RE - 21351 - Sessão: 16/10/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por JANETE CRISTINA MARQUES DE CARVALHO, candidata ao cargo de vereador em Arroio do Padre nas Eleições 2016, em face da sentença que desaprovou as suas contas de campanha, em virtude da identificação das seguintes irregularidades: a) descumprimento da obrigatoriedade de abertura da conta bancária de campanha; b) não escrituração de despesas relativas aos serviços contábeis e advocatícios; e c) ausência de recibos eleitorais, impossibilitando a verificação de eventual recebimento de recursos de fonte vedada ou de origem não identificada (fls. 71-72).

Em suas razões, a recorrente sustenta a ocorrência de rigor excessivo no julgamento das contas. Defende a admissão de documentos com o recurso e invoca o princípio da razoabilidade. Argumenta que o Município de Arroio do Padre não possui agência bancária, de modo que a abertura da conta de campanha é dispensada pela norma eleitoral. Esclarece que as despesas com honorários advocatícios e contábeis decorrem de doação realizada pelos respectivos profissionais. Informa a apresentação dos recibos solicitados. Requer a reforma da sentença para que as contas sejam aprovadas (fls. 77-83). Junta documentos (fls. 85-92).

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pelo provimento parcial do recurso, apenas para afastar as irregularidades alusivas à não abertura da conta bancária e à ausência de juntada de documentos comprobatórios das doações estimáveis em dinheiro, referentes aos serviços advocatícios e contábeis, remanescendo a desaprovação das contas em virtude das demais irregularidades (fls. 96-101).

É o relatório.

 

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

O recurso é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais, motivo pelo qual dele conheço.

Quanto aos documentos apresentados de forma intempestiva, tenho por acolhê-los com o fim de esclarecer as impropriedades apontadas no julgamento de primeiro grau.

Não desconheço que o egrégio Tribunal Superior Eleitoral possui entendimento no sentido de que, “julgadas as contas, com oportunidade prévia para saneamento das irregularidades, não se admite, em regra, a juntada de novos documentos” (TSE, AgReg no RESPE n. 239956, Relator Min. Rosa Weber. DJE: 31.10.2016).

Contudo, a teor do caput do art. 266 do Código Eleitoral, e na linha da reiterada jurisprudência desta Corte, considero não haver óbice ao conhecimento e à análise da documentação apresentada.

No mérito, a contabilidade foi desaprovada em razão das seguintes irregularidades: a) descumprimento da obrigatoriedade de abertura da conta bancária de campanha; b) não escrituração de despesas relativas aos serviços contábeis e advocatícios; e c) ausência de recibos eleitorais, impossibilitando a verificação de eventual recebimento de recursos de fonte vedada ou de origem não identificada.

Inicialmente, quanto à falta de abertura da conta de campanha, o art. 7º, § 4º, da Resolução TSE n. 23.463/15, dispõe:

Art. 7º É obrigatória para os partidos políticos e os candidatos a abertura de conta bancária específica, na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil ou em outra instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil.

[...]

§ 4º A obrigatoriedade de abertura de conta bancária eleitoral prevista no caput não se aplica às candidaturas em municípios onde não haja agência bancária ou posto de atendimento bancário (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 2º). (Grifei.)

Considerando que a declaração da fl. 91 atesta que o Município de Arroio do Padre não possui agência bancária ou posto de atendimento, não há obrigatoriedade da abertura de conta bancária de campanha pelos candidatos e pelas agremiações concorrentes na referida localidade, de modo que deve ser afastada a irregularidade apontada, porquanto não descumprida a norma eleitoral.

Na sequência, no que se refere à ausência de escrituração de despesas com honorários advocatícios e contábeis, o art. 29, § 1º e § 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15, ao tratar a respeito dos gastos eleitorais, estabelece:

Art. 29. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

[...]

§ 1º As contratações de serviços de consultoria jurídica e de contabilidade prestados em favor das campanhas eleitorais deverão ser pagas com recursos provenientes da conta de campanha e constituem gastos eleitorais que devem ser declarados de acordo com os valores efetivamente pagos. (Redação dada pela Resolução nº 23.470/2016)

§ 1º-A Os honorários referentes à contratação de serviços de advocacia e de contabilidade relacionados à defesa de interesses de candidato ou de partido político em processo judicial não poderão ser pagos com recursos da campanha e não caracterizam gastos eleitorais, cabendo o seu registro nas declarações fiscais das pessoas envolvidas e, no caso dos partidos políticos, na respectiva prestação de contas anual. (Incluído pela Resolução n. 23.470/2016)

Consoante se extrai da leitura dos dispositivos, apenas devem ser escriturados como gastos eleitorais os serviços contábeis e de advocacia que compreendam atividades de consultoria e assessoramento, que constituem atividades-meio em campanhas eleitorais, e não as hipóteses em que as referidas atividades são pactuadas para a representação processual em feitos judiciais.

Sobre o ponto, o TSE pacificou sua jurisprudência no sentido de que os honorários relativos aos serviços advocatícios e de contabilidade referentes a processos jurisdicionais não são considerados gastos eleitorais de campanha:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2014. PRESTAÇÃO DE CONTAS. Desaprovação. Candidato. Deputado estadual.

1. Não houve impugnação do fundamento da decisão agravada de ausência de indicação de julgado para comprovar o dissídio jurisprudencial em relação à falha atinente à arrecadação de recursos de origem não identificada. Incidência da Súmula 182 do Superior Tribunal de Justiça.

2. Tendo o candidato sido intimado para sanar as falhas apontadas no relatório preliminar, os documentos apresentados intempestivamente não podem ser conhecidos, por incidência da regra da preclusão. Precedente: AgR-REspe nº 222-86, rel. Min. Gilmar Mendes, DJE de 29.10.2015.

3. Os serviços advocatícios de consultoria prestada aos candidatos no curso das campanhas eleitorais constituem atividade-meio e, como acessórios da campanha eleitoral, devem ser contabilizados como gastos eleitorais. Precedentes.

4. Os honorários relativos aos serviços advocatícios e de contabilidade relacionados com processo jurisdicional-contencioso não podem ser considerados como gastos eleitorais de campanha nem estão sujeitos à contabilização ou à limitação que possa impor dificuldade ao exercício da ampla defesa.

5. Agravo regimental que deve ser negado, pois o afastamento da irregularidade relativa à ausência de contabilização dos honorários do advogado e do contador que assinaram a prestação de contas não é suficiente para reformar a decisão que rejeitou as contas do candidato, em virtude da manutenção da irregularidade relacionada à existência de recursos de origem não identificada relativa às transferências de recursos pelo órgão partidário sem a identificação do doador originário. Agravo regimental não provido.

(TSE – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 77355, Acórdão de 1°.3.2016. Relator Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: DJE- Diário de Justiça Eletrônico, Data 28.4.2016, Páginas 53-54.) (Grifei.)

Nesse sentido, ainda, colaciono ementa de julgado deste Regional:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Contabilização de serviços advocatícios. Art. 29, §§ 1º e 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Parecer conclusivo e manifestação ministerial de piso pela rejeição das contas. Proferida sentença de desaprovação sem que tenha sido oportunizada prévia manifestação à candidata acerca das irregularidades apontadas, conforme previsão do art. 64, § 4º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Decisão consubstanciada na ausência de registro de gastos e dos respectivos recibos, referentes à contratação de serviços advocatícios durante a prestação de contas. Ainda que, nesta instância, tenha sido verificado o vício procedimental, deixa-se de reconhecer de ofício a nulidade, em virtude da possibilidade de decisão favorável quanto ao mérito, sem representar qualquer prejuízo à interessada.

Diferenciação conceitual entre o serviço advocatício prestado em processo judicial contencioso e o serviço de consultoria jurídica realizado em favor das campanhas eleitorais. Entendimento do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que os honorários relativos aos serviços advocatícios e de contabilidade referentes a processo jurisdicional contencioso não são considerados gastos eleitorais de campanha. Situação distinta do serviço de consultoria, atividade-meio prestada durante a campanha eleitoral, paga com recursos provenientes da conta de campanha, constituindo gasto eleitoral que deve ser declarado de acordo com os valores efetivamente pagos. Inteligência do disposto no art. 29, §§ 1º e 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Demonstrada a outorga da procuração no mês de outubro de 2016, excluindo a obrigação contraída do rol de despesas de campanha. Não identificada impropriedade ou irregularidade na prestação, devem ser aprovadas as contas.

Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 24846, Acórdão de 07.03.2017, Relator DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 39, Data 09.03.2017, Página 5.) (Grifei.)

Na situação em análise, observo que a cláusula 1ª do contrato de prestação de serviços de advocacia da fl. 15 prevê como objeto a prestação de serviços técnicos para a elaboração da prestação de contas da campanha eleitoral de 2016, a evidenciar que a pactuação não foi encetada para a realização de assessoramento.

Outrossim, o contrato de prestação de serviços contábeis à fl. 17 expressamente estabelece a vinculação do ajuste à prestação de contas de campanha, não podendo ser considerado, na esteira da dicção normativa, como gasto eleitoral de campanha.

Desse modo, afasto a irregularidade.

Por fim, relativamente à ausência de recibos, de igual modo a falha foi sanada pela prestadora ao juntar tais documentos nas fls. 85-89, por ocasião da interposição do presente recurso, possibilitando a identificação dos doadores.

Portanto, não subsiste nos autos impropriedade capaz de malferir o exame contábil e macular a transparência que deve permear a contabilidade, motivo pelo qual sequer merece a anotação de ressalva, devendo ser afastada.

Assim, sendo apenas essas as irregularidades identificadas no exame contábil, concluo que a sentença merece reforma, comportando o juízo de total aprovação.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para julgar aprovadas as contas da recorrente.

É como voto, senhor Presidente.