REl - 0600623-88.2024.6.21.0031 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/06/2025 00:00 a 06/06/2025 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

A prestação de contas foi desaprovada pelo juízo a quo pelos seguintes motivos: cheque emitido no valor de R$ 179,68, sem ter sido cruzado; extrapolação do limite de gastos com locação de veículos, no montante de R$ 393,63; excesso de recursos próprios investidos em campanha no montante de R$ 1.270,49 e recursos caracterizados como de origem não identificada, no total de R$ 1.203,37. As irregularidades totalizaram R$ 3.047,17 e representam 75,26% do total de receitas, comprometendo as contas como um todo. Houve aplicação de multa no valor de R$ 635,25 e determinação para recolhimento ao erário do valor de R$ 1.203,37.

A sentença (ID 45805053) foi prolatada sob os seguintes fundamentos:
 

1. Quitação de despesas - Conta Outros Recursos:

O parecer conclusivo narra que para quitação da despesa constante na tabela no item 1.1.1. foi emitido o cheque n. 5, no valor de R$ 179,68, para quitação de despesa realizada com o fornecedor Dolomiten Com. de Comb. e Lubr. Ltda, o qual não foi expedido na forma cruzada.

Ainda relata, no item 1.1.2., que para as despesas quitadas com o cheque n. 4, no valor de R$ 1.095,00, do fornecedor Guilherme Duarte Lutz & Cia Ltda; e com o cheque n. 6, no valor de R$ 1.000,00, da empresa Seibert & Melchior Advogados, não foram apresentadas fotocópias dos cheques ou outra comprovação da efetiva quitação do débito.

Quanto ao cheque n. 5 o prestador esclareceu que o cheque ter sido emitido sem ser cruzado não afasta a regularidade do pagamento realizado. Por seu turno, para comprovação da efetiva quitação das despesas efetivadas com os cheques n. 4 e 6, juntou aos autos recibos de quitação das respectivas notas fiscais.

Assim, entendo superada a ausência de efetiva comprovação da quitação dos débitos atinente aos cheques n. 4 e 6. Porém, permanece a irregularidade consistente na emissão de cheque, no valor de R$ 179,68, para pagamento de Dolomiten Com. de Comb. e Lubr. Ltda, que não foi realizada de forma cruzada.

Pontua-se que a legislação eleitoral estabelece a necessidade de que os cheques utilizados para adimplemento de gastos devem ser emitidos na forma nominal e cruzada, conforme o disposto no artigo 38, inciso I, da Res. TSE n. 23.607/2019. Tal sistemática, com o condão de conferir transparência aos recursos aplicados na campanha, visa a triangulação do pagamento entre prestador de contas, fornecedor e instituição bancária, que indicará a conta bancária que efetivamente foi destinatária do recurso.

Nesse sentido, segue a jurisprudência:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DESAPROVAÇÃO. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS ORIUNDOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. GASTOS E PAGAMENTOS COM VERBAS DA CONTA “OUTROS RECURSOS”. DESPESAS NÃO COMPROVADAS. CARACTERIZADAS COMO DÍVIDAS DE CAMPANHA. MANTIDA A DESAPROVAÇÃO. REDUÇÃO DO VALOR A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de candidato, em razão da falta de comprovação de gastos eleitorais, configurando a utilização de recursos de origem não identificada. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

[...]

3. Descumprimento dos requisitos encartados nos arts. 32 e 38 da Resolução TSE n. 23.607/19. Forma de pagamento com verbas do FEFC e comprovação das despesas e do pagamento com valores da conta “Outros Recursos”. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 determina que os gastos eleitorais de natureza financeira só podem ser efetuados por meio de cheque nominal cruzado, transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário, débito em conta, ou cartão de débito da conta bancária. Na hipótese, sendo o pagamento realizado por meio de cheque, porém não nominal e cruzado, resta inviabilizado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade a receitas e gastos de campanha.

[...]

