REl - 0600212-26.2024.6.21.0005 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/06/2025 00:00 a 06/06/2025 23:59

VOTO

O recurso é tempestivo e tem presentes os demais pressupostos de admissibilidade, de forma que merece conhecimento.

No mérito, PATRÍCIA FELIX SERRAT FARIAS recorre contra a sentença que desaprovou a prestação de contas referente ao cargo de vereadora no Município de Alegrete. A decisão hostilizada determinou recolhimento no valor de R$ 8.150,83 (oito mil, cento e cinquenta reais com oitenta e três centavos). A questão central da irresignação diz respeito a irregularidades nos contratos de prestação de serviço de militantes - cabos eleitorais, apresentados pela prestadora entre os gastos com pessoal, em afronta ao art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

VII - remuneração ou gratificação de qualquer espécie paga a quem preste serviço a candidatas ou candidatos e a partidos políticos;

(…)

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

A recorrente alega que os contratos celebrados seguem modelo padrão, mas cada prestador de serviço desempenhou funções distintas e essenciais à estrutura da campanha, o que torna inaplicável a conclusão de que os contratos foram indevidos. Para individualizar os contratos, apresenta declarações dos prestadores de serviço.

Nomeadamente, os contratos considerados irregulares pela sentença foram formalizados com (i) Crislei Iarto Jacques (R$ 3.150,83); (ii) Caroline Ross dos Santos Soares (R$ 3.000,00); e (iii) Alisson Amaral Velasques (R$ 2.000,00). Além desses, a prestadora firmou contratos com Sérgio Gomes Velasques (R$ 2.000,00), Caroline Pereira da Silva (R$ 1.780,00) e Nara Rosane Martins do Amaral (R$ 2.200,00), tidos como regulares.

Todos os documentos descrevem a atividade como a função de cabo eleitoral, nas Eleições 2024, a realizar-se de Segunda-feira a Sexta-feira, das 08h às 18h, com intervalo de 30 minutos. Aos sábados, de 14h às 18h.

Pois bem.

No relativo às declarações acostadas à peça recursal, mostra-se nítido possuírem o objetivo de confirmar a tese de irresignação. As manifestações foram elaboradas após a prolação da sentença - ou seja, não são contemporâneas ao desenvolvimento das atividades. Conforme tais documentos, Crislei teria coordenado as atividades de divulgação da campanha em 64 (sessenta e quatro) bairros; Caroline, coordenado as atividades no interior do município, e Alisson, trabalhado na divulgação da campanha, através de plataformas digitais.

Ora, tal espécie de prova não pode ter peso definitivo. Aliás, na linha do entendimento ministerial, entendo que as declarações se mostram genéricas, não possuem força para desconstituir o contrato celebrado, quer pela data em que elaborados, quer pelo conteúdo, que, de forma nítida, foi, a posteriori, direcionado tendenciosamente a respaldar o recurso. Cito julgados:

ELEIÇÕES 2022. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. GASTOS COM PESSOAL. AUSÊNCIA DE DETALHAMENTO DO SERVIÇO E DA JUSTIFICATIVA DO PREÇO CONTRATADO. DEVOLUÇÃO DO VALOR IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. DESPESAS COM RECURSOS DO FEFC. IRREGULARIDADE QUE APRESENTA VALOR E PERCENTUAL ELEVADOS. GASTOS REALIZADOS ANTES DA ENTREGA DA PRESTAÇÃO DE CONTAS PARCIAL, MAS NÃO INFORMADOS À ÉPOCA. PERCENTUAL INEXPRESSIVO. CONTAS DESAPROVADAS.

1. Em se tratando de gastos com pessoal, ainda que comprovado o pagamento a destinatário identificado, a regularidade da despesa está condicionada à comprovação idônea, como por meio de contrato, que contenha o detalhamento do serviço prestado e sua confirmação pelo prestador de serviços. Inteligência do artigo 35, § 12, artigo 53, inciso II, e artigo 60 da Resolução n º 23.607/2019 do TSE. Precedente desta Corte.

