RE - 22058 - Sessão: 04/10/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por LUÍS ROGÉRIO LINK e ARLÊNIO DA SILVA (fls. 421-441), candidatos aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito de Sapucaia do Sul, em face da sentença do Juízo da 108ª Zona Eleitoral (fls. 408-412) que julgou desaprovadas as contas relativas às eleições municipais de 2016, com fulcro nos arts. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15 e 30, inc. III, da Lei n. 9.504/97, determinando o recolhimento do valor de R$ 41.300,00, considerado irregular, ao Tesouro Nacional.

Inicialmente, registro que este feito já foi examinado por esta Corte, no acórdão às fls. 342-344v., oportunidade em que foi anulada, por unanimidade, a sentença de primeiro grau, em face do reconhecimento, de ofício, da ocorrência de cerceamento de defesa aos prestadores e da omissão do juízo a quo quanto às consequências legais correspondentes às irregularidades reconhecidas no decisum.

Retornados os autos à primeira instância e prolatada nova sentença, os prestadores recorreram.

Em suas razões, alegaram, em relação à desconsideração, pelo juízo a quo, dos documentos comprobatórios de despesas com evento de campanha, que a realização do jantar sob exame foi comunicado à Justiça Eleitoral, bem como prestadas as devidas contas. Defenderam inexistir obrigatoriedade da juntada de documentos, conforme apontado pela própria magistrada quando da prolação da primeira sentença, em face da ausência de requisição nesse sentido. Afirmaram, quanto aos recursos de origem não identificada, que os valores, no total de R$ 6.000,00, foram estornados e restituídos aos doadores, portanto, não utilizados na campanha. Ressaltaram que o art. 18, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15 não especifica o procedimento relativo à devolução de tais recursos, se por meio de TED, DOC, cheque ou em espécie.

Salientaram que a apresentação das contas teria cumprido rigorosamente a legislação. Asseveraram a tempestividade da juntada das cópias dos cheques a comprovar a devolução dos valores irregularmente recebidos, os quais, a teor do § 2º do art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/15, poderiam ser apresentados em qualquer fase da prestação de contas ou até cinco dias depois do respectivo trânsito em julgado. Alegaram, relativamente às doações das quantias de R$ 22.500,00 e R$ 12.800,00, a inexistência de irregularidades. Afirmaram que, em face da greve bancária ocorrida no período de 06.9.2016 a 07.10.2016, houve a necessidade de transferir os recursos arrecadados de alguns doadores para a conta pessoal do então candidato LUIZ ROGÉRIO LINK, com posterior transferência à conta da candidatura, por meio de cheque.

Aduziram que todos os valores recebidos em espécie no período da greve bancária foram de valores inferiores a R$ 1.064,10, estando de acordo com o art. 18, § 1º da Resolução 23.463/15. Requereram, por fim, a aprovação das contas, com ou sem ressalvas.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, a qual opinou pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença de desaprovação das contas, em todos os seus termos (fls. 454-459).

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo (fls. 416 e 421) e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele conheço.

Mérito

Trata-se das contas eleitorais de LUÍS ROGÉRIO LINK e ARLÊNIO DA SILVA, candidatos (eleitos) aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito de Sapucaia do Sul, relativas às eleições municipais de 2016.

A sentença atacada (fls. 408-412), acolhendo o parecer ministerial das fls. 260-266v., desaprovou as contas de campanha dos candidatos em face das seguintes irregularidades:

a) dois depósitos em cheque na conta de campanha, nos valores de R$ 22.500,00 e R$ 12.800,00, os quais não identificam os verdadeiros doadores;

b) recebimento irregular de recursos, consistentes em um depósito em espécie de R$ 2.000,00, uma transferência eletrônica de R$ 1.000,00 proveniente de pessoa jurídica e um depósito em cheque no valor de R$ 3.000,00, com posterior devolução às pessoas indicadas como doadores por meio de cheque; e

c) inexistência de comprovação de despesas com evento de campanha, num total de R$ 25.350,00.

Passo à análise individual das irregularidades, na ordem apresentada no recurso.

Das despesas realizadas com o evento destinado a arrecadar recursos.

