RE - 2498 - Sessão: 10/06/2019 às 11:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso oposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de MANOEL VIANA em face da decisão da 79ª Zona Eleitoral – São Francisco de Assis (fls. 204-209), que desaprovou as contas do diretório municipal da agremiação relativas ao exercício de 2016, aplicando ao órgão partidário a sanção de recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 1.463,10 (um mil, quatrocentos e sessenta e três reais e dez centavos), com acréscimo de multa de 8,73%, em 04 (quatro) parcelas mensais.

Em suas razões (fls. 213-215), a agremiação afirmou que a identificação dos doadores dos valores foi realizada por documentos juntados na defesa apresentada pelo partido, os quais não foram considerados por não indicarem os nomes dos doadores originários. Acrescentou que, após a prolação da sentença, obteve documentação adicional, que acostou ao recurso (fls. 216-218). Requereu a reforma da decisão de primeira instância ou a diminuição ou exclusão da condenação, por tratar-se de representação partidária de cidade pequena.

Após manifestação do Ministério Público Eleitoral (fl. 220 e v.), nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela desconsideração de documentos juntados em sede recursal, pelo reconhecimento de nulidade da sentença ante a não aplicação da sanção de suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fls. 225-236v.).

Os autos foram remetidos à Secretaria de Controle Interno e Auditoria, que considerou que os valores não foram devidamente identificados, endossando a análise técnica realizada em primeira instância (fls. 244-249).

É o relatório.

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O apelo é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, motivo pelo qual dele conheço.

Preliminares

1. Pedido de atribuição de efeito suspensivo

Inicialmente, em relação ao pedido de atribuição de efeito suspensivo à irresignação, destaco que o art. 52 da Resolução TSE n. 23.546/17, que regula as questões processuais nas ações de prestações de contas de exercícios financeiros de partidos políticos, prevê a atribuição de tal efeito aos recursos.

Assim, a concessão de efeito suspensivo aos recursos em prestação de contas ocorre de forma automática e ex lege.

2. Preliminar de nulidade

A Procuradoria Regional Eleitoral suscita a nulidade na sentença diante da ausência de aplicação da sanção de suspensão de novas quotas do Fundo Partidário, o que seria decorrência automática do art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95 e do art. 47, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Argumenta que o afastamento da incidência de normas cogentes não é possível ante o mero silêncio da sentença. Acrescenta que questões de ordem pública não são alcançadas pela preclusão e, subsidiariamente, entende ser cabível a aplicação da referida sanção de ofício, com amparo na teoria da causa madura, por tratar-se de obrigação legal.

Ocorre que a sentença não foi omissa quanto à sanção. Pelo contrário, o juízo a quo consignou que a sanção de suspensão do Fundo Partidário seria inaplicável na hipótese. Vejamos:

Mister destacar, nesse passo, a inaplicabilidade da sanção de suspensão “até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral”, prevista pelo art. 36, I, da Lei 9.096/95 e pelo art. 47, II, da Resolução TSE n. 23.464/2015, na medida em que incompatível com o instituto da preclusão. (fls. 204-209)

Dessa forma, o acerto ou desacerto quanto ao conteúdo da decisão somente poderia ser enfrentado mediante recurso, o que não é o caso dos autos.

Afasto, assim, a preliminar de nulidade da sentença.

Mérito

Passo ao exame do mérito.

A desaprovação das contas foi fundamentada no recebimento dos valores de R$ 10,00 e R$ 210,00 sem identificação do número do CPF dos doadores no extrato bancário, e de R$ 1.243,10, quantia oriunda do diretório nacional do partido, sem identificação dos doadores originários.

Tais falhas, identificadas como irregularidades, comprometeriam a confiabilidade e a transparência das contas, segundo consignado pelo juízo a quo, verbis:

Constata-se irregularidade o recebimento em conta-corrente do partido do valor de R$ 10,00, na data de 01.4.2016, sem a devida identificação do n. do CPF do doador no extrato bancário, bem como ausente assinatura do suposto doador no recibo de doação eleitoral n. P1300.04.86940.RS.000137 à fl. 82, caracterizando tal como recurso de origem não identificada, conforme disposto no art. 13, parágrafo único, I, “b”, da Resolução TSE n. 23.464/2015, equivalendo a 0,30% do total dos recursos arrecadados pelo órgão partidário no exercício financeiro de 2016.

