E.Dcl. - 4957 - Sessão: 14/12/2018 às 09:30

RELATÓRIO

Trata-se de embargos de declaração opostos conjuntamente pelo DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PCdoB), por ADALBERTO LUIZ FRASSON e CORA MARIA TEIXEIRA CHIAPPETTA, e pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, em face do acórdão que, por unanimidade, aprovou com ressalvas as contas da agremiação, referentes ao exercício financeiro de 2016, e determinou o recolhimento da quantia de R$ 6.078,33 ao Tesouro Nacional, por tratar-se de recursos oriundos de fontes vedadas.

Nas razões apresentadas pelo PCdoB, por ADALBERTO LUIZ FRASSON e CORA MARIA TEIXEIRA CHIAPPETTA, os embargantes requerem a aplicação das alterações introduzidas no art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17 e o prequestionamento da matéria (fl. 193).

O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, por sua vez, alega que a decisão foi omissa quanto à quebra dos princípios da segurança jurídica, da isonomia e da paridade de armas no âmbito eleitoral, defendendo que as contribuições partidárias provenientes de detentores de mandato eletivo devem ser consideradas recursos de fontes vedadas de arrecadação. Colacionou jurisprudência e requereu o provimento do recurso com atribuição de efeitos infringentes (fls. 196-202).

É o relatório.

VOTO

Os embargos declaratórios são adequados, tempestivos e merecem conhecimento.

Inicialmente, verifico que as razões expendidas pelo PCdoB, por Adalberto Luiz Frasson e Cora Maria Teixeira Chiappetta apresentam inovação argumentativa ao postular a aplicação ao feito da nova redação do art. 31 da Lei dos Partidos Políticos, conferida pela Lei n. 13.488/17.

A questão não foi levantada pelas partes em nenhum momento ao longo da tramitação da demanda, sendo certo que, mesmo para fins de prequestionamento, somente são cabíveis os Embargos de Declaração nas hipóteses restritas do art. 1.022 do Código de Processo Civil.

Colaciono precedentes:

ELEIÇÕES 2010. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE COM O FIM DE DESCONSTITUIR ATOS PRATICADOS EM REPRESENTAÇÃO POR DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. OMISSÃO. INOCORRÊNCIA. INOVAÇÃO DE TESE RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA RELATIVA À OFENSA AO ART. 219 DO CE NÃO IMPUGNADA NAS RAZÕES DO AGRAVO INTERNO. PRECLUSÃO. PRETENSÃO DE REDISCUTIR A CAUSA. DESCABIMENTO. EMBARGOS DECLARATÓRIOS REJEITADOS. 1. Os argumentos de ocorrência de omissões relativas à ofensa ao art. 5º, inciso XXXV e aos arts. 302 e 304, inciso III do CPC/73 caracterizam indevida inovação recursal, inadmissível em sede de embargos de declaração. 2. O teor do acórdão embargado evidencia a desnecessidade de integração, mostrando-se o aresto claro, coerente e livre de omissão, pois examinou as questões propostas de acordo com a orientação deste Tribunal. 3. O acolhimento dos aclaratórios, até mesmo para fins de prequestionamento de dispositivos constitucionais, impõe a existência de algum dos vícios elencados no art. 1.022 do CPC/2015, o que não se verifica na hipótese. 4. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE - AI: 3081 CORUMBÁ - MS, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Julgamento: 01.02.2018, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 38, Data 23.02.2018, pp. 39-40.) (Grifei.)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DOS VÍCIOS DO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE. NÍTIDO CARÁTER INFRINGENTE. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. INOVAÇÃO RECURSAL. 1. O acórdão embargado não contém o alegado vício, uma vez que foi dirimida a questão pertinente ao litígio. É inadmissível em sede de embargos a revisão do julgado em manifesta pretensão infringente. 2. Não cabe a inovação de argumentos em sede de embargos de declaração, o que ocorre quanto à insurgência da afronta a dispositivos constitucionais, uma vez que o alegado tema não foi trazido à análise nas razões do recurso especial, sendo inadmissível por força da preclusão consumativa. 3. Embargos de declaração rejeitados.

(STJ - EDcl no AgRg no AREsp: 492634 RJ 2014/0066215-8, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 05.6.2014, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20.6.2014.) (Grifei.)

De qualquer sorte, consigno que este Tribunal, na sessão de 04.12.2017, quando do julgamento do processo RE 1497, da relatoria do Des. Eleitoral Luciano André Losekann, seguindo a diretriz jurisprudencial firmada pelo TSE, assentou a inaplicabilidade da Lei n. 13.488/17 aos processos de exercícios anteriores à sua vigência, em prestígio à lei da época dos fatos e ao princípio da segurança jurídica. Colaciono a ementa do precedente:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

(...)