5. Os recursos do FEFC utilizados indevidamente devem ser destinados ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE 23.607/19. Já as despesas não comprovadas, com valores oriundos da conta “Outros Recursos”, constituem dívidas de campanha, e não sobras.

6. Parcial provimento. Mantida a desaprovação das contas. Redução do valor a ser recolhido ao erário.

(Recurso Eleitoral n 060029071, ACÓRDÃO de 02/05/2022, Relator ROGERIO FAVRETO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 04/05/2022)

(Grifei.)

2. Limite de gastos e autofinanciamento:

O parecer conclusivo aponta ainda que o candidato excedeu ao limite de gastos com aluguel de veículos previsto no artigo 42, inciso II, da Res. TSE n. 23.607/2019, bem como o de autofinanciamento regulamentado no artigo 27, § 1º, da Res. TSE n. 23.607/2019.

Para a locação de veículos a legislação de regência estabelece em 20% o teto de despesas desta natureza em relação ao total de gastos de campanha. No caso dos presentes autos o candidato registrou R$ 4.048,68 de obrigações contraídas, acarretando em um teto de R$ 809,74 para o aluguel de automóveis. Contudo, empregou R$ 1.203,37, excedendo em R$ 393,63 o limite estabelecido.

Já a extrapolação do limite de autofinanciamento decorre do emprego de R$ 2.869,00 de recursos próprios na campanha, enquanto o teto estabelecido é de R$ 1.598,51, que perfaz 10% do limite de gastos previsto para o cargo de vereador em um município do porte de Pareci Novo. Dessa forma, excedeu em R$ 1.270,49 o limite de recursos próprios passíveis de investimento no prélio eleitoral.

O prestador de contas aduz que a despesa realizada pelo candidato é módica em em relação ao total permitido para o cargo, não podendo a locação do veículo ser interpretada como excessiva. Da mesma maneira, os recursos próprios aplicados são de baixo valor, de aproximadamente 2 salários mínimos, possuindo capacidade econômica para suportar tais despesas.

Das manifestações apresentadas pelo prestador pontuo que a legislação eleitoral indica parâmetros objetivos para a realização de gastos e para autofinanciamento, cujas ambas balizas foram ultrapassadas, não tendo as alegações trazidas o condão de afastar a irregularidade.

Assim, impõe-se o arbitramento da multa eleitoral prevista no artigo 17-B da Lei n. 9.504/97, a qual arbitro em R$ 635,25, equivalente a 50% do excesso.

3. Recursos de origem não identificada:

Por fim, a análise técnica apontou que o candidato registrou nas contas, como doação estimável em dinheiro, a locação de um veículo Fiat Mobi Like 1.0., da empresa Localiza Rent a Car S.A., pelo valor de R$ 1.203,37.

A locação foi realizada e faturada para a pessoa física do candidato, que realizou o pagamento com recursos recursos próprios que não transitaram pela conta bancária aberta para a movimentação financeira de campanha, com posterior contabilização nas contas como estimável em dinheiro.

Tal operação é irregular.

Conforme determinação do artigo 25, caput, da Res. TSE n. 23.607/2019, os bens doados por pessoas físicas devem constituir produto do próprio patrimônio, situação que não ocorre no presente caso, onde o bem foi locado de empresa terceira e doado de forma estimável para uso na campanha.

Ainda, o recurso utilizado para adimplemento da locação deve transitar pela conta bancária aberta para movimentação financeira de campanha, o que também não foi observado pelo candidato, caracterizando a grave irregularidade prevista no artigo 14 da Res. TSE n. 23.607/2019:

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou da candidata ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º) .

§ 1º Se comprovado o abuso do poder econômico por candidata ou candidato, será cancelado o registro da sua candidatura ou cassado o seu diploma, se já houver sido outorgado (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º) .

§ 2º O disposto no caput também se aplica à arrecadação de recursos para campanha eleitoral os quais não transitem pelas contas específicas previstas nesta Resolução.

