E.Dcl. - 68233 - Sessão: 05/11/2018 às 17:00

RELATÓRIO

CLAUDIOMIRO GABBI PEZZETTA opôs embargos declaratórios (fls. 2564-2589) contra acórdão deste Tribunal (fls. 2526-2560) que, negando provimento à irresignação do MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL e dando parcial provimento ao seu recurso, ao efeito de, tão somente, excluir, do objeto da condenação, a realização de jantares e o uso da máquina pública com finalidade eleitoral, manteve a sentença prolatada pelo Juízo da 23ª Zona de Ijuí (fls. 575-605), que cassou o seu diploma de Vereador conquistado no pleito de 2016, declarou a sua inelegibilidade para as eleições que se realizarem nos oito anos subsequentes e lhe impôs penalidade de multa equivalente a R$ 5.320,50, com fundamento nos arts. 30-A e 41-A da Lei n. 9.504/97 e art. 22 da Lei Complementar n. 64/90.

No acórdão, determinou-se, ainda, de ofício, fosse readequada a parte dispositiva da decisão de primeiro grau, computando-se os votos recebidos pelo embargante à legenda do partido pelo qual concorreu, de modo a empossar-se o primeiro suplente deste, em conformidade com o art. 175, § 4º, do Código Eleitoral.

Em suas razões, o embargante requereu, preliminarmente, o prequestionamento explícito dos arts. 5º, incs. X, XII, LIV e LV, e 93, inc. IX, da Constituição Federal; arts. 372, 373, 454, §§ 1º a 3º, e 489, § 1º, incs. II, IV, V e VI, do Código de Processo Civil; arts. 30-A e 41-A da Lei n. 9.504/97 e art. 22, incs. I, XIV e XV e § 3º, da  Lei Complementar n. 64/90. Apontou obscuridades e omissões no acórdão ao afastar as alegações preliminares de cerceamento de defesa e de ilicitude da prova emprestada. No mérito, propriamente dito, sustentou, em síntese, a existência de omissões e obscuridades quanto ao exame das provas das condutas ilícitas que embasaram a condenação e de contradição relativamente a julgados desta Corte e do Tribunal Superior Eleitoral.

Na sequência, a Procuradoria Regional Eleitoral interpôs recurso especial (fls. 2594-2606v.).

Após, vieram os autos conclusos para a apreciação dos embargos de declaração.

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade Recursal

Os aclaratórios foram opostos tempestivamente, pois o acórdão foi publicado no DEJERS no dia 02.10.2018 (fl. 2562) e a petição recursal, protocolizada em 05.10.2018 (fl. 2564), dentro, portanto, do prazo de três dias, previsto no art. 275, § 1º, do Código Eleitoral. Preenchidos, também, os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Mérito

CLAUDIOMIRO GABBI PEZZETTA opôs embargos de declaração (fls. 2564-2589) em face do acórdão deste Tribunal (fls. 2526-2560) que, ao apreciar os recursos interpostos por ele e pelo Ministério Público Eleitoral, manteve a condenação que lhe foi imposta pelo Juízo eleitoral da 23ª Zona de Ijuí (fls. 575-605) pela prática de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/97), arrecadação e gastos ilícitos de recursos durante a campanha eleitoral (art. 30-A da Lei das Eleições) e abuso de poder econômico (art. 22 da  Lei Complementar n. 64/90), cassando o seu diploma de Vereador obtido no pleito de 2016, declarando a sua inelegibilidade para as eleições que se realizarem nos oito anos subsequentes e condenando-o ao pagamento de multa equivalente a R$ 5.320,50, afastando do decreto condenatório, tão somente, os fatos relativos à realização de jantares e à utilização da máquina pública.

Inicialmente, o embargante apontou obscuridades e omissões no acórdão na parte em que afastou a alegação preliminar de cerceamento de defesa.

Nesse tópico, disse que as razões de decidir não se mostraram suficientemente claras no que tange a não incidência do art. 454, § 3º, do Código de Processo Civil (equivocadamente indicado, na peça recursal, como o art. 474, § 3º, do mesmo diploma legal).

