RE - 5482 - Sessão: 11/04/2019 às 18:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de Erechim (fls. 211-215v.) contra a sentença do Juízo da 20ª Zona Eleitoral (fls. 206-208), que desaprovou a sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2017 – a qual também é integrada pelos respectivos dirigentes partidários –, determinando o recolhimento da quantia de R$ 880,02 (oitocentos e oitenta reais e dois centavos) ao Tesouro Nacional, proveniente de fonte vedada, acrescida de multa de 5%, fixando, também, a suspensão de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano, com fundamento nos arts. 47 e 49 da Resolução TSE n. 23.464/15.

Em suas razões recursais, o partido pugnou pelo emprego da alteração promovida pela Lei n. 13.488/17, que conferiu nova redação ao art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, afastando qualquer ilegalidade na doação recebida de detentores de cargo comissionado, desde que filiados.

Invocou o recorrente o art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, pelo qual a lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Nesse sentido, sustentou que a revogação da lei anterior com efeito sancionatório implica a retroatividade da lei mais benéfica.

Alegou, também, que a Resolução do TSE que regulamentou a matéria, ao especificar o conceito de autoridade pública, viola texto da lei e, ainda, que a contribuição financeira de filiado detentor de cargo político é norma estatutária calcada na autonomia partidária prevista na Constituição Federal.

Ressaltou, ademais, que, não obstante defenda a legalidade de todas as doações, aquelas recebidas de Tobias Biazi – nomeado pelo seu alto grau de conhecimento técnico – merecem tratamento diferenciado, uma vez que foi nomeado no cargo de diretor no governo administrado por adversários do Partido dos Trabalhadores. Acrescentou ser um contrassenso concluir que estaria o servidor sendo pressionado a contribuir para o PT em face do exercício do cargo quando o mais razoável seria pressioná-lo para que cessassem as contribuições.

Nesta instância, com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso, mantendo-se integralmente a decisão de primeiro grau (fls. 221-225v.).

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

A sentença foi publicada no DEJERS no dia 26.11.2018 e o recurso interposto em 28.11.2018, dentro, portanto, do tríduo legal. Preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Mérito

O PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) do Município de Erechim interpôs recurso (fls. 211-215v.) contra sentença do Juízo da 20ª Zona Eleitoral (fls. 206-208), que desaprovou a sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2017, determinando o recolhimento da quantia de R$ 880,02 ao Tesouro Nacional, caracterizada como recurso proveniente de fonte vedada, acrescida da multa de 5%, bem como a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano.

De acordo com a sentença, a qual se baseou no parecer técnico conclusivo (fls. 168-170v.), a agremiação recebeu doações realizadas por servidores públicos e empregado de sociedade de economia mista, ocupantes dos cargos de chefe de gabinete da presidência da Câmara de Vereadores, diretor agropecuário, diretores administrativos, diretor de secretaria e Gerente-Geral do Banrisul, cargos esses demissíveis ad nutum, os quais permitem enquadrar, inequivocamente, os respectivos titulares no conceito de autoridade pública, constante no art. 12, inc. IV, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I – origem estrangeira;

II – pessoa jurídica;

III – pessoa física que exerça atividade comercial decorrente de concessão ou permissão; ou

IV – autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso IV do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta. (Grifei.)

Ao sentenciar o feito, o julgador de primeiro grau deixou de aplicar a alteração introduzida no art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, de acordo com a qual as doações efetuadas por pessoas físicas exercentes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, desde que filiados a partido político, passaram a ser admitidas no âmbito do ordenamento jurídico eleitoral, fazendo incidir, na hipótese, o disposto no art. 12, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, anteriormente citado.

Nesse aspecto, a sentença mostra-se irretocável, alinhando-se ao entendimento consolidado por esta Corte, na esteira da jurisprudência do TSE, no sentido de aplicar a legislação vigente à época do exercício financeiro a que se refere a prestação de contas, a exemplo das decisões a seguir colacionadas:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. SUSPENSÃO DO REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 31 DA LEI N. 9.096/95. LEI N. 13.488/17. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. IRRETROATIVIDADE. PREQUESTIONAMENTO. APLICAÇÃO. REJEIÇÃO.

Adoção da tese que prevalece neste Regional, a qual aplica a legislação vigente à época dos fatos, em relação à alteração legislativa do art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, com a redação dada pela Lei n. 13.488/17. Irretroatividade. Embargos destituídos de fundamento, sem a presença de qualquer das hipóteses previstas em lei para o seu manejo, nos termos do disposto nos arts. 275, caput, do Código Eleitoral e 1.022 do Código de Processo Civil. Aplicação do disposto no art. 1.025 do Código de Processo Civil para fins de prequestionamento. Rejeição.

(TRE-RS, RE n. 94-32, RELATOR DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL, julgado na sessão de 28.2.2018.) (Grifei.)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses. (Grifei.)

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 14-97, Relator LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN, julgado na sessão de 04.12.2017.) (Grifei.)

Dessa forma, embora o art. 12, § 1º, da Resolução TSE n. 23.546/17, invocado pelo recorrente em suas razões de recurso, contemple a regularidade das doações realizadas por filiados às agremiações partidárias, em consonância com a novel redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 conferida pela Lei n. 13.488/17, essa regra não alcança integralmente as prestações de contas referentes ao exercício financeiro de 2017, ora sob análise, uma vez que entrou em vigor na data da sua publicação, qual seja, 06.10.2017.