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

(...)

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE 1497, Rel. Des. Eleitoral Luciano André Losekann, DEJERS 15.12.2017.) (Grifei.)

Esse posicionamento se coaduna com a jurisprudência do TSE, que também entende pela irretroatividade da aplicação das alterações introduzidas tanto pela Lei n. 13.488/17 na Lei das Eleições, quanto pela Lei n. 13.165/15 na Lei dos Partidos Políticos:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. PROPAGANDA ELEITORAL PAGA. VEICULAÇÃO POR MEIO DE INTERNET.

(...)

2. No termos da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, é inaplicável retroativamente regime jurídico mais benéfico a situações já consolidadas no tempo sob a égide da lei antiga, mais gravosa. A superveniência da Lei 13.488, de 6 de outubro de 2017, que alterou a redação do art. 57-C da Lei 9.504/97, não alcança a sentença em representação na qual se apurou a veiculação de propaganda paga, mediante link patrocinado na página do candidato, ocorrida durante a campanha eleitoral de 2016.

(...)

(Agravo de Instrumento n. 4676, Acórdão, Relator Min. Admar Gonzaga, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 112, Data 08.6.2018, pp. 109-110.) (Grifei.)

ELEIÇÕES 2014. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. MULTA. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. OBSCURIDADE. ERRO MATERIAL. INEXISTÊNCIA. NOVA REDAÇÃO DO ART. 23, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. RETROATIVIDADE. IMPOSSIBILIDADE. SANÇÃO DE NATUREZA ADMINISTRATIVA. ATO JURÍDICO PERFEITO. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. APLICAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO.

(...)

4. A Lei nº 13.488/2017, que alterou o montante da multa devida pela pessoa física que efetua doação à campanha de valor superior ao limite legal (art. 23, § 3º, da Lei nº 9.504/97), não retroage para alcançar o momento em que a irregularidade foi praticada, posto tratar-se de ato jurídico perfeito que, como tal, é regido pela norma vigente ao seu tempo (tempus regit actum).

(...)

(Agravo de Instrumento n. 3203, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 71, Data 11.4.2018, p. 38.) (Grifei.)

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. SUSPENSÃO DAS COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO PELO PERÍODO DE 09 (NOVE) MESES. GRAVIDADE DAS IRREGULARIDADES. REITERAÇÃO. COMPROMETIMENTO DAS CONTAS. SÚMULA Nº 24/TSE. DESAPROVAÇÃO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INAPLICABILIDADE. SÚMULA Nº 30/TSE. ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS PROMOVIDAS PELA LEI Nº 13.165/2015. IRRETROATIVIDADE. VALOR DO REPASSE DA ÉPOCA DOS FATOS. AUSENTE PREQUESTIONAMENTO. NÃO PROVIMENTO.

(...)

6. Não há falar na aplicação retroativa da Lei nº 13.165/2015, porquanto, a teor da jurisprudência desta Casa, a nova modalidade de sanção em decorrência da desaprovação de contas prevista na nova redação do caput do art. 37 da Lei nº 9.096/1995, conferida pela Lei nº 13.165/2015, somente deve ser aplicada às prestações de contas relativas ao exercício de 2016 e seguintes.

(...)

(Recurso Especial Eleitoral n. 5970, Acórdão, Relatora Min. Rosa Weber, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 170, Data 23.8.2018, pp. 48-49.) (Grifei.)

Com esses fundamentos, rejeito os embargos de declaração.

Passo ao exame dos embargos declaratórios opostos pelo Ministério Público Eleitoral.

O Parquet reiterou, nas razões de embargos, o conteúdo do parecer ofertado nas fls. 160-173, no sentido de considerar como provenientes de fonte vedada as doações no montante de R$ 6.050,00 realizadas ao partido por detentor do mandato eletivo de deputado estadual.

O argumento foi afastado pela decisão embargada com base nas seguintes razões:

Por fim, não merece guarida o pedido da Procuradoria Regional Eleitoral de que sejam reconhecidas como provenientes de fonte vedada as doações no montante de R$ 6.050,00 (fl. 162v.), realizadas por detentor de mandato eletivo (Deputado Estadual – fl. 130).

A própria unidade técnica, em seu parecer conclusivo, entendeu por não acatar este item como irregularidade possível de gerar a reprovação das contas, uma vez que as doações de detentor de mandato eletivo não se caracterizam como fonte vedada (fl. 151).

