RC - 9086 - Sessão: 01/07/2019 às 17:00

Na condição de revisor, recebi os autos e examinei em profundidade o acervo probatório e o brilhante voto apresentado pelo ilustre relator, Desembargador Roberto Carvalho Fraga, que, com a acuidade que lhe é pertinente, bem analisou a matéria preliminar suscitada pelo recorrente, relativa a vários pontos como: indeferimento da concessão da assistência judiciária gratuita (AJG); indeferimento de produção das provas desnecessárias à decisão; legitimidade ativa do Ministério Público para denunciar o réu nos crimes de ação penal pública, na forma do art. 355 do Código Eleitoral; ausência de nulidade da decisão diante da não inclusão de coautores no polo passivo pelo MPE; e ausência de nulidade por cerceamento de defesa pelo indeferimento de prova pericial. As considerações realizadas sobre esses aspectos são irretocáveis.

Peço vênia, entretanto, para divergir do ilustre relator quanto ao mérito, pelas razões que passo a expor.

O réu, Ronaldo Shizzi, foi condenado a uma pena de 8 meses de detenção, em regime semiaberto, em razão de conduta imputada como criminosa, realizada mediante divulgação considerada injuriosa, em seu próprio Facebook, ofendendo Guilherme Bonotto Behr, candidato ao cargo de prefeito do Município de Santiago-RS.

O relator do processo reduziu a pena aplicada na origem para 4 meses de detenção, sem possibilidade de conversão da pena privativa de liberdade para pena restritiva de direitos, em razão da reincidência, mantendo in totum os demais aspectos do decreto condenatório, exceto pelas custas judiciais que foram, de ofício, afastadas.

Reputo, contudo, que os crimes contra honra no âmbito da Justiça Eleitoral devem receber exegese diferenciada daqueles previstos no Código Penal, ainda que sejam da mesma espécie. Sabe-se que os crimes contra a honra, do ponto de vista eleitoral, por força do art. 355 do Código Eleitoral, são de ação penal pública. Esta Corte já teve oportunidade de manter esse posicionamento em algumas decisões, acompanhando a jurisprudência pacífica do Tribunal Superior Eleitoral, conforme repiso:

Recurso especial. Crime eleitoral. Ação penal privada subsidiária. Garantia constitucional. Art. 5°, LIX, da Constituição Federal. Cabimento no âmbito da Justiça Eleitoral. Arts. 29 do Código de Processo Penal e 364 do Código Eleitoral. Ofensa.

1. A ação penal privada subsidiária à ação penal pública foi elevada à condição de garantia constitucional, prevista no art. 5-, LIX, da Constituição Federal, constituindo cláusula pétrea.

2. Na medida em que a própria Carta Magna não estabeleceu nenhuma restrição quanto à aplicação da ação penal privada subsidiária, nos processos relativos aos delitos previstos na legislação especial, deve ser ela admitida nas ações em que se apuram crimes eleitorais.

3. A queixa-crime em ação penal privada subsidiária somente pode ser aceita caso o representante do Ministério Público não tenha oferecido denúncia, requerido diligências ou solicitado o arquivamento de inquérito policial, no prazo legal.

4. Tem-se incabível a ação supletiva na hipótese em que o representante do Ministério Público postulou providência ao juiz, razão pela qual não se pode concluir pela sua inércia. Recurso conhecido, mas improvido.

(RESPE n. 21295, DE 14.8.2003, Rel. Min. Fernando Neves da Silva.) (Grifei.)

Entretanto, mister considerar que a razão de ser de os crimes contra a honra na seara eleitoral figurarem como de ação penal pública está ligada ao interesse público a eles subjacente. Com isso, não se pode olvidar que esse elemento desloca a análise da ofensa ao bem jurídico protegido quando da subsunção do fato à norma nos crimes eleitorais, subsunção essa que, nesses casos, deve inferir o potencial lesivo da conduta em desfavor do interesse público resguardado.

Além disso, o fato de o art. 326 do Código Eleitoral ser de ação penal pública traz um desafio ao Parquet, dominus litis nessas ações, bem como para o Judiciário Eleitoral, qual seja, o de obrigar o denunciante, bem como o julgador, a colocar-se na posição do ofendido para apreciar se a suposta ofensa seria capaz de ferir sua honra subjetiva.

