E.Dcl. - 17459 - Sessão: 01/07/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de embargos de declaração (fls. 1343-1355) opostos pelo DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO PROGRESSISTAS do RIO GRANDE DO SUL contra acórdão deste Tribunal (fls. 1331-1338v.), que aprovou as contas com ressalvas, relativas às eleições 2016, e determinou o recolhimento, ao Tesouro Nacional, do valor de R$ 123.750,00 (cento e vinte e três mil, setecentos e cinquenta reais).

O embargante entende ter ocorrido lacunas, as quais pretende que sejam enfrentadas por esta Corte para que, posteriormente, seja possível a interposição de recurso à instância superior, motivo pelo qual requer a elucidação e o “expresso” prequestionamento dos temas legais abordados. Ainda, traz argumentos que entende pertinentes, para, ao final, afirmar que os embargos visam, sobretudo, “esmiuçar a matéria legal, que temos por complexa, passível de diferentes interpretações e que incorpora legislação recente, ausente de paradigmas jurisprudenciais específicos, notadamente, no que tange ao centro do debate”, almejando “aprofundamento das perspectivas interpretativas sustentadas pela defesa e o ideal revolvimento da matéria legal atinente, ambos a propiciar o salutar enfrentamento do debate da instância judicial superior e, por formulação agudizada, alcançar o efetivo duplo grau de jurisdição”.

Requer o recebimento e o processamento do recurso aclaratório, para enfrentamento das dissonâncias apontadas, bem como seja “declarada a procedência dos requerimentos formulados”, em conjunto com o prequestionamento já indicado.

É o relatório.

VOTO

São tempestivos os embargos de declaração. A intimação ocorreu em 07.6.2019, sexta-feira, e a interposição foi protocolada em 12.6.2019, quarta-feira subsequente, atendendo-se ao interregno de 3 (três) dias previsto pelo art. 275, § 1º, do Código Eleitoral.

Além disso, estão preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, de maneira que merecem conhecimento.

As razões de embargos de declaração são condensadas nos seguintes pontos: o primeiro, quanto à transferência de recursos do Fundo Partidário aos diretórios municipais omissos nas prestações de contas e, segundo, no relativo ao pagamento dos valores tidos por irregulares por desconto no repasse de futuras cotas do Fundo Partidário.

Ambos os itens sofrem, ainda, subdivisões, como se perceberá durante o presente voto.

De qualquer maneira, inicio a análise dos embargos por um item recorrentemente requerido ao longo das razões do recurso aclaratório: o prequestionamento de dispositivos, notadamente constantes na Lei n. 9.096/95 e na Resolução TSE n. 23.463/15.

Prequestionamento

A agremiação embargante, ao longo da peça recursal, pugna pelo expresso prequestionamento de uma série de dispositivos legais e regulamentares.

Desnecessário.

Friso que o Código de Processo Civil de 2015 alterou substancialmente o regime legal e, portanto, desconstruiu o posicionamento jurisprudencial até então amplamente majoritário, no sentido da necessidade de prequestionamento expresso, no corpo das decisões recorridas das Cortes de apelação, daqueles dispositivos legais com que se pretendia reformular discussão, mediante futuro recurso aos Tribunais Superiores.

Dito de outro modo, o novo diploma processual civil consagrou o prequestionamento ficto, qual seja, aquele que subjaz automaticamente da irresignação interposta e impõe o estabelecimento de novo debate interpretativo, já no grau recursal superior, dos dispositivos legais constantes na decisão recorrida.

Nesses termos, a dicção do art. 1025 do vigente Código de Processo Civil:

Art. 1025. Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de prequestionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.

Na doutrina (e por todos), Theotonio Negrão assevera que, com o advento da redação trazida pela Lei n. 13.105/15, “para a caracterização do prequestionamento e a consequente abertura da instância superior, basta o diligente comportamento da parte no prévio debate da matéria, por meio dos embargos de declaração” (Comentários ao CPC/2015 e Legislação Processual em Vigor; Saraiva. São Paulo. 2016, 47ª Ed., pág. 955).

Dessarte, e retornando ao caso posto, destaco: por expressa redação legal, já se encontram prequestionados, para fins de recurso ao tribunal superior, todos os dispositivos citados pela agremiação embargante.

Ao mérito propriamente dito dos embargos de declaração.

Transferência de recursos do Fundo Partidário a diretórios e comissões provisórias municipais omissas nas respectivas prestações de contas

No tópico, o embargante alega ocorrentes contradição e omissão, em resumo, em virtude do que considera “interpretações transversas”, quais seriam: ora a aplicação da Resolução TSE n. 21.841/04; ora, da Resolução TSE n. 23.432/14 e, ainda, da atualmente vigente Resolução TSE n. 23.546/17, em diálogo com a Lei n. 9.096/95.

Entretanto, a leitura atenta da decisão permite dela extrair que os diferentes normativos eleitorais foram aplicados, cada um, de forma respectiva aos exercícios financeiros que a eles diziam respeito – em prestígio ao princípio amplamente indicado ao longo das razões de decidir, de que o tempo rege o ato.

