RC - 12817 - Sessão: 06/08/2019 às 17:00

Senhor Presidente, eminentes colegas.

Revisei os autos do recurso em julgamento e firmei entendimento parcialmente divergente do bem-lançado voto do digno relator.

Inicialmente, estou de acordo com a emendatio libelli realizada, pois os fatos praticados pelo recorrente realmente se amoldam à descrição típica da injúria, e não da difamação como tipificado pela sentença condenatória.

Contudo, ouso divergir do relator no tocante à absolvição do recorrente.

Não se ignora que a jurisprudência na seara eleitoral tolera o emprego de expressões desairosas contra candidatos em meio ao debate eleitoral, com o intuito de prestigiar a liberdade de expressão na busca do maior trânsito de informações e opiniões entre os eleitores.

Não se duvida do acerto do assentado, mas é preciso indagar até que ponto esta liberdade deve ser privilegiada. É pacífico o entendimento de que a liberdade de expressão não é direito absoluto, conforme inúmeros precedentes do egrégio STF, e não o deve ser também em matéria eleitoral.

As palavras exercem determinadas funções na comunicação. É possível aceitar a crítica aos candidatos, em meio ao debate eleitoral, que empregue expressões mais ríspidas ou agressivas, às vezes proferidas no calor da emoção ou conscientemente escolhidas com o intuito de chamar a atenção do eleitor.

Tais termos desairosos, entretanto, devem ser empregados com a função de criticar o homem público em sua atuação, de forma a contribuir de alguma maneira para o debate público.

Nessa linha, o egrégio TSE, em pedidos de direito de resposta, tem admitido o emprego de expressões ácidas e contundentes, mas dentro de um contexto crítico e sem direcioná-las à pessoa do candidato. Elucidativa a decisão proferida na RP n. 119271 (Relator Min. Tarcisio Vieira, 23.9.2014), na qual entendeu que “as Representantes, diante de falta de explicitação da fala impugnada (de que "no meu governo os recursos do pré-sal vão ser usados para a saúde e a educação, não para a corrupção"), não são atingidas, ainda que de forma indireta, por afirmação caluniosa, injuriosa ou inverídica”.

Diferente é o caso dos autos, no qual o acusado, de forma objetiva, dirigiu palavras ofensivas ao candidato, sem empregá-las em nenhum contexto crítico: “ÉS O MAIOR SAFADO, ORDINÁRIO E CORRUPTO QUE CONHEÇO”.

O Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa não deixa dúvidas a respeito do significado ofensivo e depreciativo das palavras empregadas. Segundo o léxico, safado possui o significado de alguém “desavergonhado”, “descarado”, “cínico”, “impudente”, “pornográfico”, “imoral”; já a palavra ordinário é sinônimo de “grosseiro”, “mal-educado”, “medíocre”, “vulgar”, “sem caráter”, “reles”, “ruim”.

As ofensas foram divulgadas na rede social Facebook, acompanhadas de um vídeo retratando as más condições de funcionamento de uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), em Gravataí, inaugurada durante a gestão do ofendido, Marco Alba. Todavia, embora o agente tenha se aproveitado da situação retratada no vídeo para criticar o candidato, fez a afirmação ofensiva sem relacioná-la com as imagens: não se refere à eventual incompetência do gestor, não trata da sua atuação, nem faz alusão a eventual fato supostamente criminoso que pudesse ter prejudicado os projetos da prefeitura. Se esse fosse o caso, penso que não se extrapolaria o campo do debate crítico aceitável, ainda que com expressões agressivas. No caso concreto, ao contrário, sem maiores explicações nem contexto crítico algum, afirma: “És o maior safado, ordinário e corrupto”.

Vale questionar de que forma tal afirmação poderia contribuir para o esclarecimento do eleitorado com informação, opinião ou crítica. O uso exclusivo das palavras ofensivas evidencia que a única finalidade dessa comunicação foi ofender diretamente o candidato.

Não creio que acusações de tal jaez tragam qualquer contribuição para o debate político ou democrático. A Justiça Eleitoral tem papel fundamental de regulação das eleições e das condutas dos candidatos e partidos. Acusações gratuitas, como as feitas no caso concreto, desapegadas do teor crítico a respeito da administração, por mais desastrosa que possa ter sido, seja por culpa ou até dolo, não revelam nenhum benefício que contribua para o bom debate. Entendo que o país precisa de moderação, em diversas das suas manifestações, e tenho que aqui se retrata um caso paradigmático dos limites entre a crítica aceitável e até ampliada e a acusação injuriosa praticada.

Em casos similares ao dos autos, os Tribunais têm reconhecido a configuração do crime de injúria.

O TSE, no HC n. 381 (Relator Min. Eduardo Alckmin, 22.9.2000), considerou caracterizada a injúria pelo uso dos termos “bandido” e “estelionatário”. O TRE/SP (RC n. 63175, Relatora Cláudia Fanucchi, 04.8.2016) considerou injuriosas as palavras “vagabundo” e “ordinário”. O TRE/RJ, na Ação Penal n. 8770 (Relator Luiz Ayoub, 11.10.2012), entendeu que a qualificação de terceiro como "safado" e "bandido" caracterizou o crime de injúria. O TRE/GO (RE n 1193, Relator Roldão de Carvalho, 05.11.2001) considerou caracterizado o delito pelo uso das palavras "ladrão" e "corrupto". Por fim, o TRE/PR (RC 31454, Relator Pedro Corat, 24.8.2017) entendeu injuriosas as ofensas de “bandido” e “corrupto”.

Diante dessas considerações, entendo caracterizado o crime de injúria eleitoral no caso dos autos.

Reconhecida a prática do delito, resta readequar a pena aplicada, por força da emendatio libelli realizada nesta instância.

A sentença manteve a pena em seu mínimo legal na fase intermediária. Ocorre que o crime de difamação prevê pena mínima de 3 meses de detenção, enquanto o mínimo da pena do delito de injúria é de 15 dias de detenção (art. 284, c/c art. 326, ambos do Código Eleitoral).

Assim, a pena intermediária deve ser reduzida para 15 dias, a qual, acrescida da causa de aumento do art. 327, inc. III, do Código Eleitoral, à razão de 1/3, tal como fez a sentença, resta definitivamente fixada em 20 dias de detenção.

Considerando que o tipo da injúria eleitoral estabelece pena alternativa de detenção ou multa de 30 a 60 dias-multa, entendo que a sanção pecuniária é a mais adequada para o caso, e a estabeleço em 40 dias-multa, à razão de 1/20 do salário-mínimo, atentando para evidências da condição financeira do acusado, que indicou ser advogado na procuração (fl. 54).

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento ao recurso, para condenar o acusado à pena de 40 dias-multa, à razão de 1/20 do salário-mínimo.

 

Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga:

Acompanho a divergência.

Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos:

Acompanho a divergência.

Des. Eleitoral Gustavo Alberto Gastal Diefenthäler:

Acompanho a divergência.

Des. André Luiz Planella Villarinho:

Acompanho o Relator.