RE - 2158 - Sessão: 05/11/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT do Município de Novo Hamburgo (fls. 368-375) contra sentença do Juízo da 172ª Zona Eleitoral (fls. 343-348), que desaprovou a sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2016 – a qual também é integrada pelos dirigentes partidários responsáveis –, determinando o recolhimento da quantia de R$ 108.376,69 ao Tesouro Nacional, acrescida de multa de 20%, em virtude do recebimento de recursos de fonte vedada e de origem não identificada, assim como a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário: a) pelo período de um ano, diante do recebimento de recursos de fonte vedada; e b) até o devido esclarecimento da origem dos recursos, quanto às receitas sem identificação da origem.

Em suas razões, o recorrente suscitou preliminar de cerceamento de defesa, em razão do indeferimento de pedido de produção de prova testemunhal, e, no mérito, sustentou que a identificação da origem dos depósitos e/ou transferências realizadas em suas contas bancárias mediante indicação do CPF do doador/contribuinte é uma liberalidade das instituições bancárias, e não atribuição do partido.

Aduziu que todas as receitas auferidas pela agremiação no exercício em questão, inclusive os depósitos em dinheiro efetuados pela própria Direção Municipal do PT, encontram-se discriminadas na peça “Demonstrativo de Contribuições Recebidas” (fls. 70-80). Asseverou que a decisão guerreada é contraditória, uma vez que aponta os valores tidos por irregulares como oriundos tanto de origem não identificada quanto de fontes vedadas.

No que concerne às receitas consideradas como provenientes de fontes vedadas, sustentou o recorrente que a legislação de regência tem sido objeto de constantes alterações que conduziram a um alargamento demasiado do termo “autoridade”. Defendeu, no ponto, que o enquadramento dos valores como de fonte vedada deveria ter se restringido àqueles provenientes de doações feitas por ocupantes de cargos com poderes de direção e chefia na Administração Pública, devidamente excluídos aqueles de caráter administrativo executório e de assessoramento, não enquadrados no conceito de autoridade.

Arguiu que a doação dos servidores públicos referidos no art. 12, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14 não é vedada pela Lei das Eleições.

Suscitou, ainda, que o partido repetiu, no exercício de 2016, a conduta adotada em períodos anteriores, em que teve as contas aprovadas, como no exercício 2013. Dessa forma, a desaprovação da contabilidade sob exame implicaria ofensa ao princípio da segurança jurídica. Finalizou requerendo a aprovação das contas.

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela rejeição da preliminar de nulidade da sentença e, no mérito, pelo parcial provimento do recurso, para, (a) mantendo-se a desaprovação da contabilidade pelo recebimento de recursos de origem não identificada, afastar a condenação pelo aporte de receita de fonte vedada, por serem incompatíveis, e (b) subsidiariamente, caso afastada a desaprovação pelo recebimento de recursos de origem não identificada, manter a condenação por aqueles oriundos de fonte vedada, com as sanções correspondentes, excluindo-se os valores advindos de exercentes de cargos de mero assessoramento.

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo (fls. 351-357 e 363-368) e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Preliminar de cerceamento de defesa

De plano, afasto a preliminar de cerceamento de defesa arguida pelo recorrente.

Sustenta o partido que lhe foi negado o direito à ampla defesa, sob o argumento de que o juízo a quo indeferiu prova (testemunhal e documental) que pretendia produzir.

Refere-se a pedido, apresentado em sede de defesa (fls. 308-311), de oitiva do responsável técnico pela contabilidade do órgão partidário ou, alternativamente, sua intimação para que produzisse manifestação escrita.

A tese não prospera.

A teor do disposto no art. 370 do Código de Processo Civil, cabe ao magistrado, destinatário final do acervo probatório carreado aos autos, direcionar o curso da instrução mediante a avaliação da necessidade ou não da produção probatória, não configurando cerceamento de defesa o indeferimento de prova quando o julgador entender que ela é prescindível para o deslinde da demanda.

Nesse sentido, pacífica a jurisprudência, conforme ilustra, a título exemplificativo, o seguinte julgado deste Tribunal:

Recurso. Registro de candidatura. Impugnação. Cargo de vereador. Inelegibilidade. Desincompatibilização. Lei Complementar n. 64/90. Eleições 2016.

