RE - 9303 - Sessão: 02/07/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por VILSON VALDIR PETRY, tesoureiro do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) de Tramandaí, contra sentença (fls. 48-49), que julgou não prestadas as contas da aludida agremiação relativas ao exercício financeiro de 2017, determinando a suspensão do recebimento de repasses do Fundo Partidário e da anotação do diretório perante o Tribunal Regional Eleitoral enquanto durar a omissão.

Em sua irresignação (fls. 67-71), suscita preliminar de nulidade do processo por ausência de citação da 2ª tesoureira, que passou à titularidade do cargo com a desfiliação do 1º tesoureiro. No mérito, argumenta que nunca teve acesso às contas bancárias do partido, nem procedeu a qualquer movimentação financeira. Aduz ter-se desfiliado do partido ainda antes do prazo de apresentação de contas, motivo pelo qual não pode integrar o feito. Requer a sua exclusão do processo.

Com vista dos autos, a Procuradoria Regional opinou pelo não conhecimento do recurso, em face de sua intempestividade (fls. 92-93v.).

É o relatório.

VOTO

Preliminar de tempestividade

Preliminarmente, o Ministério Público Eleitoral suscitou a intempestividade do recurso, pois a sentença foi publicada no Diário Oficial no dia 21.01.2019 (fl. 52), e o recurso somente foi interposto em 13.3.2019 (fl. 67), após o transcurso do prazo de 03 dias, previsto no art. 52, § 1º, da Resolução TSE n. 23.546/17.

Entretanto, trata-se de julgamento de contas não prestadas, e não havia procurador constituído nos autos. Por isso, a publicação no órgão oficial não pode ser computada como termo inicial do prazo recursal, visto que é destinada à comunicação dos atos aos advogados, como se depreende do art. 231, inc. VII, c/c o art. 272, ambos do CPC.

A intimação da sentença foi realizada na pessoa do recorrente por carta com aviso de recebimento, cujo AR cumprido foi juntado aos autos em 12.3.2019 (fl. 64), e o recurso foi interposto no dia seguinte, observando-se, portanto, o prazo recursal.

Dessa forma, deve ser conhecido o recurso.

Mérito

No mérito, o recorrente, tesoureiro do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) de Tramandaí, alega sua ilegitimidade para figurar na prestação de contas, relativas ao exercício financeiro de 2017, pois integrou o diretório municipal somente até 31.12.2017, além de ter-se desfiliado da agremiação em outubro daquele ano, de forma que não poderia responder pela omissão das contas, que somente deveriam ser apresentadas em 2018.

Diante dessa ilegitimidade, suscita também a nulidade da sentença, pois não houve a citação da segunda-secretária de finanças, Sra. Vanessa Borges Dutra, que teria assumido a titularidade da gestão financeira do partido.

O recurso não merece prosperar.

Inicialmente, não há que se falar em ilegitimidade do recorrente, Sr. Vílson Valdir Petry, para integrar o processo. Não há dúvida de que exerceu o cargo de tesoureiro da agremiação entre 18.10.2015 até, pelo menos, a data de sua desfiliação, 23.10.2017 (fl. 80), sendo responsável por suas finanças durante a maior parte do exercício financeiro sob análise.

Observe-se que a Corregedoria Regional Eleitoral orienta as Zonas Eleitorais a incluírem como responsáveis pelas contas o presidente e o tesoureiro “atuantes do exercício financeiro correspondente”, como se verifica pelo Ofício-Circular SCRE n. 001/2018 (fl. 84).

Assim, não é porque estava afastado do cargo no ano de 2018 que o tesoureiro torna-se ilegítimo para o processo. Ainda que não pudesse ter acesso a documentos ou falar em nome da agremiação, o tesoureiro é chamado a esclarecer a movimentação financeira na medida de suas possibilidades.

Na hipótese, a sentença não aplicou sanção ao recorrente e tampouco fez qualquer referência à sua boa ou má-fé. Ao contrário, a decisão recorrida limitou-se a declarar as contas da agremiação como não prestadas, sancionando unicamente a pessoa jurídica.

A respeito da pretendida nulidade da sentença por falta de citação da segunda-secretária de finanças, Sra. Vanessa Borges Dutra, tal não merece prosperar.

Não há provas de que a desfiliação do recorrente tenha acarretado o seu desligamento da função de tesoureiro. Os partidos gozam de autonomia para definir sua estrutura interna e a forma de composição de seus órgãos (art. 17, § 1º, da CF), não havendo imposição legal de que o tesoureiro seja filiado ao partido.

Na falta de maiores informações, o simples fato da desfiliação não permite concluir que a segunda-secretária de finanças assumiu a titularidade da função, especialmente porque a composição do órgão de direção municipal mantém a informação de que Vílson Petry permaneceu como tesoureiro até 31.12.2017.

Não houve, portanto, equívoco por parte do juízo de primeiro grau, que formou o processo e procedeu às citações e intimações em conformidade com as informações oficiais do PCdoB de Tramandaí existentes no banco de dados da Justiça Eleitoral.

Por fim, verifica-se que a sentença recorrida determinou a suspensão do registro do diretório municipal perante a Justiça Eleitoral, tal como determina o art. 42 da Resolução TSE n. 23.571/18.

Contudo, há de ser afastado esse sancionamento de ofício, em face de fato superveniente, consistente na recente decisão do Supremo Tribunal Federal, proferida em 16.5.2019 e publicada no DJE em 20.5.2019, em sede de ação direta de inconstitucionalidade.

O Ministro Gilmar Mendes, ad referendum do Plenário, na ADI n. 6032, concedeu medida cautelar para conferir interpretação conforme à Constituição às normas do art. 47, caput e § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14; do art. 48, caput e § 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17; e do art. 42, caput, da Resolução TSE n. 23.571/18, “afastando qualquer interpretação que permita que a sanção de suspensão do registro ou anotação do órgão partidário regional ou municipal seja aplicada de forma automática, como consequência da decisão que julga as contas não prestadas, assegurando que tal penalidade somente pode ser aplicada após decisão, com trânsito em julgado, decorrente de procedimento específico de suspensão de registro, nos termos do art. 28 da Lei 9.096/1995”.

Assim, tendo em vista a referida decisão do Pretório Excelso, dotada de eficácia erga omnes, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei n. 9.868/99, há de ser afastada a penalidade automática de suspensão do registro ou da anotação imposta ao órgão partidário.

DIANTE DO EXPOSTO, voto por negar provimento ao recurso e, de ofício, afastar a determinação de suspensão do registro do órgão municipal.