RE - 2226 - Sessão: 09/05/2019 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB) contra a sentença que desaprovou sua prestação de contas referente à movimentação financeira do exercício de 2017, determinando a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano, em razão da falta de apresentação das seguintes peças e documentos: a) comprovante de remessa da escrituração contábil à Receita Federal; b) balanço patrimonial; c) demonstração de resultado e d) demonstrativo de fluxo de caixa.

Em suas razões, o partido informa ter juntado ao recurso a documentação que conduz ao saneamento das falhas apontadas na sentença e requer a aprovação das contas, bem como o afastamento da sanção de suspensão dos repasses do Fundo Partidário (fls. 119-120v. e documentos às fls. 121-135).

A Procuradoria Regional Eleitoral opinou, preliminarmente, pela desconsideração dos novos documentos apresentados com o recurso e, no mérito, pelo provimento parcial, para que seja afastada a suspensão dos repasses do Fundo Partidário, mantendo-se a desaprovação das contas.

É o relatório.

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo, e comporta conhecimento.

Inicialmente, analiso a preliminar de não conhecimento dos novos documentos juntados com o recurso, suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral.

Efetivamente, somente após a prolação da sentença, quando da interposição do recurso, o partido providenciou a juntada aos autos dos documentos que fundamentaram a desaprovação das contas: recibo de entrega de escrituração contábil à Receita Federal, demonstração de resultado do exercício, balanço patrimonial e demonstração de fluxo de caixa, a fim de superar a omissão na entrega de documentos fundamentais para a análise das contas.

A possibilidade de aceitação de documentos com o recurso, à luz do princípio da preclusão consumativa para a prática de atos processuais, foi exaustivamente examinada por este Tribunal na sessão de 18.12.2018, quando do julgamento dos embargos de declaração na prestação de contas PC 0602877-40, da relatoria do Des. Eleitoral Miguel Antonio Silveira Ramos.

Na oportunidade, o relator enfrentou a questão como preliminar e entendeu por não admitir, no processo de prestação de contas, a juntada de documentos faltantes com a petição recursal, se, durante o trâmite, foi concedido ao prestador o respectivo prazo para ofericimento de provas.

Naquela assentada, o Tribunal, por maioria, acolhendo a divergência inaugurada pelo Des. Federal João Batista Pinto Silveira, concluiu pela possibilidade de juntada de documentos em grau recursal, em atenção ao art. 266 do Código Eleitoral, regra especial frente ao art. 435 do CPC:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2018. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS COM O RECURSO. POSSIBILIDADE. CONHECIMENTO. ALEGADA CONTRADIÇÃO E MISSÃO NO ARESTO. PEDIDO DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITOS INFRINGENTES. PRETENSÃO DE REEXAME DO FEITO. INVIÁVEL. REJEIÇÃO.

Possibilidade de juntada de documentos em sede de embargos de declaração. Busca-se, nas prestações de contas, a verdade real, a aferição da lisura e transparência da movimentação dos recursos arrecadados e gastos na campanha eleitoral, de modo a legitimar o próprio processo de escolha democrática dos nossos representantes. A aparente vedação do art. 435 do Código de Processo Civil à juntada de novos documentos não tem incidência no caso em exame, porque apenas seria aplicável (de forma supletiva ou subsidiária) se a legislação eleitoral fosse omissa ou deficitária em relação ao ponto, o que não procede, diante do contido no art. 266 do Código Eleitoral. Ademais, a prestação de contas do candidato ainda está em fase de julgamento ordinário neste Tribunal, circunstância distinta da apreciação pela esfera extraordinária do Tribunal Superior Eleitoral. Atualmente, a jurisprudência desta Corte admite a juntada de novos documentos em grau de recurso. Não obstante a existência de dissenso doutrinário acerca da natureza jurídica dos embargos de declaração, o ordenamento jurídico disciplinou o instrumento como espécie recursal (art. 994 do CPC), entendimento que tem sido adotado na jurisprudência consolidada dos tribunais. Conhecimento.

Inexistência de omissão ou contradição no aresto. Caracterizado o inconformismo com a justiça da decisão e o manifesto pedido de rejulgamento do feito, circunstância que não se coaduna com as hipóteses estritas de cabimento dos aclaratórios previstas no art. 1.022 do Código de Processo Civil.

O pedido de reforma do julgado é matéria que deve ser levada à apreciação da superior instância no recurso cabível para atacar o acórdão, pois não se amolda ao propósito integrativo e aclaratório dos embargos de declaração.

Rejeição.

(PC 0602877-40, Relator Des. El. Miguel Antonio Silveira Ramos, j. sessão de 18.12.2018.) (Grifei.)

Foi mantida, assim, a orientação jurisprudencial desta Corte no sentido do conhecimento de documentação nova, que possibilite a correção de irregularidades sem a necessidade de nova análise técnica ou diligência complementar:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRELIMINARES. APONTAMENTO EM RELAÇÃO A DOAÇÃO DE PESSOA FÍSICA. EVENTUAL ANÁLISE DEVERÁ SER REALIZADA EM SEDE DE REPRESENTAÇÃO POR DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PRELIMINAR ACOLHIDA. JUNTADA DE DOCUMENTOS EM SEDE RECURSAL. POSSIBILIDADE. PRELIMINAR AFASTADA. MÉRITO. RECURSOS PRÓPRIOS EM MONTANTE SUPERIOR AOS DECLARADOS. ART. 15 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. FALHA SANADA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. AFASTADA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. ELEIÇÃO 2016.

