RE - 1360 - Sessão: 19/12/2018 às 10:30

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) do Município de Farroupilha (fls. 167-171) contra sentença do Juízo da 61ª Zona Eleitoral (fls. 161-165), que desaprovou a sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2015, determinando o recolhimento da quantia de R$ 33.017,70 ao Tesouro Nacional, em virtude do recebimento de recursos de fonte vedada, provenientes de autoridades públicas, e a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses, com fundamento nos arts. 14, § 1º, 45, inc. IV, al. “a”, e 48, § 2º, todos da Resolução TSE n. 23.432/14.

Em suas razões, o recorrente postulou a aprovação das contas, afastando-se a determinação de recolhimento do montante declarado irregular ao Tesouro Nacional, com amparo na nova redação conferida pela Lei n. 13.488/17 ao art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, assim como a ordem de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário. Em caso de entendimento diverso, requereu a aprovação parcial da sua contabilidade, reduzindo-se, proporcionalmente, o período de suspensão do repasse de verbas do Fundo Partidário.

Nesta instância, com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 174-178v.).

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

A sentença foi publicada no DEJERS no dia 05.7.2018, quinta-feira (fl. 166), e o recurso, interposto em 09.7.2018, segunda-feira (fl. 167), dentro, portanto, do tríduo legal. Dessa maneira, como o apelo é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.

Mérito

O PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) do Município de Farroupilha interpôs recurso (fls. 167-171) contra sentença do Juízo da 61ª Zona Eleitoral (fls. 161-165) que desaprovou a sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2015, determinando o recolhimento da quantia de R$ 33.017,70 ao Tesouro Nacional, devido ao recebimento de recursos de fonte vedada, provenientes de autoridades públicas, impondo-lhe, ainda, a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 6 (seis) meses (arts. 14, § 1º, 45, inc. IV, al. “a”, e 48, § 2º, todos da Resolução TSE n. 23.432/14).

Como exarado na sentença, a agremiação recebeu doações advindas de titulares de cargos de direção e chefia junto ao Poder Executivo municipal, enquadráveis no conceito de autoridade pública, infringindo a normativa constante no art. 12, inc. XII e § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

XII – autoridades públicas;

(...)

§ 2º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso XII do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

(Grifei.)

Com efeito, no parecer técnico conclusivo (fls. 150-153v.), elaborado com respaldo nas informações prestadas pelo Prefeito do Município de Farroupilha (fls. 146v.-149v.) e pelo partido no demonstrativo das contribuições de filiados (fls. 13v.-19), identificou-se o recebimento de doações realizadas por servidores públicos municipais ocupantes dos cargos de diretor-geral, diretor de departamento, secretário municipal, coordenador e chefe de gabinete, todos integrantes do quadro da Administração direta, demissíveis ad nutum e dotados de poderes de chefia e direção, que permitem enquadrar, inequivocamente, os seus titulares no conceito de autoridade pública descrito na legislação eleitoral.

Ressalto que o magistrado de primeira instância considerou regulares as doações efetivadas por detentores de cargos e funções de assistência e assessoramento, acolhendo o parecer técnico conclusivo na parte em que asseverou que, “(…) em relação a estas pessoas, não existe aparente a relação de subordinação que ensejaria doação ilícita de recursos” (fl. 151).

Além disso, ao sentenciar o feito, o julgador de primeiro grau deixou de aplicar a alteração introduzida no art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17, de acordo com a qual as doações efetuadas por pessoas físicas exercentes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, desde que filiados a partido político, passaram a ser admitidas no âmbito do ordenamento jurídico-eleitoral.