Decisão do juízo eleitoral pela improcedência da impugnação e deferimento do registro de candidatura, por entender preenchidos os requisitos legais.

Preliminar afastada. Não vislumbrado cerceamento de defesa. Cabe ao magistrado verificar a pertinência ou não das provas requeridas pelas partes.

Exigência de afastamento de três meses anteriores à data do pleito para os membros de conselhos municipais, porquanto equiparados a servidores públicos, nos termos do art. 1º, inc. II, al. “l”, da LC n. 64/90. Na condição de membro do conselho municipal da saúde, provada a sua desincompatibilização por meio da declaração firmada pelo presidente do aludido órgão, no sentido do desligamento das funções em tempo hábil.

Provimento negado

(TRE/RS - RE n. 23550, Relatora Dra. Gisele Anne Vieira de Azambuja, PSESS em 11.10.2016.) (Grifei.)

Ademais, não foi demonstrada, in casu, a pertinência da oitiva da referida testemunha, não havendo, de igual forma, demonstração da existência de circunstância que obstasse à apresentação espontânea, por parte da agremiação, de manifestação escrita eventualmente produzida pelo contabilista.

No ponto, peço vênia para transcrever trecho da manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral, extraído do parecer de fls. 386-397, e incorporá-lo às razões de decidir:

Em que pese ter sido indeferido o pedido do partido para que o contador que assina a prestação de contas fosse intimado para ser ouvido em juízo ou, subsidiariamente, para que fosse intimado para juntar manifestação escrita, nada impedia que o próprio partido acostasse eventual parecer do aludido contador da agremiação, não havendo necessidade de intimação do mesmo para tanto. Destarte, o indeferimento da intimação do contador não trouxe prejuízo ao partido, que poderia ter feito a juntada da manifestação escrita independentemente de intimação, incidindo, pois, o princípio pas de nullité sans grief (não há nulidade sem prejuízo), insculpido no art. 219 do Código Eleitoral e art. 282, § 1º, do CPC/2015, aplicável subsidiariamente ao processo judicial eleitoral.

Assim, por não vislumbrar o prejuízo alegado, rejeito a preliminar.

 

Mérito

O PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT do Município de Novo Hamburgo interpôs recurso (fls. 368-375) contra sentença do Juízo da 172ª Zona Eleitoral (fls. 343-348), que desaprovou sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2016, determinando o recolhimento, ao Tesouro Nacional, do valor de R$ 108.376,69, acrescido de multa de 20%, assim como a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 01 (um) ano, devido ao recebimento de recursos de origem não identificada e de fontes vedadas.

De acordo com a sentença, do total de receitas arrecadadas pela agremiação em 2016 - R$ 128.729,71, mais de 80% foram havidos de forma irregular, porquanto de origem não identificada. Parte desse percentual – R$ 24.767,00, foi considerado, também, como advindo de titulares de cargos de direção e chefia junto ao Poder Executivo Municipal, enquadráveis no conceito de autoridade pública, em infração à regra constante no art. 12, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Em suas razões, o recorrente alega que A identificação de recursos oriundos de fonte vedada escancara a contradição da sentença, porque ao mesmo tempo que o argumento de que os documentos carreados ao feito impedem a identificação de receitas, existe o aponte de receitas oriundas de fonte vedada.

Com razão a agremiação recorrente.

Com efeito, a sentença está a merecer reforma no ponto em que considerou, a um só tempo, a receita como advinda de fonte vedada e de origem não identificada.

Explico.

De acordo com o magistrado sentenciante, verbis:

O mesmo estudo técnico apontou as seguintes irregularidades: receitas de fontes vedadas (154) representando 19,2395% (R$ 24.767,00) dos recursos declarados (R$ 128.729,71); receitas sem identificação nos extrato bancários do Banrisul (R$ 11.180,85) e da Caixa Econômica Federal (R$ 95.185,84), que representa 82.6279% dos recursos declarados; receitas de origem identificada com o CNPJ do próprio Partido no extrato bancário, no montante de R$ 1.380,00, representando 1,0720% do montante dos recursos declarados; receitas cujos doadores/contribuintes declarados pela agremiação não coincidem com extratos bancários.

