RE - 5743 - Sessão: 04/07/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo partido DEMOCRATAS (DEM) de PANAMBI contra sentença que desaprovou sua prestação de contas relativa às eleições de 2018 e determinou a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses, devido à ausência de abertura de conta bancária específica.

Em suas razões, sustenta que a instituição financeira se recusou a abrir conta bancária para a agremiação,diante de  inconsistência na grafia dos nomes das pessoas físicas do tesoureiro e do presidente do diretório municipal junto ao Sistema de Gerenciamento de Informações Partidárias (SGIP) da Justiça Eleitoral. Afirma que solicitou a respectiva retificação ao diretório estadual, mas que a correção não foi providenciada a tempo. Invoca a ausência de má-fé e o princípio da razoabilidade, requerendo a aprovação das contas, ainda que com ressalvas (fls. 52-53).

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 60-63).

Na sessão de julgamento, em manifestação oral, o Procurador Regional Eleitoral modificou o parecer ofertado, com fundamento na alteração legislativa implementada pela Lei n. 13.831, de 13 de maio de 2019, a fim de que o feito seja convertido em diligência para que os dirigentes partidários firmem a declaração de ausência de movimentação de recursos prevista no § 4° do art. 32 da Lei n. 9.096/95.

É o relatório.

VOTO

Antes do exame do mérito recursal, enfrento como questão preliminar o pedido ministerial de conversão do julgamento em diligência.

Inicialmente, entendo inviável a aceitação de eventual declaração da ausência de movimentação de recursos no caso concreto, uma vez que a alteração promovida pela Lei n. 13.831/19 é inaplicável aos processos de prestação de contas de campanha eleitoral.

Referido normativo modificou dispositivos da Lei dos Partidos Políticos - Lei n. 9.096/95 -, a qual dispõe sobre as prestações de contas anuais de exercício financeiro das agremiações, enquanto que o caso em julgamento trata de prestação de contas do pleito de 2018, prevista na Lei n. 9.504/97 - Lei das Eleições - e regulamentada pela Resolução TSE n. 23.553/17.

Além disso, caso fosse considerada válida a aplicação da novel legislação às prestações de contas de campanha, observo que seria desnecessária a determinação de baixa em diligência, pois na fl. 03 dos autos consta uma declaração de que não houve movimento financeiro da legenda durante a campanha de 2018, firmada pelo presidente do partido, documento que atenderia à exigência prevista no § 4° do art. 32 da Lei n. 9.096/95, na redação dada pela Lei n. 13.831, de 2019.

De qualquer sorte, a hipótese em apreço não trata de contas julgadas não prestadas, circunstância para a qual o legislador introduziu a sistemática da declaração de ausência de recursos nos casos de contas anuais, mas sim de apresentação formal das contas de campanha desacompanhadas da respectiva abertura da conta bancária específica para recebimento de recursos eleitorais.

Assim, considerando que as contas foram prestadas, bem como a linha de raciocínio até então adotada por este Tribunal no tocante ao julgamento das prestações de contas do pleito de 2018, concluo que a promoção ministerial não comporta acolhimento e que a melhor solução, no caso concreto, é o provimento do recurso para que as contas sejam aprovadas com ressalvas, pelas razões que passo a expor.

No mérito, o DEM de Panambi atendeu ao comando de apresentar suas contas eleitorais e declarou não ter movimentado recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro voltados às eleições de 2018. De outra parte, não observou a regra que exige a abertura de conta bancária específica de campanha eleitoral destinada ao registro ou à prova de ausência de movimentação financeira.

A Resolução TSE n. 23.553/17, que dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos e candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições, prescreve, em seu art. 10, que as agremiações políticas estão obrigadas a abrir conta bancária específica, independentemente da circunstância de auferir receita e realizar despesa relacionada à campanha eleitoral, litteris:

Art. 10. É obrigatória para os partidos políticos e os candidatos a abertura de conta bancária específica, na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil ou em outra instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil.

§ 1º A conta bancária deve ser aberta em agências bancárias ou postos de atendimento bancário:

I - pelo candidato, no prazo de dez dias contados da concessão do CNPJ pela Secretaria da Receita Federal do Brasil;

II - pelos partidos políticos registrados após 15 de agosto de 2016, até 15 de agosto do ano eleitoral, caso ainda não tenham aberto a conta "Doações para Campanha", disciplinada no art. 6º, II, da Resolução-TSE nº 23.464/2015.