1. Preliminares. 1.1 O julgador monocrático fez apenas um registro, na sentença, de que as doações realizadas por determinada pessoa física à campanha do prestador deveriam ser melhor analisadas pelo Ministério Público Eleitoral que, caso se conclua pela irregularidade, deverá ser realizada em eventual representação por doação acima do limite legal, e não no âmbito da prestação de contas de candidato. Preliminar acolhida. 1.2 Viabilidade da apresentação de novos documentos com o recurso quando capazes de esclarecer de plano as falhas apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligência complementar. Preliminar não acolhida.

2. Mérito. Utilização de recursos próprios na campanha em valor acima do declarado como patrimônio pessoal. A questão restou devidamente esclarecida, porquanto, durante a campanha, o candidato permaneceu auferindo vencimentos provenientes do desempenho de cargo público ocupado junto à Prefeitura do município. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

Aprovação com ressalvas. Provimento parcial.

(RE 486-43, Relator Des. El. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, j. sessão de 14.11.2017.) (Grifei.)

Este Tribunal tem posição consolidada no sentido de ser possível conhecer de documentos juntados ao recurso com o objetivo de amparar o pedido de aprovação das contas, os quais não foram submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, desde que o seu conteúdo não demonstre ser imprescindível a realização de nova análise técnica, ou seja, quando sua simples leitura puder sanar irregularidades.

Desse procedimento verifica-se que a documentação acostada ao recurso será aprioristicamente conhecida pelo Tribunal e que, somente após exame superficial de seu conteúdo, o relator concluirá pela possibilidade de saneamento das falhas constatadas ou por sua inviabilidade diante da exigência de novo exame técnico-contábil.

Feitas essas considerações, tenho que, no caso concreto, é impossível considerar a documentação juntada ao recurso e sua capacidade de influenciar positivamente o exame da contabilidade, de forma a prestigiar a retidão no emprego de recursos e realização de despesas, pois as peças requerem análise contábil, inclusive sujeitando-se a conferências e verificações técnicas por examinador designado.

Assim, acolho a preliminar suscitada e não conheço dos novos documentos juntados com a peça recursal, diante da necessidade de que seu conteúdo seja examinado mediante nova análise técnica das contas, procedimento inviável na instância recursal.

No mérito, durante a instrução, a legenda partidária foi regularmente notificada em duas oportunidades (fls. 97-103), mas não atendeu às diligências, abdicando de sanar, na fase processual própria, a falha apontada na contabilidade.

A obrigatoriedade de prestar contas é exigida anualmente dos partidos políticos, que devem instruir os autos contábeis em conformidade com o rol de documentos estabelecidos na legislação eleitoral.

A ausência de documentos de apresentação obrigatória tolheu sobremaneira a confiabilidade das contas apresentadas, pois impediu a realização de exame técnico específico sobre o balanço patrimonial e a exibição de resultados do exercício financeiro, bem como do demonstrativo de fluxo de caixa.

É pacífica a jurisprudência pela desaprovação das contas devido à ausência de documentos fundamentais para análise contábil:

Prestação de contas anual. Partido político. Diretório estadual. Art. 14 da Resolução TSE n. 21.841/2004. Exercício 2013. Desaprovam-se as contas quando identificadas falhas que comprometem a auditoria contábil pela Justiça Eleitoral. No caso, ausência de documentos obrigatórios para a fiscalização da movimentação financeira da agremiação e tramitação de recursos de fonte não identificada. Recolhimento de valor ao Fundo Partidário e suspensão do repasse das cotas do mesmo fundo. Desaprovação. TRE/RS, PC 63-46.2014.6.21, Rel. Dr. Hamilton Langaro Dipp, j. 19.11.2014.

 

Recurso. Prestação de contas anual. Partido político. Diretório Estadual. Exercício de 2011.

Desaprovam-se as contas quando constatadas falhas que comprometem sua confiabilidade e regularidade. No caso, existência de recursos não identificados, omissão da apresentação dos Livros Razão e Diário e valor em conta contrariando o art. 10 da Resolução TSE n. 21.841/2004.

Reforma da sentença para reduzir o prazo de suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário.

Provimento parcial.

(TRE/RS, Recurso Eleitoral n. 4873, Acórdão de 16.10.2014, Relatora DESA. FEDERAL MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 189, Data 20.10.2014, Página 3.)

Quanto às sanções, correta a Procuradoria Regional Eleitoral ao apontar que a decisão recorrida aplicou indevidamente a suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário, pois a penalidade, prevista no art. 47 da Resolução TSE n. 23.464/15, foi reservada para os casos de recebimento de recursos procedentes de fontes vedadas ou de origem não identificada, o que não é o caso dos autos.

Dessa forma, o recurso comporta parcial provimento, para que a determinação de suspensão de repasse de quotas do Fundo Partidário fixada na sentença seja afastada.

Ante o exposto, acolho a preliminar suscitada, não conhecendo dos documentos juntados ao recurso em virtude de seu conteúdo demandar nova análise técnica sobre as contas e, no mérito, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para afastar o sancionamento de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário determinado na sentença, mantendo a desaprovação das contas.