A leitura do texto acima demonstra que o numerário de R$ 24.767,00 foi ao mesmo tempo considerado como proveniente de fonte vedada e de origem não identificada, conclusão que desafia a lógica, uma vez que, a prevalecer tal entendimento, a soma dos valores tidos por irregulares corresponderia a R$ 132.513,69 (R$ 24.767,00 + R$ 11.180,85 + R$ 95.185,84 + R$ 1.380,00), ultrapassando em R$ 3.783,98 o total de receitas arrecadadas (R$ 128.729,71).

Dito de outra forma, o percentual das irregularidades corresponderia a absurdos 102,9394% da arrecadação do partido (19,2395% + 82,6279% + 1,0720%).

No ponto, reproduzo, por oportuno, o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (fls. 386-396), cujos fundamentos abaixo transcrevo e, desde já, adoto como razões de decidir:

Iniciaremos a análise do recurso pela irregularidade consistente no recebimento de recursos sem identificação de origem, haja vista que o reconhecimento do recebimento de recursos de fontes vedadas deve se dar apenas subsidiariamente, caso afastada a existência de recursos de origem não identificada relativamente aos detentores de cargos de chefia e direção.

Dizemos isso, pois a Unidade Técnica, no seu parecer conclusivo, deixa claro que os recursos considerados como de fonte vedada foram também considerados como recursos de origem não identificada. Veja-se o seguinte trecho do parecer (fl. 221 e 228):

Das receitas acima declaradas pelo Partido, R$ 24.137,00 (vinte e quatro mil cento e trinta e sete reais) não puderam ser identificadas nos extratos bancários. Tais valores – observação na 2ª tabela acima – constarão igualmente como valores de origem não identificada. […] Considerando-se a sobreposição de R$ 24.137,00, que são ao mesmo tempo fonte vedada declarada e recurso não identificado nos extratos bancários, o montante de recursos advindos de fontes vedadas e de origem não identificada resultam num montante de R$ 106.996,69 [...]

É dizer, o responsável pelo parecer da Unidade Técnica identificou os detentores de cargos de chefia e direção, com base no Demonstrativo de Contribuições Recebidas juntado pelo partido (fls. 70-80), e por isso fez constar a irregularidade do recebimento de fonte vedada, mas, como não constava a identificação dos doadores nos extratos, considerou, igualmente, que essas mesmas doações eram de origem não identificada.

Entendemos que, por uma questão de lógica, se o Demonstrativo de Contribuições Recebidas trazido pelo partido não é suficiente para caracterizar a origem da doação, com o que concordamos, então não é possível dizer que os exercentes de cargos de chefia e direção que constavam da referida relação efetivamente realizaram as doações.

Pelas razões acima, entendo que, no caso dos autos, a irregularidade constatada consiste exclusivamente na ausência de identificação da origem de receitas, razão pela qual deixo de analisar a matéria sob o aspecto da vedação imposta aos doadores exercentes de cargos demissíveis ad nutum.

Prossigo.

Rezam os arts. 7º, caput, 8º, §§ 1º e 2º, e 13 da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

Art. 8º [...]

§ 1º As doações em recursos financeiros devem ser, obrigatoriamente, efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político ou por depósito bancário diretamente na conta do partido político (Lei nº 9.096/95, art. 39, § 3º).

§ 2º O depósito bancário previsto no § 1º deste artigo deve ser realizado nas contas “Doações para Campanha” ou “Outros Recursos”, conforme sua destinação, sendo admitida sua efetivação por qualquer meio de transação bancária no qual o CPF do doador ou contribuinte, ou o CNPJ no caso de partidos políticos ou candidatos, sejam obrigatoriamente identificados.

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I - o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF do doador ou contribuinte, ou no CNPJ, em se tratando de partidos políticos ou candidatos: a) não tenham sido informados; ou b) se informados, sejam inválidos, inexistentes, nulos, cancelados ou, por qualquer outra razão, não sejam identificados;

II - não haja correspondência entre o nome ou a razão social e a inscrição no CPF ou CNPJ informado; e

[...]

O órgão técnico responsável pelo exame das contas apurou que não foram identificados pelos respectivos números de inscrição no cadastro de pessoas físicas (CPF), nos extratos bancários, os doadores/contribuintes responsáveis pelos aportes financeiros assinalados no exercício 2016. Verificada, ainda, entrada de recursos pelo próprio órgão municipal do Partido dos Trabalhadores de Novo Hamburgo.

