RC - 27487 - Sessão: 10/06/2019 às 11:00

Senhor Presidente, eminentes colegas.

Revisei os autos do recurso em julgamento e adianto que estou acompanhando o voto do ilustre relator, mas gostaria de realizar uma breve declaração, dadas as circunstâncias do caso.

Inicialmente, com razão o parecer ministerial ao destacar que os elementos de informação produzidos na fase inquisitorial podem ser valorados pelo magistrado na formação de um juízo condenatório, desde que amparados em provas devidamente judicializadas e produzidas sob o crivo do contraditório. Assim como destacou o ilustre Procurador Regional Eleitoral, veda-se apenas a condenação com base exclusivamente em dados apurados no inquérito. Este é o pacífico entendimento do STJ e do STF:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL.

ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO DELITO DE TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE DO ÉDITO CONDENATÓRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 155 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. INEXISTÊNCIA. CONDENAÇÃO LASTREADA EM ACERVO PROBATÓRIO COLHIDO NA FASE INQUISITORIAL E NO CURSO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.

AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

- A teor do art. 155 do Código de Processo Penal, não se mostra admissível que a condenação do réu seja fundada exclusivamente em elementos de informação colhidos durante o inquérito e não submetidos ao crivo do contraditório e da ampla defesa, ressalvadas as provas cautelares e não repetíveis. Contudo, mister se faz reconhecer que tais provas, em atendimento ao princípio da livre persuasão motivada do juiz, desde que corroboradas por elementos de convicção produzidos na fase judicial, podem ser valoradas na formação do juízo condenatório. Precedentes desta Corte.

- Na espécie, a condenação do paciente foi lastreada não apenas no depoimento prestado na fase inquisitorial por policial militar, mas também em vasto acervo probatório, consubstanciado no boletim de ocorrência, no auto de exibição e apreensão - que atesta a apreensão de 740 gramas de maconha, 2,7 gramas de crack, R$ 112,00 em espécie, além de uma balança de precisão -, no laudo pericial e nas informações prestadas pelos outros menores que foram abordados juntamente com o paciente.

- Diante disso, a pretensão formulada pela impetrante encontra óbice na jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça.

- Agravo regimental não provido.

(STJ, AgRg no HC 465.732/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 12.3.19, DJe 25.3.19.)

Habeas corpus. Processual Penal. Roubo qualificado. Artigo 157, § 2º, II, do Código Penal. Condenação. Nulidade. Reconhecimento pretendido, sob o fundamento de que se baseou exclusivamente em elementos de informação do inquérito policial. Decisão, todavia, transitada em julgado. Impossibilidade de utilização do habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal. Precedentes. Inexistência de flagrante ilegalidade que justifique a concessão da ordem de ofício. Elementos de informação do inquérito que se harmonizam com as provas colhidas sob o crivo do contraditório. Inteligência do art. 155 do Código de Processo Penal. Meio inidôneo para o revolvimento do conjunto fático-probatório e a aferição de sua suficiência ou insuficiência para a condenação. Extinção do writ, por inadequação da via eleita. 1. É firme o entendimento, no Supremo Tribunal Federal, de que o habeas corpus não pode ser utilizado como sucedâneo de revisão criminal nem constitui meio adequado para o revolvimento do conjunto fático-probatório, no intuito de se aferir sua suficiência ou insuficiência para a condenação. Precedentes. 2. O art. 155 do Código de Processo Penal não impede que o juiz, para a formação de seu convencimento, utilize elementos de informação colhidos na fase extrajudicial, desde que se ajustem e se harmonizem à prova colhida sob o crivo do contraditório judicial. Precedentes. 3. Habeas corpus extinto, por inadequação da via eleita.

(STF, HC 125035, Relator Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 10.02.15.)

No caso, impressiona o farto acervo probatório a respeito do aliciamento de eleitores pelo acusado LEANDRO BORGES EVALDT para que transferissem seus títulos eleitorais para o Município de Morrinhos do Sul, mesmo sem domicílio eleitoral na localidade.

Os inúmeros eleitores ouvidos na fase inquisitorial prestaram relatos coerentes e harmônicos – embora não mantivessem relação pessoal entre si – no sentido de que foram induzidos por Leandro Evaldt a transferir seus títulos indevidamente.

Tais fatos estão comprovados pelos Requerimentos de Alistamento Eleitoral – RAEs e são corroborados pela prova produzida em juízo. O chefe de cartório confirmou que o volume de transferências naquele ano (2008) chamou a atenção, além de ouvir repetidas denúncias a respeito de transferências irregulares. O escrivão da Polícia Federal afirmou que diferentes eleitores informaram residir no mesmo endereço sem apresentar qualquer vínculo em comum, evidenciando o uso de tais endereços somente para justificar as transferências irregulares. Também a eleitora Letícia Constant dos Santos disse ter transferido seu título para Morrinhos a pedido de seus pais, que recebiam constantes visitas do acusado Leandro Evaldt nas quais conversavam sobre o pleito.

Todavia, o delito de induzir a inscrição fraudulenta de eleitores, tipificado no art. 290 do Código Eleitoral e sobejamente comprovado, teve sua punibilidade extinta pela prescrição da pretensão punitiva, como reconheceu a sentença recorrida.

A prescrição da pretensão punitiva é uma importante garantia do cidadão, mas sempre que é verificada representa uma falha do Estado, que não logrou apurar os fatos em tempo hábil, e acaba deixando de prestar a devida jurisdição. No caso, a prescrição parecia mesmo inevitável: tratava-se de um delito com pena diminuta (máximo de 2 anos de reclusão) e um processo complexo, envolvendo vários acusados (69 ao todo), residentes em diferentes municípios, o que dificultou a marcha processual e ocasionou diversas cisões ao longo do tempo.

Em relação ao crime de corrupção eleitoral, tipificado no art. 299 do Código Eleitoral, embora ainda não tenha sido fulminado pela prescrição, visto que sua pena máxima é maior (reclusão até 4 anos), entendo, assim como o ilustre relator, que as provas produzidas judicialmente não se prestam a corroborar os elementos de informação colhidos na fase inquisitorial.

Isso porque o tipo do delito em questão possui um elemento subjetivo, consistente no fim específico de obter o voto do eleitor, e esta finalidade, embora presente em alguns depoimentos prestados perante a autoridade policial, não chega a ser confirmada em juízo.

O servidor do cartório apenas atesta o volume maior de transferências, assim como o fez o escrivão de polícia em relação à irregularidade das transferências, mas sem atestarem o elemento anímico dessas movimentações. Quando este último afirma que diferentes eleitores disseram ter recebido R$ 80,00 ou R$ 100,00 como ajuda ou promessa não faz nada além de reproduzir os depoimentos colhidos de forma unilateral e documentados no inquérito. Da mesma forma, a eleitora Letícia dos Santos Bauer admite que transferiu indevidamente seu domicílio eleitoral, mas somente esclarece que seguiu a orientação de seus pais, sem precisar se eles receberam alguma espécie de benefício ou promessa de Leandro Evaldt.

Afirma o Ministério Público que os eleitores, ao serem ouvidos em juízo na instrução dos processos cindidos, confirmam o recebimento de promessas de Leandro Evaldt em troca de votos, mas não houve juntada oportuna dessa prova, de forma que resta inviável sua valoração nesta ação e neste momento.

Assim, embora viável a valoração de elementos de informação produzidos no inquérito, a prova judicializada não corrobora o necessário elemento subjetivo para a caracterização do crime de corrupção eleitoral, de forma que deve ser mantida a sentença de improcedência da ação.

Com essas considerações, estou acompanhando o ilustre relator.