Em relação à inexistência de comprovação de despesas com evento de campanha, no total de R$ 25.350,00, os recorrentes afirmaram que a realização do jantar foi comunicada à Justiça Eleitoral, bem como prestadas as devidas contas. Defenderam inexistir obrigatoriedade da juntada de documentos, conforme apontado pela própria magistrada quando da prolação da primeira sentença, em face da ausência de requisição nesse sentido.

Sustentaram que a posterior juntada de documentos bastaria para comprovar a regularidade das contas prestadas quanto a esse item.

De início, esclareço que a realização do jantar realizado no dia 15.9.2016 para arrecadação de recursos foi devidamente comunicada à Justiça Eleitoral, em conformidade com o disposto no art. 24, inc. I, da Resolução TSE n. 23.463/15, conforme se verifica no documento de fl. 290, protocolado em 05.9.2016 sob o n. 118.097/2016.

Sobre a contabilidade em si, os documentos juntados pelos recorrentes são suficientes para comprovar as despesas relativas ao jantar. Vejamos.

- Contrato de locação e prestação de serviços firmado com a empresa Cristhiane Ferreira, cujo objeto é “a locação do espaço (…) e prestação de serviços” (fls. 296-298).

- Nota Fiscal n. 024, emitida pela empresa denominada “Armazém Festas e Eventos”, da titularidade de Cristhiane Ferreira, no valor de R$ 25.000,00, em 15.9.2016, que discrimina como serviço a “locação de espaço para jantar” (fl. 292).

- Nota Fiscal n. 139, emitida por Pontocom Gráfica e editora, no valor de R$ 350,00, emitida em 12.9.2016, referente à confecção e impressão de 250 convites numerados (fl. 294).

O juízo a quo entendeu que, quando da juntada desses documentos, já teria se consumado a preclusão, considerando-os, em consequência, extemporâneos.

Nesse ponto, entendo que merece reforma a sentença.

Em primeiro lugar, porque, de fato, como asseverado no recurso, dos três relatórios emitidos pela unidade técnica antes da prolação da primeira sentença, nenhum fez referência a tais gastos e, por conseguinte, não foram solicitados os documentos, razão pela qual não pode ser considerada preclusa uma oportunidade que nem sequer foi dada aos prestadores.

Em segundo, esta Corte tem admitido a juntada de documentos simples, que não demandem exames técnicos, como é o caso do contrato e das notas fiscais em comento, inclusive com o recurso, possibilitando, com mais razão, a apreciação e acolhida daqueles juntados antes da prolação da segunda sentença, ora recorrida. Lembro, ainda, que a primeira foi anulada justamente para que os recorrentes pudessem se manifestar a respeito de irregularidades sobre as quais não haviam sido intimados.

Feitas essas considerações, tenho por comprovadas as despesas de R$ 25.350,00 relativas ao evento para arrecadação de recursos.

No mesmo sentido é o parecer da PRE a respeito do tema (fl. 458).

Das doações irregulares “estornadas” por cheque.

A sentença de primeiro grau entendeu irregular o recebimento dos seguintes recursos: a) depósito em espécie no valor de R$ 2.000,00, em 01.9.2016; b) TED de R$ 1.000,00, recebido de pessoa jurídica em 12.9.2016 e, c) depósito em espécie no valor de R$ 3.000,00, em 13.9.2016.

Os recorrentes alegaram que comprovaram a devolução dos valores aos doadores por meio de “estorno” mediante a emissão de cheques (cópias às fls. 287, 374, 375).

Em relação ao recurso de R$ 2.000,00, recebido em 01.9.2016, foi debitado na conta-corrente dos recorrentes o cheque n. 850052, nominal a José Spikermann de Mello Bentancur, mas apenas em 21.10.2016; sobre o valor de R$ 3.000,00, recebido em 13.9.2016, foi emitido um cheque nominal a Adilpio Antonio Zandonai, compensado em 20.10.2016 (extrato à fl. 232v.).

Ainda que não existam nos autos prova de que os doadores foram, efetivamente, José Spikermann de Mello Bentancur e Adilpio Antonio Zandonai, uma vez que a via impressa dos extratos não apresenta nenhuma identificação dos depositantes, consultando-se o extrato eletrônico na página do TSE na internet, é possível verificar que os dois depósitos foram identificados com os números de CPF dos respectivos doadores.

