RE - 332 - Sessão: 29/01/2020 às 11:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso eleitoral interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de SÃO JOSÉ DO NORTE contra a sentença do Juízo da 130ª Zona Eleitoral que desaprovou suas contas, referentes à movimentação financeira do exercício de 2017, diante do recebimento de recursos de origem não identificada, no montante de R$ 4.003,19, determinando, assim, o recolhimento do referido valor ao Tesouro Nacional, acrescido de multa de 20%, bem como a suspensão do repasse de recursos do Fundo Partidário até que o esclarecimento da origem da quantia seja aceito pela Justiça Eleitoral ou comprovada a restituição da importância recebida indevidamente (fls. 196-200).

Em suas razões, sustenta a agremiação que realizou a juntada da individualização dos doadores (fls.149-166) com as respectivas informações do nome, CPF, número do recibo, data do crédito e valor da doação. Assim, levando-se em conta o espírito da lei, estaria suprida a necessidade de apresentar, novamente, os doadores de forma diversa da já realizada. Pede a reforma da sentença (fls. 207-210).

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 216-218).

É o relatório.

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

O PT de São José do Norte teve suas contas partidárias relativas ao exercício de 2017 julgadas desaprovadas em razão do recebimento de recursos de origem não identificada, no total de R$ 4.003,19, na conta-corrente n. 601899308, creditados pelo Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, CNPJ n. 00.676.262/0002-51 e n. 00.676.262/001-70, sem a identificação dos doadores originários, em desacordo com o art. 5° da Resolução TSE n. 23.464/15.

Antes de adentrar no exame das razões para reforma da sentença, pontuo algumas considerações acerca da natureza jurídica dos processos de prestações de contas.

A transparência do aporte de recursos e dos gastos realizados pelos partidos políticos, como entes que viabilizam o exercício da soberania popular, é premissa essencial ao Estado Democrático de Direito e atende ao dever constitucional de prestação de contas à Justiça Eleitoral (art. 17, inc. III, da CF).

Daí que a fiscalização das contas, sejam elas de campanha ou de exercício, deve ser efetuada de modo a verificar a origem das receitas e a destinação das despesas, mediante avaliação formal dos documentos contábeis e fiscais apresentados pelos partidos políticos e candidatos, sendo vedada a análise das atividades político-partidárias ou qualquer interferência em sua autonomia.

A natureza jurídica do processo de contas é eminentemente declaratória, com supedâneo nas informações voluntariamente declaradas pelas agremiações e pelos candidatos e encaminhadas à Justiça Eleitoral, sendo assente que o exame técnico realizado não obstaculiza  a investigação de fatos que possam configurar ilícitos penais, civis ou administrativos por outras instituições fiscalizatórias, como o Ministério Público Eleitoral.

Com fulcro nessas premissas, passo a examinar os autos.

Imputa-se ao PT de São José do Norte o recebimento de recursos oriundos do diretório nacional da sigla sem a identificação do doador originário, contrariando o disposto nos arts. 5º, inc. IV, e 11, inc. III, da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 5º Constituem receitas dos partidos políticos:

[…]

IV – doações de pessoas físicas e de outras agremiações partidárias, destinadas ao financiamento de campanhas eleitorais e das despesas ordinárias do partido, com a identificação do doador originário.

 

Art. 11. Os órgãos partidários de qualquer esfera devem emitir, no prazo máximo de três dias contados do crédito na conta bancária, recibo de doação para:

[…]

III – as transferências financeiras ou estimáveis em dinheiro realizadas entre níveis de direção partidária do mesmo partido político, com a identificação do doador originário.

De fato, a grei recebeu recursos provenientes do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores no valor total de R$ 4.003,19.

Todavia, apresentou documentos suficientes para identificar o doador originário dos recursos, recebidos, inicialmente, pelo órgão de direção nacional e repassados, posteriormente, ao órgão municipal.

