PC - 6290 - Sessão: 25/11/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se da prestação de contas do exercício de 2015 do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO PROGRESSISTA (PP).

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI) realizou exame preliminar da documentação apresentada, apontando a necessidade de sua complementação (fl. 141 e v.).

O partido trouxe aos autos petição e documentos (fls. 157-167) e, em exame da prestação de contas, o órgão técnico assinalou irregularidades, sugerindo a abertura de prazo para manifestação (fls. 303-308).

A agremiação colacionou esclarecimentos e documentação (fls. 343-603). Sobreveio parecer conclusivo opinando pela desaprovação das contas e indicando que as irregularidades sujeitas à devolução ao Tesouro Nacional representavam R$ 144.271,43 (fls. 606-616).

Em parecer, a Procuradoria Regional Eleitoral manifestou-se pela desaprovação das contas e determinação de recolhimento de R$ 174.921,31 ao Tesouro Nacional, bem como pela suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo prazo de um ano e pelo aumento de 2,5% do valor destinado à criação e à manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres no exercício subsequente ao trânsito em julgado da decisão proferida nestes autos (fls. 621-634v.).

O PARTIDO PROGRESSISTA (PP), CELSO BERNARDI e OTOMAR OLEQUES VIVIAN apresentaram defesa e documentos, postulando a produção de provas (fls. 641-740), sendo os autos, na sequência, remetidos à Secretaria de Controle Interno e Auditoria.

Na manifestação, o órgão técnico analisou os documentos juntados com a defesa, mantendo o teor do parecer conclusivo pela desaprovação das contas, alterando, porém, o valor a ser recolhido para R$ 30.506,85 (fls. 748-751v.).

Declarada encerrada a instrução (fl. 754), o partido e os dirigentes apresentaram alegações finais (fls. 760-769), sendo juntada manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 772-773v.).

Estando os autos conclusos, o PARTIDO PROGRESSISTA (PP), CELSO BERNARDI e OTOMAR OLEQUES VIVIAN apresentaram petição postulando a aplicação da Lei n. 13.831/19, que introduziu o art. 55-D na Lei n. 9.096/95 (fls. 775-777).

Com vista dos autos, o Ministério Público Eleitoral sustentou a existência de vício de inconstitucionalidade no dispositivo legal invocado (fls. 803-805).

É o relatório.

VOTO

Senhora Presidente,

Eminentes colegas:

Inicio por examinar a questão preliminar relativa à aplicação do art. 55-D, introduzido na Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.831, de 17 de maio de 2019, com o seguinte teor:

Art. 55-D. Ficam anistiadas as devoluções, as cobranças ou as transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições feitas em anos anteriores por servidores públicos que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político.

Como a questão do recebimento de recursos oriundos de fonte vedada – doações ou contribuições feitas no exercício financeiro em questão por servidores públicos que exerciam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração – será examinada neste julgamento, cabe a apreciação incidental da constitucionalidade do mencionado dispositivo.

Em relação ao recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, considerado, nesse momento, decorrência possível acaso reconhecida concretamente a irregularidade, esta Corte Eleitoral já se manifestou sobre a existência de vício na instituição da anistia, tendo reconhecido, à unanimidade, a inconstitucionalidade do dispositivo legal em comento, consoante ementa que transcrevo no ponto que interessa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. MATÉRIA PRELIMINAR ACOLHIDA. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95, INCLUÍDO PELA LEI N. 13.831/19. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA E DE FONTE VEDADA. PORCENTAGEM REPRESENTATIVA DAS IRREGULARIDADES DIANTE DA TOTALIDADE DOS RECURSOS ARRECADADOS NO PERÍODO. AFASTADA A APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE DESAPROVAÇÃO. REDUZIDO O PERÍODO DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. AFASTADA A CONDIÇÃO DE QUE A SANÇÃO SUBSISTA ATÉ QUE OS ESCLARECIMENTOS SEJAM ACEITOS PELA JUSTIÇA ELEITORAL. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Incidente de inconstitucionalidade suscitado pelo Procurador Regional Eleitoral. 1.1. O art. 55-D da Lei n. 9.096/95, norma legal objeto do aludido incidente, incluído pela Lei n. 13.831/19, assinala a anistia das devoluções, cobranças ou transferências ao Tesouro Nacional que tenham como causa as doações ou contribuições efetuadas, em anos anteriores, por servidores públicos os quais exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, desde que filiados a partido político. Ausência de notícia de que tenha havido oferecimento dos dados relativos à previsão de estimativa de impacto orçamentário e financeiro quando da tramitação da proposta legislativa prevendo a renúncia da receita. Omissão que afronta a exigência constitucional incluída pela EC n. 95/16 no art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. A legislação infraconstitucional igualmente exige seja comprovado o impacto orçamentário e financeiro à concessão de benefício que gere a diminuição de receita da União, nos termos do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal e arts. 114 e 116 da Lei n. 13.707/18. 1.2. A anistia das verbas consideradas como oriundas de fontes vedadas - benefício instituído em causa própria e sem qualquer finalidade pública subjacente - atenta ao princípio da moralidade administrativa e desvirtua a natureza jurídica do instituto. 1.3. Vício de inconstitucionalidade formal e material. Acolhimento da preliminar. Afastada, no caso concreto, a aplicação do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19. (...)