§ 2º A obrigação prevista neste artigo deve ser cumprida pelos partidos políticos e pelos candidatos, mesmo que não ocorra arrecadação e/ou movimentação de recursos financeiros, observado o disposto no § 4º.

§ 3º Os candidatos a vice e suplente não são obrigados a abrir conta bancária específica, mas, se o fizerem, os respectivos extratos bancários deverão compor a prestação de contas dos titulares.

§ 4º A obrigatoriedade de abertura de conta bancária eleitoral prevista no caput não se aplica às candidaturas:

I - em circunscrição onde não haja agência bancária ou posto de atendimento bancário (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 2º);

II - cujo candidato renunciou ao registro antes do fim do prazo de 10 (dez) dias a contar da emissão do CNPJ de campanha, desde que não haja indícios de arrecadação de recursos e realização de gastos eleitorais.

§ 5º A abertura de conta nas situações descritas no § 4º deste artigo obriga os candidatos a apresentar os extratos bancários em sua integralidade.

O magistrado a quo, com base nesse dispositivo, concluiu que a falta de abertura de conta-corrente configura falha apta a comprometer a regularidade dos procedimentos da prestação de contas, desaprovando as contas do partido e determinando a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário por seis meses, conforme se depreende de trecho abaixo:

Cuida-se de apreciar as contas de campanha eleitoral oferecidas pelo PARTIDO DEMOCRATAS - DEM de Panambi. Pela análise dos autos, constata-se como irregularidade a não abertura de conta bancária específica, obrigatória mesmo não havendo arrecadação e/ou movimentação de recursos financeiros, conforme art. 10, caput e §2°, da Resolução TSE ° 23.553/2017. A abertura de conta bancária é ferramenta obrigatória e essencial para a análise das contas, cuja inobservância compromete a regularidade dos procedimentos da prestação de contas. Assim, embora não haja elementos nos autos que indiquem a utilização de valores de origem não identificada ou de fonte vedada, tampouco elemento capaz de configurar abuso de poder econômico, o que afasta qualquer possibilidade de ilícitos eleitorais, a ausência de preenchimento daquele requisito essencial leva a um juízo desfavorável.

[…]

Isso posto, julgo DESAPROVADAS as contas do PARTIDO DEMOCRATAS - DEM de Panambi referente às Eleições Gerais de 2018, nos termos do art. 77, inciso III, da Resolução TSE nº 23.553/2017, ante os fundamentos declinados e, nos termos dos §§ 4º e 6º do art. 77, da mesma Resolução, determino a suspensão do direito ao recebimento de cotas do Fundo Partidário pelo prazo de 6 (seis) meses, devendo ser aplicada no ano seguinte ao do trânsito em julgado.

Contudo, esta Corte não comunga da tese de que a ausência de conta-corrente específica resulte em inevitável comprometimento da regularidade das finanças partidárias, redundando imperiosamente no julgamento pela desaprovação das contas, especialmente diante das circunstâncias do caso concreto.

A regra que determina a abertura de conta bancária há de ser interpretada com equidade e sofrer temperamento em situações como a dos autos, em que se examina contabilidade de órgão partidário municipal relativa a campanhas destinadas ao preenchimento de cargos eletivos estaduais e federais, bem como ao fato de inexistir qualquer indício de sua participação em tais pleitos.

Não parece razoável que as contas de diretório municipal que tenha declarado, de maneira verossímil, não ter arrecadado ou aplicado recursos em prol de uma campanha eleitoral que transcende a seus interesses imediatos sejam desaprovadas unicamente pelo descumprimento dessa recente exigência de ordem regulamentar.

Anoto que a razão de se exigir que os partidos políticos realizem transações financeiras exclusivamente por intermédio de contas bancárias é possibilitar a fiscalização das finanças pela Justiça Eleitoral.

Ora, tratando-se de esfera partidária de âmbito distinto daquele em que são realizadas as eleições, e não havendo indícios mínimos de participação do partido na eleição, é razoável concluir que não houve movimento de valores para o pleito, e razão não há para suas contas serem desaprovadas.

A circunstância de não possuir conta bancária específica não acarreta ao partido, de per si, a desaprovação das contas. Esta pode ser a solução jurídica para a hipótese, mas devem ser sopesadas as peculiaridades do quadro fático.

Havendo identidade entre a circunscrição do pleito e a esfera partidária prestadora de contas, cabível a desaprovação das contas em caso de se constatar a falta de conta bancária específica, porquanto a própria finalidade do respectivo órgão partidário é a de lançar candidaturas e envolver-se no respectivo pleito, não se mostrando crível seu isolamento.

