E.Dcl. - 102 - Sessão: 02/05/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de embargos de declaração opostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL em face do acórdão das fls. 883-893v., que, por maioria, deu provimento ao recurso, a fim de reformar a sentença e julgar improcedente a ação.

O embargante sustenta haver contradição no acórdão, porquanto o caso em tela não trata de prova testemunhal singular, não se subsumindo na hipótese prevista no art. 368-A do CE, haja vista o próprio aresto ter reconhecido a existência das testemunhas Cristiano Sampaio da Silva e Simone da Veiga dos Santos, relativamente ao mesmo fato, os quais confirmaram narrativa favorável da distribuição de vale-combustível pelo candidato Marcelo Saggin. Requer, ainda, sejam os embargos recebidos com efeitos infringentes (fls. 899-905).

É o relatório.

VOTO

Os embargos são regulares, tempestivos e comportam conhecimento. No entanto, não merecem ser acolhidos.

O art. 1.022 do CPC estabelece que cabem embargos de declaração para esclarecer obscuridade, eliminar contradição ou suprir omissão sobre ponto ou questão acerca dos quais devia se pronunciar o juiz.

Barbosa Moreira leciona que se verifica a contradição “quando no acórdão se incluem proposições entre si inconciliáveis” (Comentários ao Código de Processo Civil, vol V, 17ª ed., 2013, p. 553), ou seja, a contradição que autoriza o manejo dos aclaratórios é aquela interna, verificada entre os fundamentos ou diferentes elementos do acórdão, e não a eventual contradição entre a decisão e outros elementos dos autos, normas jurídicas ou jurisprudência.

No mérito, a leitura do acórdão prolatado pelo Tribunal não evidencia a presença do vício apontado nos aclaratórios, uma vez que o julgado expressamente aplicou o art. 368-A do Código Eleitoral. A julgar pelas provas apresentadas, percebe-se que nenhuma se prestou para desincumbir o autor, Ministério Público Eleitoral, do ônus probatório inerente às alegações formuladas.

Sobre a análise, pelo acórdão embargado, do conjunto probatório, transcrevo excerto abaixo (fls. 890-891) :

Cumpre examinar o conjunto probatório.

Inicialmente, observo que os vídeos gravados na mídia à fl. 30 demonstram apenas o abastecimento de veículos com adesivo de propaganda do recorrente. E, nem mesmo a inquirição dos condutores dos veículos filmados comprovou a irregularidade alegada.

Gilberto Vezaro Maroso, Maurício dos Santos Otero e Lucivani Bueno Gonçalves dos Santos negaram o abastecimento por meio de vales-combustível (fls. 123-124, 586-587).

Luis Fernando Rodrigues de Lara, em sentido diverso, confirmou a utilização do vale-combustível, mas alegou que o benefício foi entregue por pessoas que representavam o partido, para franquear a sua participação em carreata em favor de candidatos da agremiação, ocasião em que teve o seu carro adesivado com propaganda do recorrente e do candidato concorrente ao cargo de prefeito (fl. 582-584).

No que diz respeito aos vales-combustível, apesar das observações quanto às datas de emissão no período eleitoral e a numeração sequencial, não há nenhuma identificação do candidato no material apreendido (Anexo 01), tampouco essa vinculação pode ser extraída após a inquirição dos frentistas (fls. 268-270, 588-590, 591-595), dos responsáveis pelos estabelecimentos em que foram realizadas as apreensões (fls. 593-595, 604-605) e dos esclarecimentos prestados pelas gráficas oficiadas (fls. 362,364, 372, 399) e postos de combustíveis (fl. 373-379).

No tocante à prova testemunhal, tendo em vista que Fabiana de Lima Santos apresentou versões antagônicas a respeito da origem do vale-combustível que portava por ocasião da apreensão, deixo de atribuir valor probatório ao depoimento prestado em juízo (fls. 578-581).

Considerando que o depoimento do servidor da Justiça Eleitoral apenas menciona o abastecimento de carros adesivados com a propaganda do candidato e o pagamento com vales-combustível (fls. 573-575), tenho que as informações prestadas não comprovam a ação ilícita de fornecimento dos vales imputada ao recorrente.

Apenas a versão apresentada por Cristiano Sampaio da Silva e por sua esposa Simone da Veiga dos Santos (fl. 666), relativamente ao mesmo fato, contemplam narrativa favorável a ocorrência da distribuição de vale-combustível pelo candidato Marcelo Saggin.

Ocorre que não se extrai do relato dos depoentes a comprovação segura de que o candidato tenha entregue o benefício.

Prevalece, nessa hipótese, o disposto no art. 368-A do Código Eleitoral, segundo o qual “A prova testemunhal singular, quando exclusiva, não será aceita nos processos que possam levar à perda do mandato”.

Ademais, tenho que as anotações apreendidas não servem para atestar a omissão de gastos eleitorais (fl. 74 - Apenso).

Ainda que se possa extrair dos escritos lançamentos em valores superiores aos escriturados na contabilidade da campanha, o registro efetuado é insuficiente para validar a ocorrência dos aludidos gastos.

O que se verifica a partir do exame do bloco de anotações é a existência de um conjunto de informações atinentes à campanha eleitoral, com a aposição de quantias que retratam uma espécie de expectativa de acontecimentos, com cenários hipotéticos, o que se coaduna com a tese alegada pelo candidato nas suas razões recursais e com os esclarecimentos prestados por Rone Vieira Moreira, ouvido em juízo como informante (fl. 606v.).

Gize-se que, efetivamente, somente o depoimento da testemunha Luis Fernando Rodrigues de Lara teria confirmado a alegada utilização do vale-combustível. Contudo, ponderou que o benefício fora entregue por pessoas que representavam o partido, para franquear a sua participação em carreata em favor de candidatos da agremiação, oportunidade em que teve seu carro adesivado com propaganda do recorrente e do candidato ao cargo de prefeito (fls. 582-584).

Quanto às demais testemunhas, há clareza solar no acórdão embargado relativamente aos motivos pelos quais seus depoimentos não foram considerados na decisão, por essa razão prevaleceu, na hipótese dos autos, a aplicação do art. 368-A do Código Eleitoral, segundo o qual “A prova testemunhal singular, quando exclusiva, não será aceita nos processos que possam levar a perda do mandato”.

Ainda, quanto aos motivos externados em aclaratórios, é de se frisar que restaram evidentes no acórdão tanto a interpretação conferida ao art. 368-A do CE quanto as razões que levaram à sua aplicação. Destarte, não há contradição a ser enfrentada, restando ao embargante, caso não concorde com a subsunção do caso ao dispositivo legal citado, o manejo de peça recursal idônea a qual permita a infringência colimada.

Isso posto, apesar dos argumentos expostos na petição de embargos, o acórdão não padece de nenhum dos vícios elencados no art. 275 do Código Eleitoral, c/c art. 1.022 do CPC, uma vez que enfrentou a matéria de forma exauriente e rebateu todas as alegações de modo suficiente.

Ante o exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.