Daí, não procede o argumento de que à época dos exercícios entendidos como omissos pelos diretórios municipais – anos entre 2004 e 2014, não havia a cisão conceitual entre contas não prestadas e contas desaprovadas, pois relativamente ao objeto da presente prestação de contas, eleições 2016, a diferenciação já era corrente, de modo que se está a analisar o comportamento do PROGRESSISTAS DO RIO GRANDE DO SUL, no ano de 2016, irregular ao repassar valores a diretórios cujas contas foram julgadas não prestadas em exercícios anteriores, quando não deveria assim ter procedido.

Portanto, de longe se percebe que os diferentes tratamentos conferidos aos diferentes exercícios (anos 2004 a 2014, e ano de 2016) de prestações de contas são consectários lógicos do princípio tempus regit actum, indicado no acórdão embargado como razões de decidir, conforme já indicado.

O argumento trazido pelo embargante, outrossim, de que “deva prevalecer a interpretação sistemática dos §§ do art. 68 da Resolução TSE n. 23.463/15” não se trata, em verdade, de apontamento de vício ensejador de oposição de aclaratórios (contradição, omissão, et cetera), mas sim tentativa de rediscussão do mérito da matéria já julgada. Prevaleceram os normativos condizentes com cada uma das épocas das prestações de contas.

Ora, a questão da “especialidade” da norma há de ser, logicamente, harmonizada à aplicação do direito intertemporal, pois, como devidamente reforçado nas razões do acórdão, a não prestação de contas é o descumprimento constitucionalmente qualificado – art. 17, inc. III, da Constituição Federal –; é o descumprimento mais grave; é a falta de jaez constitucional de uma agremiação partidária em, exatamente, cumprir as normas atinentes à arrecadação e aplicação de recursos – muitos deles públicos, diga-se de passagem.

E pelos mesmos motivos hão de ser afastadas as alegações trazidas, no sentido de que o Diretório Estadual do PROGRESSISTAS fora um mero “entreposto” de repasse de verbas aos diretórios municipais.

O ponto foi devidamente fundamentado na decisão embargada, e segue transcrito, com destaque, para a passagem que elucida a questão da data dos repasses e, portando, a legislação aplicável à espécie:

Ou seja, inviável entender que o diretório estadual “nada tem a ver com os recursos ordinários” repassados, conforme afirmado às fls. 1304-1305. Ora, as previsões estatutárias são matéria interna corporis das agremiações, não sendo possível afirmar, como feito nas razões defensivas, que o diretório regional apenas “serviu de entreposto” (fl. 1305) dos valores. A “data de utilização” do art. 13, § 2º, inc. II, da Resolução TRE/RS n. 298/17 é, exatamente, a data em que o PROGRESSISTAS do Rio Grande do Sul efetuou repasses a diretórios municipais omissos nas respectivas prestações de contas. (Grifei.)

Ao tratar de “facilitar” a prestação de contas do órgão partidário nacional, como indicado pelo embargante, o diretório estadual naturalmente puxou para si a responsabilidade pelos acertos e erros dos repasses – utilizando devida, ou indevidamente, o valor que lhe fora fornecido.

No que diz respeito à necessidade, ou desnecessidade, de notificação da não prestação de contas do Diretório do PROGRESSISTAS do município de Alegria – RS, transcrevo novamente trecho do corpo do acórdão, por elucidar a questão:

A propósito, e tendo em vista se tratar de não apresentação de contas relativas ao exercício de 2012 do Diretório do Município de Alegria (processo n. 34-54.2013.6.21.0089), o dispositivo também se aplica às razões invocadas no item 3.1.4 da manifestação do PROGRESSISTAS do Rio Grande do Sul – ausência de notificação ao Diretório Estadual.

Ora, a expressão utilizada pelo normativo é “agremiações partidárias”, não se impondo a obrigação de comunicação, como deseja o embargante, ao Diretório Estadual, e portanto não exsurgindo das razões de decidir qualquer contradição. Como já exposto ao longo da decisão embargada, o controle dos resultados dos processos judiciais de determinada agremiação compete somente a ele, partido político.

Pagamento dos valores irregulares via desconto no repasse de quotas futuras do Fundo Partidário

Neste item, há nova tentativa de rediscussão da possibilidade (defendida ao longo do processo pelo PROGRESSISTAS), ou impossibilidade (conforme decidido no acórdão deste Tribunal), de descontos de valores do Fundo Partidário, para fins de adimplemento dos valores apontados como de recolhimento necessário ao Tesouro Nacional – no caso, R$ 123.750,00 (cento e vinte e três mil, setecentos e cinquenta reais).

E o embargante, nitidamente, preferia fosse aplicado outro dispositivo regulamentar, em detrimento daquele efetivamente aplicado – art. 60, § 3º, da Resolução TSE n. 23.546/17, o que não consubstancia hipótese para acolhimento de aclaratórios: omissão, contradição, erro material ou obscuridade.

Repito que não se evidencia na decisão embargada a existência de qualquer das hipóteses mencionadas, mas sim uma interpretação que não favoreceu a tese defendida pelo prestador de contas.

Na espécie, portanto, é verificável apenas que o embargante busca a rediscussão de matéria já apreciada e decidida, com o objetivo de obter o prequestionamento acerca de aspectos impertinentes para o deslinde da causa, visando lastrear recurso às instâncias superiores.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e rejeição dos embargos, salientando-se a ocorrência de prequestionamento dos dispositivos legais e regulamentares apontados na interposição, conforme previsto pelo art. 1.025 do CPC.