Assim, deve o recurso ser recolhido ao Tesouro Nacional, com atualização monetária e juros moratórios, conforme previsão do artigo 32, inciso VI e § 3º, da Res. TSE n. 23.607/2019.

Dessa forma, examinadas as irregularidades, passo a realizar o juízo proporcionalidade e razoabilidade para fins de desaprovação ou aprovação com ressalvas das contas. No caso em tela, permanecem as seguintes irregularidades:

a) Gasto adimplido com outros recursos, que totalizam R$ 179,68, cujo cheque não foi emitido na forma cruzada (item 1 desta fundamentação);

b) Extrapolação do limite de gastos com locação de veículos, no montante de 393,63 (item 2 desta fundamentação);

c) Excesso de recursos próprios investidos em campanha, de R$ 1.270,49 (item 2 desta fundamentação);

d) Recursos caracterizados como de origem não identificada, no total de R$ 1.203,37 (item 3 desta fundamentação).

Analisadas as irregularidades, estas totalizam R$ 3.047,17 e perfazem 75,26% do total de receitas, ou seja, supera tanto o montante de R$ 1.064,10 e ao percentual de 10% costumeiramente adotados como balizas para a aprovação com ressalvas das contas, impondo sua desaprovação.

Nesse sentido, segue a jurisprudência:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. CANDIDATOS. DESAPROVADAS. DESPESAS COM INSTALAÇÃO DE COMITÊ DE CAMPANHA. COMPROVAÇÃO. REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. POSSIBILIDADE. IRREGULARIDADES REMANESCENTES. PERCENTUAL INEXPRESSIVO NO CONTEXTO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. PRECEDENTES. PROVIMENTO MONOCRÁTICO DO RECURSO ESPECIAL PARA APROVAR, COM RESSALVAS, AS CONTAS DOS RECORRENTES. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. AGRAVO DESPROVIDO.

1. O reenquadramento jurídico dos fatos, quando cabível, é restrito às premissas assentadas pela instância regional e não se confunde com o reexame e a revaloração do caderno probatório, providência incabível em sede de recurso especial, a teor do disposto na Súmula nº 24/TSE.

2. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral tem admitido a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para superação de irregularidades que representem valor absoluto diminuto, ainda que o percentual no total da arrecadação seja elevado. Precedentes.

3. Adota-se como balizas, para as prestações de contas de candidatos, o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) como espécie de "tarifação do princípio da insignificância" como valor máximo absoluto entendido como diminuto e, ainda que superado o valor de 1.000 UFIRs, é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aquilatar se o valor total das irregularidades não superam 10% do total da arrecadação ou da despesa, permitindo-se, então, a aprovação das contas com ressalvas.

4. Tal balizamento quanto aos aspectos quantitativos das prestações de contas não impede sua análise qualitativa. Dessa forma, além de sopesar o aspecto quantitativo descrito acima, há que se aferir se houve o comprometimento da confiabilidade das contas (aspecto qualitativo). Consequentemente, mesmo quando o valor apontado como irregular representar pequeno montante em termos absolutos ou ínfimo percentual dos recursos, eventual afetação à transparência da contabilidade pode ensejar a desaprovação das contas.

5. No caso dos autos, o diminuto percentual das falhas detectadas (0,38%) - em relação ao valor absoluto arrecadado em campanha - não representa gravidade capaz de macular a regularidade das contas.

6. Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 0601473-67.2018.6.24.0000, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data 07.5.2020.)

(Grifei.)

III - DISPOSITIVO:

Ante o exposto, julgo DESAPROVADAS as contas prestadas por ANTONIO GELCI DE MELLO, candidato ao cargo de VEREADOR de PARECI NOVO-RS nas eleições municipais 2024, forte no artigo 74, inciso III, da Res. TSE n. 23.607/2019, cominando ao prestador multa no valor de R$ 635,25, a ser quitada no prazo de 30 dias do trânsito em julgado, e determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 1.203,37, com atualização monetária e juros moratórios.