Pontuou a inocorrência de inovação, em sede de memoriais, quanto à tese de imprescindibilidade da oitiva do Deputado Pompeu de Mattos - afirmando existirem omissões relativas à interceptação de conversa telefônica mantida entre essa testemunha e o candidato Darci Pretto -  relativa à violação das garantias constitucionais do contraditório e da ampa defesa.

Contudo, a leitura do acórdão revela a inexistência de pontos omissos ou obscuros no enfrentamento dessa preliminar, havendo referência expressa à ausência de demonstração da pertinência da oitiva da testemunha Pompeu de Mattos e à inaplicabilidade do regramento constante no art. 454, § 3º, do Código de Processo Civil, devido às circunstâncias próprias da hipótese vertente, refutando-se, por consequência, mácula processual aos primados constitucionais do contraditório e da ampla defesa derivados do indeferimento da produção dessa prova pelo juiz eleitoral da origem, que a considerou prescindível ao deslinde do feito (fls. 2529-2531).

Além disso, o acórdão não se mostrou omisso relativamente à degravação do diálogo entre a testemunha Pompeu de Mattos e Darci Pretto, porquanto, ao analisar o conjunto probatório e os memoriais apresentados pelo embargante, asseverou que:

(…) tendo em vista os argumentos trazidos em sede de memoriais, que muito embora conste nos autos degravação de diálogo ocorrido entre Darci Pretto e o Deputado Pompeo de Mattos, trata-se de material que apenas está no processo porque foi juntado aos autos cópia integral do Procedimento Preparatório, mas tal conversa não embasou a inicial, tampouco a condenação, ao menos não neste processo (fl. 2531 - grifos do original).

O embargante também assinalou omissões referentes à rejeição da preliminar de ilicitude da prova emprestada, sob o argumento de que a decisão emanada desta Corte não deduziu os motivos pelos quais deixou de aplicar o entendimento adotado pelo Tribunal Superior Eleitoral no julgamento do RCED n. 730/RS, limitando-se a reproduzir a ementa do RE n. 391-33, em que analisou a mesma preliminar ao julgar a sua prestação de contas de campanha.

Asseverou, também, que o julgado atacado não enfrentou todos os fundamentos deduzidos quando da interposição do recurso contra a sentença, em especial o de infringência ao art. 372 do Código de Processo Civil. Indicou, ainda, omissão quanto à restrição indevida aos seus direitos à privacidade e à intimidade ao considerar lícita a utilização da prova derivada de busca e apreensão de aparelhos de telefone celular, tablets e computadores.

Todavia, percebe-se que a fundamentação do acórdão se mostrou bastante clara e consistente ao refutar a suposta nulidade decorrente de ofensa aos princípios da privacidade e da intimidade, afirmando que “A decisão que autorizou a busca e apreensão de aparelhos de telefone celular, tablets e computadores foi fundamentada à exaustão e a extração de dados, como consequência, devidamente autorizada”, referindo, inclusive, orientação nesse sentido externada pelo Superior Tribunal de Justiça no RHC n. 75.800/PR (fl. 2532 e v.).

No que concerne ao mérito propriamente dito, o embargante aduziu, primeiramente, omissões e obscuridades relativas à configuração das elementares constitutivas da captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei na. 9.504/97).

Fazendo referência ao conjunto fático-probatório, sustentou que o acórdão:

a) deixou de individualizar os eleitores considerados identificáveis, de especificar as condutas ilícitas que ensejaram a condenação e de tipificar o específico fim de agir, em violação ao art. 489, § 1º, inc. II, do Código de Processo Civil;

b) baseou o juízo condenatório, única e exclusivamente, na apreensão de vales-combustível e no relatório que apontou intenso fluxo de veículos no “Posto Burmann”, sem caracterizar o nexo de causalidade entre a apreensão dos documentos e o específico fim de agir exigido para as condenações fundadas no art. 41-A da Lei das Eleições;