Aliás, este Tribunal, na sessão de 06.12.2017, a partir dos julgamentos dos recursos RE n. 14-78 e RE n. 13-93, da relatoria do ilustre Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, decidiu rever a resposta à Consulta n. 109-98.

Nos julgamentos, foi assentada a possibilidade de detentores de mandato eletivo efetuarem contribuição a partido político, por não se enquadrarem no conceito de autoridade previsto no inc. II do art. 31 da Lei n. 9.096/95, sem as alterações introduzidas pela Lei n. 13.488/17, pois os termos do referido diploma legal somente podem ser considerados para os exercícios financeiros posteriores à sua vigência.

Em verdade não há, na legislação brasileira a expressa previsão de que detentores de mandato eletivo não possam doar para partidos políticos.

A toda evidência, o entendimento pela impossibilidade de recebimento de recursos de detentores de cargo eletivo parte de uma interpretação analógica de que tais doadores estariam na mesma posição dos servidores designados para ocupar cargo em comissão demissível ad nutum com poder de autoridade, ou seja, chefia, direção e coordenação, na administração pública direta ou indireta dos três Poderes nas esferas federal, estadual ou municipal.

Essa interpretação extensiva do conceito de autoridade estabelecido na redação originária do inc. II do art. 31 da Lei dos Partidos Políticos viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Ora, é da essência das pessoas que se filiam a partidos políticos, concorrem como candidatas e são alçadas a desempenhar mandato eletivo devido à vitória nas eleições (e não por nomeação no âmbito dos três Poderes), o direito de contribuir financeiramente para a legenda pela qual foram eleitas e cuja ideologia defendem e compartilham.

Assim, somente as demais contribuições são consideradas irregulares, porque os doadores se enquadram no conceito de autoridade, por se tratarem de cargos de chefia e liderança, conforme previsão do art. 12, inciso XII, e § 2º, da Resolução TSE n. 23.464/15.

O tema foi levado ao TSE em recurso especial interposto pela Procuradoria Regional Eleitoral contra acórdão do TRE-RS, tendo a Corte Superior Eleitoral negado seguimento ao recurso sob o fundamento de que a norma inscrita no § 1º, inciso IV, do art. 12 da Res.-TSE nº 23.464/2015 “não incluiu os detentores de mandato eletivo na vedação legal à doação para as agremiações partidárias” (RESPE - Recurso Especial Eleitoral nº 1393, Decisão monocrática de 30/8/2018, Relator: Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico - 03/09/2018 - Página 35-42).

Nas razões recursais, o Ministério Público Eleitoral alega que “não houve qualquer consideração a respeito das consequências disso para os princípios da segurança jurídica e isonomia/paridade de armas no processo eleitoral, questão expressamente suscitada no parecer ministerial”. Para tanto, cita uma série de precedentes jurisprudenciais que decidiram de forma favorável a sua tese.

Como se vê, o propósito dos declaratórios é rediscutir a justiça do julgado para forçar o Tribunal a prolatar nova decisão que atenda ao raciocínio do embargante, pois, a todo efeito, foram apresentadas clara e suficientemente fundamentadas as razões para a revisão do entendimento de que os detentores de cargo eletivo não poderiam contribuir em benefício dos partidos políticos pelos quais são eleitos.

Ora, se para o TSE os detentores de mandato eletivo não são considerados autoridades para os fins do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 – razão pela qual as doações por eles realizadas aos partidos políticos não são oriundas de fonte vedada, é descabido o argumento de que essa orientação não pode ser adotada, sob pena de malferimento dos postulados da segurança jurídica e da isonomia.

Ademais, a decisão expressamente aponta que a tese do Ministério Público Eleitoral “viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade”.

Por esse mesmo motivo, pondero que a irresignação quanto ao resultado do julgamento não abre espaço para que o Tribunal reveja a justiça da decisão ou atribua efeitos infringentes ao recurso porque em casos análogos o provimento jurisdicional foi diferente.

Assim, as alegações de ofensa a princípios por contrariedade do acórdão em relação a outros julgados é matéria que deve ser levada à apreciação da superior instância no recurso próprio – instrumento adequado para postular a reforma da decisão –, pois não dá azo ao manejo de embargos de declaração.

ANTE O EXPOSTO, voto pela rejeição dos embargos de declaração opostos pelo DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL (PCdoB), por ADALBERTO LUIZ FRASSON e CORA MARIA TEIXEIRA CHIAPPETTA, e pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL.