RE - 9219 - Sessão: 18/05/2021 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) do Município de Santo Ângelo (fls. 95-102) contra decisão do Juízo da 45ª Zona Eleitoral, que desaprovou a sua prestação de contas referente ao pleito de 2018 (fls. 89-91v.), bem como determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 39.754,87 (trinta e nove mil, setecentos e cinquenta e quatro reais e oitenta e sete centavos) e a suspensão do recebimento de verbas do Fundo Partidário pelo período de 06 (seis) meses.

Em suas razões recursais (fls. 96-102), o partido sustenta que o parecer conclusivo apontou irregularidades formais, com base nas quais o Ministério Público Eleitoral de primeiro grau opinou pela aprovação com ressalvas. Alega que o repasse de 30% para as candidaturas femininas foi efetuado pelo diretório nacional do órgão partidário antes de realizar a transferência para o recorrente, haja vista que as eleições gerais têm abrangência nacional e estadual, devendo os respectivos diretórios cumprir com a referida obrigação legal. Aduz que o dever de repasse do diretório municipal está atrelado ao pleito municipal, quando deverá reservar a cada sexo o percentual mínimo previsto em lei. Requer, por fim, a reforma da sentença para que sejam aprovadas as contas ou, alternativamente, aprovadas com ressalvas.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 107-111v.).

É o relatório.

 

VOTO

 

Admissibilidade Recursal

A sentença foi publicada via nota de expediente no DEJERS em 28.5.2019, terça-feira (fls. 92-94), e a peça recursal protocolizada em cartório no dia 31.5.2019, sexta-feira (fl. 95), sendo, portanto, tempestivo o apelo. Presentes os demais requisitos de admissibilidade, dele conheço.

Mérito

Cuida-se de recurso interposto em virtude de desaprovação das contas do PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) de Santo Ângelo relativas à campanha eleitoral de 2018 (fls. 95-102).

Ressalto, por importante, que, após a submissão das contas para apreciação do corpo técnico da 45ª Zona Eleitoral, se constatou a permanência das seguintes irregularidades e impropriedades técnicas (fls. 83-85):

1) Descumprimento do prazo para entrega dos relatórios finais das doações descritas na tabela constante na fl. 83v., em dissonância com o art. 50, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17 (item 1.1);

2) Apresentação parcial dos extratos bancários da conta destinada à movimentação de recursos do Fundo Partidário, contrariando o disposto no art. 56, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.553/17 (item 1.2.1);

3) Divergências no depósito da sobra de campanha, em desacordo com o art. 53, § 3º, da Resolução TSE n. 23.553/17 (item 1.2.2);

4) Ausência de documentos comprobatórios da destinação do valor mínimo do Fundo Partidário à cota de gênero, ferindo a Resolução TSE n. 23.553/17 em seu art. 21, §§ 4º e 5º (item 2).

A apresentação extemporânea dos aludidos relatórios (1), muito embora não observado o art. 50, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17, constitui mácula que não prejudica a confiabilidade dos documentos contábeis, tampouco obstaculiza a efetiva fiscalização da movimentação financeira pela Justiça Eleitoral. Portanto, representa falha formal a impor o apontamento de ressalvas no julgamento das contas.

No que se refere à segunda irregularidade (2), o partido deixou de apresentar os extratos bancários da conta destinada à movimentação de recursos do Fundo Partidário referente ao período total da campanha eleitoral. Em resposta, o recorrente apresentou justificativas para os débitos do período solicitado, mas o extrato bancário trazido aos autos não contempla o período omisso.

Frisa-se que o objetivo da prestação de contas é viabilizar o controle da origem de todos os recursos de campanha e de seus respectivos destinos, sendo imprescindível a apresentação dos extratos bancários completos para o cumprimento dessa finalidade. E, na situação dos autos, o partido não conseguiu trazer as informações bancárias necessárias à transparência das contas, prejudicando o seu exame.

