RE - 2587 - Sessão: 04/06/2019 às 14:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) de PELOTAS em face da sentença que desaprovou as contas partidárias referentes ao exercício de 2017, ante o recebimento de doações procedentes de fonte vedada, na importância de R$ 17.136,00 (dezessete mil, cento e trinta e seis reais) (fls. 170-174).

Em suas razões, a agremiação pugna pelo recebimento do apelo no efeito suspensivo, sustenta a legalidade das doações, aduzindo que os recursos são provenientes dos vereadores da bancada do PDT de Pelotas e que apenas foram repassados pela Câmara Municipal. Aduz que o débito automático, realizado nos subsídios mensais dos parlamentares, objetivava garantir as contribuições partidárias, e sustenta que a Câmara de Vereadores não possui personalidade jurídica. Ao final, postula o provimento do recurso para que as contas sejam aprovadas com ressalvas e, caso mantida a sentença, requer o prequestionamento do art. 46, § 3º, da Resolução 23.546/17 (fls.181-184).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 190-193 v.).

É o relatório.

VOTO

Senhor Presidente, Eminentes Colegas:

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Preliminarmente, o recorrente postula o recebimento do presente recurso no duplo efeito.

Entretanto, incabível a aplicação do efeito pretendido, pois, por determinação do art. 257 do Código Eleitoral, “os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo”. A regra é excepcionada apenas pelo teor da previsão contida no parágrafo 2º do mesmo dispositivo, ou seja, a atribuição de efeito suspensivo quando a decisão implique “cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo”, efeitos que não se extraem da sentença que julga as contas eleitorais em sua sede processual própria.

Transcrevo os aludidos comandos legais:

Art. 257. Os recursos eleitorais não terão efeito suspensivo.

(...)

§ 2º O recurso ordinário interposto contra decisão proferida por juiz eleitoral ou por Tribunal Regional Eleitoral que resulte em cassação de registro, afastamento do titular ou perda de mandato eletivo será recebido pelo Tribunal competente com efeito suspensivo.

Portanto, rejeito a preliminar.

Passando ao exame do mérito, inicialmente, ressalto que, conforme o art. 65 da Resolução TSE n. 23.546/17, em relação ao exercício financeiro de 2017, deve ser aplicada a Resolução TSE n. 23.464/15, quanto ao mérito, bem como a Resolução TSE n. 23.546/17 para as disposições processuais.

Pois bem.

As contas da agremiação foram desaprovadas em face da identificação de recebimento de recursos de fonte vedada, contrariando o art. 12, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15.

O órgão técnico de análise identificou o recebimento pelo partido político de R$ 17.136,00 (dezessete mil, cento e trinta e seis reais), oriundos da Câmara Municipal de Pelotas – órgão público constituído sob a forma de pessoa jurídica (fl.182v.)

Em sua defesa, a grei assevera que as contribuições foram realizadas por parlamentares que autorizaram os descontos em seus subsídios, as quais foram somente repassadas pela Câmara de Vereadores, mera intermediária no recolhimento e envio das doações. Sustenta que tal procedimento visava garantir as contribuições partidárias. Aduz, ao final, que a Casa Legislativa não possui personalidade jurídica.

Ocorre que as cópias dos contracheques juntados aos autos, muito embora demonstrem os descontos referentes à contribuição partidária, não comprovam tratar-se dos mesmos recursos enviados pela Casa Legislativa. Nos autos, não constam extratos bancários com a identificação dos doadores originários, tampouco recibos eleitorais emitidos em nome desses.

A Resolução TSE n. 23.464/15 determina que o depósito bancário previsto no parágrafo 1º do art. 8º deve ser realizado nas contas “Doações para Campanha” ou “Outros Recursos”, conforme sua destinação, sendo admitida sua efetivação por qualquer meio de transação bancária, na qual o CPF, do doador ou contribuinte, ou o CNPJ, no caso de partidos políticos ou candidatos, sejam obrigatoriamente identificados.

As hipóteses das doações informadas na referida resolução – que regulamenta as finanças e a contabilidade dos partidos – são taxativas. Assim, apenas os meios elencados nos dispositivos legais podem ser utilizados para efetivar as contribuições, tal como o depósito bancário identificado.

Importa ressaltar que a redação do preceito normativo alcança a doação realizada de forma indireta, ou seja, o repasse de contribuições, conforme art. 12, § 3º da Resolução TSE n. 23.464/15 e inc. II do art. 31 da Lei 9.096/95, veto presente tanto na redação primitiva, como na nova redação dada pela Lei n. 13.488/17:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações orçamentárias do Fundo Partidário e do FEFC;

(...)

§ 3º Entende-se por doação indireta, a que se refere o caput, aquela efetuada por pessoa interposta que se inclua nas hipóteses previstas nos incisos. (Grifei.)