De qualquer sorte, ainda que seja possível a identificação das pessoas que realizaram os depósitos, as operações, em valores superiores a R$ 1.064,10, contrariam o art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, verbis:

Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

(...)

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

Incidente, portanto, a regra do  § 3º do mesmo artigo, que reza:

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26.

No caso dos autos, os recorrentes procederam à restituição aos doadores em 20 e 21 de outubro de 2016, 40 e 50 dias após o recebimento dos recursos, mas antes da apresentação das contas à Justiça Eleitoral, a qual ocorreu em 03.11.2016.

Ao contrário do que entendeu o juizo a quo, é possível identificar os destinatários dos recursos, uma vez que os cheques emitidos indicam, nominalmente, os favorecidos, como também apontado pela Procuradoria Regional Eleitoral.

Resta apurar se as quantias recebidas indevidamente foram utilizadas na campanha, ou se apenas permaneceram depositadas na conta para posterior devolução.

Como já referido, os recursos foram recebidos no dia 01.9.2016 (R$ 2.000,00) e 13.9.2018 (R$ 3.000,00). Desde a primeira data até o dia 23.9, a conta de campanha ostentava saldos superiores à soma dos dois valores. Todavia, no dia 26.9.2016, depois da compensação de um cheque no valor de R$ 13.464,90, o saldo diminuiu para a quantia de R$ 811,40 (fls. 232v).

Raciocínio lógico é o de que, se no dia 26.9.2016 os valores arrecadados de forma irregular, num total de R$ 5.000,00, já não estavam mais na conta de campanha dos recorrentes, é porque foram, de fato, utilizados.

Posteriormente, no decorrer da campanha, foram recebidos outros recursos, de outras fontes, que viabilizaram a devolução dos valores – nos dias 20 e 21 de outubro (extrato às fls. 232 e v.) –, mas, reitero, aqueles recebidos originariamente já haviam sido utilizados.

No ponto, transcrevo trecho da manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral, à qual me alinho:

Portanto, visto que os candidatos (1) receberam recursos em violação à legislação eleitoral; (2) realizaram estornos com muito atraso, fazendo uso dos valores indevidamente arrecadados; impõe-se a desaprovação, somada ao recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 18, § 3º, e art. 26 da Resolução TSE nº 23.463/15.

No mesmo sentido, jusrisprudência desta Casa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPÓSITOS EM ESPÉCIE ACIMA DO LIMITE LEGAL. ART. 18, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. DESAPROVAÇÃO. DESPROVIMENTO. ELEIÇÃO 2016.

1. Doações de pessoas físicas em valor igual ou superior a R$ 1.064,10 somente são permitidas na modalidade de transferência eletrônica direta. Art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Objetivo legal é o de impedir transações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

2. Efetuados depósitos em dinheiro na conta de campanha do candidato cujo montante extrapola o limite legal. Falha que representa 22,79% da totalidade das receitas percebidas e enseja a desaprovação das contas. Devolução de valores aos doadores somente é possível na hipótese de não utilização pelo candidato. Art. 18, § 3º, da Resolução n. 23.463/15. Recursos efetivamente empregados na campanha, devendo ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

3. Provimento negado.

(TRE-RS. RE n. 376-37, relator Des. Jorge Luís Dall'Agnol, J. Sessão de 26.7.2017)

Cabe salientar que, conquanto a legislação não prescreva a forma adequada à devolução, como aduzido pelos recorrentes, se por meio de DOC ou TED, por exemplo, ela refere, expressamente, que os valores não podem ser utilizados.

Nessa esteira, considerando que a devolução passível de ser considerada é aquela efetivada de imediato e que, no caso concreto, os candidatos utilizaram os recursos recebidos de maneira diversa à prevista na Resolução TSE n. 26.463/15, correto o comando de recolhimento do valor ao erário.

A situação é um pouco distinta no que diz respeito ao recurso de R$ 1.000,00, recebido em 12.9.2016, de pessoa jurídica e que constitui, portanto, fonte vedada. Em relação a tal doação, os recorrentes emitiram o cheque nominal a Adolfo Kulman e Silva, suposta pessoa jurídica doadora, compensado no dia seguinte, 13.9.2016.