Por tal motivo, o art. 56, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.553/17 veda expressamente a apresentação de extratos bancários parciais ou que omitam qualquer movimentação financeira:

Art. 56. Ressalvado o disposto no art. 65 desta resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta, cumulativamente:

(…)

II - pelos seguintes documentos, na forma prevista no § 1º deste artigo:

a) extratos das contas bancárias abertas em nome do candidato e do partido político, inclusive da conta aberta para movimentação de recursos do Fundo Partidário e daquela aberta para movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), quando for o caso, nos termos exigidos pelo inciso III do art. 3º desta resolução, demonstrando a movimentação financeira ou sua ausência, em sua forma definitiva, contemplando todo o período de campanha, vedada a apresentação de extratos sem validade legal, adulterados, parciais ou que omitam qualquer movimentação financeira;

 

Assim, permanece a irregularidade.

No que diz respeito ao valor de R$ 43,40 (quarenta e três reais e quarenta centavos), embora apontado no parecer conclusivo como sobras de campanha relativas aos recursos do Fundo Partidário (3), não constitui irregularidade.

De acordo com a cronologia do processo, ocorreu o seguinte.

O relatório preliminar para expedição de diligências (fl. 54v.) informou, mediante análise do extrato eletrônico retirado do sistema SPCE-WEB, a ocorrência de movimentação financeira na conta-corrente do partido destinada ao trânsito de valores do Fundo Partidário em data posterior a 1º.11.2018, com saldo final de R$ 43,40 (quarenta e três reais e quarenta centavos).

Chamada a se manifestar, a agremiação apresentou um comprovante de depósito na conta do partido para movimentação de outros recursos, cujo valor é o mesmo identificado na conta do Fundo Partidário (R$ 43,40) e cujo doador é pessoa física registrada no CPF sob o n. 000.418.040-23 – Daniele Vieira (fl. 85).

Destaco, primeiramente, que a prova trazida pelo recorrente, no entanto, não guarda relação com o que foi destacado no mencionado relatório, pois o valor tido como “sobra de campanha” foi auferido a partir da conta do Fundo Partidário e o documento apresentado refere-se à conta para movimentação “de outros recursos”.

De qualquer sorte, o saldo apurado no relatório para expedição de diligências, no meu entendimento, não constitui sobra de campanha, motivo pelo qual não se pode constatar que tenha havido desrespeito ao art. 53, § 3º, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Explico.

O dispositivo legal que trata das sobras de campanha é direcionado à campanha eleitoral de candidatos. A transferência das sobras de campanha e encerramento das respectivas contas bancárias é uma obrigatoriedade aplicada ao candidato e deve ser comprovada no ato de apresentação da sua prestação de contas à Justiça Eleitoral.

Cabe às agremiações, por sua vez, a comprovação, na respectiva prestação de contas, das sobras financeiras recebidas dos candidatos, creditadas na conta do partido.

É o que se depreende da leitura dos dispositivos transcritos abaixo:

Lei n. 9.504/97

Art. 31. Se, ao final da campanha, ocorrer sobra de recursos financeiros, esta deve ser declarada na prestação de contas e, após julgados todos os recursos, transferida ao partido, obedecendo aos seguintes critérios:

I – no caso de candidato a Prefeito, Vice-Prefeito e Vereador, esses recursos deverão ser transferidos para o órgão diretivo municipal do partido na cidade onde ocorreu a eleição, o qual será responsável exclusivo pela identificação desses recursos, sua utilização, contabilização e respectiva prestação de contas perante o juízo eleitoral correspondente;

II – no caso de candidato a Governador, Vice-Governador, Senador, Deputado Federal e Deputado Estadual ou Distrital, esses recursos deverão ser transferidos para o órgão diretivo regional do partido no Estado onde ocorreu a eleição ou no Distrito Federal, se for o caso, o qual será responsável exclusivo pela identificação desses recursos, sua utilização, contabilização e respectiva prestação de contas perante o Tribunal Regional Eleitoral correspondente;

III – no caso de candidato a Presidente e Vice-Presidente da República, esses recursos deverão ser transferidos para o órgão diretivo nacional do partido, o qual será responsável exclusivo pela identificação desses recursos, sua utilização, contabilização e respectiva prestação de contas perante o Tribunal Superior Eleitoral;

IV – o órgão diretivo nacional do partido não poderá ser responsabilizado nem penalizado pelo descumprimento do disposto neste artigo por parte dos órgãos diretivos municipais e regionais.

Parágrafo único. As sobras de recursos financeiros de campanha serão utilizadas pelos partidos políticos, devendo tais valores ser declarados em suas prestações de contas perante a Justiça Eleitoral, com a identificação dos candidatos. (Grifo nosso)

(...)

 

Resolução TSE n. 23.553/17

Art. 53. Constituem sobras de campanha:

I – a diferença positiva entre os recursos financeiros arrecadados e os gastos financeiros realizados em campanha;

II – os bens e materiais permanentes adquiridos ou recebidos durante a campanha até a data da entrega das prestações de contas de campanha.

§ 1º As sobras de campanhas eleitorais devem ser transferidas ao órgão partidário, na circunscrição do pleito, conforme a origem dos recursos, até a data prevista para a apresentação das contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º O comprovante de transferência das sobras de campanha deve ser juntado à prestação de contas do responsável pelo recolhimento, sem prejuízo dos respectivos lançamentos na contabilidade do partido político.

§ 3º As sobras financeiras de recursos oriundos do Fundo Partidário devem ser transferidas para a conta bancária do partido político destinada à movimentação de recursos dessa natureza.

§ 4º As sobras financeiras de origem diversa da prevista no § 3º devem ser depositadas na conta bancária do partido político destinada à movimentação de "Outros Recursos", prevista na resolução que trata das prestações de contas anuais dos partidos políticos.

§ 5º Os valores do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) eventualmente não utilizados não constituem sobras de campanha e devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional integralmente por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU) no momento da prestação de contas.

§ 6º Na hipótese de aquisição de bens permanentes com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), estes devem ser alienados ao final da campanha, revertendo os valores obtidos com a venda para o Tesouro Nacional, devendo o recolhimento dos valores ser realizado por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU) e comprovado por ocasião da prestação de contas.

§ 7º Os bens permanentes a que se refere o parágrafo anterior devem ser alienados pelo valor de mercado, circunstância que deve ser comprovada quando solicitada pela Justiça Eleitoral. (Grifo nosso)

 

Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 16. A comprovação da existência e a destinação das sobras de campanha incumbem ao:

I – Diretório Nacional, no que se refere às campanhas para o cargo de presidente da República;

II – Diretório Estadual ou Distrital, no que se refere às campanhas para governador, senador, deputado federal, estadual ou distrital; e

III – Diretório Municipal, no que se refere às campanhas para prefeito e vereador.

§ 1º As sobras financeiras de campanha recebidas de candidatos devem ser creditadas nas contas bancárias de que tratam os incisos do art. 6º, conforme a natureza dos recursos, obedecendo-se aos seguintes critérios (Lei nº 9.504/1997, art. 31):

I – no caso de candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador, esses recursos devem ser transferidos para o órgão diretivo municipal do partido na cidade onde ocorreu a eleição, o qual será o responsável exclusivo pela identificação desses recursos, pela sua utilização, pela contabilização e pela respectiva prestação de contas no juízo eleitoral correspondente;

II – no caso de candidatos a governador, vice-governador, senador, deputado federal e deputado estadual ou distrital, esses recursos devem ser transferidos para o órgão diretivo regional do partido no Estado onde ocorreu a eleição ou no Distrito Federal, se for o caso, o qual será o responsável exclusivo pela identificação desses recursos, pela sua utilização, pela contabilização e pela respectiva prestação de contas no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) correspondente;

III – no caso de candidatos a presidente e a vice-presidente da República, esses recursos devem ser transferidos para o órgão diretivo nacional do partido, o qual será o responsável exclusivo pela identificação desses recursos, pela sua utilização, pela contabilização e pela respectiva prestação de contas no TSE;

IV – o órgão diretivo nacional do partido não pode ser responsabilizado nem penalizado pelo descumprimento do disposto neste artigo por parte dos órgãos diretivos municipais e regionais.

(...)  

