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19.

Afastadas as alegações da agremiação partidária, persiste o apontamento do órgão técnico quanto à caracterização da quantia de R$ 1.993,03 como de fonte vedada, a qual deve ser recolhida ao Tesouro Nacional.

Do recebimento de recursos de origem não identificada, em contrariedade ao disposto no art. 7º da Resolução TSE n. 23.464/15 (item 3.2.1):

Dos valores pendentes de identificação quanto à origem dos recursos, uma vez que, no curso do processo, o partido procedeu à identificação de alguns doadores e recolheu os valores que entendia devidos (sob o montante de R$ 1.300,00), restou a quantia de R$ 3.686,38 (fl. 836).

Desse total, o prestador apresenta informações relativas às contribuições abaixo relacionadas, discriminadas nos extratos bancários como relativas à operação “Cred. Conv encargos”, que somam a importância de R$ 1.163,00 (fl. 849):

- R$ 275,00, recebidos em 05.02.2016, depósito atribuído a Guilherme Cortez;

- R$ 200,00, recebidos em 0303/2016, depósito atribuído a Nader Ali;

- R$ 488,00, recebido em 03/06/2016, depósito atribuído a Rui Fabrin;

- R$ 200,00, recebido em 06/06/2016, depósito atribuído a Nader Ali.

Além das informações, o partido juntou relatórios (fls. 623-626), onde consta, para cada um dos valores, os supostos doadores, cujas contribuições teriam sido feitas por débito automático.

Ocorre que, não obstante o esforço do partido, os relatórios acostados aos autos, sem qualquer timbre da instituição bancária, apresentam apenas nomes, sem identificação de CPF, contrariando o regramento constante dos arts. 5º, inc. IV, e 7º, caput, da Resolução TSE n. 23.464/15, verbis:

Art. 5º Constituem receitas dos partidos políticos:

(…)

IV – doações de pessoas físicas e de outras agremiações partidárias, destinadas ao financiamento de campanhas eleitorais e das despesas ordinárias do partido, com a identificação do doador originário;

(...)

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

À igual conclusão chega-se em face da declaração do Banrisul anexada pela agremiação partidária na fl. 864, após inclusive o parecer final da Procuradoria Regional Eleitoral, segundo a qual os referidos créditos, recebidos pelo PSDB, se referem às pessoas acima nominadas. Isso porque, embora nela constem os nomes, não há informação acerca do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) de nenhuma delas, retirando a fidedignidade e a certeza acerca do doador, imposta de forma objetiva pela legislação. Nesse sentido, a ausência de CPF impede, inclusive, a possibilidade de cruzamento de dados ao efeito de se saber se referidas doações procedem de fontes vedadas ou não, o que obviamente seria uma tarefa a cargo da unidade técnica responsável.

Além dos valores acima relacionados, a SAI apontou a existência de outros recursos de origem não identificada que foram recebidos sob a operação “Créditos Títulos”.

O partido, em resposta, alega que a identificação dos doadores estaria nos relatórios juntados às fls. 627-643. Todavia, os números de CPF foram lançados naqueles relatórios manualmente, à caneta, arranjo esse que não atinge à finalidade almejada pelo legislador, pois não oferece certeza quanto à identidade dos doadores.

No caso dos autos, a infringência à norma impede o conhecimento da real origem dos valores recebidos, implicando a sua caracterização como de origem não identificada, na forma do art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I - o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF do doador ou contribuinte, ou no CNPJ, em se tratando de partidos políticos ou candidatos:

a) não tenham sido informados; ou

(…).

Consequentemente, os valores recebidos sem identificação dos doadores originários respectivos devem ser transferidos ao Tesouro Nacional, como definido no art. 14, caput, da Resolução TSE n. 23.434/15, na esteira da jurisprudência consolidada no âmbito deste Regional:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES ORIUNDAS DE FONTE VEDADA. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. USO IRREGULAR DE RECEITA DO FUNDO PARTIDÁRIO. INOBSERVÂNCIA DO PERCENTUAL MÍNIMO DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO A SER UTILIZADO NA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA FEMININA. RECOLHIMENTO DO VALOR IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS.

1. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da Administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Caracterizado, nos autos, o emprego de valores de procedência ilícita, advindos de cargos de Chefe de divisão, Supervisor, Diretor, Chefe de gabinete, Oficial de gabinete e Secretário municipal. A norma proibitiva incide de forma objetiva, devendo o valor irregular ser recolhido ao Tesouro Nacional. Incidência do disposto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, na redação vigente ao tempo dos fatos em análise.

2. Crédito de receitas com apenas a indicação do CNPJ do órgão partidário, sem a identificação do real doador originário, contrariando as disposições contidas nos arts. 5º, inc. IV, e 7º, ambos da Resolução TSE n. 23.464/15. Caracterizada como de origem não identificada, deve a quantia ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15.