Essa análise, feita por qualquer viés, terá sempre uma alta carga de subjetividade. Isso porque, em tese, se a violação ocorre contra a honra subjetiva, só ao ofendido caberia quantificar tal ofensa, sobretudo em razão das diferenças internas da própria língua, que determinam o significado das expressões conforme o espaço geográfico no qual foram proferidas (variações diatópicas da língua). Igualmente, precisam ser considerados aspectos socioculturais dos envolvidos e até mesmo a modalidade expressiva utilizada, os chamados aspectos diastráticos e diafásicos do vernáculo.

Para superar o subjetivismo dessa análise, entendo que também deva ser levada em consideração uma interpretação sistêmica e teleológica, na qual a mens legis utilizada para definir os crimes eleitorais como sendo de ação penal pública ganhe destaque para atender aos fins sociais aos quais se dirige e às exigências do bem comum.

De tudo isso decorre que o principal sujeito passivo desses crimes não é vítima, ofendido direto do crime, mas, sim, o eleitorado, que, dissuadido pelo fato injurioso divulgado contra a honra do candidato durante a propaganda (elemento normativo do tipo), fica exposto a possíveis influências em sua escolha, o que pode alterar o resultado do pleito. Portanto, a exegese que interpreto como correta nos casos de crimes contra a honra eleitorais diferencia-se daquela prevista no Código Penal e parte do seguinte questionamento: a ofensa direcionada ao candidato, durante a propaganda eleitoral, teve o condão de ferir o objeto jurídico tutelado pelo tipo, alcançando o eleitorado e nele projetando um estado mental suficiente a questionar suas próprias escolhas eleitorais?

Partindo dessa premissa, na verificação da tipicidade dos crimes de injúria eleitoral, deve se ter em mente que o princípio norteador é aquele que dispõe sobre a intervenção mínima da Justiça Eleitoral, paradigma de todas as decisões recentes do TSE e que ganhou destaque ao ser elevado a filtro elementar de análise das propagandas eleitorais em 2018, conforme dispõe o art. 23 da Resolução TSE n. 23.551/17. Aqui transcrevo:

Art. 23, § 6º A manifestação espontânea na internet de pessoas naturais em matéria político-eleitoral, mesmo que sob a forma de elogio ou crítica a candidato ou partido político, não será considerada propaganda eleitoral na forma do inciso IV, devendo observar, no entanto, os limites estabelecidos no § 1º do art. 22 desta resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).

Art. 22. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57-A).

§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ocorrer ofensa à honra de terceiros ou divulgação de fatos sabidamente inverídicos.

Art. 33. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).

Ao apreciar as resoluções do TSE conclui-se que na propaganda eleitoral a regra é a liberdade de manifestação e de expressão, em especial pela internet, quando feita pelos próprios eleitores. A interferência da Justiça Eleitoral deve ser mínima, sendo a punição, censura ou vedação, a exceção, a qual deve ser bem fundamentada pelo intérprete ao explicitar as razões que o levaram a interferir nas manifestações políticas, sobretudo quando feitas por um cidadão, destinatário final de toda discussão política durante as campanhas que antecipam os pleitos e para quem é realizado o debate democrático.

A inobservância desses preceitos pode ter como efeito o cerceamento da participação do cidadão, que projeta sua perspectiva eleitoral pelas redes sociais como principal mecanismo de participação nos debates, por isso precisa estar em consonância com os anseios democráticos atuais, que objetivam uma maior participação do eleitorado na política, visando potencializar a cultura política e a participação popular nos rumos do Estado.

In casu, é inobjetável que a análise da tipicidade do fato precisa passar por questões hermenêuticas outras além das previstas no art. 140 do Código Penal. Por isso, chamo a atenção para a descrição do fato imputado ao réu na sentença (fl. 248):

“No dia 13 de setembro de 2016, em horário incerto, em Santiago/RS, o denunciado Ronaldo Shizzi, por meio que facilitou a divulgação da ofensa, injuriou Guilherme Bonotto Beher, visando a fins de propaganda eleitoral, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro.