c) analisou de forma obscura e contraditória os depoimentos dos agentes policiais, Colins Lucas Moreira e Edson Maurício Fagundes Palácio, e das testemunhas Jorge Rodrigues, Celo Luiz Becker e Osmar José Rodrigues. Por consequência, teria admitido a inversão do ônus da prova no processo, em afronta ao art. 373, inc. I, do Código de Processo Civil, e a condenação lastreada em provas indiciárias e meras presunções, desconsiderando a orientação que vem sendo adotada por esta Corte e pelo Tribunal Superior Eleitoral, notadamente no REspe n. 750-57;

d) contrariou o entendimento perfilhado por esta Corte no julgamento do RE n. 297-67, ao considerar que o fato de os carros se encontrarem adesivados e seus condutores serem filiados ao seu partido político não afastava, por si só, a captação ilícita de sufrágio, sem proceder à distinção entre as hipóteses concretamente examinadas, violando, com isso, o regramento constante no art. 489, § 1º, inc. VI, do Código de Processo Civil; e

e) não explicitou a identidade fático-jurídica com o RESPE n. 355-73, violando o art. 489, § 1º, inc. V, do Código de Processo Civil.

Reportando-se ao ilícito descrito no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, o recorrente argumentou que a decisão embargada:

i) apresentou fundamentação insuficiente, na medida em que não detectou o recebimento de recursos de fonte vedada e a ligação entre a movimentação de recursos durante a campanha e a captação de gastos ilícitos, tampouco má-fé na sua conduta, voltada a induzir em erro a fiscalização da Justiça Eleitoral; e

ii) provocou a inversão do ônus probatório ao concluir que a suposta omissão de declaração de recursos arrecadados durante a campanha impediu a fiscalização desta Justiça Especializada, confrontando a orientação da Corte Superior no REspe n. 181, precedente que não foi abordado, destoando do comando do art. 489, § 1º, inc. VI, do Código de Processo Civil.

Com relação ao abuso de poder econômico (art. 22 da  Lei Complementar n. 64/90), defendeu, do mesmo modo, a insuficiência da fundamentação, dizendo que o acórdão teria utilizado expressões jurídicas indeterminadas, a exemplo de “envolveu valores excessivos e desproporcionais” e “que os valores movimentados constituem flagrante abuso de poder econômico”, sem discriminar as importâncias que teriam sido movimentadas ou os elementos objetivos dotados de gravidade suficiente para afetar a normalidade e o equilíbrio do pleito.

A análise detida dos argumentos expendidos pelo embargante para demonstrar as alegadas obscuridades e omissões atinentes ao mérito da demanda revela, em verdade, o seu propósito de ver reexaminadas as provas produzidas ao longo da instrução processual, devido à sua inconformidade com o resultado do julgamento, o que, entretanto, não se amolda às finalidades da espécie recursal, conforme disposto no art. 275 do Código Eleitoral, c/c o art. 1.022 do Diploma Processual Civil.

Nesse sentido, a jurisprudência consolidada no âmbito deste Regional:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. INTEMPESTIVIDADE. NÃO CONHECIMENTO. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS. TENTATIVA DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. REJEIÇÃO.

Não caracterizada qualquer das hipóteses previstas no art. 1.022 do Código de Processo Civil para o manejo dos aclaratórios. Decisão adequadamente fundamentada, inexistindo omissão, dúvida, obscuridade, contradição ou mesmo erro material passível de ser sanado. Configurado o inconformismo do embargante com as conclusões do acórdão. Evidenciada tentativa de rediscussão da matéria, hipótese que não encontra abrigo nesta espécie recursal. Rejeição.

(TRE-RS, EDcl. na EXC n. 873, Relator Des. LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN, DEJERS de 11.9.2018, p. 5.) (Grifei).

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO DE RECURSOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. APLICAÇÃO DE MULTA. INCIDÊNCIA DO ART. 81, §§ 1º E 2º, DA LEI DAS ELEIÇÕES. INAPLICABILIDADE DAS DISPOSIÇÕES INSERIDAS PELA LEI N.13.165/15. CONTRADIÇÃO NÃO CONFIGURADA. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA RETROATIVIDADE DE LEI POSTERIOR MAIS BENÉFICA. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO. ALEGAÇÕES EXPRESSAS E DEVIDAMENTE FUNDAMENTADAS. ACOLHIMENTO DE EFEITOS MODIFICATIVOS APENAS PARA AGREGAR OS ESCLARECIMENTOS EXPOSTOS. ACOLHIMENTO PARCIAL.

