RE - 4578 - Sessão: 01/02/2019 às 10:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso contra decisão que aprovou com ressalvas a prestação de contas anual apresentada pelo PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO (PTB), do Município de Candelária – RS, relativa ao exercício de 2016.

Segundo a sentença (fls. 61-63), foram verificadas inconsistências e falhas que impedem a regular aprovação das contas, em especial a presença de créditos de origem não identificada, que representaram 100% das receitas recebidas pelo partido no ano de 2016.

O Juízo Zonal, atendendo aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade  - e afastada a existência de dolo ou má-fé -, decidiu por aprovar as contas com ressalvas, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional da totalidade dos valores recebidos sem identificação de origem.

Irresignado, vem aos autos o PTB (fls. 67-71) clamando pela reforma da decisão prolatada, argumentando, em síntese, que os valores que transitaram pelas contas bancárias têm origem identificada, embora o contador do partido tenha extraviado os comprovantes de depósitos feitos pelo presidente da agremiação, à época, para cobrir despesas de manutenção de conta.

Argumentou ainda que o valor de R$ 741,99 é irrisório e, alegando a ausência de dolo ou má-fé, combinada com o tamanho e  as condições do diretório municipal do partido, sustentou o afastamento da determinação de recolhimento.

A Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 74-87) manifestou-se pela nulidade da sentença por não aplicação da multa de até 20%, prevista no caput do art. 37 da Lei n. 9.096/95, tampouco da suspensão das quotas do Fundo Partidário conforme determina o art. 36, inc. I, da mesma Lei.

Em obediência ao efeito translativo dos recursos, pugnou a Procuradoria Regional Eleitoral que esta Corte dê vigência às normas cogentes previstas na Lei dos Partidos Políticos, aplicando as devidas sanções ao recorrente.

É o relatório.

VOTO

O Juízo a quo fundamentou a aprovação das contas com ressalvas nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, entendendo que, malgrado a irregularidade de crédito de recursos de origem não identificada represente 100% dos valores transitados pela conta bancária do partido, tais valores são de baixa expressão financeira, possibilitando a aprovação com ressalvas e consequente recolhimento dos valores tidos por irregulares ao Tesouro Nacional.

Quanto aos argumentos do recorrente, sorte não lhe assiste. Isso porque, ao pugnar que seja o Partido Trabalhista Brasileiro dispensado de recolher ao Tesouro Nacional os valores tidos por irregulares, estar-se-ia sustentando a desobediência a postulados basilares inscritos na legislação eleitoral sobre a regularidade das receitas partidárias, expressos tanto na Lei dos Partidos quanto em Resolução do TSE:

Art. 39 da Lei 9.096/95:

§ 3o As doações de recursos financeiros somente poderão ser efetuadas na conta do partido político por meio de:

II – depósitos em espécie devidamente identificados;

Res. 23.464/15

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I - o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF do doador ou contribuinte ou no CNPJ, em se tratando de partidos políticos ou candidatos:

a) não tenham sido informados; ou

b) se informados, sejam inválidos, inexistentes, nulos, cancelados ou, por qualquer outra razão, não sejam identificados;

Dessa forma, inexistente a possibilidade de acolhimento dos argumentos do partido, tendo em vista a imposição do art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15, senão vejamos:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 3º O não recolhimento dos recursos no prazo estabelecido neste artigo ou a sua utilização constitui irregularidade grave a ser apreciada no julgamento das contas.

Quanto à manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral, argumentando a necessidade da aplicação das sanções relacionadas à multa de até 20% sobre o valor recebido irregularmente, bem como da suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário, mister analisar cum grano salis.

Dispõe o art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 49. A desaprovação das contas do partido implicará a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento) (Lei nº 9.096/1995, art. 37).

Observe-se que a redação da previsão supramencionada invocada pelo Ministério Público dispõe explicitamente que, sempre que houver desaprovação das contas do partido, deve-se aplicar, como consequência, a multa de até 20% sobre o valor gerador da irregularidade e causador da proscrição das contas.