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(…)

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações referidas no art. 38 desta Lei e as proveniente do Fundo Especial de Financiamento de Campanha;(Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)

Quanto à forma de recolhimento das doações adotada pelo partido, com desconto em folha, visando garantir as contribuições partidárias, destaca-se que há muito foi considerada uma prática condenável, conforme julgados do TSE, pois revela o uso da estrutura estatal para facilitar a arrecadação de recursos para o partido.

Colaciono julgado do TSE:

(…)

No presente caso, tem-se como prova irrefutável do ilícito a documentação trazida pelo Partido, qual seja, cópia das Autorizações de débito em favor do Recorrente (fls.188/204), Relação "Contribuição Partidária" oriunda de pessoas físicas (ocupantes de cargos em comissão ou funções de confiança e vereadores) por meio de descontos uniformes, relativos ao período 2009, no percentual de 3% (três pontos percentuais) sobre o rendimento base (fls.205/218)

A ilicitude ressai cristalina, nos moldes dos julgados acima transcritos, haja vista que comprova que o Partido Recorrente montou, naquele ano, um esquema de arrecadação de valores provenientes de fonte inesgotável e ilícita, violando frontalmente a Lei no 9.096/1995.

O "modus operandi" desenvolvido pelo PMDB/MT (Rondonópolis), em 2009, é o mesmo de algumas outras agremiações que também adotaram essa condenável sistemática, conforme já tratado nesta Corte, porque revela a utilização da estrutura estatal para facilitar a arrecadação de recursos para o partido e por outro lado, a falta de "voluntariedade" das tais "doações" ao Recorrente se reflete na isonomia nos descontos.

(RESPE - Recurso Especial Eleitoral nº 190109, Decisão monocrática de 14/4/2015, Relator(a): Min. Henrique Neves da Silva, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico - 17/04/2015.) (Grifei.)

No tocante à doação pela Câmara Municipal de Pelotas, órgão público integrante do governo municipal, conforme se extrai dos arts. 2º, 29 e 31 da Constituição Federal, resta expressamente vedada, de acordo com o art. 31 da Lei dos Partidos, já referido, e do art. 12, inc. II, da Resolução TSE n. 23.546/17:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I - origem estrangeira;

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações orçamentárias do Fundo Partidário e do FEFC;

Constatado o recebimento de doação oriunda de fonte vedada (ente público), a qual constitui irregularidade grave e compromete a análise da origem das receitas, impõem-se a desaprovação das contas e o recolhimento do montante irregular ao Tesouro Nacional, nos termos previstos no art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15, não sendo possível, como defende o recorrente, ser considerada a irregularidade mero erro formal ou material.

Colaciono ementa deste Regional:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ORIUNDOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES PÚBLICAS. IRRETROATIVIDADE DAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N. 13.488/17. MANTIDOS O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL E O PERCENTUAL DA MULTA IMPOSTA. REDUZIDO PRAZO DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Desaprovação das contas da agremiação em virtude do recebimento de recursos de fonte vedada oriundos de contribuições de ocupantes de cargos de chefia demissíveis ad nutum. O TSE e esta Corte posicionaram-se no sentido da incidência da legislação vigente à época do exercício da prestação de contas e pela irretroatividade das alterações legislativas introduzidas pela Lei n. 13.488/17. A vedação das doações partidárias por detentores da condição de autoridades busca garantir a isonomia de oportunidades entre as agremiações e prevenir a distribuição oportunista de cargos, estando em perfeita harmonia com o texto constitucional. Escorreita a aplicação, pelo juízo a quo, do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, em sua redação primitiva, para as doações realizadas enquanto vigente a redação originária do dispositivo. No mesmo sentido, correto o juízo de regularidade das doações realizadas por ocupantes de cargos em comissão filiados ao partido político, após a entrada em vigor da Lei n. 13.488/17 - em 06.10.2017 -, aplicando adequadamente a norma vigente ao tempo da realização dos fatos.

2. Valores irregularmente recebidos que representam 17,75% dos recursos arrecadados pela agremiação no exercício financeiro. Mantida a desaprovação das contas.

3. Sancionamento. Adequado o montante apurado a ser recolhido ao Tesouro Nacional, bem como o percentual da multa fixada na sentença. Aplicados os princípios da proporcionaliade e da razoabilidade para realizar a dosimetria da sanção, a fim de reduzir a suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário para dois meses.

4. Parcial provimento. (Grifei.)

Ainda, considerando que o valor total de receitas do órgão partidário, no ano de 2017, foi de R$ 37.120,43 e que o aporte à agremiação procedente de fonte vedada totaliza R$ 17.136,00, correspondente a 46,16% (quarenta e seis vírgula dezesseis por cento) das receitas partidárias, entendo proporcional a penalidade de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário por 6 (seis) meses.

ANTE O EXPOSTO, considero prequestionado o dispositivo invocado e VOTO pelo desprovimento do recurso, determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 17.136,00 (dezessete mil, cento e trinta e seis reais), acrescida de multa de 5% (cinco por cento) sobre o montante irregular, bem como seja determinada a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses.

É como voto, senhor Presidente.