RE - 72194 - Sessão: 20/11/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso eleitoral interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (PMDB) de ARARICÁ contra sentença que desaprovou suas contas, relativas às eleições de 2016, e determinou a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário, pelo prazo de 10 meses, devido à falta de apresentação dos extratos da conta bancária destinada ao trânsito de outros recursos e à ausência de registro da movimentação financeira constatada por meio de extratos eletrônicos (fls. 68-69).

Em suas razões, o recorrente sustenta que, por equívoco, deixou de escriturar a doação eleitoral de R$ 870,00, realizada ao candidato Sergio Delias Machado, mas que o lançamento foi julgado regular no Processo PC 735-78, relativo às contas de campanha do candidato, as quais foram aprovadas pela Justiça Eleitoral. Afirma que, por engano, o contador omitiu dados nas contas e que as falhas constatadas referem-se a erros meramente formais, invocando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Aponta que a doação de R$ 870,00 foi devidamente identificada e escriturada na prestação de contas de campanha do candidato beneficiário. Requer o provimento do recurso para que a contabilidade seja aprovada, mesmo com ressalvas. Junta documentos (fls. 78-92).

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral suscita a preliminar de não conhecimento dos novos documentos juntados com o recurso e, no mérito, manifesta-se pelo desprovimento (fls. 99-103).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. Houve a publicação no dia 02.4.2018, via DEJERS (fl. 74), e a irresignação foi protocolada em 05.4.2018 (fl. 77), obedecendo ao prazo previsto no art. 77 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Inicialmente, afasto a prefacial de não conhecimento da documentação apresentada com o recurso, pois este Tribunal tem jurisprudência consolidada no sentido de que, nos processos de prestação de contas, é possível a juntada de documentos na fase recursal, desde que demonstrada a impossibilidade de acesso anterior ao seu conteúdo e que o exame não dependa de nova análise técnica ou de diligências complementares. Confira-se:

 

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e gastos de recursos em campanha eleitoral. Eleições 2016.

Matéria preliminar. 1. Embora a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral não admita a juntada de documentação nova ao processo quando já transcorrida oportunidade prévia de saneamento das irregularidades, a previsão do art. 266 do Código Eleitoral autoriza a sua apresentação com a interposição do recurso, quando se tratar de documentos simples, capazes de esclarecer os apontamentos sem a necessidade de nova análise técnica ou diligência complementar. 2. A ausência de manifestação sobre eventual irregularidade nas contas não se confunde com a invalidade da sentença. Observado o regular procedimento na análise das contas ofertadas pelo candidato. Nulidade afastada.

Mérito. Falta de registro de despesa com serviços contábeis e gastos lançados com combustível sem consignar o aluguel ou cessão de veículo. Inconsistências sanadas com a juntada de novos documentos quando da interposição do recurso, que comprovam receita estimável em dinheiro referente ao serviço de contabilidade e juntada de termo de cessão de veículo para uso na campanha.

Desacolhido o pedido ministerial, nesta instância, de arrecadação de valores ao Tesouro Nacional em razão de recebimento de quantia não identificada, a fim de evitar a “reformatio in pejus”.

Aprovação das contas. Provimento.

(RE PC n. 282-92.2016.6.21.0128, Relator Dr. Jamil Andraus Hanna Bannura, DEJERS 18.5.17.)

 

De acordo com o referido precedente, o entendimento foi firmado porque o “interesse público na transparência da contabilidade de campanha, aliada à ausência de prejuízo à célere tramitação das contas, caracteriza a vedação de novos documentos em segundo grau como formalismo excessivo, que deve ser evitado, por não servir aos propósitos do rito legal”.

Dessa forma, a preliminar deve ser rejeitada.

No mérito, a sentença merece ser mantida, pois o PMDB de ARARICÁ não esclareceu as irregularidades constatadas nas contas.

As razões recursais não justificam o motivo de o partido não ter apresentado os extratos da conta bancária destinada à movimentação de outros recursos durante a campanha.

Além disso, conforme consta do parecer conclusivo das fls. 61-62, a agremiação apresentou as contas com movimentação financeira zerada, isto é, declarou à Justiça Eleitoral que não recebeu receitas nem realizou despesas durante as eleições de 2016.

Todavia, o exame técnico consultou os extratos eletrônicos de uma conta bancária da grei e verificou que, entre agosto e setembro de 2016, o partido recebeu receitas no valor de R$ 9.871,00, por intermédio de depósito em dinheiro (R$ 8.000,00 e R$ 871,96) e transferência entre contas (R$ 1.000,00), e realizou despesas de R$ 2.741,96, na forma de estorno de cheque depositado (R$ 871,96) e  cheques compensados (R$ 870,00 e R$ 1.000,00).

A legenda limita-se a sustentar a omissão desses registros por equívoco, mas deveria ter atendido à intimação realizada durante a tramitação do feito (fl. 57) e retificado integralmente as contas.

Em vez disso, o partido deixou o prazo para saneamento da falha transcorrer sem manifestação (fl. 59) e permanece sem prestar contas dos recursos movimentados na campanha.

Dessa forma, o douto magistrado sentenciante decidiu com acerto, merecendo ser reproduzidas suas razões de decidir:

 

Realizada a análise técnica foram verificadas as seguintes inconsistências:

Não apresentados os Extratos das contas bancárias destinadas à movimentação de Outros Recursos que devem integrar a prestação de contas (art. 59 da Resolução TSE n. 23.463/2015, constituindo inconsistência grave, geradora de potencial desaprovação.

Identificado no relatório divergências na movimentação financeira registrada na prestação de contas e aquela registrada nos extratos eletrônicos (art. 7º da Resolução TSE n. 23.463/2015), constituindo inconsistência grave que impede aferir a real movimentação financeira declarada, geradora de potencial desaprovação.

Foram declaradas transferências diretas efetuadas a outros prestadores de contas, mas não registradas na prestação de contas em exame, revelando indícios de omissão de receitas, infringindo o disposto no art. 48, I, c, da Resolução TSE n. 23.463/2015: Prestador de contas não registrou doação declarada como recebida pelo beneficiário Sergio Delias Machado, em sua prestação de contas.

 

Como se percebe, o juízo a quo entendeu que, no conjunto, as falhas são graves e geradoras de desaprovação, porque os esclarecimentos prestados não puderam ser submetidos a outros elementos de controle que lograssem validá-los, prejudicando a confiabilidade das contas.

Ressalto que os documentos juntados ao recurso não suprem essas irregularidades.

O objetivo da prestação de contas é viabilizar o controle da origem de todos os recursos de campanha e seus respectivos destinos, sendo imprescindível a apresentação dos extratos bancários completos para o cumprimento dessa finalidade.

Por tal motivo, o art. 48, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.463/15 impõe categoricamente a apresentação dos extratos bancários integrais e autênticos da conta aberta em nome do partido:

 

Art. 48. Ressalvado o disposto no art. 57, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta, cumulativamente:
(...)
II - pelos seguintes documentos:
a) extratos da conta bancária aberta em nome do candidato e do partido político, inclusive da conta aberta para movimentação de recursos do Fundo Partidário, quando for o caso, nos termos exigidos pelo inciso III do art. 3º, demonstrando a movimentação financeira ou sua ausência, em sua forma definitiva, contemplando todo o período de campanha, vedada a apresentação de extratos sem validade legal, adulterados, parciais ou que omitam qualquer movimentação financeira;
(Grifei.)

 

Nesse trilhar, correto o juízo de desaprovação das contas, pois a ausência dos extratos impede a fiscalização pela Justiça Eleitoral e a realização do escopo da prestação de contas, especialmente no caso em tela, no qual é possível verificar a presença de movimentação financeira de campanha.

Dessa forma, a inconsistência implica o juízo de desaprovação das contas, conclusão que se amolda aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade diante da gravidade e da insanabilidade das falhas.

Cito precedente do Tribunal Superior Eleitoral neste exato sentido:

 

ELEIÇÕES 2012. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PREFEITO. OMISSÃO DE RECEITA/DESPESA. DESAPROVAÇÃO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS NO ACÓRDÃO. INVIABILIDADE. NÃO PROVIMENTO.

1. Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização das contas.

2. Não se aplicam ao caso os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, pois o Tribunal Regional Eleitoral, analisando o conjunto probatório dos autos, concluiu que a irregularidade maculou as contas a ensejar-lhes a desaprovação.

3. A jurisprudência do TSE é firme em que a omissão de receitas/despesas é irregularidade que compromete a confiabilidade das contas.

4. É inviável a aplicação do princípio da insignificância, pois, em se tratando de receita/despesa omitida, inexiste parâmetro quanto ao valor relativo aos serviços prestados e não declarados. Assim, não há como avaliar se se trata, ou não, de quantia com pouca representatividade diante do contexto total das contas.

5. Agravo regimental desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 33677, Acórdão, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 65, Data 08.4.2015, Página 144.)

 

Além disso, reforço o entendimento de que a hipótese de omissão de despesas não se emoldura no conceito de impropriedade formal, que admite a superação quando o meio utilizado atende à finalidade da norma.

Por fim, registro que a conformação às exigências legais representa medida imprescindível para que se verifique, com segurança, a identificação do doador, a origem dos recursos ofertados e a observância dos limites de gastos estabelecidos de campanha, garantindo a transparência e a confiabilidade das contas.

Ante o exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso.