RE - 1586 - Sessão: 18/12/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por ANTÔNIO JOCELI CARDOSO DA SILVA e ANA PAULA DINIZ ALVARENGA, Presidente e Tesoureira, respectivamente, do MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB) de São Nicolau, em face da sentença que julgou não prestadas as contas da agremiação referentes ao exercício financeiro de 2016 e determinou: a) o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 7.870,20, procedente de fonte vedada; b) o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 158.028,09, referente aos recursos considerados como de origem não identificada; c) a suspensão do recebimento de recursos provenientes do Fundo Partidário, pelo tempo em que perdurar a omissão; d) a suspensão do registro ou anotação do órgão de direção municipal (fls. 46-49v.).

Em suas razões (fls. 69-74), os recorrentes reconhecem o recebimento de receitas originárias de fontes vedadas, mas argumentam que os valores pertenciam aos sócios das empresas, tendo sido utilizada a pessoa jurídica apenas como meio para transferir a quantia ao órgão partidário. Sustentam que os demais valores decorrem de contribuições partidárias, arrecadadas por meio de boletos bancários com a identificação de cada contribuinte. Defendem a regularidade dos recursos recebidos. Invocam a aplicação do art. 46, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, que possibilita o julgamento das contas como prestadas quando parcialmente apresentados os documentos e as informações contábeis e presentes elementos mínimos para a análise das contas. Asseveram que os extratos às fls. 24-29 comprovam que todos os valores que ingressaram na conta bancária foram identificados, seja pela aposição da inscrição do CPF do depositante, seja pela indicação do número do boleto bancário. Ao final, requerem a reforma da sentença para que as contas sejam julgadas desaprovadas.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 83-86v.).

É o relatório.

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, os recorrentes insurgem-se com a sentença que julgou não prestadas as contas do MDB de São Nicolau referentes ao exercício financeiro de 2016.

Nos termos do art. 28 da Resolução TSE n. 23.464/15, aplicável ao exercício financeiro de 2016 por força do que dispõe o art. 65, § 3º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.546/17, incumbe ao partido político, em todas as esferas de direção, apresentar a sua prestação de contas à Justiça Eleitoral anualmente, até 30 de abril do ano subsequente. O dispositivo também explicita, em seu § 2º, que a prestação de contas é obrigatória, ainda que ausente o recebimento de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro.

A falta de apresentação dos documentos e das informações exigidas pela norma eleitoral impede a publicização, a transparência e o controle das finanças dos partidos, além de afrontar a disposição contida no art. 17, inc. III, da CF/88, que estabelece aos partidos políticos o dever de prestar contas à Justiça Eleitoral.

Na hipótese dos autos, embora a agremiação e seus responsáveis tenham sido intimados tanto para justificar a não apresentação da contabilidade quanto para se manifestar acerca da análise técnica, quedaram-se silentes diante das oportunidades ofertadas.

A omissão absoluta do órgão partidário impõe a manutenção do juízo de não prestação das contas e inviabiliza a aplicação do disposto no art. 46, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, que permite sejam consideradas prestadas as contas desde que presentes dois requisitos, a saber: 1) omissão parcial dos documentos e das informações a que se refere o art. 29 da Resolução TSE n. 23.464/15; e 2) estejam presentes elementos mínimos para a análise da contabilidade.

Ressalta-se que o feito foi instruído de acordo com o art. 30, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.546/17, que estabelece, no caso de não apresentação das contas, a adoção de providências tendentes a viabilizar a análise da movimentação de recursos pela agremiação, notadamente a aplicação irregular de verbas do Fundo Partidário, bem assim o recebimento de valores procedentes de fontes vedadas e sem a identificação da origem.

Na situação em análise, a partir dos extratos bancários eletrônicos disponibilizados à Justiça Eleitoral em atenção ao art. 6º, § 2º, da Resolução TSE n. 23.464/15, norma reproduzida no art. 6º, § 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17, a unidade técnica constatou o recebimento de recursos procedentes de fontes vedadas e a falta de identificação da origem de valores que ingressaram na conta bancária (fls. 30-31v.).