3. Uso irregular de recursos do Fundo Partidário. Realização de despesas em desacordo com o estipulado pelo art. 18 da Resolução TSE n. 23.464/15. Falhas que não podem ser consideradas como de natureza meramente formal, uma vez que envolvem recursos de natureza pública.

4. Inobservância da regra de destinação do percentual mínimo de 5% dos recursos oriundos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas para promover e difundir a participação política das mulheres. Art. 22, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15. Transferência do valor correspondente para a conta bancária específica, e aplicação do recurso, conforme determina a legislação eleitoral, no exercício seguinte ao do trânsito em julgado das contas, sob pena de ser acrescido em 12,5%, a ser utilizado na mesma finalidade.

5. Atitude colaborativa da agremiação para sanar os erros apontados. Falhas que representam 11,52% da totalidade dos recursos arrecadados. Aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar a severa penalidade de desaprovação das contas.

6. Aprovação com ressalvas. Recolhimento da quantia considerada irregular ao Tesouro Nacional.

(Grifei.)

(Prestação de Contas n. 4520, ACÓRDÃO de 08.11.2018, Relator GERSON FISCHMANN, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data: 12.11.2018, p. 5.)

Percentual das Irregularidades Constatadas.

Embora caracterizada a arrecadação de receitas de fonte vedada (R$ 1.993,03) e sem identificação de doadores originários (R$ 3.686,38), o seu somatório (R$ 5.679,41) representa tão somente 0,45% do total recebido durante o exercício financeiro de 2016 (R$ 1.237.201,43 – fl. 44).

Nesse contexto, em que envolvido percentual ínfimo dos recursos recebidos pelo partido, bem abaixo do fixado como parâmetro pelo Tribunal Superior Eleitoral, viabiliza-se o juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade, aplicando-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Nessa linha, colaciono julgado deste Tribunal:

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA A PRELIMINAR DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. MÉRITO. RECURSOS ADVINDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES. IRREGULARIDADES QUE SOMAM O PERCENTUAL DE 9,86% DAS RECEITAS AUFERIDAS PELA GREI NO EXERCÍCIO FINANCEIRO EM ANÁLISE, POSSIBILITANDO O JUÍZO DE APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS. REDUÇÃO DO VALOR A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS AS PENALIDADES DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DE MULTA. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas. É vedado aos partidos políticos receber doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, quando ostentarem a condição de autoridades.

2. Inviável reconhecer a aduzida inconstitucionalidade do art. 65, inc. III, da Resolução TSE n. 23.546/17 por mostrar-se incompatível com o art. 60, § 4º, inc. III, da Constituição Federal. Embora o art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 13.488/17, considere regular as doações realizadas por autoridades públicas com vínculo partidário, essa regra alcança, tão somente, as doações efetuadas após a data da sua publicação, qual seja, 06.10.2017, não sendo aplicável a todo o exercício financeiro de 2017. Incidência da legislação vigente à época em que efetivadas as doações por autoridades públicas.

3. Irregularidades que somam o percentual de 9,86% da totalidade das receitas arrecadadas pela agremiação no exercício financeiro em análise, possibilitando o juízo de aprovação das contas com ressalvas, na esteira da jurisprudência firmada pelo Tribunal Superior Eleitoral, igualmente adotada no âmbito deste Tribunal.

4. Redução do valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional e afastadas as penalidades de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário e de multa.

5. Provimento parcial. Aprovação com ressalvas.

(Recurso Eleitoral n. 1526, ACÓRDÃO de 14.5.2019, Relatora MARILENE BONZANINI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 88, Data: 17.5.2019, p. 8.) (Grifei.)

As contas da agremiação, portanto, devem ser aprovadas com ressalvas, na medida em que o diminuto percentual das irregularidades envolvido não compromete substancialmente a higidez contábil, tampouco a efetividade da fiscalização financeira por esta Justiça Especializada.

Decorre que a penalidade de suspensão de quotas do Fundo Partidário, requerida pela Procuradoria Regional Eleitoral, mostra-se incompatível com a hipótese de aprovação das contas, assim como a incidência de multa, conforme esta Corte vem reiteradamente decidindo.

Dever de Recolhimento dos Valores ao Tesouro Nacional.

Por outro lado, o juízo de aprovação com ressalvas não desobriga o órgão partidário do dever de recolhimento, ao Tesouro Nacional, dos valores recebidos de fontes vedadas e sem identificação dos seus respectivos doadores, porquanto esse dever não constitui uma penalidade ou efeito decorrente da desaprovação das contas, mas consequência específica e independente do reconhecimento da irregularidade da movimentação das receitas, como se extrai da leitura conjunta dos arts. 13, caput, e 14, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, a seguir transcritos:

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

(...)

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 desta resolução sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º desta resolução, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput deste artigo também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 5º do art. 11, os quais devem, nesta hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

(Grifei.)

Diante do exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas do Diretório Estadual do PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), relativas ao exercício financeiro de 2016, e determino o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 5.679,41 (cinco mil, seiscentos e setenta e nove reais e quarenta e um centavos).