1. Contradição não configurada. Inaplicável o princípio da retroatividade de lei posterior mais benéfica, uma vez que a alteração do ordenamento jurídico conferiu maior gravidade à conduta lesiva praticada contra o bem tutelado, proibindo-a de forma peremptória na ordem social.

2. Não caracterizada omissão. Questão expressamente analisada no aresto embargado, com a presença de todos os fundamentos necessários quanto aos motivos da aplicação do art. 81, §§ 1º e 2º, da Lei n. 9.504/97.

3. Em sede de embargos, inviável a rediscussão da matéria, devendo a contrariedade com a decisão que lhe foi desfavorável ser dirigida à instância recursal apropriada. Acolhidos os embargos somente para agregar ao acórdão embargado os esclarecimentos expostos.

4. Acolhimento parcial.

(TRE-RS, EDcl. No RE n. 44-75, Relator Des. Eleitoral Jorge Luís Dall'Agnol, julgado na sessão de 09.4.2018) (Grifei).

Embargos de declaração. Ação de investigação judicial eleitoral. Improcedência. Omissão e contradição. Art. 275, inc. II, do Código Eleitoral. Ausentes os vícios para o manejo dos aclaratórios. Inexistente omissão ou contradição a ser sanada. Decisão devidamente fundamentada, na qual debatidos os pontos trazidos pelo embargante.

Tentativa de rediscussão da matéria já apreciada, o que descabido em sede de embargos. Rejeição.

(TRE-RS, EDcl n. 301-12, Rel. DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, julgado na sessão de 11.5.2017.) (Grifei.)

 

Noto que os pontos omissos e obscuros assinalados pelo embargante quanto à condenação pela prática de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei das Eleições) foram todos enfrentados no acórdão.

A precisa identificação dos eleitores foi expressamente dispensada enquanto requisito ao juízo condenatório, com amparo no entendimento adotado pelo Tribunal Superior Eleitoral no RO n. 7-87, de relatoria do Min. Francisco César Asfor Rocha. Por outro lado, ressaltou-se, não obstante a desnecessidade de identificação dos eleitores envolvidos no ilícito, que, na hipótese concreta, existiam elementos que tornavam os eleitores, no mínimo, identificáveis, segundo se verifica na seguinte passagem do acórdão (fl. 2537 e v.):

De qualquer sorte, no caso concreto, existem elementos que tornam os eleitores, no mínimo, identificáveis, como por exemplo, a tabela com placas de veículos que abasteciam no momento da realização de diligência realizada e nome dos respectivos proprietários (fls. 775-776).

Ademais, a própria defesa alega que as pessoas que abasteciam eram filiadas ao seu partido, ou seja, trata-se de um grupo determinado de eleitores, plenamente identificáveis, fato que, no dizer de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral – 12. ed. - São Paulo: Atlas, 2016. pg.729), enquadra a oferta de vantagem, se comprovada, na moldura do art. 41-A da lei eleitoral (Grifos do original).

 

E, mais adiante, no voto-vista do Desembargador Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes (fl. 2556):

De igual modo, acompanho o entendimento no sentido da desnecessidade de que os beneficiários da captação ilícita de sufrágio e de abuso de poder econômico estejam especificamente identificados na inicial, bastando que sejam identificáveis. No caso dos autos, uma parcela dos eleitores agraciados com vales-combustível pode ser individualizada a partir do levantamento realizado pela autoridade policial quando das operações de busca e apreensão efetuadas no Posto de Combustíveis Burmann, que aponta as placas de carros abastecidos. Além disso, o voto condutor ponderou que a principal tese defensiva é no sentido de que as pessoas que abasteciam veículos eram filiadas ao partido do candidato.

