E.Dcl. - 32829 - Sessão: 20/08/2018 às 18:00

RELATÓRIO

Trata-se de embargos declaratórios com pedido de atribuição de efeitos infringentes opostos por RAUL FERNANDO COHEN (fls. 94-96) em face do acórdão deste Tribunal (fls. 85-90) que deu parcial provimento ao recurso interposto contra sentença prolatada pelo Juízo da 113ª Zona Eleitoral para aprovar com ressalvas a sua prestação de contas relativa ao pleito de 2016, no qual disputou o cargo de Vereador no Município de Porto Alegre, mantendo, todavia, a ordem de recolhimento da quantia de R$ 3.000,00 ao Tesouro Nacional, com fundamento nos arts. 18, § 1º, e 26 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Em suas razões, o recorrente indicou obscuridade e omissão do julgado no tocante aos elementos de prova que embasaram o entendimento pela ausência de identificação da origem do montante de R$ 3.000,00, conforme exige o art. 371 do Código de Processo Civil, uma vez que foram juntados os comprovantes de depósito e os recibos eleitorais correspondentes, os quais constituem documentos hábeis a essa comprovação, nos termos dos arts. 3º, inc. IV, 6º, caput, e 52, todos da Resolução TSE n. 23.463/15.

Defendeu, ainda, que a ordem de recolhimento do referido valor ao Tesouro Nacional implicou ofensa aos arts. 10 e 1.013, caput, do Código de Processo Civil, caracterizando, além disso, o enriquecimento ilícito da União.

Postulou a reforma do acórdão para que seja afastada a determinação de recolhimento daquele valor ao Tesouro Nacional e o prequestionamento dos dispositivos legais invocados.

É o relatório.

 

VOTO

Admissibilidade Recursal

O acórdão foi publicado no DEJERS no dia 20.7.2018, sexta-feira (fl. 92), e a petição recursal foi protocolizada em 25.7.2018, quarta-feira (fl. 96v.). Portanto, o recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal (art. 275, § 1 º, do Código de Processo Civil), e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, motivos pelos quais dele conheço.

Do mérito

RAUL FERNANDO COHEN opôs embargos declaratórios (fls. 94-96) em face do acórdão deste Tribunal (fls. 85-90) que deu parcial provimento ao recurso interposto contra sentença do Juízo da 113ª Zona Eleitoral para aprovar com ressalvas suas contas relativas às eleições de 2016, em que disputou o cargo de Vereador no Município de Porto Alegre, mantendo, entretanto, a determinação de recolhimento da quantia de R$ 3.000,00 ao Tesouro Nacional, com fundamento nos arts. 18, § 1º, e 26 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Em suas razões, o embargante alega que o acórdão não apontou os elementos de prova sobre os quais embasou a tese de ausência de identificação da origem da quantia de R$ 3.000,00 (recebidos na forma de dois depósitos em espécie no valor individual de R$ 1.500,00), aduzindo ter feito tal comprovação por meio dos comprovantes de depósito e dos recibos eleitorais pertinentes, como determinam os arts. 3º, inc. IV, 6º e 52 da Resolução TSE n. 23.463/15.

No que se refere a esse tópico recursal, não identifico a omissão apontada no acórdão, que expôs as razões pelas quais considerou não identificada a origem do montante em referência, destinado ao financiamento da campanha, como se depreende do seguinte trecho do aresto a seguir transcrito (fls. 86v.-87):

O juízo de primeiro grau desaprovou as contas em razão de irregularidade apontada pelo parecer técnico conclusivo (fls. 55-56), consistente no recebimento de duas doações advindas de pessoas físicas, efetuadas por meio de depósito em espécie, em valor superior a R$ 1.064,10, em contrariedade ao disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, o qual assim dispõe:

(…)

'Art. 18. As pessoas físicas somente poderão fazer doações, inclusive pela Internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, na impossibilidade, recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 26.'

Como visto, a partir do patamar de R$ 1.064,10, o depósito deve ser realizado por meio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário.

A exigência normativa de que as doações de campanha sejam feitas por meio de transferência eletrônica visa coibir a possibilidade de manipulações e transações ilícitas, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

In casu, os extratos trazidos aos autos (fls. 7-8 e 32-35) demonstram que o candidato recebeu aporte financeiro, na forma de depósitos bancários em espécie na sua conta de campanha, no valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) cada, em violação ao art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Assim, incontroverso que o candidato recebeu depósito, em dinheiro, em sua conta de campanha, acima do limite máximo fixado na Resolução TSE n. 23.463/15.

Incontestável, igualmente, que referido montante foi efetivamente utilizado na campanha, consoante se apura do extrato final da movimentação financeira da prestação de contas (fl. 5) e do parecer técnico exarado pelo examinador à origem (fls. 55-56).

O candidato informou que os depósitos foram realizados por Elson Furini – CPF n. 293.008.430-87 - e Ilmar José Tasca – CPF n. 316.117.530, aludindo ao comprovante bancário correspondente, à fl. 34, e aos recibos eleitorais acostados, por cópia, às fls. 51-52.

Contudo, não foi possível a identificação da origem mediata das doações, não tendo sido acostado elemento probatório nesse sentido, como ocorreria com a demonstração de que os recursos advieram, por exemplo, da conta-corrente das pessoas físicas doadoras em questão. Os documentos apresentados limitaram-se a confirmar, tão somente, a pessoa responsável pelos depósitos.

O embargante também sustentou que a determinação de recolhimento da quantia de R$ 3.000,00 ao Tesouro Nacional importou ofensa à regra de vedação à “decisão-surpresa” (art. 10 do Código de Processo Civil) e ao princípio tantum devolutum quantum appellatum (art. 1.013, caput, do Código de Processo Civil), bem como causou o enriquecimento ilícito da União, na medida em que essa não integrou a relação processual na condição de parte.

Igualmente, não lhe assiste razão.

A fundamentação do acórdão foi bastante clara ao mencionar que o juiz eleitoral de primeira instância se baseou no parecer técnico conclusivo de fls. 55-56 (fl. 86v.), o qual, ratificando o exame preliminar de fls. 36-37, apontou a obrigatoriedade de o montante de R$ 3.000,00 ser recolhido ao Tesouro Nacional, por força do disposto no art. 18, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Após a análise preliminar, foi aberto prazo para que o embargante se manifestasse, segundo previsto no art. 59, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15 (fl. 39), dentro do qual, inclusive, protocolizou a petição e os documentos de fls. 44-52, no exercício do seu direito de defesa.

Dessa forma, as questões relativas à identificação da origem do valor irregularmente movimentado e ao seu recolhimento ao Tesouro Nacional foram submetidas ao contraditório, nos exatos moldes exigidos pela legislação de regência, sendo inviável reconhecer a alegada contrariedade ao art. 10 do Código de Processo Civil, pois, sob nenhum aspecto, o embargante foi surpreendido com decisões lastreadas em fatos e fundamentos a respeito dos quais não lhe foi oportunizada manifestação durante o trâmite processual.

Acrescento que, diversamente da tese sustentada nos aclaratórios, o recolhimento do citado valor ao Tesouro Nacional foi determinado de forma expressa na sentença (fl. 61v.). Logo, não se verifica a aduzida violação ao art. 1.013, caput, do Código de Processo Civil, uma vez que esta Corte apenas manteve o comando sentencial nesse particular, sem que a sua atividade cognitiva tenha extrapolado os limites do efeito devolutivo do recurso de apelação interposto, com o conhecimento de matéria não impugnada pelo embargante.

Do mesmo modo, carece de amparo normativo a tese de que a ordem de recolhimento dos valores de origem não identificada ao Tesouro Nacional representou o enriquecimento ilícito da União, pelo fato de essa jamais ter integrado o processo como parte processual.

E isso porque, na linha da fundamentação do acórdão embargado, essa determinação não constitui uma penalidade ou efeito decorrente da desaprovação das contas, voltado a afetar somente a esfera de interesse jurídico das partes, mas uma consequência impositiva, específica e independente, que deriva da inobservância do art. 18, § 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Portanto, a pretensão do recorrente traduz a evidente tentativa de rediscussão da matéria fático-jurídica debatida nos autos, hipótese não abrigada pela espécie recursal.

Nesse sentido, a jurisprudência paradigmática deste Regional:

Embargos de declaração. Ação de investigação judicial eleitoral. Improcedência. Omissão e contradição. Art. 275, inc. II, do Código Eleitoral. Ausentes os vícios para o manejo dos aclaratórios. Inexistente omissão ou contradição a ser sanada. Decisão devidamente fundamentada, na qual debatidos os pontos trazidos pelo embargante.

Tentativa de rediscussão da matéria já apreciada, o que descabido em sede de embargos. Rejeição.

(TRE-RS – E.Dcl. n. 301-12.2016.6.21.0092 – Relator Des. Carlos Cini Marchionatti – Julgado em 11.5.2017.)

Embargos de declaração. Acórdão que negou provimento a recurso contra sentença de procedência em representação por doação para campanha acima do limite legal.

Alegada ocorrência de contradição e obscuridade no exame de matéria essencial ao deslinde da controvérsia. Descabimento da tese invocada e impossibilidade de inovação temática em sede de embargos.

Enfrentamento de todas as questões necessárias ao deslinde da questão.

Desacolhimento.

(TRE/RS – RE n. 6210 – Relatora Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria – Julgado em 10.7.2012.)

Para finalizar, registro que, nos termos do art. 1.025 do Código de Processo Civil, todos os elementos suscitados na petição dos embargos declaratórios são considerados incluídos no acórdão para fins de prequestionamento, ainda que o recurso seja inadmitido ou rejeitado, na hipótese de o tribunal superior considerar existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade na decisão atacada, sendo desnecessário provimento desta Corte para que o embargante tenha acesso à via recursal extraordinária.

Por essas razões e considerando o contexto específico dos autos, entendo que não restaram configuradas as hipóteses de cabimento dos aclaratórios (art. 275 do Código Eleitoral c/c o art. 1.022, do Código de Processo Civil), devendo o acórdão impugnado ser mantido nos seus exatos termos.

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos declaratórios opostos por RAUL FERNANDO COHEN.