Relativamente aos recursos provenientes de fontes vedadas, a sentença apontou que o montante de R$ 7.870,20, proveniente da Clínica Saúde Total (CNPJ n. 12.883.506/0001-75), afrontou o disposto no art. 12, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15, que proíbe a arrecadação de recursos procedentes de pessoa jurídica.

Reproduzo o dispositivo:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[…]

II – pessoa jurídica;

Em defesa, os responsáveis argumentam que as doações não foram realizadas pela pessoa jurídica informada no demonstrativo bancário, mas pelos seus sócios, pessoas físicas.

Ocorre que a alegação não encontra amparo em provas ou documentos capazes de atestar a ocorrência do equívoco.

Ao contrário disso, repriso que não houve manifestação da agremiação a respeito dos apontamentos realizados pelo órgão técnico, tampouco a juntada de documentos em grau recursal.

Portanto, irretocável a decisão.

Consequentemente, a quantia irregularmente recebida deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15.

A respeito dos recursos considerados como sendo de origem identificada, melhor sorte não assiste aos recorrentes.   

O art. 7º da Resolução TSE n. 23.464/15 determina que os recursos arrecadados pelos órgãos partidários tenham sua origem identificada:       

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

No caso dos autos, o juízo a quo considerou como recursos de origem não identificada apenas os valores que foram arrecadados sem a indicação do CPF ou CNPJ, reputando regulares aqueles que foram recebidos de acordo com a determinação regulamentar.

A fim de evitar tautologia, colho o excerto da decisão:

[...]

Referente à conta 6000228906, agência 818, do BANRISUL, contempla um total de R$ 168.727,35 em créditos e o valor de R$ 172.674,87 em débitos, estabelecendo um saldo negativo de R$ 3.947,52, no período, conforme extratos (fls.24-29). Deste total, o montante de R$ 2.829,06, foi devidamente identificado com o número de inscrição do CPF, estando de acordo com a legislação eleitoral, já que não se tratam de fontes vedadas.

Entretanto, verifica-se na movimentação financeira dos extratos que o valor de R$ 158.028,09 são recursos de origem não identificada (RONI), visto que ingressaram na conta sem qualquer identificação da fonte que realizou a transação bancária, por omissão do CPF ou CNPJ, conforme disciplina o art. 8º da Resolução TSE 23.464/2015.

[...]

Saliento que a tese defendida nas razões do recurso a respeito da identificação dos recursos por meio da geração de boletos não está amparada em qualquer elemento de prova.

Diante do cenário de completa omissão do órgão partidário, o aporte dos recursos de maneira diversa da determinada pela normatização regente, a par de inviabilizar a atuação fiscalizatória da Justiça Eleitoral, impede seja verificada a sua origem, acarretando o dever de recolhimento da quantia correspondente ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15.

Acrescento que a falta de apresentação de contabilidade, além de ensejar o julgamento das contas como não prestadas, nos termos do art. 46, inc. IV, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.464/15, acarreta a perda do direito de recebimento de novas quotas do Fundo Partidário enquanto não for regularizada a situação do partido político, à luz do disposto no art. 48 do mesmo diploma, verbis:

Art. 48. A falta de prestação de contas implica a proibição de recebimento de recursos oriundos do Fundo Partidário, enquanto não for regularizada a situação do partido político.

Ainda, resta aplicável igualmente a suspensão da anotação ou registro do órgão partidário municipal, como penalidade adicional, na dicção do art. 42, caput, da Resolução TSE n. 23.465/15.

Por elucidativo, reproduzo o dispositivo:

Art. 42. Será suspenso o registro ou a anotação do órgão de direção estadual ou municipal que tiver suas contas partidárias julgadas como não prestadas, até que seja regularizada a situação.