Na ocasião, o denunciado, durante a campanha eleitoral de 2016, injuriou o então candidato a Prefeito de Santigo, Guilherme Bonotto Beher, da Coligação Somos Todos Santiago, por meio de publicação em rede social (perfil pessoal do denunciado no Facebook), meio este que facilitou a divulgação da ofensa.

Para tanto, o denunciado postou um vídeo da vítima realizando proposta eleitoral, e, ao final, acrescentou vídeos de pessoas em gargalhadas, sob o título “Presta atenção neste… NÓS CONSTRUÍMOS O AÇUDE KKKK”. (prints, mídia audiovisual e certidão das fls. 20-23 do IP) de forma a desacreditar e ridicularizar a vítima, ofendendo-a”.

Como se percebe, o decreto condenatório entendeu ter havido violação ao bem jurídico protegido com a edição desautorizada de um vídeo disponível na internet no qual o candidato, ora ofendido, narra as ações políticas desenvolvidas e exalta suas qualidades enquanto detentor do cargo de secretário do meio ambiente de Santiago-RS.

Durante o vídeo, após o ofendido alegar que construiu o parque Zamperetti e o açude da cidade quando secretário ambiental, foram inseridas gargalhadas de crianças e/ou adolescentes, de modo a interrompê-lo. A postagem tem como título os seguintes dizeres: “Presta atenção neste… NÓS CONSTRUÍMOS O AÇUDE KKKK”.

Senti a necessidade de aprofundar a análise da subsunção do fato à norma no caso concreto, neste primeiro momento sob um aspecto meramente formal, levando em consideração o contexto atual de redes sociais e de interferência mínima da Justiça Eleitoral no debate democrático. Questiono, portanto, se teria havido, conforme o tipo previsto no art. 326 do Código Eleitoral, a subsunção daquele fato à norma objetivamente considerada, para ofender a dignidade e/ou o decoro do candidato. Repiso o texto que descreve a conduta penalmente tipificada:

Art. 326. Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Ora, no contexto eleitoral, dissociado do contexto puramente penal em razão da imperiosa necessidade de ofensa ao interesse público para violar os tipos penais especiais, não coaduno com a ideia de que acrescentar gargalhadas a um vídeo durante afirmação não verificada de um candidato em sua campanha política, ou escrever “Presta atenção neste… NÓS CONSTRUÍMOS O AÇUDE KKKK” seja o suficiente para ofender a honra subjetiva daquele que se lança à disputa política e se dispõe a passar pelo crivo do eleitorado.

Do candidato se exige vigor para suportar as críticas. A sensibilidade excessiva não pode encontrar proteção nos debates democráticos, sob pena de calar o eleitorado e a necessária perquirição sobre as propostas enunciadas.

Nesse mesmo sentido decidiu o Tribunal Superior Eleitoral durante toda a campanha de 2018, senão vejamos:

REPRESENTAÇÃO (11541)-0601693-34.2018.6.00.0000 - Direito de Resposta, Cargo - Presidente da República, Propaganda Política - Propaganda Eleitoral - Internet - DISTRITO FEDERAL - BRASÍLIA TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

DECISÃO

1. Trata-se de representação para o exercício do direito de resposta ajuizada pela Coligação O Povo Feliz de Novo (PT/PCdoB/PROS) e Fernando Haddad contra (i) Olavo Luiz Pimentel de Carvalho; (ii) Twitter Brasil Rede de Informação Ltda.; e (iii) Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., impugnando publicações realizadas em rede social, sob o argumento de que as postagens apresentam conteúdos ofensivos, difamatórios e inverídicos, suficientes a ensejar aplicabilidade ao art. 58 da Lei nº 9.504/1997, bem como à incidência da sanção de multa.