Já em situações como a presente, em que inexiste coincidência entre o órgão partidário e o âmbito das eleições, a desaprovação das contas não é decorrência lógica daquela irregularidade.

Trago à colação precedente deste Tribunal que, analisando as contas de diretório partidário estadual, relativas a eleições municipais, concluiu pela aprovação com ressalvas, ainda que ausente conta bancária específica:

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. SERVIÇOS DE ADVOCACIA E CONTABILIDADE. UTILIZADOS PARA APRESENTAÇÃO DAS CONTAS. AUSÊNCIA DE CONTA BANCÁRIA ESPECÍFICA. AGREMIAÇÃO SEM PARTICIPAÇÃO NO PLEITO. ELEIÇÕES 2016. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. O uso de serviços advocatícios e de contabilidade para elaboração e apresentação das contas não são despesas de campanha, conforme dispõe o art. 29, § 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

2. A ausência de abertura de conta bancária específica para as eleições é irregularidade que, por si só, é apta a ensejar a desaprovação das contas. No entanto, ausentes indícios de participação do partido no pleito, adequado o entendimento de aprovação das contas com ressalvas, nos termos do parecer conclusivo da unidade técnica do Tribunal.

Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, PC n. 210-04.2016.6.21.0000, Relator Des. Eleitoral Jamil Andraus Hanna Bannura, julgado em 18.10.2017.)

Se, naquele caso, não foram as contas desaprovadas, com mais razão merecem ser aprovadas as contas relativas a certame voltado ao preenchimento de cargos eletivos estaduais e federais apresentadas por órgão partidário municipal, quando não detenha conta bancária específica e inexistam indícios de sua participação no pleito.

No mesmo sentido, em recente julgado, este Colegiado, analisando situação análoga à destes autos, decidiu que a falta de conta bancária específica constitui impropriedade formal, não ensejando a desaprovação de suas contas:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. ELEIÇÕES 2018. DESAPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE CONTA BANCÁRIA ESPECÍFICA. IMPROPRIEDADE FORMAL. AGREMIAÇÃO SEM PARTICIPAÇÃO NO PLEITO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO.

1. A Resolução TSE n. 23.553/17 prevê a obrigatoriedade de os órgãos partidários municipais prestarem contas à Justiça Eleitoral acerca da arrecadação e gastos nas eleições, prescrevendo que a ausência de movimentação de recursos não os isenta de tal dever. Nesse sentido, o art. 10 da norma determina que é dever da agremiação abrir conta bancária específica, independente de auferir receitas e realizar despesas relacionadas à campanha eleitoral.

2. A agremiação atendeu ao comando de apresentar suas contas eleitorais, declarando não ter havido receita ou gasto, mas não cumpriu a exigência de abrir conta bancária específica para registrar o movimento financeiro de campanha. A declaração no sentido de não ter participado economicamente do pleito eleitoral se harmoniza com a demonstrada incapacidade de deter conta em entidade bancária, porquanto o respectivo CNPJ encontrava-se na condição “inapto”.

3. A regra que determina a abertura de conta bancária há de ser interpretada com equidade e sofrer temperamento em situações como a dos autos, em que trata-se de órgão diretivo de partido político vinculado a município pequeno, com menos de cinco mil eleitores, e de as contas serem alusivas a disputas travadas em circunscrições eleitorais a ele estranhas.

4. Dadas as peculiaridades do caso concreto, a inexistência de conta bancária constitui-se em impropriedade formal, não ensejando a desaprovação das contas do órgão partidário.

5. Provimento. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, PC n. 75-80.2018.6.21.0142, Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 02.5.2019.)

No caso concreto, não há qualquer indício que possa infirmar a declaração do órgão partidário municipal, que nega participação nas campanhas voltadas ao preenchimento de cargos eletivos estaduais e federais de 2018. A assertiva do partido revela-se plenamente crível.

Assim, entendo que, dadas as peculiaridades do presente caso, a inexistência de conta bancária constitui-se em impropriedade formal, não ensejando a desaprovação das contas do órgão partidário.

Ante o exposto, preliminarmente indefiro a promoção ministerial de conversão do julgamento em diligência e, no mérito, VOTO pelo provimento do recurso para aprovar com ressalvas as contas relativas às eleições de 2018 do DEMOCRATAS - DEM DE PANAMBI, nos termos da fundamentação.