Com efeito, um simples exame dos extratos acostados às fls. 14-60 revela que não foi observada a legislação de regência, visto que os créditos foram realizados na conta bancária do partido sem qualquer identificação do doador, vício que alcança, inclusive, os aportes onde constou o CNPJ do próprio recorrente.

A agremiação atribui a responsabilidade ao sistema bancário, sustentando que as instituições Caixa Econômica Federal e Banrisul teriam permitido depósitos na conta do partido sem discriminação dos respectivos depositantes. Alega que os doadores encontram-se identificados na peça “Demonstrativo de Contribuições Recebidas” (fls. 70-80), que integrou sua prestação de contas.

A alegação não merece acolhida.

A responsabilidade pela identificação dos doadores é da agremiação partidária, a quem incumbe o conhecimento e a fiel observância do sistema legal vigente.

Importante frisar que, dado seu caráter meramente declaratório, a relação de doadores apresentada pela agremiação não é suficiente para suprir a ausência de indicação do doador nos extratos bancários, porquanto se trata de documento produzido internamente pelo partido, ao passo que a identificação do contribuinte deve ocorrer na própria operação bancária, conforme previsto na legislação que regula a matéria.

Nesse sentido é a jusrisprudência desta Corte, conforme ilustra a ementa dos seguintes julgados:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2016. DESAPROVAÇÃO. CONTRIBUIÇÕES DE FONTES VEDADAS. AUTORIDADES E DETENTORES DE MANDATO ELETIVO. RECEBIMENTO DE RECURSO FINANCEIRO SEM IDENTIFICAÇÃO DE DOADOR ORIGINÁRIO. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Conhecimento de documentos em grau recursal, por força do art. 266 do Código Eleitoral.

2. O art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 proíbe o recebimento de doações provenientes de autoridades públicas, dentre elas os detentores de cargos em comissão que desempenhem função de chefia e direção.

3. Licitude das doações efetuadas por detentores de mandato eletivo, pois eleitos pelo povo em obediência aos princípios democrático e republicano.

4. Ingresso de recursos na conta bancária do diretório, sem a identificação do doador originário, contrariando o que dispõe o art. 7° da Resolução TSE n. 23.464/15.

5. Provimento parcial para reduzir o valor considerado irregular e a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário para 8 meses, mantidos os demais termos da sentença.

(TRE-RS - RE 1453 – Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira – J. Sessão dia 23.5.2018) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2015. FALTA DE APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS E PEÇAS INDISPENSÁVEIS. RECURSOS SEM TRÂNSITO NA CONTA BANCÁRIA. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. COMPROMETIDA A TRANSPARÊNCIA DAS CONTAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. SUSPENSÃO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DESAPROVAÇÃO.

1. As peças relacionadas na normatização regente são imprescindíveis para que a Justiça Eleitoral possa exercer o controle dos recursos arrecadados e dos gastos realizados. A impossibilidade de confrontação das informações declaradas malfere a transparência, a publicidade e a confiabilidade das informações prestadas.

2. A arrecadação de receitas sem trânsito de recursos pela conta bancária é irregularidade grave que impede a atuação fiscalizatória quanto à licitude das quantias recebidas.

3. Recebimento de recursos sem indicação do número de inscrição no CPF dos doadores. Impossibilidade de identificação da origem.

4. Irregularidade que alcança a totalidade das receitas contabilizadas no período, justificando a aplicação da penalidade de desaprovação das contas.

5. Recolhimento do montante ao Tesouro Nacional.

6. Aplicação dos parâmetros fixados no § 3º do art. 37 da Lei n. 9.096/95, em sua redação originária, para fixar o período de suspensão de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de quatro meses, em atenção ao princípio da razoabilidade.

Desaprovação.

(TRE-RS - RE 9750 – Rel. Des. Fed. João Batista Pinto Silveira – 04.7.2018.) (Grifei.)

Indiscutível, portanto, a caracterização de recursos de origem não identificada quanto aos valores recebidos pelo partido político, via depósito bancário sem a identificação do doador e/ou contribuinte originário.

