RE - 3121 - Sessão: 24/04/2019 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso eleitoral interposto pelo PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PCdoB) de Alegrete contra a sentença do Juízo da 5ª Zona Eleitoral (fls. 151-156), que desaprovou as contas da agremiação referentes à movimentação financeira do exercício de 2016, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada e de fonte vedada, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional da importância de R$ 3.260,00, acrescida de multa de 12% sobre esse montante, bem como a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 8 meses ou até que os esclarecimentos sobre a origem dos recursos sejam aceitos pela Justiça Eleitoral.

Em seu recurso (fls. 160-162), o partido alega que a verba considerada de origem não identificada representa irrisórios R$ 220,00, cabendo a aplicação do princípio da insignificância. Quanto às contribuições realizadas por detentora da condição de autoridade pública, sustenta que a atual Resolução TSE n. 23.546/17 permite as receitas, desde que a doadora seja filiada a partido político. Ressalta que a doação perfaz o valor de R$ 3.210,00, admitindo a aplicação do princípio da proporcionalidade. Afirma que a doadora tinha à época dos fatos outras fontes de renda, de modo que os valores questionados não são exclusivamente oriundos de atividade em cargo comissionado. Por fim, requer a aprovação das contas.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 170-179v.).

É o relatório.

VOTO

O recorrente teve suas contas partidárias relativas ao exercício de 2016 julgadas desaprovadas em razão do reconhecimento de duas irregularidades: a) recursos depositados por meio do CNPJ do próprio partido, ou seja, sem a identificação do doador originário, no montante de R$ 220,00; e b) doações realizadas por Virgínia de Almeida Pires do Rosário enquanto detentora do cargo de diretora de apoio da gestão educacional na Prefeitura de Alegrete, enquadrada como fonte vedada de recursos, no somatório de R$ 3.040,00.

No tocante ao primeiro apontamento, os arts. 7º, caput, e 8º, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15 estipulam que as transações bancárias em favor do prestador de contas devem ser feitas, obrigatoriamente, mediante cheque cruzado ou depósito bancário direto, sempre com identificação do CPF do doador. Transcrevo o teor dos dispositivos em comento:

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

Art. 8º As doações realizadas ao partido político podem ser feitas diretamente aos órgãos de direção nacional, estadual, distrital, municipal e zonal, que devem remeter à Justiça Eleitoral e aos órgãos hierarquicamente superiores do partido o demonstrativo de seu recebimento e respectiva destinação, acompanhado do balanço contábil (Lei nº 9.096, de 1995, art. 39, § 1º).

§1º As doações em recursos financeiros devem ser, obrigatoriamente, efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político ou por depósito bancário diretamente na conta do partido político (Lei nº 9.096/95, art. 39, § 3º).

§ 2º O depósito bancário previsto no § 1º deste artigo deve ser realizado nas contas “Doações para Campanha” ou “Outros Recursos”, conforme sua destinação, sendo admitida sua efetivação por qualquer meio de transação bancária no qual o CPF do doador ou contribuinte, ou o CNPJ no caso de partidos políticos ou candidatos, sejam obrigatoriamente identificados. (Grifou-se.)

A partir dos extratos bancários eletrônicos disponibilizados pelo TSE, o examinador técnico apontou um conjunto de quatro depósitos, perfazendo o total de R$ 220,00, cujo doador foi identificado com o CNPJ do próprio diretório partidário.

Com efeito, a jurisprudência deste Tribunal pacificou o entendimento de que a carência de identificação da fonte originária do recurso na própria operação bancária é falha grave que impede o controle da Justiça Eleitoral sobre eventuais fontes vedadas e prejudica a transparência das declarações contábeis.

Na mesma linha, colaciono recente julgado deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA. EXISTÊNCIA DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. FALHAS DE REDUZIDA REPRESENTATIVIDADE FRENTE À MOVIMENTAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Entendimento deste Tribunal no sentido de que a nova redação dada ao art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, pela Lei n. 13.488/17, denominada Reforma Eleitoral, não se aplica às doações realizadas antes da vigência do normativo, ou seja, 06.10.2017.