 

As condutas que embasaram a condenação também foram claramente identificadas no acórdão, procedendo-se a um estudo pormenorizado dos elementos de prova documental e testemunhal para concluir que, embora, no caso dos autos, não tivessem sido colhidos testemunhos de eleitores confirmando o recebimento ou a promessa de doação de combustíveis em troca do voto, existia prova farta e robusta do especial fim de agir do embargante, para fins de condenação pela prática de captação ilícita de sufrágio (fl. 2543).

Essa contestação acerca da prova produzida nos autos – embora frustre a expectativa da parte de obter provimento judicial de improcedência da demanda, com o afastamento das penalidades que lhe foram impostas –, não permite acolher os seus argumentos de inversão do ônus da prova ou de condenação lastreada, exclusivamente, na apreensão de vales-combustível, em provas indiciárias ou em meras presunções dissociadas do acervo probatório.

Idêntico raciocínio aplica-se à condenação pela prática de arrecadação e gastos ilícitos de recursos durante a campanha eleitoral (art. 30-A da Lei das Eleições), porquanto o acórdão detalhou os motivos pelos quais entendeu configurado o ilícito, sendo oportuno destacar que, contrariamente ao defendido pelo embargante, o emprego de recursos oriundos de fonte vedada não é condição indispensável à caracterização da conduta irregular.

Saliento, ainda, que as provas motivadoras da condenação lastreada no art. 30-A da Lei das Eleições também se mostraram incontestavelmente fortes e contundentes, sendo, assim, desprovida de plausibilidade jurídica a tese de inversão do ônus probatório e de insuficiência de fundamentação, como se deduz a partir do seguinte trecho do acórdão (fls. 2550-2552):

Isso porque, não obstante tenha o candidato declarado, na sua prestação de contas, receita e despesa nos valores de R$ 10.060,18 e 9.185,08, respectivamente, os elementos apurados na investigação preparatória realizada pelo Ministério Público revelaram que a movimentação de recursos em prol da candidatura de CLAUDIOMIRO extrapolou, em muito, esse valor, fato que configuraria infração ao disposto no art. 30-A da Lei n.° 9.504/97, que assim dispõe:

(…)

Feitas essas premissas, destaco que as contas de campanha de CLAUDIOMIRO receberam sentença de desaprovação, a qual foi mantida por esta Corte em julgado que restou assim ementado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. PRELIMINARES AFASTADAS. MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL EXTEMPORÂNEA. DOCUMENTAÇÃO ESTRANHA À LIDE. PROVA EMPRESTADA. VIOLAÇÃO AO ROL DE ATOS PROCESSUAIS. MÉRITO. OMISSÃO DE GASTOS COM COMBUSTÍVEIS. ART. 22, § 3º, DA LEI N. 9.504/97. DESAPROVAÇÃO. DESPROVIMENTO. ELEIÇÕES 2016.

As questões preliminares foram afastadas. Os prazos conferidos ao Ministério Público Eleitoral, quando atuando como fiscal da lei, não são preclusivos. Possível anexar documentos como prova emprestada quando, em prestígio ao contraditório, é permitido à parte manifestar-se.

O surgimento de indícios de omissão de dados na prestação de contas permite novo parecer ministerial pela desaprovação da contabilidade, visto que o prestador teve o ensejo de apresentar esclarecimentos sobre a prova acostada.

O candidato adquiriu quantidade expressiva de combustível, distribuído em forma de vales durante a campanha eleitoral. Não há registro da despesa na prestação de contas, em desacordo com as disposições legais de regência. Desaprovação.

Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n 391-33, ACÓRDÃO de 17.9.2017, Relator DR. EDUARDO AUGUSTO DIAS BAINY.)

Muito embora a desaprovação das contas não conduza, por si só, à configuração do ilícito descrito no art. 30-A da Lei das Eleições, tenho que, no caso concreto, o conjunto probatório não só demonstra a ilicitude na captação e nos gastos dos recursos movimentados na campanha, como revela a gravidade da conduta de modo a atrair a sanção de cassação do mandato.

Com efeito, os blocos de compra e vales-combustíveis apreendidos, analisados em cotejo com a conversa gravada entre CLAUDIOMIRO e o então prefeito Ballin, a qual, repito, tratava da campanha eleitoral, demonstra que houve um grande incremento de recursos financeiros na campanha eleitoral do recorrente, não declarados na prestação de contas. O cheque de R$ 8.184,00 apreendido, sozinho, já equivale a 89,10% de todo o valor declarado como despesa pelo então prestador de contas.

