RE - 1349 - Sessão: 10/10/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) do Município de Estrela (fls. 117-121) contra sentença do Juízo da 21ª Zona Eleitoral (fls. 111-115), que desaprovou a sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2016, determinando o recolhimento da quantia de R$ 58.022,06 ao Tesouro Nacional, em virtude do recebimento de recursos de fonte vedada, provenientes de autoridades públicas, assim como a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 01 (um) ano.

Em suas razões, o recorrente sustentou que, de acordo com a delimitação conferida por esta Corte ao conceito de autoridade pública (art. 12, inc. XII e § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14) na CTA n. 109-98, o enquadramento dos valores como de fonte vedada deveria ter se restringido àqueles provenientes de doações feitas por ocupantes de cargos eletivos e cargos em comissão, com poderes de direção e chefia na Administração Pública, devidamente excluídos aqueles de assessoramento, observando-se a lei municipal que criou e definiu as atribuições dos cargos comissionados no Município de Estrela. Defendeu, também, que as doações realizadas por filiados deveriam ser excluídas do montante a ser recolhido ao Tesouro Nacional, em conformidade com a nova redação conferida pela Lei n. 13.488/17 ao art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95.

Nesta instância, com vista dos autos, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo desprovimento do recurso, mantendo-se desaprovada a contabilidade do partido, com a imposição do recolhimento do valor proveniente de fonte vedada ao Tesouro Nacional e a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário por 01 (um) ano. Salientou, ainda, a impossibilidade de incidência da pena de multa de até 20%, prevista no art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15, por ter sido fundamentadamente afastada na sentença, sem ter havido oposição do órgão ministerial de origem (fls. 126-133).

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

A sentença foi publicada no DEJERS no dia 27.3.2018 (fl. 116), e a irresignação interposta em 02.4.2018 (fl. 117), primeiro dia útil subsequente ao feriado do dia 30.03.2018, termo final do prazo recursal. O apelo é, portanto, tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

O PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) do Município de Estrela interpôs recurso (fls. 117-121) contra sentença do Juízo da 21ª Zona Eleitoral (fls. 111-115), que desaprovou a sua prestação de contas relativa ao exercício financeiro de 2016, determinando o recolhimento do valor de R$ 58.022,06 ao Tesouro Nacional, devido ao recebimento de recursos de fonte vedada, provenientes de autoridades públicas, assim como a suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 01 (um) ano.

Segundo exarado na sentença, a agremiação recebeu doações advindas de titulares de cargos de direção e chefia junto ao Poder Executivo municipal, enquadráveis no conceito de autoridade pública, infringindo a regra constante no art. 12, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

I – origem estrangeira;

II – pessoa jurídica;

III – pessoa física que exerça atividade comercial decorrente de concessão ou permissão; ou

IV – autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso IV do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

(Grifei.)

No exame da prestação das contas (fls. 77-79), posteriormente ratificado pelo parecer técnico conclusivo (fls. 93-94), foi discriminada planilha contendo o nome dos servidores que efetuaram doações à agremiação durante o exercício financeiro sob análise, no valor total de R$ 58.022,06 (fl. 78).

O Ofício n. 12-01/2017, expedido pela Secretaria de Administração e Recursos Humanos da Prefeitura de Estrela (fls. 103-107), comprova que os servidores indicados na referida planilha (fl. 78) desempenhavam os cargos de supervisor, coordenador, encarregado de setor, chefe de departamento e secretário municipal, todos ocupantes, por conseguinte, de cargos demissíveis ad nutum da Administração Direta, dotados de poderes de direção e chefia, e enquadráveis, inequivocamente, no conceito de autoridade pública, não se identificando cargos aos quais fosse atribuída a função de mero assessoramento, como sustentou o partido.

Eventual prova em sentido contrário deveria ter sido providenciada pelo próprio recorrente, que, entretanto, sequer trouxe aos autos cópia da mencionada lei municipal que teria criado e disciplinado o exercício de cargos comissionados no Município de Estrela, seja ao interpor o recurso, seja durante a fase de apresentação de defesa, segundo apontado no parecer técnico conclusivo (fl. 93-v.).