2. Não é permitido aos partidos políticos receber doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta quando detenham a condição de autoridades. Recursos procedentes de ocupantes de cargos de chefia e direção, todos considerados fontes vedadas, enquadrados na proibição do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95.

3. As receitas obtidas por meio de depósito com a indicação do CNPJ do próprio partido devem ser consideradas como de origem não identificada, uma vez descumprido o preceito do art. 7º da Resolução TSE n. 23.464/15.

4. As falhas apuradas totalizam 3,41% do total de recursos arrecadados pela agremiação. Aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Determinado o recolhimento do valor recebido de forma irregular ao Tesouro Nacional.

5. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS – PC 24-44.2017.6.21.0000, relator Des. Eleitoral João Batista Pinto Silveira, julgado em 23.10.2018, unânime.) (Grifei.)

Em suas razões recursais, a agremiação admite a infringência das disposições normativas e reconhece a impossibilidade de identificação do doador originário dos valores, limitando-se a suscitar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da insignificância, diante da diminuta quantia em questão.

Embora o valor seja, de fato, singelo, a falha não pode ser individualmente tomada, segregada das demais irregularidades eventualmente reconhecidas, para se concluir que o quantum em evidência não compromete o exame das contas.

Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade incidem quando todo o conjunto de irregularidades não guardar relevância em relação ao total das arrecadações auferidas no exercício. Assim, imprescindível a continuidade da análise para que se verifique a aplicação ou não dos aludidos postulados ao presente caso.

Por sua vez, a segunda irregularidade refere-se ao recebimento de doações provenientes de pessoa física detentora de cargo demissível ad nutum na Prefeitura de Alegrete, enquadrada como fonte vedada de recursos, no total de R$ 3.040,00.

Diversamente do pretendido pelo recorrente, a novel Resolução TSE n. 23.546/17 não deve ser aplicada no exame de mérito de exercícios financeiros anteriores à sua vigência. Tratando-se de contas relativas ao ano de 2016, o exame da contabilidade observa as prescrições normativas contidas na Resolução TSE n. 23.464/15, vigentes ao tempo dos fatos, consoante expressamente estabelece o art. 65, caput e § 3º, da Resolução TSE n. 23.546/17:

Art. 65. As disposições previstas nesta resolução não atingem o mérito dos processos de prestação de contas relativos aos exercícios anteriores ao de 2018.

[…].

§ 3º As irregularidades e impropriedades contidas nas prestações de contas devem ser analisadas de acordo com as regras vigentes no respectivo exercício, observando-se que:

[…].

III - as prestações de contas relativas aos exercícios de 2016 e 2017 devem ser examinadas de acordo com as regras previstas na Resolução-TSE nº 23.464, de 17 de dezembro de 2015; e

(Grifei.)

Cumpre registrar, ainda, que, para o exame das contas, está sendo considerado o texto do art. 31, e seus incisos, da Lei n. 9.096/95 vigente ao tempo do exercício financeiro de 2016, sem as posteriores alterações legislativas.

Nesse tocante, observo que este Tribunal, ao apreciar a aplicação da Lei n. 13.488/17, que facultou as doações de filiados a partidos políticos, ainda que ocupantes de cargos demissíveis ad nutum na administração direta ou indireta, mediante juízo de ponderação de valores, sedimentou o posicionamento pela irretroatividade das novas disposições legais, ainda que eventualmente mais benéficas ao prestador de contas, tendo preponderado os princípios do tempus regit actum, da isonomia e da segurança jurídica.

Nesses termos, destaco o seguinte julgado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

(...)

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

(...)

6. Provimento parcial.

(TRE-RS; Recurso Eleitoral n. 14-97, Relator: Des. Eleitoral Luciano André Losekann, julgado em 04.12.2017, por unanimidade.) (Grifei.)

O TSE adota o mesmo entendimento sobre o tema, no sentido de que, “considerando tratar-se de direito material de natureza não penal e observando-se o princípio da irretroatividade, o dispositivo legal deve ser aplicado aos fatos ocorridos durante a sua vigência, segundo o princípio tempus regit actum, à luz do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro” (TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 5079, Relator Min. Admar Gonzaga, DJE: 19.12.2018.).