(...) (TRE/RS, Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, RE n. 35-92.2016.6.21.0005, Rel. Des. Eleitoral Gerson Fischmann, DEJERS de 23.8.2019.) (Grifei.)

Pelas razões acima elencadas, o art. 55-D da Lei n. 9.096/95 é inconstitucional por instituir hipótese de incidência destoante das normas extraídas da Constituição Federal, devendo ser afastada sua aplicação no caso concreto.

Assim, declaro incidentalmente a inconstitucionalidade do dispositivo.

Passando ao exame do mérito, consigno que, na análise da documentação relativa ao exercício de 2015, encaminhada pelo DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO PROGRESSISTA (PP), a Secretaria de Controle Interno e Auditoria (fls. 748-751v.) apontou:

a) o pagamento de despesas com recursos do Fundo Partidário sem a devida comprovação, no montante de R$ 2.729,00;

b) o recebimento de recursos oriundos de fonte vedada, no valor de R$ 11.292,20; e

c) o recebimento de recursos de origem não identificada, no valor de R$ 16.485,65.

Parte das irregularidades apontadas na análise técnica preliminar foi sanada durante a instrução processual, de forma que as máculas originalmente estimadas em R$ 144.271,43 (fls. 606-613) foram posteriormente redimensionadas para R$ 30.506,85.

Passo então a enfrentar individualmente os apontamentos.

1. Pagamento de despesas com recursos oriundos do Fundo Partidário sem a devida comprovação

A Resolução TSE n. 23.432/14, aplicável à espécie, estipula em seu art. 18 que a “comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço”.

A análise técnica procedida nos autos apontou que as notas fiscais juntadas nas fls. 309-313 e 316 não indicam o CNPJ do partido, de modo que não permitem seja aferida a esfera partidária (estadual, municipal ou nacional) do diretório que contratou a despesa.

O prestador de contas admite a incorreção e argumenta que tais irregularidades não devem ensejar a desaprovação das contas, sobretudo diante dos modestos valores envolvidos e da existência de outras notas fiscais regulares emitidas pelas mesmas empresas.

Aduz que a falha no controle dos elementos formais do documento fiscal não compromete a transparência e a confiabilidade da escrituração apresentada, de modo que a inconsistência deveria ser objeto de recomendação para contabilidades futuras.

A redação do art. 18 da Resolução TSE n. 23.432/14 é clara, de modo que a violação deve ser enfrentada de forma objetiva.

Ausente um dos elementos que deveria constar no documento fiscal, considera-se que o gasto não foi devidamente comprovado.

A aptidão da falha para determinação de rejeição das contas deverá ser analisada no contexto da movimentação do exercício, sendo que individualmente e apenas em razão de seu montante não se reveste de gravidade acentuada.

No entanto, mesmo que as falhas não ensejem, em tese, a desaprovação das contas, é impositiva a determinação de recolhimento, ao Tesouro Nacional, dos valores cujo gasto não foi devidamente comprovado.