Com efeito, os documentos juntados (fls. 149-166) indicam doações correspondentes àquelas apontadas no parecer conclusivo das fls. 171-172 e informam o CPF do doador originário, seu nome e a data da arrecadação. Aliás, há correspondência exata dos valores e das datas constantes nos documentos trazidos pela agremiação com os lançados nas fls. 171-172 (parecer conclusivo), cujo montante alcançou o valor de R$ 4.003,19.

Apenas a título de amostragem, é possível verificar, no documento da fl. 164, a indicação do recebimento pelo órgão nacional do valor de R$ 2.257,66, em 21.11.2017, proveniente de doações oriundas de pessoas físicas perfeitamente identificadas. Ao mesmo tempo, na fl. 172, o parecer conclusivo indica o repasse do valor de R$ 2.257,66, em 21.11.2017, ao recorrente.

Assim, tenho que esses documentos identificam, à saciedade, os doadores originários, para fins do art. 11, inc. III, da Resolução TSE n. 23.464/15, e harmonizam-se com o princípio da transparência que deve nortear a contabilidade das agremiações. Diferentemente do que entendeu a sentença recorrida, o doador originário deve ser informado, identificado –providência cumprida pelo recorrente.

Desse modo, os documentos apresentados atendem à exigência regulamentar de identificação do doador originário, não havendo que se falar em insuficiência probatória a seu respeito.

Anoto que, no parecer conclusivo, esses documentos constaram como unilaterais, razão pela qual não seria possível verificar sua veracidade (fl. 172-v.).

Efetivamente, a documentação é unilateral, mas, considerando que a sigla foi instada a sanar a falha, e o processo de contas é de natureza declaratória, caso haja alguma dúvida sobre a fidedignidade da informação devem ser adotadas as medidas adequadas para a comprovação do que foi declarado.

Na espécie, ao contrário do que constou na sentença, o parecer conclusivo que examinou as doações recebidas pelo órgão nacional, em cotejo com as informações prestadas pelo recorrente, dá conta de que há fidedignidade nas doações declaradas.

Nesse sentido, recente julgado desta Corte, da relatoria do Des. Eleitoral Gerson Fischmann, em situação idêntica:

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS PROVENIENTES DO DIRETÓRIO NACIONAL. ATENDIDA A EXIGÊNCIA DE IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR ORIGINÁRIO. APRESENTAÇÃO INTEMPESTIVA DA CONTABILIDADE. FALHA SEM GRAVIDADE. AFASTADAS AS SANÇÕES IMPOSTAS. PARCIAL PROVIMENTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Desaprovação das contas em virtude do recebimento de recursos oriundos do diretório nacional sem a identificação do doador originário, contrariando o disposto nos arts. 5º, inc. IV, e 11, inc. III, da Resolução TSE n. 23.464/15. Ao contrário do entendimento de primeiro grau, os documentos apresentados pela agremiação atendem à exigência regulamentar de identificação do doador originário, não havendo que se falar em insuficiência probatória. Tal comprovação é imposta somente na prestação de contas do órgão de direção nacional, que arrecadou os recursos diretamente da fonte originária informada.

2. A apresentação intempestiva das contas constitui falha sem gravidade, permitindo a aprovação das contas com ressalvas. Afastadas as sanções impostas.

3. Provimento parcial. (RE n. 94-70.2017.6.21.0094, PROCEDÊNCIA: PINHEIRINHO DO VALE; RECORRENTE: PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT); RECORRIDO: JUSTIÇA ELEITORAL, julg. 07.8.2019.) (Grifo nosso.)

Na espécie, essa era a única irregularidade das contas e, sendo ela devidamente sanada, tenho que merece integral provimento o apelo interposto, de modo a aprovar a contabilidade sem ressalvas.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento total do recurso, para reformar a sentença e julgar aprovadas as contas do Partido dos Trabalhadores de São José do Norte relativas ao exercício de 2017.