Oportuno ressaltar que a própria unidade técnica, no parecer conclusivo, tratou de excluir doações efetuadas por filiados a partir da data referida, à exceção daquela realizada por Lauren Cristiani Bianchi, não filiada, limitando-se a controvérsia às doações recebidas de filiados no período de 01.01.2017 a 05.10.2017 e àquelas recebidas de Lauren até o final do ano de 2017.

Correto, ainda, o entendimento do juízo de primeira instância relativo à autonomia partidária, no sentido de que “a estrutura interna, organização e funcionamento dos partidos pode ser livremente regulada, desde que respeitados os limites impostos pelo ordenamento jurídico”. Ressaltou o julgador que a regra vigente à época das doações (art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, regulamentado pelo art. 12, inc. IV, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15) proibia o recebimento, pelos partidos, de recursos oriundos de autoridades públicas.

Igualmente, alio-me ao entendimento do juízo monocrático no que se refere à doação auferida de Tobias Biazi. Isso porque a norma proibitiva em questão tem caráter objetivo, mostrando-se irrelevante o fato de o cargo ocupado pela autoridade ser em governo administrado por integrante de partido adversário. Em outras palavras, recebida a doação de servidor que se enquadre na categoria autoridade pública, nos termos da Resolução TSE n. 23.464/15, aplicável ao exercício em análise, não sobra espaço para análise subjetiva.

Por essas razões, deve ser mantido o comando de recolhimento do valor de R$ 880,02 ao Tesouro Nacional, por ter sido arrecadado de fontes vedadas pela legislação eleitoral, nos termos do art. 12, § 1º, c/c o art. 14, § 1º, ambos da Resolução TSE n. 23.464/15.

Todavia, cotejando-se o valor relativo à irregularidade com o montante arrecadado de R$ 31.144,10 (fl. 05), mostra-se possível a aprovação das contas com ressalvas, com base nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, pois resulta no pequeno percentual de 2,83%.

Nesse sentido a jurisprudência deste Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. DOAÇÃO DE CAMPANHA. PERMISSIONÁRIO DE SERVIÇO PÚBLICO. ART. 25, INC. III, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. FONTE VEDADA. VALOR DE PEQUENA MONTA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO PARCIAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. ELEIÇÕES 2016.

Recebimento de doação de permissionário de serviço público, caracterizado como fonte vedada, nos termos do disposto no art. 25, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15. Falha de pequena monta, representando 3,7% das receitas arrecadadas. Evidenciada a boa-fé da prestadora, que realizou todos os registros da doação impugnada e esclareceu os apontamentos quando solicitados. Retificação do destino do recolhimento do valor irregular para o Tesouro Nacional, uma vez que a doação já foi empregada na campanha. Aprovação com ressalvas.

Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n. 20936, ACÓRDÃO de 23.02.2018, Relator JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 31, Data: 27.02.2018, p. 2.)

PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. NÃO ATENDIDO O PERCENTUAL CORRESPONDENTE À PARTICIPAÇÃO FEMININA NA POLÍTICA. FALHAS DE REDUZIDO PERCENTUAL. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Definição expressa no texto do art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/15. Excluídos da proibição normativa os detentores de mandato eletivo, considerados fontes lícitas após entendimento firmado por este Tribunal. No caso, recebimento de recursos provenientes de titulares de cargos públicos com poder de autoridade. Inaplicabilidade das alterações sofridas no art. 31 da Lei n. 9.096/95, que excluiu a vedação às doações realizadas por ocupantes de cargos demissíveis ad nutum, desde que sejam filiados a partido político. Incidência da legislação vigente à época dos fatos.

2. Inobservância da regra de destinação do percentual mínimo de 5% dos recursos oriundos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas para promover e difundir a participação política das mulheres. Imposição do acréscimo de 2,5% no ano seguinte ao trânsito em julgado, bem como o recolhimento do valor correspondente ao Erário, ante a proibição legal de utilização da quantia para outra finalidade (art. 44, inc. V e § 5º da Lei n. 9.096/95).

3. Conjunto de falhas que não ultrapassam 10% do total arrecadado pelo partido. Aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

4. Aprovação com ressalvas.

(Prestação de Contas n. 487, ACÓRDÃO de 31.01.2018, Relator JORGE LUÍS DALL'AGNOL, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 17, Data: 05.02.2018, p. 7.)

Assim, o recurso comporta provimento parcial para o fim de aprovar as contas com ressalvas, afastando-se, por consequência, a sanção de multa sobre a quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional.

Igualmente, deve ser afastada a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, em conformidade com a jurisprudência firmada por esta Corte, como se observa no acórdão relativo ao RE n. 45-86, da lavra do Des. João Batista Pinto Silveira, do qual extraio o seguinte excerto:

(...) no tocante à sanção contida no art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.464/15, que prevê a suspensão do repasse de verbas do Fundo Partidário por um ano, em razão do recebimento de recursos de fontes vedadas, pondero que este Tribunal não tem aplicado a referida penalidade quando a ausência da gravidade da falha admite a aprovação das contas com ressalvas, situação que se enquadra na hipótese dos autos.

Com essas considerações, estou encaminhando o meu voto no sentido de dar provimento parcial ao recurso para aprovar com ressalvas as contas, mantendo a determinação de recolhimento da quantia de R$ 880,02 ao Tesouro Nacional.

Dispositivo

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) do Município de Erechim, para aprovar com ressalvas as contas relativas ao exercício financeiro de 2017 e, por consequência, afastar as sanções de multa e de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, mantendo a determinação de recolhimento de R$ 880,02 (oitocentos e oitenta reais e dois centavos) ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.