Aqui, os prestadores teriam procedido à imediata devolução do valor recebido, fato que, em tese, atenderia o disposto no § 1º do art. 25 da Resolução TSE n. 23.463/15, verbis:

O recurso recebido por candidato ou partido oriundo de fontes vedadas deve ser imediatamente devolvido ao doador, sendo vedada sua utilização ou aplicação financeira.

Todavia, conforme ressaltado pela Procuradoria Regional Eleitoral, embora haja identificação do destinatário do recurso “devolvido”, não há nos autos comprovação de que Adolfo Kulmann e Silva tenha sido efetivamente a pessoa (física ou jurídica) que realizou a doação.

Vai além a Procuradoria Regional Eleitoral, suscitando dúvida sobre Adolfo Kulmann e Silva ser, de fato, uma pessoa jurídica.

Em vista dessa situação, consultei o extrato eletrônico dos recorrentes na página do TSE (http://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2016/2/89010/210000003943/extratos) e constatei que o recurso proveniente de fonte vedada, no valor de R$ 1.000,00, é aquele recebido no dia 12.9.2016 (extrato de fl. 231v.), mas de Marisa Helena Kutter e Silva ME, inscrita no CNPJ n. 07.194.602/0001-76 e não de Adolfo Kulmann e Silva pessoa física, inscrito no CPF n. 229.179.930-49.

Ou seja, a campanha eleitoral dos recorrentes recebeu duas doações realizadas por TED no dia 12.9.2016, sendo uma de pessoa jurídica. É dizer, no momento de proceder ao que chamam de “estorno”, emitiram um cheque à pessoa errada.

Tal situação demonstra a falta de controle dos prestadores a respeito da receita e dos verdadeiros financiadores de campanha, de tal forma que, não tendo o valor sido devolvido ao verdadeiro doador, persiste a irregularidade.

Conclui-se que os recursos referentes aos dois depósitos recebidos de maneira diversa ao exigido pelo art. 18 da Resolução TSE n. 23.463/15, os quais foram utilizados na campanha, no total de R$ 5.000,00 e aquele recebido de pessoa jurídica, portanto, de fonte vedada, no valor de R$ 1.000,00, devem ser recolhidos ao Tesouro nacional, nos termos determinados na sentença.

Dos depósitos de R$ 22.500,00 e R$ 12.800,00.

O parecer técnico apontou, ainda, o recebimento dos valores de R$ 22.500,00 e R$ 12.800,00 na conta de campanha por meio de depósitos de cheques do Banco do Brasil, oriundos da conta pessoal do candidato Luís Rogério Link, transações que também não representam uma TED (transferência eletrônica disponível), em contrariedade ao disposto no já citado art. 18, §§ 1º e 3º da Resolução TSE n. 23.463/15.

A respeito, os recorrentes apresentaram a justificativa de que, em razão da greve do sistema bancário, estendida entre os dias 06.9 a 07.10.2016, houve a necessidade de realizar operações bancárias à margem da normalidade, consistente no agrupamento das doações recebidas em dinheiro e realização de depósito na conta-corrente pessoal de LUIS ROGÉRIO LINK, com posterior transferência para a conta de campanha mediante emissão e depósito de cheque. Afirmaram que nenhuma doação ultrapassou o valor de R$ 1.064,10 e que todas se encontram documentadas pelos recibos eleitorais das fls. 20-56 e 64-92.

Aduziram que os extratos bancários juntados às fls. 376 e seguintes permitem a correta identificação da origem das despesas, em conformidade com o disposto no art. 18, inc. I, da Resolução TSE n. 23.463/15. Sustentaram, ainda, que a greve teria impedido a adoção do procedimento exigido pela aludida Resolução.

Todavia, ainda que se admitisse como prova os extratos bancários juntados às fls. 377-386, em nome de algumas das pessoas indicadas como doadoras nos recibos relacionados à fl. 438 dos autos, tais documentos apenas demonstram a realização de saques, pelos supostos doadores, alguns em datas próximas e outros mais distantes; como exemplo, cito o saque efetuado por Jessica Vargas Bianchessi, em 16.9, e o recibo emitido em 27.9.