 

Ademais, ressalto que a conta bancária dos candidatos é encerrada ao final da campanha. Os órgãos partidários, por seu turno, em todos os níveis (nacional, estadual e municipal), possuem conta bancária de caráter permanente para a circulação dos recursos do Fundo Partidário. Não há, portanto, sobras financeiras de campanha relativas a verbas do Fundo Partidário, e a conta não é encerrada ao final da campanha, como defendido pelo recorrente na fl. 63.

Isso porque todos os níveis partidários estão obrigados a abrir contas de campanha específicas, conforme os tipos de recursos a serem movimentados. É o que se depreende do art. 6º da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 6º Os partidos políticos, nos termos dos parágrafos deste artigo, devem abrir contas bancárias para a movimentação financeira das receitas de acordo com a sua origem, destinando contas bancárias específicas para a movimentação dos recursos provenientes:

I – do Fundo Partidário, previstos no inciso I do art. 5º;

II – da conta "Doações para Campanha", previstos no inciso IV do art. 5º;

III – da conta "Outros Recursos", previstos nos incisos II, III e V do art. 5º;

IV – dos destinados ao programa de promoção e difusão da participação política das mulheres (art. 44, V, da Lei nº 9.096/95);

V – do FEFC, previstos no inciso VIII do art. 5º.

Traduzindo para a situação dos autos, temos que a conta do PDT de Santo Ângelo, na qual foi apurado o saldo corresponde à conta do Fundo Partidário, é conta bancária de caráter permanente, utilizada pela agremiação para a circulação dos valores que são provenientes do referido fundo.

Em resumo, não há se falar em sobras de campanha em conta dessa natureza. Assim, embora não justificado pelo partido, o fato não constitui irregularidade.

No que toca à falha do item quatro (4), a auditoria técnica apontou que o partido recorrente não comprovou o repasse do valor mínimo dos recursos do Fundo Partidário à cota de gênero, fato esse que contraria a decisão proferida na ADI STF n. 5617 e o disposto nos §§ 4º e 5º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.553/17.

Embora o diretório municipal não participe diretamente das eleições gerais, restou demonstrado que, dos R$ 140.000,00 (cento e quarenta mil reais) de Fundo Partidário recebidos diretamente do diretório nacional, foi gasto com a eleição de 2018 o total de R$ 139.836,25 (cento e trinta e nove mil, oitocentos e trinta e seis reais e vinte e cinco centavos), sem que fossem reservados às candidaturas femininas os 30% (R$ 41.950,87) previstos no art. 21, § 4º, da Resolução TSE n. 23.553/17, que dispõe, in litteris:

Art. 21. Os partidos políticos podem aplicar nas campanhas eleitorais os recursos do Fundo Partidário, inclusive aqueles recebidos em exercícios anteriores.

(…)

§ 4º Os partidos políticos, em cada esfera, devem destinar ao financiamento de campanhas de suas candidatas no mínimo 30% dos gastos totais contratados nas campanhas eleitorais com recursos do Fundo Partidário, incluídos nesse valor os recursos a que se refere o inciso V do art. 44 da Lei nº 9.096/1995.

(…)

§ 6º A verba oriunda da reserva de recursos do Fundo Partidário, destinada ao custeio das candidaturas femininas, deve ser aplicada pela candidata no interesse de sua campanha ou de outras campanhas femininas, sendo ilícito o seu emprego, no todo ou em parte, exclusivamente para financiar candidaturas masculinas. (Grifo nosso)

 

Cumpre referir que, do total gasto na campanha eleitoral de 2018, R$ 132.516,25 (cento e trinta e dois mil, quinhentos e dezesseis reais e vinte e cinco centavos) foram transferidos ao então candidato a deputado estadual Eduardo Debacco Loureiro.

Em suas razões, o recorrente alega o cumprimento da destinação legal pelo diretório nacional antes de efetuar o repasse do Fundo Partidário. Contudo, tal fato não restou demonstrado nos autos.

Da mesma forma, não procede a alegação de responsabilidade exclusiva do diretório estadual pelo repasse da cota mínima às candidaturas femininas, por se tratar de eleições gerais.

De fato, tratando-se de eleições gerais, a lógica seria que o diretório nacional repassasse os recursos do Fundo Partidário aos diretórios estaduais e esses, por sua vez, destinassem os valores às campanhas eleitorais, sem a participação dos diretórios municipais nesse processo. Contudo, não é o que ocorre na realidade.