Há grave irregularidade, também, na ausência de discriminação da origem dos recursos recebidos do diretório nacional do Partido dos Trabalhadores - PT, conforme recibos de doação eleitoral ns. P1300.04.86940.RS.000122 à fl. 72 (R$ 1.160,11) e P1300.04.86940.RS.000142 à fl. 84 (R$ 82,99), confirmado pela movimentação financeira anotada nos extratos bancários às fls. 36 e 38, respectivamente, ou seja, de necessário registro que permitisse a clara identificação da origem dos valores e a identidade dos doadores originários, porquanto inviabilizada a fiscalização de eventual incursão em fonte vedada (art. 31 da Lei n. 9.096/1995 e art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/2015), caracterizando-se o montante de R$ 1.243,10 transferido pelo órgão partidário nacional, portanto, como recurso de origem não identificada, nos termos do art. 13, parágrafo único, I, "a", da Resolução TSE n. 23.464/2015, equivalendo a 37,08% do total dos recursos arrecadados pelo órgão partidário no exercício financeiro de 2016.

Apresenta-se igualmente irregular, a flagrante inobservância da regra insculpida pelo art. 13, parágrafo único, I, “b”, da Resolução TSE n. 23.464/2015, com relação ao apontamento IV, “d”, do parecer técnico conclusivo à fl. 153-verso, com a retificação pertinente da 4ª consideração inicial da manifestação da unidade técnica à fl. 189, corroborado pela análise do item VII da referida manifestação à fl. 190 e verso.

Do montante inicialmente tido como irregular de R$ 650,00, chegou-se a conclusão de que apenas R$ 210,00 configuram-se como recursos de origem não identificada, uma vez que omissa a identificação dos ns. dos CPF's nos extratos bancários, bem como ausentes as assinaturas dos supostos doadores nos recibos de doações eleitorais referidos no item VII da manifestação da unidade técnica à fl. 190 e verso, equivalendo a 6,26% do total dos recursos arrecadados pelo órgão partidário no exercício financeiro de 2016.

De todo o exposto, pelos documentos acostados nos autos, considerando os pontos arguidos pela defesa do órgão partidário e o parecer final do Ministério Público Eleitoral, evidente a ocorrência de impropriedades e irregularidades comprometendo, no conjunto, a confiabilidade e a transparência das contas.

O recorrente argumenta que a documentação juntada é suficiente para esclarecer a origem dos montantes.

A legislação eleitoral determina, explicitamente, que as “contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de quantias provenientes de outro partido político ou de candidatos” (art. 7º da Resolução TSE n. 23.464/15, que regulamenta o art. 39, § 3º, inc. II, da Lei dos Partidos Políticos).

Ainda quanto aos recursos provenientes de outros níveis de direção do mesmo partido político, a mesma resolução impõe a identificação do doador originário (art. 11, inc. III).

Na hipótese, tanto o exame técnico em primeira instância quanto a análise da documentação feita pela Secretaria de Controle Interno e Auditoria deste Regional apontaram que os doadores originários dos recursos repassados pela direção nacional do partido não foram devidamente identificados.

Nesta instância, o órgão técnico apontou que (fls. 244-249):

[...]

No que diz respeito às contribuições oriundas destas contas bancárias, o partido demonstra que o Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores repassou ao diretório municipal do PT de Manoel Viana parte das contribuições recebidas de sues filiados (fls. 216/218). Porém, não há como evidenciar a devida correspondência dos créditos, com as informações constantes na documentação acostada, uma vez que, no Diretório Nacional, os aludidos contribuintes/filiados (doadores originários) não estão identificados nos extratos bancários de forma individualizada, com o cpf do doador, ou seja, não há como validar a identidade do doador originário indicado pela Direção Nacional.

[…]

Ainda, a origem de 87% dos recursos foram de anos anteriores a 2016, ou seja, impossibilita a correspondência dos créditos dos contribuintes quando do repasse pelo Diretório Nacional do PT ao Diretório Municipal do PT de Manoel Viana.

[...]

Anoto que a sistemática de repasse de valores adotada pelo partido também vem sendo considerada irregular por outros regionais por não permitir a identificação dos doadores originários, como demonstra a decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Norte cuja ementa abaixo se transcreve:

RECURSO ELEITORAL - PRESTAÇÃO DE CONTAS - PARTIDO POLÍTICO - EXERCÍCIO FINANCEIRO - 2014 - DOAÇÕES E CONTRIBUIÇÕES AO PARTIDO - ART. 4º, § 2º, DA RESOLUÇÃO/TSE Nº 21.841 - NECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DOS DOADORES - FALTA DE IDENTIFICAÇÃO PRECISA - IRREGULARIDADE GRAVE - DÚVIDA QUANTO À ORIGEM DOS RECURSOS ARRECADADOS - UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DE FONTE NÃO IDENTIFICADA - IRREGULARIDADE GRAVE - DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS - DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DA QUANTIA TIDA POR IRREGULAR AO ERÁRIO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA - DESPROVIMENTO DO RECURSO