Registro que o egrégio TSE consolidou o entendimento de que a exceção prevista no art. 37, § 2º, da Lei n. 9.096/95, com redação conferida pela Lei n. 13.165/15, é aplicável exclusivamente nas hipóteses de desaprovação da contabilidade, incidindo a sanção insculpida no art. 42 da Resolução TSE n. 23.465/15 nos casos de omissão do dever de prestar contas. Nesses termos, destaco o precedente:

PETIÇÃO. PARTIDOS POLÍTICOS. ART. 42, CAPUT, DA RES.-TSE Nº 23.465. PEDIDOS. REVOGAÇÃO OU SUSTAÇÃO DO DISPOSITIVO. INDEFERIMENTO.

1. A transmissão dos dados pelos órgãos partidários por meio do Sistema Público de Escrituração Contábil (SPED) atende às disposições emanadas da Secretaria da Receita Federal e às regras que tratam dos processos judiciais.

2. Consoante dispõe o art. 17, III, da Constituição da República, os Partidos Políticos são obrigados a prestar contas à Justiça Eleitoral.

3. A disposição contida no art. 42 da Res.-TSE nº 23.465, ao prever que "será suspenso o registro ou a anotação do órgão de direção estadual ou municipal que tiver suas contas partidárias julgadas como não prestadas", não é inovadora no âmbito deste Tribunal, pois dispositivo semelhante já constava da Res.-TSE nº 23.432/2014.

4. As hipóteses de desaprovação de contas e de julgamento destas como não prestadas não se confundem. Na primeira, por disposição legal, o registro dos órgãos partidários não pode ser suspenso (Lei nº 9.096/95, arts. 31, § 5º, e 37, caput c/c § 2º). No entanto, a ausência de prestação de contas é motivo de extinção do partido político (Lei nº 9.096/95, art. 28, III) e implica a suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário enquanto perdurar a inadimplência e sujeita seus responsáveis às penas da lei (Lei nº 9.096/95, art. 37-A).

5. A situação de inadimplência dos órgãos partidários que não prestam contas à Justiça Eleitoral somente se caracteriza quando as contas são julgadas como não prestadas em processo judicial que se inicia com a intimação dos órgãos partidários e seus responsáveis para suprir a omissão, e, mesmo após a decisão judicial, a agremiação pode requerer a regularização da sua situação de inadimplência, nos termos da Res.-TSE nº 23.464/2015.

6. O art. 42 da Res.-TSE nº 23.465 traz efetividade ao comando constitucional que impõe a obrigação de o órgão partidário prestar contas à Justiça Eleitoral e somente perdura até que a situação seja regularizada. A transitoriedade da inadimplência depende exclusivamente do respeito à obrigação constitucional de prestar contas.

Pedidos indeferidos.

(TSE, INSTRUÇÃO n. 3, Acórdão, Relator Min. Henrique Neves Da Silva, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data 30.6.2016, pp. 34-36.) (Grifei.)

Nessa esteira de entendimento, é o posicionamento firmado por este Tribunal, como revela a seguinte ementa:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2016. CONTAS NÃO PRESTADAS. SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. SUSPENSÃO DO REGISTRO OU DA ANOTAÇÃO DO ÓRGÃO ESTADUAL.

1. É obrigação dos partidos, em todas as esferas de direção, apresentar a sua prestação de contas anualmente até 30 de abril do ano subsequente, conforme dispõe o art. 28 da Resolução TSE n. 23.464/15. Omissão da agremiação em prestar contas, embora esgotadas todas as formas de notificação para tanto. Contas não prestadas implicam na proibição de recebimento de recursos oriundos do Fundo Partidário, enquanto não regularizada a situação do partido.

2. Constatado em parecer técnico a existência de recursos recebidos sem a correta e fiel identificação da origem, sujeitando-se ao recolhimento do valor ao Tesouro Nacional, por força do art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15. Neste sentido, aplicada igualmente a penalidade de suspensão do registro ou da anotação do órgão de direção estadual até que seja regularizada a situação, conforme prevê o art. 42 da Resolução TSE n. 23.465/15.

Contas julgadas não prestadas.

(TRE-RS, PC n. 75-55.2017.6.21.0000, relator Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 19.12.2017.)

Portanto, a sentença deve ser mantida em sua integralidade.

Em face do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.