Como era de se esperar, os recursos financeiros utilizados para a prática de captação ilícita de sufrágio – distribuição de combustíveis e ranchos – não foram declarados na prestação de contas. Em decorrência, não há notícias referentes à fonte e à forma de captação desses recursos.

Segundo leciona José Jairo Gomes, (Direito Eleitoral, 12a ed. - São Paulo: Atlas, 2016, p. 714), "O termo captação ilícita remete tanto à fonte quanto à forma de obtenção de recursos. Assim, abrange não só o recebimento de recursos de fontes ilícitas e vedadas (vide art. 24 da LE), como também sua obtenção de modo ilícito, embora aqui a fonte seja legal".

À luz dessa doutrina, no caso concreto, a omissão de receita na prestação de contas impediu a fiscalização, por esta justiça especializada, tanto em relação à licitude da fonte, quanto à identificação dos doadores e respectivos limites legais.

Quantos aos gastos, a seu turno, despiciendo tecer maiores considerações, uma vez que a prática de captação ilícita de sufrágio, por exemplo, já reconhecida nestes autos, nada mais é do que gasto ilícito de recursos para fins eleitorais, havendo perfeita subsunção do fato à norma.

 

O mesmo intuito de rediscussão da causa pode ser identificado relativamente à condenação por abuso de poder econômico (art. 22 da  Lei Complementar n. 64/90).

Diversamente da argumentação do recorrente, não se verifica a utilização de expressões jurídicas indeterminadas conferindo obscuridade à decisão, tampouco a ausência de discriminação dos valores ilicitamente movimentados, ou dos elementos objetivos dotados de gravidade suficiente para afetar a normalidade e o equilíbrio do pleito, como se extrai do seguinte trecho do acórdão (fls. 2552-2554):

Na hipótese dos autos, não resta dúvida de que os valores movimentados por CLAUDIOMIRO na sua campanha eleitoral constituem flagrante abuso de poder econômico com violação ao princípio da paridade de armas entre os candidatos.

A conduta envolveu valores excessivos e desproporcionais, haja vista a demonstração dos fatos até aqui examinados, como o relativo ao cheque apreendido no Posto Burmann, no valor de R$ 8.184,00, para pagamento de vales-combustíveis, especialmente se considerado o tamanho do Município de Ijuí, de médio porte.

Nesse mesmo sentido, colaciono a jurisprudência desta Casa:

Recurso. Ação de investigação judicial eleitoral. Prefeito e vice não eleitos. Abuso de poder econômico. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Inelegibilidade. Eleições 2012.Preliminares de ilicitude da prova e de inovação recursal rejeitadas: a) a juntada de prova emprestada “realizada em processo criminal em que se apuraram os mesmos fatos”, antes da apresentação das alegações finais, não configura afronta ao devido processo legal. Oportunizado aos réus o contraditório, que dele se utilizaram e se manifestaram, inclusive sobre a prova cuja ilicitude se alega; b) pequena modificação à tese da defesa, nas razões recursais, não caracteriza inovação recursal.

1. Abuso de poder econômico. Existência de provas materiais e testemunhais demonstrando a distribuição de vales-combustível e a concomitante adesivação dos veículos dos eleitores com a propaganda dos recorrentes. Difusão massiva da candidatura no cenário de disputa política local, representando utilização de recursos financeiros de forma abusiva. Manutenção da condenação e da declaração da inelegibilidade dos recorrentes pela prática do abuso de poder econômico previsto no art. 22, caput, c/c inciso XIV, da Lei Complementar n. 64/90.

2. Captação ilícita de sufrágio. Entrega de dinheiro e vale-gás a eleitora em troca do voto. Ausência da prova robusta e incontroversa da ocorrência do especial fim de agir para a negociação do voto. Reforma da sentença no ponto. Afastada a pena de multa.

Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n 46429, ACÓRDÃO de 08.10.2015, Relator(a) DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator(a) designado(a) DR. LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 187, Data 13.10.2015, Página 4.) (Grifei.)