A falha constatada obstaculiza a fiscalização pela Justiça Eleitoral, comprometendo a confiabilidade da escrituração, razão pela qual deve ser mantida a desaprovação das contas do partido recorrente, bem como a determinação de recolhimento da quantia irregularmente arrecadada ao Tesouro Nacional, na forma do art. 13, c/c o art. 14, caput e § 1º, todos da Resolução TSE n. 23.464/15, acrescida de multa de até 20%, nos termos do art. 37 da Lei n. 9.096/95 com a redação dada pela Lei n. 13.165/15, incidente sobre as contas do exercício financeiro de 2016, consoante entendimento firmado pelo egrégio Tribunal Superior Eleitoral (PC n. 96183, Relator Min. Gilmar Mendes, DJE: 18.3.2016):

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 desta resolução sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º desta resolução, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput deste artigo também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 5º do art. 11, os quais devem, nesta hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

Art. 37 A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento).

No que respeita à quantia a ser recolhida pela agremiação, impõe-se, de ofício, pequena correção, uma vez que a soma dos recursos cuja origem não foi possível determinar corresponde a R$ 107.746,69 (R$ 11.180,85 + R$ 95.185,84 + R$ 1.380,00) e não R$ 108.376,69, como constou na decisão atacada.

O recebimento de recursos de origem não identificada enseja a aplicação do art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95, o qual prevê que:

Art. 36. Constatada a violação de normas legais ou estatutárias, ficará o partido sujeito às seguintes sanções:

I - no caso de recursos de origem não mencionada ou esclarecida, fica suspenso o recebimento das quotas do fundo partidário até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral;

Entretanto, segundo jurisprudência consolidada, inclusive nesta Casa, no condizente a contas do exercício financeiro de 2016, a suspensão do recebimento das quotas do Fundo Partidário “até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral” não é compatível com o instituto da preclusão e/ou da coisa julgada (RE n. 2015, Relator Des. João Batista Pinto Silveira, julgado em 5.10.2018 / RE n. 3221, Relator Des. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 28.8.2018 / RE n. 65-11, Relatora Desa. Marilene Bonzanini, julgado em 25.6.2018 / RE n. 6375, Relator Des. Jorge Luís Dall'Agnol, julgado em 8.5.2018).

Com efeito, a regra do art. 36, inc. I, da Lei dos Partidos Políticos, reproduzida pelo art. 47, inc. II, da Resolução TSE n. 23.464/15 aplica-se somente durante a instrução do feito. Após a prolação da sentença, não mais teria lugar o exame de esclarecimentos. Ainda, representaria penalidade desarrazoada fixar a suspensão do Fundo Partidário até o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional.

Por essa razão, conforme entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, a penalidade pode ser substituída pelo repasse dos respectivos recursos ao Tesouro Nacional, o qual será acrescido da multa de até 20% prevista pelo já referido art. 37 da Lei n. 9.096/95. Caso contrário, poderia ensejar longos períodos de suspensão ou, ainda, interminável pesquisa sobre a origem do recurso.

Considerando a natureza da falha (recebimento de recursos de origem não identificada), e não se tratando de quantia irrisória – seja pelo critério proporcional (percentual: 83,70%) ou quantitativo (absoluto: R$ 107.746,69) –, não é possível a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar o juízo de reprovação.

Outrossim, sem olvidar da gravidade da irregularidade detectada e atenta às circunstâncias do caso concreto, entendo adequado reduzir a pena de multa lançada para 15% sobre a importância apontada como irregular, totalizando a quantia final de R$ 123.908,69, que deve ser recolhida ao Erário.

 

Dispositivo

Diante do exposto, afastada a matéria preliminar, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para, mantendo a desaprovação das contas do órgão de Direção Municipal do PARTIDO DOS TRABALHADORES - PT de Novo Hamburgo, relativas ao exercício de 2016, nos termos da fundamentação:

a) afastar a irregularidade referente ao recebimento de recurso oriundo de fonte vedada, no montante de R$ 24.767,00 (vinte e quatro mil, setecentos e sessenta e sete reais) e, por consequência, a sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário aplicada na sentença; e

b) determinar o recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos cuja origem restou pendente de identificação, acrescidos da multa de 15% sobre o valor da irregularidade, sob a quantia final de R$ 123.908,69 (cento e vinte e três mil, novecentos e oito reais e sessenta e nove centavos).