1.1. Considera-se irregular o gasto com pessoal não comprovado mediante apresentação da justificativa do preço praticado e, tendo em vista que o pagamento foi realizado com recursos oriundos do Fundo Especial de Financiamento da Campanha, é cogente a devolução do valor irregular ao Tesouro Nacional, na forma do artigo 79, § 1º, da Resolução nº 23.607/2019 do TSE, aplicando-se como parâmetro para fixação do teto de gastos a todos que desempenharam a mesma função o valor da média simples.

2. A existência de gastos eleitorais realizados em data anterior à entrega das prestações de contas parcial, não informadas à época, que correspondam a percentual inexpressivo no contexto da campanha, não compromete a fiscalização das contas.

3. Irregularidades que apresentam valor total superior a R$ 1.064,00 e percentual acima de 10% da movimentação financeira de campanha impede a aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, ensejando a desaprovação das contas.

4. Contas desaprovadas, com determinação de devolução de valores ao Tesouro Nacional.

PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060310259, Acórdão, Relator Des. Guilherme Frederico Hernandes Denz, Publicação: DJE - DJE, 22.05.2024.

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO NÃO ELEITO. CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. FALHAS RELATIVAS À COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM O FUNDO PARTIDÁRIO. PROPRIEDADE DE BEM OBJETO DE CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL. SANADA A FALHA. DESPESA COM CONTRATAÇÃO DE PESSOAL. ATIVIDADE DE MILITÂNCIA E MOBILIZAÇÃO DE RUA. INOBSERVÂNCIA DO § 12 DO ART. 35 DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. DECLARAÇÃO UNILATERAL. BAIXO PERCENTUAL DA IRREGULARIDADE. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.
1. Prestação de contas de candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.
2. Identificadas falhas relativas à comprovação de gastos com o Fundo Partidário. 2.1. Não demonstrada propriedade de bem objeto de contrato de locação. Embora o contrato particular de compra e venda juntado pelo candidato esteja incompleto e não tenha sido apresentada cópia da matrícula do imóvel, a cópia da fatura de energia elétrica, de titularidade do locador, demonstra que este detinha a posse do bem e, portanto, possuía legitimidade para locar o imóvel. Sanada a falha. 2.2. Despesa realizada com contratação de pessoal. Atividade de militância e mobilização de rua. Ausência de indicação de elementos mencionados no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19. Apresentado contrato genérico de prestação de serviços, que não atende aos requisitos da resolução de regência. Ademais, a declaração confirmando os termos do contrato e sua execução foi produzida de forma unilateral e não é contemporânea à prestação dos serviços, circunstâncias que inviabilizam sua admissão para comprovar a regularidade do uso de recursos públicos.
3. A irregularidade remanescente representa 3,12% do total das receitas declaradas na campanha, percentual que autoriza a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas, na esteira da jurisprudência do TSE e deste Tribunal.
4. Aprovação com ressalvas. Determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060302949, Acórdão, Relator Des. Voltaire De Lima Moraes, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, 03.08.2023.

 

Assim, entendo devam ser considerados como prova soberana, no presente processo, os contratos firmados, e julgo por afastar unicamente a irregularidade vinculada a Alisson Amaral Velasques, pois, no caso deste militante, houve contrato firmado em valor equivalente aos demais considerados regulares.

Restam irregulares, portanto, as avenças pactuadas com Crislei Iarto Jacques e Caroline Ross dos Santos Soares, no total de R$6.150,83 (seis mil, cento e cinquenta reais com oitenta e três centavos) Destaco que o valor importa em 33,43% dos recursos recebidos (R$ 18.395,33) e, nominalmente, constitui quantia superior a R$ 1.064,10, valor admitido pela jurisprudência como “balizador, para as prestações de contas de candidatos” (...) “como espécie de tarifação do princípio da insignificância” (AgR–REspe n. 0601473–67, de relatoria do Ministro Edson Fachin, de 05.11.2019).

A situação não permite o juízo de aprovação com ressalvas e impõe a manutenção da sentença que desaprovou as contas, acompanhada de ordem de devolução, ao erário, da verba pública indevidamente utilizada.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso de PATRÍCIA FELIX SERRAT FARIAS, para (1) manter a desaprovação das contas  e (2) reduzir a ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional para o valor de R$ 6.150,83.