Além disso, não há correlação exata entre os valores sacados e aqueles anotados nos recibos.

Assim, se ultrapassados todos esses óbices à validação desses documentos como prova, faltariam extratos relativos a 46 recibos, uma vez que, como citado pelos próprios recorrentes, trouxeram apenas alguns extratos (dez) a título de exemplo.

Ademais, a alegação de que como norma geral a agência do Banco do Brasil não aceitava depósitos sem identificação do doador (fl. 130) é genérica e não esclarece em que sentido a greve teria impedido os depósitos, com a devida identificação do doador, por meio dos terminais de autoatendimento do banco, os quais, em regra, permanecem funcionando durante a greve.

Além disso, ainda que a greve tivesse, de fato, impedido o depósito em caixa eletrônico, os candidatos deveriam ter orientado os doadores a fazerem as suas doações por meio de DOC (documento de ordem de crédito) ou TED (transferência eletrônica disponível), a fim de possibilitar sua correta identificação.

Não se pode admitir, a pretexto de eventual urgência do candidato em contar com recursos financeiros, que sejam atropelados os procedimentos formais, os quais, no caso, visam coibir a possibilidade de atos fraudulentos, em arrepio aos ditames legais.

Assim, a paralisação dos serviços bancários não tem o condão de eximir o candidato do cumprimento das normas que disciplinam a arrecadação e os gastos de recursos em campanhas eleitorais.

Nesse mesmo sentido, é o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, cujos fundamentos adoto como razões de decidir:

(...)

Não fica claro porque a greve impedia, por exemplo, o depósito, com a identificação do doador no envelope de depósito, através do caixa eletrônico do banco, os quais, de regra, continuam funcionando.

Mas mesmo que a greve dos bancos estivesse impedindo qualquer depósito em dinheiro, ainda que em caixas eletrônicos, os candidatos recorrentes deveriam então ter optado pela sistemática que não impediria a identificação dos doadores, qual seja, não aceitar os recursos em dinheiro e solicitar aos doadores que fizessem sua doação através de DOC ou TED.

Sabemos que, conforme afirmado pelos recorrentes, os recursos seriam inferiores a R$ 1.064,00, os quais, em princípio, não estariam sujeitos a TED, conforme se extrai do § 1º do art. 18 da Resolução TSE nº 23.463/2015.

Ocorre que, para recursos inferiores a R$ 1.064,00, de qualquer sorte, é exigida a identificação dos doadores através de transação bancária (depósito, DOC) na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado.

Se essa identificação não estava sendo possível através de depósito bancário em virtude da greve, deveriam os candidatos ter exigido que as doações fossem feitas mediante DOC ou TED, a fim de, desta forma, identificar os doadores.

O que não é aceitável é a sistemática que optaram os recorrentes (depositar os valores recebidos em espécie na própria conta, sem identificação do CPF dos doadores, com posterior transferência para a conta de campanha).

Tal sistemática impede de se saber se realmente esses recursos transferidos para a conta de campanha decorrem das supostas doações em espécie objeto dos recibos eleitorais.

Poderia muito bem ter havido doação em espécie por fonte vedada dos aludidos valores, os quais foram depositados na conta pessoal do candidato com posterior transferência para a conta de campanha, e emissão de recibos em nome de pessoas físicas em valores inferiores a R$ 1.064,00.

Sendo assim, entendemos que as justificativas trazidas pelos recorrentes são insuficientes para afastar a irregularidade em comento, que compromete a confiabilidade das contas prestadas, ensejando a desaprovação das mesmas.

(…)

Alegação semelhante foi enfrentada nos autos do RE n. 775,04, de relatoria do Des. Sílvio Ronaldo de Moraes, julgado em 13.11.2017, de cujo acórdão extraio o seguinte:

Ocorre que a paralisação dos serviços bancários não dispensa o candidato da observação das normas que disciplinam a arrecadação e os gastos de recursos em campanhas eleitorais.