Entretanto, essencial rememorar que as contas do Partido Trabalhista Brasileiro foram aprovadas com ressalvas pelo juiz sentenciante, portanto, no caso concreto, não há a incidência da desaprovação necessária ao texto legal. Isso, por si só, afasta a imperatividade da aplicação da norma prevista no art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15, agindo corretamente, por conseguinte, o prolator da sentença.

Quanto à suspensão das quotas do Fundo Partidário, sua previsão legal está sintetizada na Resolução TSE n. 23.464/15, conforme transcrevo na íntegra abaixo:

Art. 47. Constatada a violação de normas legais ou estatutárias, o órgão partidário fica sujeito às seguintes sanções:

I - no caso de recebimento de recursos das fontes vedadas de que trata o art. 12, sem que tenham sido adotadas as providências de devolução à origem ou recolhimento ao Tesouro Nacional na forma do art. 14, o órgão partidário fica sujeito à suspensão da distribuição ou do repasse dos recursos provenientes do Fundo Partidário pelo período de um ano (Lei nº 9.096/1995, art. 36, inciso II);

Mister observar que a previsão do art. 47 citado não se aplica ao caso concreto, tendo em vista que objetiva cuidar dos casos em que tenha havido recebimento de recursos de fontes vedadas. Por essa razão, a única possibilidade de suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário aplicável ao caso concreto seria aquela inscrita no art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95, senão vejamos:

Art. 36. Constatada a violação de normas legais ou estatutárias, ficará o partido sujeito às seguintes sanções:

I - no caso de recursos de origem não mencionada ou esclarecida, fica suspenso o recebimento das quotas do fundo partidário até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral;

Contudo, é pacífica a jurisprudência deste tribunal de que tal suspensão só pode ser aplicada durante o curso do processo. Isso porque, se assim não fosse, criar-se-ia a possibilidade de causas sem coisa julgada, acaso o esclarecimento da origem dos recursos fosse eternamente recusado por esta justiça especializada.

Nesse sentido, segue decisão prolatada por este Tribunal no Recurso Eleitoral n. 2481, de relatoria do Des. Eleitoral Eduardo Augusto Dias Bainy, publicado em 26.11.2018:

O art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95 e o art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.464/15 disciplinam as consequências decorrentes do recebimento de recursos de origem não identificada:

Art. 36. Constatada a violação de normas legais ou estatutárias, ficará o partido sujeito às seguintes sanções:

I - no caso de recursos de origem não mencionada ou esclarecida, fica suspenso o recebimento das quotas do fundo partidário até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral;

Art. 47. Constatada a violação de normas legais ou estatutárias, o órgão partidário fica sujeito às seguintes sanções:

[...]

II – no caso de não recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos de origem não identificada de que trata o art. 13 desta resolução, deve ser suspensa a distribuição ou o repasse dos recursos provenientes do Fundo Partidário até que o esclarecimento da origem do recurso seja aceito pela Justiça Eleitoral (Lei nº 9.096/95, art. 36, I).

A sentença, contudo, não aplicou a determinação constante nos comandos normativos, mas apenas ordenou o recolhimento, ao Tesouro Nacional, dos valores irregularmente arrecadados.

Em que pese a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral, anoto que a penalidade da suspensão de recursos do Fundo Partidário, até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral, somente tem sentido durante a tramitação do feito e não após a prolação da decisão que julga as contas, pois nela deve ser determinado que os recursos de origem não identificada retornem integralmente aos cofres públicos, como ocorreu no particular.

Interpretação diversa poderia redundar na imposição de sanção por tempo infinito, penalidade não admitida no ordenamento jurídico interno, sendo certo que após a prolação da sentença sequer teria lugar o exame de novos esclarecimentos.

Logo, a interpretação teleológica do texto do art. 36, inc. I, da Lei dos Partidos Políticos evidencia que o repasse de novas quotas do Fundo Partidário somente ficará suspenso até que a justificativa seja aceita pela Justiça Eleitoral ou haja o julgamento do feito.

Assim, restam vencidos os argumentos do recorrente, pelas razões acima expostas, não devendo ser acolhida a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso para manter in totum a sentença prolatada, subsistindo o recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores irregularmente recebidos, totalizando R$741,99 (setecentos e quarenta e um reais e noventa e nove centavos).

É como voto, Sr. Presidente.