Ademais, do cotejo da planilha à fl. 78 com o Ofício n. 12-01/2017 (fls. 103-107), percebe-se que os nomes do Prefeito e do Vice-Prefeito do Município de Estrela não foram elencados para fins de cômputo de valores a serem transferidos ao erário, procedimento compatível com a orientação de que as doações eventualmente realizadas por detentores de mandato eletivo não se sujeitam à vedação legal em comento, como firmado por este Tribunal no julgamento do RE n. 13-93, cuja ementa transcrevo a seguir:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. RECEBIMENTO DE DOAÇÃO REALIZADA POR DETENTOR DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DA NORMA. NÃO CARACTERIZADA FONTE VEDADA. LICITUDE DA DOAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO DAS CONTAS. PROVIMENTO.

Configuram recursos de fontes vedadas as doações a partidos políticos advindas de autoridades públicas, vale dizer, aqueles que exercem cargos de chefia ou direção na administração pública, direta ou indireta. Definição expressa no texto do art. 12 da Resolução TSE n. 23.464/15.

No caso, a agremiação partidária recebeu recursos de detentor de mandato eletivo de vereador. O texto normativo não contempla os agentes políticos. Impossibilidade de se dar interpretação ampliativa à norma que traz uma restrição de direitos. O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, exerce "munus" público, eleito pelo povo. As doações realizadas por essa espécie de agente não possuem a potencialidade de afetar o equilíbrio entre as siglas partidárias. Caracterizada, assim, a licitude da doação efetuada pelo vereador. Fonte vedada não caracterizada. Reforma da sentença para aprovar as contas. Provimento.

(RE n. 13-93, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, julgado na sessão de 06.12.2017) (Grifei).

Acrescento, ainda, que esta Corte, por ocasião do julgamento do RE n. 14-97, debateu a respeito da aplicação imediata da alteração introduzida no art. 31 da Lei n. 9.096/95 pela Lei n. 13.488/17 – que passou a considerar lícitas as doações feitas por pessoas físicas exercentes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, desde que filiados a partido político –, fixando entendimento pela incidência da legislação vigente à época do exercício da prestação de contas, na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, conforme se extrai do teor da respectiva ementa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses. (Grifei).

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, RE n. 14-97, Relator Des. Eleitoral LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN, julgado na sessão de 04.12.2017) (Grifei)

Desse modo, restou caracterizado o recebimento de recursos advindos de fontes vedadas pela agremiação, em contrariedade à norma de regência, no montante de R$ 58.022,06, perfazendo 60,93% da arrecadação (fls. 40-41), o que justifica, diante da expressividade nominal e percentual do valor, o juízo de desaprovação das contas, devendo ser integralmente recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15.

A irregularidade apontada suscitou, ainda, a aplicação, pelo juiz de primeiro grau, da penalidade de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de 01 (um) ano, com respaldo no art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.464/15.

Todavia, este Tribunal, reconhecendo o cabimento da suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário nas hipóteses de recebimento de recursos oriundos de fonte vedada (art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.464/15), tem entendido pela possibilidade de dosimetria desse sancionamento, entre 01 (um) e 12 (doze) meses, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Assim, em face das circunstâncias dos autos e da gravidade da falha detectada, bem como da inexistência de indícios de má-fé pelo prestador e da repercussão dos valores irregulares sobre a totalidade das contas (60,93%), entendo proporcional e razoável suspender o repasse de quotas do Fundo Partidário pelo período de 5 (cinco) meses.

Por fim, na esteira do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, deixo de aplicar, de ofício, a penalidade de multa de até 20% sobre a importância irregularmente arrecada pelo partido, prevista no art. 49 da Resolução TSE n. 23.464/15, porquanto, por imposição do princípio do non reformatio in pejus, a sanção, que foi afastada de forma fundamentada na sentença, somente poderia ser aplicada, em grau recursal, mediante o manejo de recurso pelo agente ministerial à origem.

Assim, o recurso merece ser parcialmente provido, apenas para que se reduza o período de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para 5 (cinco) meses.

Dispositivo

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso interposto pelo PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB) de Estrela para, mantendo a sentença que desaprovou suas contas relativas ao exercício financeiro de 2016, bem como a determinação de recolhimento da quantia de R$ 58.022,06 (cinquenta e oito mil e vinte e dois reais e seis centavos) ao Tesouro Nacional, reduzir o período de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário para 5 (cinco) meses.