Dessarte, não se aplica ao feito, de forma retroativa, a alteração promovida pela Lei n. 13.488/17 que excluiu do rol de fontes vedadas a doação de filiado, ainda que exercente de função ou cargo público demissível ad nutum.

Fixadas tais premissas, é incontroverso que o cargo comissionado ocupado pela doadora ao tempo das liberalidades insere-se no conceito de autoridade pública previsto no art. 31, inc. II, da Lei n. 9096/95, conforme regulamentação insculpida no art. 12, inc. IV e § 1°, da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(…)

IV – autoridades públicas.

(…)

§1º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso IV do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

(Grifei.)

A proscrição legal da receita não é mitigada pelo fato de o doador possuir outras fontes de renda, como alega o recorrente. Primeiro, porque tal ressalva não é feita pela norma de regência. Segundo, porque não é possível separar os proventos pelas diferentes origens, que, uma vez percebidos, misturam-se no patrimônio da mesma pessoa física.

Seguindo essa linha de raciocínio, é certo que a percepção de rendimentos decorrentes do cargo público de livre nomeação e exoneração por quem já possui outras fontes de rendimentos confere ainda melhores condições financeiras ao doador, refletindo invariavelmente nas contribuições realizadas.

Cito precedente deste Tribunal com idêntico entendimento:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2016. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. CONTRIBUIÇÕES DE OCUPANTES DE CARGOS DEMISSÍVEIS “AD NUTUM”. CONCEITO DE AUTORIDADE. MANTIDA A SENTENÇA DE DESAPROVAÇÃO. MANUTENÇÃO DA PENALIDADE DE RECOLHIMENTO DO VALOR INDEVIDO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO PARCIAL.

Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis “ad nutum” da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou de chefia.

Contribuições recebidas de cargo de chefia e direção, enquadrados no conceito de autoridade pública, nos termos definidos pela jurisprudência. Percepção de recursos de outra fonte de renda pelo doador não altera a ilicitude da doação.

A desaprovação das contas enseja o recolhimento do valor irregular para o Tesouro Nacional acrescido de multa de até 20%.

A percepção de recursos de fonte vedada tem como consequência específica, prevista no art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95 e no art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.464/15, a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

Provimento parcial do recurso para reduzir o período de suspensão do repasse do Fundo Partidário para 06 meses.

(TRE-RS; Recurso Eleitoral n. 50-83.2017.6.21.0148, Relator: Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos, julgado em 20.6.2018, por unanimidade.) (Grifei.)

Finalmente, as receitas irregularmente recebidas alcançam a quantia de R$ 3.260,00, correspondente à soma dos recursos de origem não identificada (R$ 220,00) com as receitas de fonte vedada (R$ 3.040,00). A cifra total representa 60,25% do total de recursos arrecadados (R$ 5.411,00), mostrando-se inviável a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade frente à magnitude percentual e absoluta das irregularidades no universo das presentes contas.

Em relação às sanções aplicadas, o tempo de suspensão do Fundo Partidário, em razão do recebimento de receitas de fonte vedada, foi fixado pela sentença em 8 meses, e a multa de até 20% sobre o valor irregular, decorrente da desaprovação das contas, na forma do art. 37 da Lei n. 9.096/95, restou aplicada em 12% do valor irregular.

Percebe-se que o magistrado a quo empregou um critério equitativo, dosando as penalidades em percentuais equivalentes aos das irregularidades frente ao total de receitas auferidas, em conformidade com os critérios de fixação adotados por este Tribunal, conforme precedente a seguir transcrito:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS ADVINDOS DE FONTES VEDADAS. APLICAÇÃO DE MULTA DE 10% SOBRE O VALOR RECEBIDO INDEVIDAMENTE. ART. 37, CAPUT, DA LEI N. 9.096/95. ALEGADA DUPLA PENALIDADE. INEXISTENTE. EXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL DA SANÇÃO. FIXAÇÃO DAS SANÇÕES MEDIANTE DA ANÁLISE DE PARÂMETROS OBJETIVOS E DAS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. DESPROVIMENTO.

1. Recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas. Alegada dupla penalidade, decorrente da determinação de recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional e da multa aplicada. A devolução dos valores oriundos de fonte vedada é apenas consequência da própria irregularidade. As únicas penalidades impostas foram a suspensão do repasse do Fundo Partidário por seis meses e a aplicação da multa proporcional de 10% sobre o valor irregularmente recebido.

2. Necessidade do estabelecimento de parâmetros mínimos para a dosimetria da sanção em prestação de contas, como decorrência da segurança jurídica e isonomia de tratamento. Fixação da penalidade em duas etapas. Em um primeiro momento, a multa é estabelecida entre 0 e 20%, objetivamente, de acordo com o percentual do montante irregular frente ao total de recursos movimentados. Em um segundo momento, a penalidade pode ser majorada ou minorada, sempre mediante fundamentação, a depender das peculiaridades do caso, tais como, natureza da irregularidade, gravidade da falha, grau de prejuízo à transparência, reincidência nas mesmas irregularidades ou evidente boa-fé e empenho do prestador em esclarecer seus gastos. Parâmetros também a serem empregados na fixação da suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário entre 01 e 12 meses.

3. Sentença exarada com observância aos parâmetros delineados, proporcional ao volume de irregularidades e às circuntâncias do caso.

4. Provimento negado.

(TRE/RS, RE 25-06, Rel. Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 11.02.2019.)

Da mesma forma, nada há que se reparar na sentença quanto à determinação de recolhimento dos valores de origem não identificada e de fonte vedada ao Tesouro Nacional, uma vez que consequência específica da percepção de tais espécies de receitas, como se extrai do art. 14, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Por outro lado, merece reparo a decisão no tocante à sanção de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, fixada, nos termos do art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95, até que o esclarecimento sobre a origem dos recursos seja aceito pela Justiça Eleitoral.

Da análise sistemática da regulamentação, verifica-se que a suspensão de quotas até que a origem dos recursos seja informada somente tem sentido durante a tramitação do feito, e não após a prolação da decisão que julga as contas, pois nela deve ser determinado que os recursos de origem não identificada retornem integralmente aos cofres públicos.

Interpretação diversa poderia redundar na imposição de sanção por tempo infinito, penalidade não admitida no ordenamento jurídico brasileiro, sendo certo que após a prolação da sentença sequer teria lugar o exame de eventuais novos esclarecimentos.

Logo, a interpretação teleológica do texto do art. 36, inc. I, da Lei dos Partidos Políticos evidencia que o repasse de novas quotas do Fundo Partidário somente ficará suspenso até que a justificativa seja aceita pela Justiça Eleitoral ou haja o julgamento do feito concluindo pela existência de recursos de origem não identificada.

A ilustrar referido posicionamento, elenco o seguinte julgado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. PERCEPÇÃO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO DO VALOR IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. AFASTADA A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE NOVAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

Recebimento de depósitos em espécie não identificados com o CPF do doador e outros dois depósitos com identificação do próprio partido como doador originário, sem emissão de recibo para quaisquer dessas operações, caracterizando o ingresso de receita de origem não identificada. Os esclarecimentos prestados pelo partido não conferem segurança e confiabilidade para se considerar a falha como sanada.

Manutenção da determinação de recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional acrescido de multa de 10%. Afastada a penalidade de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário até que o partido preste esclarecimentos à Justiça Eleitoral. A interpretação teleológica do texto do art. 36, inc. I, da Lei dos Partidos Políticos evidencia que o repasse de novas quotas do Fundo Partidário somente ficará suspenso até que a justificativa seja aceita pela Justiça Eleitoral ou haja o julgamento do feito.

Parcial provimento.

(TRE-RS – PC 23-57.2017.6.21.0033, relator Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 20.11.2018, unânime.) (Grifei.)

Assim, o período de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário deve ser fixado objetivamente em 8 meses, afastada a condição de que a origem do valor venha a ser aceita pela Justiça Eleitoral, nos termos da fundamentação acima.

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, apenas para afastar a condição de que a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário subsista até que os esclarecimentos sobre a origem dos recursos sejam aceitos pela Justiça Eleitoral.