Em síntese, os representantes sustentam os seguintes pontos (ID 532761): a) no dia 11 de setembro de 2018, o representado Olavo de Carvalho utilizou seu sítio eletrônico para ofender e difamar o candidato Fernando Haddad, bem como a coligação O Povo Feliz de Novo; b) a publicação informa de maneira difamatória e inverídica que o candidato Fernando Haddad estaria defendendo o incesto em seu livro intitulado ‘Desorganizando o consenso’; c) “por se tratar de figura pública, o representado possui uma grande quantidade de seguidores, os quais são diretamente influenciados pelas suas diversas e reiteradas mentiras” (p. 7); e d) a liberdade de expressão não é garantia absoluta, sendo certo que existindo abuso surge a possibilidade do direito de resposta.

Pleiteiam, ao final, a procedência da representação a fim de exercer o direito de resposta, nos termos do art. 58, § 3º, inciso IV, da Lei nº 9.504/1997, bem como a retirada definitiva da publicação considerada ilícita e a imposição da sanção de multa, nos moldes do art. 57-D, § 2º, do mesmo diploma normativo.

Na data de 15.10.2018, indeferi o pedido de tutela provisória, pois, embora a publicação veiculada apresente teor ofensivo ou negativo, exterioriza o pensamento crítico do representado Olavo Luiz Pimentel de Carvalho acerca de uma obra de autoria do candidato Fernando Haddad, de modo que a liberdade de expressão no campo político-eleitoral abrange não só manifestações, opiniões e ideias majoritárias, socialmente aceitas, elogiosas, concordantes ou neutras, mas também aquelas minoritárias, contrárias às crenças estabelecidas, discordantes, críticas e incômodas (ID 533889).

Contra a decisão de indeferimento da liminar os representantes interpuseram recurso (ID 539852).

As empresas provedoras de aplicação de Internet Twitter Rede de Informação Ltda. e Facebook Serviços Online Brasil Ltda. apresentaram defesa conforme ID 541650 e ID 544297, respectivamente.

O representado Olavo Luiz Pimentel de Carvalho – devidamente citado (ID 538714) – não apresentou defesa.

O Vice-Procurador-Geral Eleitoral opina pela improcedência dos pedidos formulados na representação. O parecer apresenta a seguinte ementa (ID 553886):

Eleições 2018. Presidente da República. Representação eleitoral. Publicações na internet. Conteúdo ofensivo. Ausência de demonstração. Liberdade de expressão.

1. A publicação que exterioriza pensamento crítico sobre obra literária está albergada pelo direito à liberdade de expressão, não ensejando, pois, a concessão de direito de resposta.

2. A retirada de publicação da internet demanda a existência de argumentos que demonstrem a abusividade de seu conteúdo, sob pena de se violar o direito à liberdade de expressão.

Parecer pela improcedência dos pedidos formulados na representação.

[...]

Na espécie, embora existente publicação carregada com teor ofensivo ou negativo, em verdade, exterioriza o pensamento crítico do representado Olavo Luiz Pimentel de Carvalho acerca de uma obra de autoria do candidato Fernando Haddad, alcançada, portanto, pelo exercício legítimo da liberdade de expressão (art. 5º, inciso IV, da Constituição Federal).

As liberdades comunicativas no campo político-eleitoral abrangem não só manifestações, opiniões e ideias majoritárias, socialmente aceitas, elogiosas, concordantes ou neutras, mas também aquelas minoritárias, contrárias às crenças estabelecidas, discordantes, críticas e incômodas.

À luz da decisão liminar, penso que o controle sobre quais conteúdos ou nível das críticas veiculadas, se aceitáveis ou não, deve ser realizado pela própria sociedade civil, porquanto a atuação da Justiça Eleitoral, no âmbito da Internet, ainda que envolva a honra e reputação dos políticos e candidatos, deve ser minimalista, sob pena de silenciar o discurso dos cidadãos comuns no debate democrático. (Grifei.)

3. Ante o exposto, julgo improcedente o pedido de aplicação de multa aos representados e, considero prejudicados os pedidos quanto ao direito de resposta e remoção das publicações, bem assim o recurso interposto da decisão que indeferiu a liminar (art. 36, § 6º, do RITSE).

Publique-se. Intime-se. Ciência ao MPE.

Brasília, 7 de dezembro de 2018.

Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator

Percebe-se, portanto, que, para o TSE, conforme dito pela Corte no julgado acima transcrito:

À luz da decisão liminar, penso que o controle sobre quais conteúdos ou nível das críticas veiculadas, se aceitáveis ou não, deve ser realizado pela própria sociedade civil, porquanto a atuação da Justiça Eleitoral, no âmbito da Internet, ainda que envolva a honra e reputação dos políticos e candidatos, deve ser minimalista, sob pena de silenciar o discurso dos cidadãos comuns no debate democrático. (Grifei.)

Com essas premissas, a conclusão a que cheguei é que não há potencialidade lesiva ao bem jurídico protegido pelo tipo penal eleitoral na conduta de acrescentar gargalhadas a um vídeo, como modo de indagar, mesmo que indiretamente, as afirmações do candidato. Na verdade, entendo como uma forma válida de questionar a veracidade das afirmações sem ferir a honra subjetiva, a dignidade ou o decoro, uma vez que a própria propaganda, direcionada aos eleitores, serve para colocar em xeque aqueles que concorrem para, acaso eleitos, tornarem-se representantes.

Ademais, entendo que o vídeo, mesmo que combinado com a frase que o intitula, qual seja, “Presta atenção neste… NÓS CONSTRUÍMOS O AÇUDE KKKK”, não tem a capacidade de se subsumir à norma para ofender o bem jurídico aqui resguardado. In casu, seria impossível violar, ao mesmo tempo, a honra subjetiva do candidato durante a propaganda e prejudicar o pleito ao alcançar os eleitores, em razão da insignificância da manifestação do réu. Entendo, portanto, não haver tipicidade formal na conduta analisada com fundamento no art. 326 do Código Eleitoral.

Ainda se assim não fosse, recordo que a tipicidade formal é apenas um dos aspectos considerados no conceito tripartite do crime. A moderna doutrina, acompanhada pelas mais recentes decisões dos tribunais superiores, vem se posicionando de forma pacífica sobre questionar se a conduta prescrutada, além de representar relevante lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico protegido, é determinada ou fomentada pelo direito eleitoral.

Isso porque, não basta a existência de previsão abstrata à qual a conduta empreendida se amolde perfeitamente, sendo necessário que essa conduta não seja fomentada e que atente de fato contra o bem jurídico tutelado. O juízo a ser feito considera as consequências do crime praticado e a reprimenda a ser imposta ao agente, numa análise além da tipicidade formal, respeitando a tipicidade material.

Colaciono aos autos esclarecedora interpretação dada pelo STF:

1. A tipicidade penal não pode ser percebida como o trivial exercício de adequação do caso concreto à norma abstrata. Além da correspondência formal, para a configuração da tipicidade, é necessária uma análise materialmente valorativa das circunstâncias do caso concreto, no sentido de se verificar a ocorrência de alguma lesão grave, contundente e penalmente relevante do bem jurídico tutelado. 64. STF - Primeira Turma - HC 108946 - Rel i. Min. Cármen Lúcia - DJ e 07/12/ 2011.

Conforme já exposto, além da inexistência da tipicidade formal, por esse prisma, entendo também ausente a relevância penal do fato aqui em análise, razão pela qual, data maxima venia, considero carecer de tipicidade material a conduta aferida.

Voto, portanto, pela atipicidade da conduta, para absolver o réu em razão de o fato não constituir infração penal, na forma do art. 386, III, do Código de Processo Penal, aqui aplicado subsidiariamente, conforme o art. 364 do Código Eleitoral.

Ante o exposto, VOTO pelo reconhecimento da atipicidade da conduta, para absolver o réu em razão de o fato não constituir infração penal, na forma do art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal, aqui aplicado subsidiariamente, conforme o art. 364 do Código Eleitoral.

É como voto, senhor Presidente.

 

Desembargador Eleitoral Gustavo Alberto Gastal Diefenthaler:

Acompanho o relator.

 

Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz:

Acompanho o relator.

 

Desembargador André Luiz Planella Villarinho:

Acompanho a divergência.

 

Desembargador Eleitoral Gerson Fischmann:

Acompanho a divergência.

 

Desembargadora Marilene Bonzanini - Presidente:

Acompanho a divergência.