Nesse aspecto, a sentença mostra-se, igualmente, irretocável, pois alinha-se ao entendimento firmado por esta Corte, na esteira da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, no sentido de aplicar a legislação vigente à época do exercício financeiro a que se refere a prestação de contas, a fim de assegurar estabilidade e segurança às relações jurídicas subjacentes, como se extrai dos seguintes arestos deste Regional:

RECURSOS. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADAS AS PRELIMINARES DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 31, INC. II, DA LEI N. 9.096/95, DE APLICAÇÃO RETROATIVA DA LEI N. 13.488/17 E DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 14, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.432/14. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES PÚBLICAS. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE ASSISTENTES, ASSESSORES E DETENTORES DE MANDATO ELETIVO. POSSIBILIDADE. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DAS FUNÇÕES DE COORDENADOR, SUPERVISOR E DE CHEFE DE GABINETE. VEDAÇÃO. REDUÇÃO DA SUSPENSÃO DO REPASSE DE NOVAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DESPROVIMENTO DO RECURSO MINISTERIAL. PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO PARTIDO.

1. Preliminares rejeitadas. 1.1 Inconstitucionalidade do art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95. Até que ocorra pronunciamento do Poder Judiciário em sentido contrário, seja em controle difuso ou em controle concentrado, os dispositivos constantes em lei ordinárias apresentam presunção de constitucionalidade. 1.2. Retroatividade da Lei n. 13.488/17. Consoante entendimento desta Corte e do Tribunal Superior Eleitoral, privilegia-se a aplicação da legislação vigente à época dos fatos, em homenagem aos princípios do tempus regit actum, da isonomia, da segurança jurídica, da anualidade eleitoral e das regras que disciplinam o conflito de leis do tempo. 1.3. Inconstitucionalidade do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.432/14. Alegada exorbitância do poder regulamentar do TSE, diante da determinação do recolhimento de recursos julgados como provenientes de fontes vedadas ao Tesouro Nacional. A determinação de recolhimento procede da proibição ao recebimento dos recursos, medida isenta e necessária para o restabelecimento da ordem jurídica violada.

2. Recebimento de doações de assistentes, assessores especialistas e assessores técnicos. As funções de assessoramento, consoante os Decretos Municipais ns. 44/10 e 18.198/13, não detêm atribuição de direção ou chefia. Portanto, não há como integrá-las no âmbito das fontes vedadas.

3. Recebimento de doações das funções de coordenador, supervisor e de chefe de gabinete. Impossível enquadrá-los como de mero assessoramento, uma vez que, do exercício das referidas atividades, depreende-se a existência de subordinados e de poder de comando e gestão.

4. Recebimento de doações de detentores de mandato eletivo. A jurisprudência desta Corte tem compreendido que os detentores de mandato eletivo não estão incluídos no conceito de autoridade pública estabelecido pelo art. 12, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14, sendo, portanto, permitidas as doações a partidos políticos.

5. Redução da quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional, bem como do período de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário.

Provimento negado ao recurso do Ministério Público Eleitoral.

Parcial provimento ao apelo do partido.

(TRE-RS, RE n. 8-79, Relator DES. Eleitoral Luciano André Losekann, julgado na sessão de 07.9.2018.) (Grifei.)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTES VEDADAS. OCUPANTES DE CARGOS DE CHEFIA E DIREÇÃO. ART. 31, INC. II, DA LEI N. 9.096/95. SUSPENSÃO DOS REPASSES DO FUNDO PARTIDÁRIO E RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL MANTIDOS. DESPROVIMENTO.

1. Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de titulares de cargos demissíveis "ad nutum" da administração direta ou indireta que tenham a condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia. Na espécie, a agremiação partidária recebeu recursos de autoridade pública – chefe de gabinete, chefe de departamento, entre outros – caracterizando o ingresso de recurso de origem proibida pela norma regente.

2. As alterações introduzidas pela Lei n. 13.488/17 no texto da Lei dos Partidos Políticos, para o fim de considerar legítima a contribuição realizada por filiados, ainda que investidos em cargos públicos com o poder de autoridade, não se aplicam de forma retroativa. Nesse sentido, esta Corte fixou entendimento pela aplicação da legislação vigente à época da prestação de contas.

3. Irregularidade que compromete o controle desta Justiça Especializada, impedindo a transparência e confiabilidade das contas.

Provimento negado.