Segundo o art. 4º, § 2º, da Resolução/TSE nº 21.841, doações e contribuições de recursos devem ser efetuadas por cheque nominativo cruzado ou por crédito bancário identificado, diretamente na conta do partido político (art. 39, § 3º, Lei nº 9.096/95, vigente à época dos fatos). Tal regra tem por finalidade identificar os doadores, a fim de que não haja ofensas à norma eleitoral no tocante à vedações de fontes, controle de limites de doações, formação de caixa dois de recursos, dentre outras particularidades.

Nesse particular, a falta de identificação precisa dos doadores de campanha constitui irregularidade grave na prestação de contas, em virtude das dúvidas geradas quanto à verdadeira origem dos recursos em espécie arrecadados, comprometendo, dessa forma, a verificação da legitimidade desses recursos e a credibilidade das contas prestadas.

Na espécie, o processo de débitos (de recursos doados) e créditos (de contribuições de filiados) utilizado pelo partido, na forma ocorreu em Mossoró (de modo genérico, sem que haja efetiva identificação dos doadores pelo banco conveniado), fere o art. 4º, § 2º, da Resolução/TSE nº 21.841, ao não identificar os doadores, não imprimindo segurança acerca da licitude da origem dos créditos.

Planilha elaborada pela contadoria do partido, onde relaciona os filiados doadores e suas respectivas contribuições, acompanhadas de documentos denominados "Apoio à contabilidade - pagamentos efetuados pelo DN" e recibos de doação, são documentos produzidos de modo unilateral pela agremiação, inexistindo qualquer liame seguro que demonstre que os reais doadores são aqueles titulares das contas bancárias onde ocorreu o débito automático da contribuição.

A utilização de recursos de fonte não identificada, concernentes a créditos bancários sem comprovação de sua origem lícita, consubstancia irregularidade grave, capaz de ensejar a desaprovação das contas, com a determinação de seu recolhimento ao erário, nos termos do Art. 6º da Resolução 21.841 do TSE. Precedentes.

Sendo a falha relativa a recursos de origem não identificada, deve ser recolhido ao erário, pelo órgão municipal, a quantia de R$ 13.981,31, como determina o art. 6º da Resolução/TSE nº 21.841.

Recurso conhecido e desprovido.

(TRE-RN, RECURSO ELEITORAL n. 3481, ACÓRDÃO n. 283/2018 de 09.8.18, Relator LUIS GUSTAVO ALVES SMITH, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data: 22.8.18, pp. 4-5.)

Dessa forma, deve ser mantida a sentença em relação à existência de valores sem origem identificada na contabilidade, no valor de R$ 1.243,10.

Em relação ao recebimento dos valores de R$ 10,00 e R$ 210,00 sem informação acerca do número do CPF dos doadores no extrato bancário, o recorrente afirma que os responsáveis “não sabem informar por que não estão identificados provavelmente por falta de atenção no momento de identificalos ou na própria prestação” (sic).

Como já mencionado, o regulamento determina que a identificação das doações recebidas se faz pela aposição do número de inscrição do CPF, bem como constituem importâncias de origem não identificada aquelas em que a inscrição do CPF do doador ou contribuinte não tenha sido informada (art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.564/15).

As alegações do recorrente não são aptas a justificar a omissão do registro, de forma que a sentença deve ser mantida também nesse ponto.

Ademais, a constatação da existência de recursos de origem não identificada impõe a determinação de recolhimento do montante ao Tesouro Nacional (art. 14 da Resolução TSE n. 23.464/15).

A multa fixada pelo juízo a quo, no patamar de 8,73% sobre o montante glosado, é razoável e proporcional, de forma que não se justifica sua alteração.

Repriso que a sentença considerou inaplicável a sanção de suspensão do Fundo Partidário e que não houve recurso quanto ao ponto.

Portanto, a desaprovação das contas do PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) de MANOEL VIANA relativas ao exercício de 2016 deve ser mantida, bem como a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 1.463,10 (um mil, quatrocentos e sessenta e três reais e dez centavos), com acréscimo de multa de 8,73%.

Diante do exposto, VOTO por rejeitar a preliminar de nulidade e, no mérito, por negar provimento ao recurso.

É como voto, senhor Presidente.