Nesse sentido, colho do § 2º do art. 61 da resolução de regência que, em sendo verificada “impropriedade ou irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário ou no recebimento dos recursos de que tratam os arts. 12 e 13 desta Resolução, o órgão partidário e os seus responsáveis serão notificados para fins de devolução ao erário, se já não demonstrada a sua realização”.

Na mesma linha, trago precedente do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que: “A determinação de devolução aos cofres públicos decorre da natureza pública dos recursos que constituem o Fundo Partidário e independe da sorte do processo de prestação de contas, consoante previsto no art. 64 da Res.-TSE nº 23.432/2014” (Prestação de Contas n. 79347, Acórdão, Relatora Min. Luciana Lóssio, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 206, Data: 29.10.2015, p. 58).

Em razão da falha na comprovação da realização de despesas com recursos do Fundo Partidário, determino o recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 2.729,00.

2. Recebimento de recursos de fonte vedada

A unidade técnica apurou a existência de arrecadação de recursos advindos de contribuintes considerados autoridades pela Lei n. 9.096/95, caracterizados como fontes vedadas no exercício de 2015, no montante de R$ 24.531,56.

A redação do dispositivo aplicável da Lei dos Partidos Políticos era a seguinte, por ocasião do exercício em exame:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I - entidade ou governo estrangeiros;

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

[…]

Por seu turno, a Resolução TSE n. 23.432/14 estabelecia que:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I – entidade ou governo estrangeiro;

II – órgão ou entidade da Administração Pública Direta e Indireta, inclusive Fundações Públicas;

III – concessionário ou permissionário de serviço público;

IV – entidade de direito privado que receba, na condição de beneficiária, contribuição compulsória em virtude de disposição legal;

V – entidade de utilidade pública;

VI – entidade de classe ou sindical;

VII – pessoa jurídica sem fins lucrativos que receba recursos do exterior;

VIII – entidades beneficentes e religiosas;

IX – entidades esportivas;

X – organizações não governamentais que recebam recursos públicos;

XI – organizações da sociedade civil de interesse público;

XII – autoridades públicas;

XIII – fundações instituídas em virtude de lei e para cujos recursos concorram órgãos ou entidades governamentais; e

XIV – cartórios de serviços notariais e de registros.

[...]

§ 2º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso XII do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta. (Grifei.)

Diante da proibição de recebimento de doações provenientes de ocupantes de cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta, foi identificado o ingresso de recursos oriundos de doadores ocupantes de cargos de Delegado Regional, Coordenador, Chefe de Seção, Diretor, Chefe de Gabinete, Gerente Executivo e Chefe de Divisão de órgãos da administração pública direta e indireta, no valor de R$ 11.292,20 (tabela da fl. 749v.).

O prestador de contas argumenta que as doações foram consideradas originárias de autoridades, tomando por base apenas a nomenclatura dos cargos. Alega que tal presunção é ilegítima, visto que a atividade funcional dos doadores é aquela definida em lei, e que seria ônus do órgão técnico a comprovação da efetiva execução de tarefas de chefia e direção realizadas pelas supostas autoridades.

Ocorre que é incabível admitir que a lei tenha fixado nomenclatura dissonante entre o cargo e as atribuições a ele pertinentes, de maneira que reputo correto o enquadramento realizado mediante o cotejo entre a denominação atribuída à função e o plexo de atividades a ela imanentes.

A presunção de veracidade da lei impõe o ônus argumentativo a quem a conteste, encargo do qual não se desincumbiu o órgão partidário.

Portanto, os cargos comissionados ocupados pelos doadores ao tempo das liberalidades inserem-se no conceito de autoridade pública previsto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9096/95, com a redação vigente ao tempo dos fatos, conforme regulamentação insculpida no art. 12, inc. XII e § 2°, da Resolução TSE n. 23.432/14, acima transcritos, e a norma, à época dos fatos, coibia o recebimento pelo partido, de doações procedentes de autoridades públicas.

Anoto que a Lei n. 13.488/17 consagrou a faculdade de os filiados contribuírem para a manutenção dos partidos políticos, mas a aplicação retroativa de suas disposições é obstada, por serem as prestações de contas regidas pela lei vigente à época dos fatos – tempus regit actum -, em prol, resumidamente, dos princípios da isonomia e da segurança jurídica.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. DIRETÓRIO ESTADUAL DE PARTIDO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXECUÇÕES. INVIÁVEL O PARCELAMENTO MEDIANTE DESCONTOS DOS REPASSES DO FUNDO PARTIDÁRIO. POSSIBILIDADE COM RECURSOS PRÓPRIOS. ART. 44 DA LEI 9.096/95. RESOLUÇÃO TSE N. 21.841/04. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012.