Por essas razões, reportando-me à análise do caderno probatório acima realizada, entendo que restou suficientemente comprovada a prática de abuso do poder econômico pelo recorrente, devendo ser mantida a sentença também nesse sentido.

Acrescento que as contradições passíveis de adequação por meio de embargos declaratórios são as de natureza interna, ou seja, aquelas eventualmente existentes entre o relatório, a fundamentação e o dispositivo da própria decisão impugnada, e não entre esta e outras decisões do órgão julgador ou de instância superior.

Este Tribunal, aliás, tem rejeitado embargos de declaração destinados a rediscutir a matéria, quando a contradição apontada é externa ao julgado, como se depreende das seguintes ementas:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ALEGADA OMISSÃO. DECISÕES JURISPRUDENCIAIS CONFLITANTES. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 16-A DA LEI N. 9.504/97. INEXISTÊNCIA DOS VÍCIOS. DESACOLHIMENTO.

Os aclaratórios servem para afastar obscuridade, contradição ou omissão, nos termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil. O acórdão embargado analisou a circunstância fática em todos os elementos relevantes, firmando sua conclusão de acordo com os fundamentos jurídicos apresentados.

A análise de eventuais precedentes em sentido contrário à decisão não justifica o manejo dos embargos de declaração, devendo a irresignação ser dirigida à superior instância pela via de recurso próprio. Tampouco configurada a alegada negativa de vigência ao art. 16-A da Lei n. 9.504/97 e ao art. 222 do Código Eleitoral, pois o aproveitamento de votos para a legenda está disciplinado no art. 175, § 4º, do Código Eleitoral, como expressamente consignado na decisão. Inexistência dos vícios apontados.

Desacolhimento.

(TRE-RS, EDcl. no RE n. 599-02, Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado na sessão de 11.10.2018.) (Grifei.)

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. LEGALIDADE DAS DOAÇÕES ORIUNDAS DE DETENTORES DE MANDATO ELETIVO. ALEGADA EXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÃO E OMISSÃO ENTRE O ACÓRDÃO E OS PRECEDENTES. INEXISTÊNCIA DOS VÍCIOS. REJEIÇÃO.

Oposição contra acórdão alegadamente omisso e contraditório. Inexistência dos vícios elencados no art. 275, caput, do Código Eleitoral c/c art. 1.022 do Código de Processo Civil para o manejo dos aclaratórios. A contradição passível de ser eliminada por meio dos embargos de declaração é aquela eventualmente existente entre o relatório, a fundamentação e o dispositivo; não entre a decisão embargada e outras decisões ou precedentes deste Tribunal ou mesmo jurisprudência da instância superior. Decisão adequadamente fundamentada, com enfrentamento das questões suscitadas pelos embargantes. Inviável, em sede de embargos, a rediscussão da matéria, devendo a contrariedade com a decisão que lhe foi desfavorável ser dirigida à instância recursal apropriada.

Rejeição.

(TRE, EDcl. na PC n. 4-87, Relator Des. Eleitoral Jorge Luís Dall'Agnol, julgado na sessão de 09.4.2018.) (Grifei.)

 

Embargos de declaração. Pedido de atribuição de efeitos infringentes. Prestação de contas. Candidato. Desaprovação. Art. 1022 do Código de Processo Civil. Eleições 2010.

1. Alegada contradição no acórdão, por não condicionar a obtenção de quitação eleitoral ao efetivo recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, o que vem destoar do tratamento dado às multas eleitorais não pagas. Diferença conceitual entre os institutos. Disposição expressa em lei condicionando a quitação ao pagamento das multas eleitorais, circunstância que não ocorre com relação às determinações de recolhimento ao Tesouro Nacional.

2. A contradição passível de ser enfrentada via embargos é aquela interna ao julgado. A comparação entre acórdãos que enfrentam matérias distintas não autoriza o manejo dos aclaratórios.

