RE - 533 - Sessão: 02/07/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por DIANA DIONARA DE SOUZA PERES contra decisão da MM. Juiz da 76ª Zona Eleitoral de Novo Hamburgo (fls. 11-12), que aplicou multa no valor de R$ 351,40 (trezentos e cinquenta e um reais e quarenta centavos), com fundamento no art. 124 do Código Eleitoral, em decorrência de a recorrente, convocada para prestar serviço eleitoral como mesária, na função de presidente de mesa, não ter comparecido à seção eleitoral no primeiro turno das eleições de 2018 .

Em suas razões, a recorrente afirma que deixou de atender à convocação eleitoral porque no dia do pleito trabalhara como freelancer, com o objetivo de pagar as despesas de aluguel. Anexa cópia de sua CTPS, a fim de comprovar o exercício de trabalho temporário nos períodos de 14.11.2018 a 13.12.2018, bem como da CTPS do esposo, atualmente também desempregado, que exerceu trabalho temporário nos períodos de 10.01.2018 a 7.02.2018. Ainda, sustenta que o valor recebido em troca do trabalho temporário serviu para pagar as despesas com aluguel e alimentação, não havendo possibilidade de efetuar o pagamento da multa a que foi condenada (fls. 22-26). Requer provimento.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pelo parcial provimento do recurso, para que seja reduzido o valor da multa arbitrada para o mínimo legal (fls. 32-34v.).

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo. Foi expedida Carta de Notificação à recorrente, com aviso de recebimento, o qual foi juntado aos autos em 10.4.2019, quarta-feira, (fl. 20v.), enquanto o recurso foi interposto no dia 15.4.2019, segunda-feira, (fl. 22), primeiro dia útil subsequente ao término do prazo.

E, muito embora o recurso tenha sido interposto sem a constituição de advogado, alinho-me ao posicionamento exarado pela Procuradoria Regional Eleitoral no sentido do conhecimento da irresignação, uma vez que “o recorrente possui legitimidade para interpor recurso sem advogado, eis que se trata de punição administrativa, ainda que aplicada por juiz eleitoral.”

Não desconheço que a regra é a de que os recursos interpostos perante os Tribunais hão de ser subscritos por advogado devidamente habilitado e com instrumento de mandato nos autos. Porém, por se tratar de matéria eminentemente administrativa, os precedentes têm flexibilizado o rigor da norma, dispensando-se a representação legal, conforme julgado do TRE/SC, a seguir destacado:

RECURSO – MATÉRIA ADMINISTRATIVA – MESÁRIO FALTOSO - NÃO COMPARECIMENTO AOS TRABALHOS ELEITORAIS NO PRIMEIRO TURNO DO PLEITO DE 2016 – INTELIGÊNCIA DO ART. 124 DO CÓDIGO: ELEITORAL.

RECURSO SUBSCRITO PELO PRÓPRIO MESÁRIO FALTOSO – FLEXIBILIZAÇÃO DA EXIGÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL POR ADVOGADO LEGALMENTE CONSTITUÍDO QUANDO SE TRATAR DE CONDUTA EMINENTEMENTE ADMINISTRATIVA – POSSIBILIDADE - PRECEDENTE.

[…]

(TRE/SC, Acórdão n. 32.350, de 15.3.2017, Rel. Juiz Wilson Pereira Júnior.)

E a flexibilização tem razão de ser, sobretudo no campo axiológico, em prestígio do acesso à Justiça. Note-se o caso dos autos: a multa (administrativa) aplicada tem o montante de R$ 351,40, e a cidadã multada entende dela recorrer. A exigência de contratação de um advogado impediria o acesso ao Poder Judiciário, pelo viés econômico: um advogado cobraria, pelo serviço, mais do que o valor da própria multa, muito provavelmente.

Em obra fundamental sobre o tema, Cappelleti e Garth lecionam que se destacam, entre os obstáculos ao acesso à Justiça, os custos financeiros que uma demanda judicial pode gerar, resultando em desequilíbrio entre as partes na obtenção do bem da vida discutido nos autos, o que, por si só, já demonstraria o “caráter utópico do acesso à justiça”, idealizado como absolutamente igualitário. (CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre, RS: Sergio Antonio Fabris, 1988).

Contudo, sendo possível, como é o caso, facilitar-se o acesso ao Poder Judiciário, entendo por superar a ausência de advogado constituído.