1. As alterações introduzidas pela Lei n. 13.165/15 ao art. 37 da Lei 9.096/95 não se aplicam às prestações de contas partidárias de exercícios anteriores. A nova redação dada retirou a suspensão de quotas do Fundo Partidário e estabeleceu exclusivamente a imposição de multa de até 20% sobre o valor a ser recolhido. Tratando-se de prestação de contas do exercício financeiro de 2012, devem ser observadas as normas de direito material previstas na Resolução TSE n. 21.841/04.

2. Irretroatividade da Lei n. 13.488/17, in casu, por ser processo de exercício anterior a sua vigência. Obediência aos princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica.

3. Agremiação condenada a recolher valores ao Fundo Partidário e ao Tesouro Nacional. Possibilidade de parcelamento. Vedado o uso de recursos do Fundo Partidário na medida em que o art. 44 da lei 9.096/95 prevê hipóteses taxativas de sua aplicação.

4. Negado provimento. (TRE-RS, PC n. 6380, Acórdão de 31.01.2018, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS.)

Na hipótese, as doações realizadas no exercício de 2015, antes da edição da Lei n. 13.488/17, devem ser caracterizadas como recursos oriundos de autoridades – fontes vedadas pela legislação eleitoral.

Assim, não cabe a aplicação da nova disposição à hipótese, porque ocorrida antes da sua vigência.

Nessa linha de raciocínio, aliás, já há precedente deste Tribunal, cuja relatoria coube ao d. Des. João Batista Pinto Silveira:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS PROCEDENTES DE FONTES VEDADAS. DETENTORES DE CARGOS DEMISSÍVEIS AD NUTUM. IRRETROATIVIDADE DA LEI N. 13.488/17. DUPLO TRATAMENTO JURÍDICO DAS DOAÇÕES DE PESSOAS FÍSICAS EXERCENTES DE CARGOS DE CHEFIA E DIREÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. RETIFICAÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. REDUÇÃO DAS PENALIDADES DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DE MULTA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Recebimento de recursos procedentes de fontes vedadas. É proibido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da Administração direta ou indireta, quando ostentarem a condição de autoridades. No caso dos autos, identificado o recebimento de doações de recursos financeiros de ocupantes de funções de direção e chefia.

2. Irretroatividade da Lei n. 13.488/17. 2.1. Posicionamento, deste Tribunal, pela aplicação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 em sua redação original, devido à irretroatividade de novas disposições legais, ainda que mais benéficas ao prestador de contas, em homenagem aos princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica. 2.2. Duplo tratamento jurídico das doações de pessoas físicas exercentes de cargos de chefia e direção na Administração Pública, em decorrência da sucessão legislativa. Devido ao fato de a Lei n. 13.488/17 ter entrado em vigor no dia 06.10.2017, cumpre aplicar, em relação às contribuições anteriores a esta data, a redação original do art. 31 da Lei dos Partidos Políticos, bem como as prescrições do art. 12, inc. IV e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, as quais vedavam as contribuições ainda que provenientes de filiados a partidos políticos. Todavia, as contribuições realizadas a partir de 06.10.2017 devem observar o disposto no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95 em sua nova redação, que ressalva a licitude dos auxílios pecuniários quando advindos de filiados a partidos políticos.

[...]

Provimento parcial. (Recurso Eleitoral n. 14-74. Relator Des. João Batista Pinto Silveira. Julgado em 04.02.2019, unânime.) (Grifei.)

Forte nessas razões, reconheço como provenientes de fonte vedada as doações realizadas por autoridades ao partido político, no valor de R$ 11.292,20.

Conforme já exposto, declarada incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, fica afastada a possibilidade de reconhecimento da anistia, devendo ser determinado o recolhimento de R$ 11.292,20 ao Tesouro Nacional,  com fundamento no art. 61, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14.