3. Rejeição, seja por apontar contradição externa, seja por rediscutir as razões do decisum.

(Petição n 5683, ACÓRDÃO de 24.8.2016, Relatora DRA. MARIA DE LOURDES GALVÃO BRACCINI DE GONZALEZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 156, Data 26.8.2016, Página 5.) (Grifei.)

 

Ressalto ser desnecessário que o órgão julgador justifique, explicitamente, as razões de não ter adotado legislação ou orientação jurisprudencial diversas, bastando que aborde os elementos essenciais e determinantes para solucionar a lide, de forma lógica e clara, mantendo coerência entre os fundamentos e as conclusões aduzidas em sua decisão, conforme preconiza o art. 93, inc. IX, Constituição Federal:

Art. 93. (...)

IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; […]

Por fim, o recurso também não merece acolhida para que sejam prequestionados os arts. 5º, incs. X, XII, LIV e LV, e art. 93, inc. IX, da Constituição Federal; arts. 372, 373, 454, §§ 1º a 3º, e 489, § 1º, incs. II, IV, V e VI, do Código de Processo Civil; arts. 30-A e 41-A da Lei n. 9.504/97 e art. 22, incs. I, XIV e XV e § 3º, da  Lei Complementar n. 64/90.

E isso porque, consoante a dicção do art. 1.025 do Código de Processo Civil, todos os elementos suscitados pelo recorrente consideram-se incluídos no acórdão para fins de prequestionamento, ainda que os embargos declaratórios sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade na decisão impugnada, cabendo à parte interessada, na hipótese de identificar violação a disposições expressas de lei, manejar o competente recurso especial, nos termos do art. 276, inc. I, al. “a”, do Código Eleitoral.

A respeito desse tema, colaciono os seguintes arestos desta Corte:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. ALEGADA OMISSÃO E OBSCURIDADE NO ACÓRDÃO. INEXISTÊNCIA DOS VÍCIOS. PREQUESTIONAMENTO. REJEIÇÃO.

Oposição contra acórdão alegadamente omisso e obscuro. Inexistência dos vícios elencados no art. 1.022 do Código de Processo Civil para o manejo dos aclaratórios. As questões trazidas nos embargos foram integralmente apreciadas no contexto do acórdão impugnado, do que se infere uma tentativa de rediscussão da matéria fático-jurídica debatida no processo, hipótese não abrigada por essa via recursal. Consideram-se incluídos no acórdão impugnado os dispositivos legais suscitados para fins de prequestionamento, ainda que inadmitidos os aclaratórios, caso o tribunal superior reconheça a existência de omissão, contradição ou obscuridade, à luz do art. 1.025 do Código de Processo Civil. Rejeição.

(EDcl. no RE n. 328-29, Relatora Desa. MARILENE BONZANINI, DEJERS de 22.8.2018, pg. 3.) (Grifei.)

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. OMISSÃO E OBSCURIDADE. ORIGEM DE RECURSOS. PREQUESTIONAMENTO. REJEIÇÃO.

Aclaratórios em que se apontam omissão e obscuridade quanto à análise do art. 30, §§ 2º e 2º-A da Lei n. 9.504/97. A insurgência contra decisão desfavorável deve ser atacada via recurso próprio, e não por meio de embargos. O financiamento de campanha deve observar a legislação de regência. Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de prequestionamento, à luz do art. 1.025 do Código de Processo Civil.

Rejeição.

(EDcl. no RE n. 284-50, Relator Des. Eleitoral Eduardo Augusto Dias Bainy, julgado na sessão de 19.9.2017.) (Grifei.)

 

Por essas razões, entendendo que não restaram configuradas as omissões e obscuridades identificadas pelo recorrente, nos moldes delineados pelo art. 275 do Código Eleitoral c/c o art. 1.022 do Código de Processo Civil,  assim como se mostra despiciendo o prequestionamento explícito dos dispositivos legais por ele invocado, estou encaminhando meu voto pelo conhecimento e pela rejeição dos embargos declaratórios, mantendo integralmente o acórdão impugnado.

 

Dispositivo

Diante do exposto, voto por conhecer e rejeitar os embargos declaratórios opostos por CLAUDIOMIRO GABBI PEZZETTA, mantendo integralmente o acórdão das fls. 2526-2560.