(TRE-RS, RE n. 23-30, Relator DES. ELEITORAL Eduardo Augusto Dias Bainy, julgado na sessão de 16.7.2018.) (Grifei.)

Por outro lado, como se denota da ementa do acórdão do RE n. 8-79, de relatoria do Des. eleitoral Luciano André Losekann, acima transcrita, esta Corte vem entendendo que os detentores de mandato eletivo não se amoldam ao conceito de autoridade pública, porquanto exercem munus público, e não cargo ou função de livre nomeação e exoneração, que podem ser manipulados com finalidade político-partidária, interferindo no equilíbrio de forças atuantes no processo eleitoral.

Nessa linha, reporto-me, ainda, ao RE n. 13-93, apreciado na sessão de 06.12.2017, em acórdão de relatoria do Des. Eleitoral João Batista Pinto Silveira, a partir do qual esta Corte passou a adotar essa orientação, independentemente do exercício financeiro a que se refere a prestação de contas:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. RECEBIMENTO DE DOAÇÃO REALIZADA POR DETENTOR DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA NORMA. NÃO CARACTERIZADA FONTE VEDADA. LICITUDE DA DOAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO DAS CONTAS. PROVIMENTO.

Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de autoridades públicas, vale dizer, aqueles que exercem cargos de chefia ou direção na administração pública, direta ou indireta. Definição expressa no texto do art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/15.

No caso, a agremiação partidária recebeu recursos de detentor de mandato eletivo de vereador. O texto normativo não contempla os agentes políticos. Impossibilidade de se dar interpretação ampliativa à norma que traz uma restrição de direitos. O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce "munus" público, eleito pelo povo. As doações realizadas por essa espécie de agente não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias. Caracterizada, assim, a licitude da doação efetuada pelo vereador. Fonte vedada não caracterizada. Reforma da sentença para aprovar as contas. Provimento.

(RE n. 13-93, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado na sessão de 06.12.2017.) (Grifei).

Consequentemente, deve ser reconhecida a licitude das três doações feitas à agremiação por Claiton Gonçalves, Prefeito do Município de Farroupilha durante o ano de 2015, as quais somaram R$ 2.109,00 (fl. 151v.), adequando-se o total de receitas ilicitamente arrecadas pela agremiação para R$ 30.908,70.

Como as doações derivadas de fonte vedada representam 38,8% do total das receitas obtidas pelo partido ao longo do exercício financeiro sob exame, isto é, R$ 79.660,65 (fl. 6v.), justifica-se, diante da expressividade nominal e percentual do valor, a manutenção do juízo de desaprovação das contas, impondo-se, ainda, o recolhimento da importância de R$ 30.908,70 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.432/14.

Da mesma forma, merece ser redimensionada a penalidade de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, fixada pelo prazo de 6 (seis) meses na sentença.

E isso porque, este Tribunal, reconhecendo o cabimento da suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário nas hipóteses de recebimento de recursos oriundos de fonte vedada, com fundamento no art. 46, inc. I, da Resolução TSE n. 23.432/14, tem admitido a possibilidade de dosimetria desse sancionamento, entre 01 (um) e 12 (doze) meses, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

No caso, em face das circunstâncias dos autos e da gravidade da falha detectada, bem como da inexistência de indícios de má-fé do prestador e da repercussão dos valores irregulares sobre a totalidade das contas (38,8%), considero proporcional e razoável suspender o repasse de quotas do Fundo Partidário pelo período de 4 (quatro) meses.

Desse modo, o recurso merece ser parcialmente provido, reduzindo-se o montante a ser transferido ao Tesouro Nacional para R$ 30.908,70 e o período de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para 4 (quatro) meses.

Dispositivo

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso interposto pelo PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) do Município de Farroupilha para, mantendo a sentença que desaprovou suas contas relativas ao exercício financeiro de 2015, adequar o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional para R$ 30.908,70 (trinta mil, novecentos e oito reais e setenta centavos) e reduzir o período de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário para 4 (quatro) meses, nos termos da fundamentação.