3. Recebimento de recursos de origem não identificada

A análise técnica apontou que parte dos recursos recebidos pelo DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO PROGRESSISTA (PP) não teve os doadores devidamente identificados, contrariando o disposto no art. 7º da Resolução TSE n. 23.432/14.

A SCI consigna que “foram observados créditos identificados como '0236-CREDITOS TITULOS' e '0180-CREDITO MANUAL TITULO' nos extratos bancários disponibilizados pelo TSE. Entretanto, não há a identificação do CPF ou CNPJ do doador/contribuinte nos créditos” (fls. 748-751v.).

A grei argumenta que a indicação do CPF dos doadores consta no demonstrativo de doações recebidas e que as instituições bancárias somente passaram a adequar a identificação dos doadores nos extratos posteriormente à regulamentação da Justiça Eleitoral, de forma que a responsabilidade não pode ser atribuída ao partido político.

Defende que a análise conjunta dos documentos apresentados permite individualizar os doadores.

Como se percebe, o prestador de contas reconhece a ausência de identificação de parte das doações, bem como atribui a responsabilidade pela falha à instituição bancária.

O partido também sustenta ser possível especificar os doadores por outros documentos constantes nos autos.

Ocorre que a Resolução TSE n. 23.432/14 foi publicada em 16 de dezembro de 2014, de modo a regular a prestação de contas para o exercício seguinte – 2015, não sendo admissível a tese de que a agremiação foi surpreendida com a necessidade de individualização dos doadores quando do depósito dos valores.

O regulamento estabelece, de forma bastante clara, que as “contas bancárias somente poderão receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) do doador ou contribuinte (art. 7º)", de forma que não há como relevar que, durante todo o exercício, o partido tenha recebido depósitos de doações sem atentar para a norma.

A Resolução, diante da possibilidade de ingresso de recursos de origem não identificada, estipulou que os partidos políticos pudessem “recusar doação identificável que seja creditada em suas contas bancárias indevidamente, promovendo o estorno do valor para o doador identificado até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito” (art. 11, § 3º), o que impõe o dever de vigilância sobre os depósitos recebidos e afasta a responsabilidade da instituição bancária.

Mais uma vez, a norma que veda objetivamente o recebimento de valores em conta bancária sem identificação do CPF do doador impede que se busque em outros documentos produzidos pelo prestador de contas o esclarecimento acerca da origem dos valores, de forma que a irregularidade não pode ser afastada.

Assim, reconheço a irregularidade dos depósitos relacionados no verso da fl. 306, que perfazem o total de R$ 16.485,65 e caracterizam-se como recursos de origem não identificada.

Em atenção ao disposto no art. 61, § 2ª, da Resolução n. 23.432/14, deve ser determinado o recolhimento de tal montante ao Tesouro Nacional.

À guisa de conclusão, repriso que considerei como

- gastos não devidamente comprovados as despesas pagas com recursos do Fundo Partidário, no valor de R$ 2.729,00;

- provenientes de fonte vedada as doações realizadas por autoridades ao partido político, no valor de R$ 11.292,20;

- recursos de origem não identificada os depósitos relacionados no verso da fl. 306, que perfazem o total de R$ 16.485,65.

As máculas acima especificadas atingem o quantitativo de R$ 30.506,85 e representam 1,8% das receitas do exercício (R$ 1.691.704,81 – fl. 748v.), comprometimento financeiro que, considerando a boa-fé do prestador ao esclarecer os apontamentos do órgão técnico, permite a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas.

Ressalto que o reconhecimento da recepção de recursos de origem não identificada e de fonte vedada, bem como da irregularidade na aplicação dos recursos do Fundo Partidário impõem a determinação do recolhimento de R$ 30.506,85 ao Tesouro Nacional.

ANTE O EXPOSTO, DECLARO, incidentalmente, a inconstitucionalidade do art. 55-D da Lei n. 9.096/95, incluído pela Lei n. 13.831/19. No mérito, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas do exercício financeiro de 2015 do DIRETÓRIO ESTADUAL do PARTIDO PROGRESSISTA (PP) e pela determinação de recolhimento de R$ 30.506,85 (trinta mil, quinhentos e seis reais e oitenta e cinco centavos) ao Tesouro Nacional.

É como voto, senhora Presidente.