 

 

Em relação ao cheque no valor de R$ 179,68, que não foi emitido na forma cruzada, em que pese seja possível verificar que a cártula foi compensada em favor de DOLOMITEN COMERCIO DE COMBUSTIVEIS E LUB  31.394.388/0001-86, a irregularidade em face do quanto previsto no art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 permanece, não havendo reparos à sentença.

No que diz respeito ao excesso do limite de gastos com locação de veículos, no montante de R$ 393,63, e ao excesso de recursos próprios investidos em campanha, no montante de R$ 1.270,49, da mesma forma nenhum reparo à sentença.

O recorrente foi condenado à multa apenas em relação ao excesso do autofinanciamento regulamentado no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, no percentual de 50% (R$ 1.270,49), ou seja, R$ 635,25, percentual arbitrado de forma razoável em face do montante da irregularidade.

E, por último, a falha no valor de R$ 1.203,37, em razão da locação de veículo realizada e faturada para a pessoa física do candidato, a partir de recursos próprios e com posterior contabilização nas contas como estimável em dinheiro.

O recorrente alega que “o valor despendido com locação de veículo tem como origem recursos próprios e foram indicados como estimáveis em dinheiro, não podendo representar recursos de origem não identificada, representando inclusive incongruência lógica indicar tais recursos como tal. Não é possível que, sobre o mesmo gasto exista aplicação de dupla penalidade. Ou se trata de utilização de recursos próprios com autofinanciamento de campanha ou utilização de recursos de origem não identifica”.

Os argumentos não possuem o condão de alterar a decisão recorrida.

Na espécie, o veículo somente poderia ser qualificado como recurso estimável em dinheiro se houvesse a comprovação de que o bem estimável (veículo) integrava o patrimônio do cedente (art. 25, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19).


 

Art. 25, da Resolução 23.607/19:

Os bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas devem constituir produto de seu próprio serviço, de suas atividades econômicas e, no caso dos bens, devem integrar seu patrimônio.

 

Não é o caso dos autos.

Com efeito, foi declarado pelo próprio recorrente que o veículo Fiat Mobi Like 1.0., da Empresa Localiza Rent a Car S.A., cedido para a campanha eleitoral, foi objeto de locação (ID 45805006).

Não sendo o proprietário do veículo, o valor despendido com a locação deveria ter sido quitado com recursos que tenham circulado pela conta bancária da campanha para movimentação financeira.

Como tal despesa não foi paga com recursos provenientes de contas específicas, considera-se que foram utilizados na campanha recursos de origem não identificada, caracterizando dessa forma a irregularidade prevista no art. 14 da Resolução TSE n. 23.607/19, a qual tem como consequência a desaprovação da prestação de contas.

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou da candidata ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º) .

 

Assim, diante da não comprovação da origem dos recursos utilizados na campanha, considera-se irregular o montante de R$ 1.203,37, passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme os arts. 14 e 32 da Resolução TSE n. 23.607/19

No mesmo sentido, o ínclito Parecer do Procurador Regional Eleitoral (ID 45811227):

Assim, o carro foi locado de terceiro com o intuito de prestar a doação para a campanha, não sendo o veículo parte do patrimônio do candidato no momento da campanha. Dessa forma, tais recursos não transitaram na conta corrente para que a despesa pudesse regularmente ser quitada, bem como o montante irregular ultrapassa os 10% previstos para aplicação do princípio da proporcionalidade e razoabilidade.

 

Tendo em vista que as irregularidades presentes na prestação de contas somam R$ 3.047,17 e representam 75,26% do total de receitas, estando tanto o valor (R$ 1.064,10) como o percentual (10%) muito acima dos parâmetros utilizados para aprovação com ressalvas pela Justiça Eleitoral, é de ser mantido igualmente o juízo de desaprovação.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.