A agremiação recorrente, embora não tenha participado diretamente das eleições gerais, empregou os recursos do Fundo Partidário a ela transferidos pelo diretório nacional nas eleições de 2018, fato que atrai a incidência da regra prevista no § 4º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.553/17: os partidos políticos, em cada esfera, devem destinar ao financiamento de campanhas de suas candidatas no mínimo 30% dos gastos totais contratados nas campanhas eleitorais com recursos do Fundo Partidário.

Assim, a obrigação da transferência de valores do Fundo Partidário às candidaturas femininas deve recair na esfera do partido que empregou o recurso público na campanha eleitoral, cumprindo a cada esfera da agremiação demonstrar, no momento de sua prestação de contas eleitorais, o atendimento às condicionantes legais, evitando-se, assim, fraude ao escopo legal.

Importa salientar que o Diretório Estadual do PDT, na Prestação de Contas relativa às eleições de 2018 (PC n. 0602518-90), também fora condenado à devolução de valores por ausência do repasse da cota mínima às campanhas femininas. Nesse processo, o PDT estadual igualmente alegou que a transferência havia sido realizada pelo diretório nacional, não comprovando tal alegação. Curiosamente, foi demonstrado que o diretório estadual recebeu, a título de Fundo Partidário, a importância de R$ 70.000,00, tendo gasto, na campanha, o total de R$ 69.000,00, valores consideravelmente inferiores aos recebidos pela agremiação municipal em ano no qual não participaria diretamente do pleito. É inequívoco que tal situação acende um sinal de alerta na análise da prestação de contas para a utilização desse mecanismo como forma de burlar a previsão legal.

Por fim, destaco que o percentual previsto para o uso do Fundo Partidário nas candidaturas femininas possui destinação específica, o que impede utilização outra que não a ação afirmativa relacionada às mulheres na política. Sendo assim, nem mesmo a inexistência de candidaturas femininas afastaria a obrigação legal, situação que implicaria a devolução ao Tesouro Nacional da quantia que deveria ter sido empregada, por aplicação analógica do art. 19, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17.

A irregularidade atinente à ausência de repasse de valores para candidaturas femininas transgride não só a literalidade do texto da norma, mas também o sentido do comando expresso, em razão da não observância da igualdade de gênero no financiamento da campanha eleitoral, constituindo falha grave.

Desse modo, as irregularidades atinentes à apresentação parcial dos extratos bancários e à aplicação irregular dos valores provenientes do Fundo Partidário (R$ 139.836,25) perfazem a quantia de R$ 41.950,87 (valor que corresponde a 30%, o qual deveria ter sido aplicado nas candidaturas femininas) e representam aproximadamente 30% da arrecadação de valores do Fundo Partidário movimentados em campanha – R$ 139.836,25, impedindo a aprovação da contabilidade.

Além disso, a falha correspondente à falta de aplicação do percentual mínimo de recursos do Fundo Partidário em campanhas femininas enseja o dever de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia irregularmente movimentada (R$ 41.950,87), conforme disposto no art. 82, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Nesse ponto, cumpre esclarecer que a sentença a quo incorreu em equívoco no cálculo relativo aos 30% destinados às candidaturas femininas, pois indicara o montante de R$ 39.754,87 a ser recolhido ao Tesouro Nacional. Contudo, por se tratar de erro material passível de ser reconhecido de ofício, inclusive aferido na execução do julgado, retifico a sentença, nesse ponto, determinando o recolhimento de R$ 41.950,87, nos termos do inc. I do art. 494 do CPC.

Por essas razões, o voto é no sentido de negar provimento ao recurso interposto pelo partido, mantendo integralmente a sentença de desaprovação das suas contas com relação ao pleito de 2018, com fundamento no art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17, bem como a determinação da suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses (art. 77, §§ 4º e 6º, da Resolução TSE n. 23.553/17) e o recolhimento do valor de R$ 41.950,87 ao Tesouro Nacional em virtude da utilização indevida dos recursos do Fundo Partidário, conforme o disposto no art. 82, § 2º, da mesma resolução.

 

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do apelo.