Assim, o recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a eleitora Diana Dionara, devidamente convocada para prestar serviço eleitoral como mesária (Presidente), deixou de comparecer à seção eleitoral no dia do primeiro turno das eleições de 2018, não tendo apresentado justificativa para a ausência no prazo de 30 (trinta) dias, previsto no art. 124 do Código Eleitoral. Transcrevo:

Art. 124. O membro da mesa receptora que não comparecer no local, em dia e hora determinados para a realização de eleição, sem justa causa apresentada ao juiz eleitoral até 30 (trinta) dias após, incorrerá na multa de 50% (cinquenta por cento) a 1 (um) salário-mínimo vigente na zona eleitoral cobrada mediante selo federal inutilizado no requerimento em que fôr solicitado o arbitramento ou através de executivo fiscal.

§ 1º Se o arbitramento e pagamento da multa não for requerido pelo mesário faltoso, a multa será arbitrada e cobrada na forma prevista no artigo 367.

§ 2º Se o faltoso for servidor público ou autárquico, a pena será de suspensão até 15 (quinze) dias.

§ 3º As penas previstas neste artigo serão aplicadas em dobro se a mesa receptora deixar de funcionar por culpa dos faltosos.

§ 4º Será também aplicada em dobro observado o disposto nos §§ 1º e 2º, a pena ao membro da mesa que abandonar os trabalhos no decurso da votação sem justa causa apresentada ao juiz até 3 (três) dias após a ocorrência. (Grifei.)

Diante da inércia da eleitora no prazo concedido para oferta de justificativa, o juízo a quo aplicou multa no valor de R$ 351,40 (fls. 11-12).

Notificada, a eleitora apresentou manifestação, argumentando que deixou de atender à convocação eleitoral porque no dia do pleito trabalhara como freelancer, com o objetivo de pagar as despesas de aluguel. Ademais, acrescenta que o valor recebido em troca do trabalho temporário serviu para pagar as despesas com aluguel e alimentação, não havendo possibilidade de efetuar o pagamento da multa a que foi condenada (fl. 22).

A recorrente instruiu o pedido com a cópia de sua CTPS, buscando demonstrar o exercício de trabalho temporário nos períodos de 14.11.2018 a 13.12.2018, bem como da CTPS de Renan Peres, esposo, também desempregado e que exerceu trabalho temporário nos períodos de 10.01.2018 a 7.02.2018 (fls. 23-26).

A Procuradoria Regional Eleitoral, em seu parecer, manifestou-se pelo parcial provimento do recurso, com a redução do valor da multa arbitrada ao mínimo legal, sob o fundamento de que Diana Dionara comprovou sua situação de desemprego, por meio da apresentação de cópias das CTPS, sua e de seu marido, e também pela ausência de outros elementos que justificassem a aplicação da multa em valores superiores ao mínimo legal.

Com efeito, a eleitora deixou de comparecer aos trabalhos eleitorais no dia da eleição, sendo reprovável, igualmente, a falta de justificativa tempestiva para a ausência.

E as justificativas prestadas pela recorrente, apesar de respeitáveis, não deixam de fazer incidir, sobre o caso, o art. 124 do Código Eleitoral.

De fato, conquanto não seja presumível a má-fé neste caso, os motivos elencados não se coadunam com os princípios que regem a Justiça Eleitoral, em especial, com a preponderância do interesse público sobre o particular.

Ausente a apresentação de justa causa ao devido tempo, pois, deve prevalecer a aplicação de multa, em razão do descumprimento da norma eleitoral, e até como medida pedagógica, de modo a evitar a reiteração da conduta omissiva.

Entendo, todavia, que a pena pecuniária fixada merece ser minorada. No caso dos autos, os documentos denotam a ocorrência de motivos financeiros suficientes, aptos a caracterizar a atual hipossuficiência econômica da eleitora.

E a análise conjunta das circunstâncias do processo levam igualmente ao entendimento de não se mostrar razoável penalizar a eleitora com multa arbitrada em dez vezes o valor máximo para cada turno das eleições.

Lembro que toda e qualquer pena, ausentes circunstâncias específicas que justifiquem majoração, há de partir do respectivo piso – e, aqui, há motivo para a manutenção no patamar mínimo.

Portanto, entendo apto e razoável permitir a redução do valor da multa fixada pela ausência ao trabalho na seção  eleitoral para qual havia sido convocada.

Assim, arbitro a penalidade em R$ 35,14, nos termos do art. 825, § 1º, da Consolidação Normativa Judicial Eleitoral, regularmente estabelecida como suficiente para sancionar a generalidade dos casos.

Diante do exposto, acolho o entendimento da douta Procuradoria Regional Eleitoral, e VOTO no sentido de dar provimento parcial ao recurso, para o fim de reduzir o valor da multa arbitrada para R$ 35,14 (trinta e cinco reais e quatorze centavos).