A eventual urgência do candidato em contar com recursos financeiros para o pagamento das despesas da campanha não é argumento que legitime a não observância dos procedimentos formais, os quais visam coibir a possibilidade de manipulações e transações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

Quanto à afirmação de que nenhuma doação teria superado o limite legal, adianto que, mesmo os valores correspondentes não ultrapassando o valor de R$ 1.064,10, a identificação dos doadores pelos números de CPF ainda seria necessária.

Ressalto que não desconheço os precedentes desta Casa a respeito da matéria, como o RE 15-329, julgado em 18 de dezembro de 2017, de relatoria do Des. Sílvio Ronaldo Santos de Moraes, cuja ementa transcrevo a seguir:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. PRELIMINAR AFASTADA. POSSIBILIDADE DE APRESENTAÇÃO DE NOVOS DOCUMENTOS COM O RECURSO. MÉRITO. DOAÇÃO EM ESPÉCIE. DEPÓSITO DIRETO NA CONTA DE CAMPANHA. EXTRAPOLADO LIMITE REGULAMENTAR. ART. 18, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. COMPROVADA A ORIGEM DOS VALORES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar afastada. O oferecimento de novos documentos com o recurso, especialmente em sede de prestação de contas de campanha, não apresenta prejuízo à tramitação do processo, principalmente quando se trata de documentos simples capazes de esclarecer irregularidades apontadas e que visem salvaguardar o interesse público na transparência na contabilidade de campanha.

2. As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 somente podem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário. Depósito em espécie realizado diretamente na conta de campanha, acima do limite regulamentar, em desobediência ao disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Comprovada a origem da quantia depositada, por meio de cheques e extratos bancários emitidos pelo prestador e devidamente compensados. Atendida a finalidade da norma, identificada a real fonte de financiamento da campanha. Aprovação com ressalvas.

Provimento parcial. (Grifei.)

Contudo, destaco que o caso em análise difere-se do julgado acima, uma vez que não lograram êxito os prestadores em comprovar de forma adequada a origem dos recursos. Aliás, no caso dos autos, os próprios recorrentes reconhecem a anormalidade do procedimento do modo como foi realizado (fl. 440).

A alegação de que os valores recebidos foram identificados mediante a emissão de recibos eleitorais antes de transitarem pela conta pessoal não socorre os recorrentes, pois a identificação exigida pela norma é aquela ocorrida no momento do crédito na conta de campanha.

Portanto, em face do descumprimento ao disposto na Resolução TSE n. 23.463/15, quanto ao procedimento prescrito para as doações em tela, e do percentual do valor irregularmente arrecadado, de, aproximadamente, 13,10% sobre a totalidade das receitas (R$ 269.301,86 – fl. 246), entendo que a arrecadação constitui irregularidade grave e acarretaria, por si só, a desaprovação das contas.

Das sanções

As irregularidades apontadas, no valor de R$ 41.300,00, equivalente a 15,33% da totalidade das receitas (R$ 269.301,86), comprometem a análise das contas e ensejam sua desaprovação, nos termos do art. 68, inc. III, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Outrossim, em se tratando de doações financeiras recebidas em desacordo com a legislação e utilizadas pelos candidatos, impõe-se o recolhimento da quantia correspondente ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 18, § 3º, e 26 da aludida Resolução.

Nesse sentido, é o entendimento consolidado nesta Corte:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Doação financeira. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Doação financeira realizada por meio de depósito bancário, contrariando o disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, que exige transferência eletrônica. Ausência de documentos aptos a comprovar a origem do recurso, fato que caracteriza recebimento de recurso de origem não identificada e acarreta ordem de recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

Provimento negado.

(TRE-RS, RE n. 14-208, Relator Des. Luciano André Losekann, Julgado em 18.4.2017) (Grifei)

Anoto que o provimento parcial do recurso em face do acolhimento das razões recursais no ponto relativo à comprovação das despesas com o evento de campanha não altera o comando sentencial, dado que mantida a desaprovação das contas.

Dispositivo

Diante do exposto, nos termos da fundamentação, VOTO pelo parcial provimento do recurso, mantendo a sentença que desaprovou as contas de LUÍS ROGÉRIO LINK e ARLÊNIO DA SILVA, relativas às eleições municipais de 2016, e determinou o recolhimento do valor de R$ 41.300,00 (quarenta e um mil e trezentos reais) ao Tesouro Nacional.