RE - 11590 - Sessão: 04/10/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto por DELMAR ANIBAL BOTTA MENEGUZZI, concorrente ao cargo de Vereador no Município de Jaguari, contra sentença do Juízo da 26ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas referentes às eleições municipais de 2016, com fundamento no art. 30, inc. III, da Lei n. 9.504/97, tendo em vista o depósito em espécie de R$ 1.083,04 na conta de campanha, sem a observância da transferência eletrônica estabelecida pelo art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/2015, e determinou, ainda, a restituição dos valores respectivos ao doador, nos termos do art. 18, § 3º, da referida Resolução. (fls. 48-49).

Em seu apelo (fls. 51-60), o recorrente aduz que a doação recebida está, no cômputo geral, em conformidade com a legislação pertinente, não representando abuso de poder econômico ou qualquer falha grave. Sustenta que a doação foi realizada no valor necessário ao encerramento e à finalização da prestação de contas apresentada. Aduz que a doadora é pessoa física e que contribui dentro do limite de 10% dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição. Invoca os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da insignificância, por se tratar de diferença de valor irrisório. Argumenta serem conhecidas tanto a origem do valor, quanto a identificação do doador. Assevera a inexistência de má-fé e de prejuízo ao eleitor. Ao final, requer o conhecimento e o provimento do recurso para que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

Com vista dos autos, o Ministério Público Eleitoral com atuação em primeiro grau ofereceu contrarrazões, manifestando-se pelo desprovimento do recurso (fls. 62-63.)

Nesta instância, a Procuradoria Regional Eleitoral opinou pelo não provimento do recurso, requerendo a alteração do destinatário do valor recebido, para determinar o recolhimento do valor de R$ 1.083,04 ao Tesouro Nacional (fls. 67-71v.).

É o relatório.

 

VOTO

O recurso é tempestivo. Houve a publicação da decisão no DEJERS em 04.5.2018 (fl. 50) e a interposição ocorreu em 08.5.2018 (fl. 50v.), de forma que foi obedecido o prazo de três dias, indicado no art. 77 da Resolução TSE n. 23.463/15.

Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

No mérito, as contas do candidato foram desaprovadas em razão do reconhecimento da doação financeira recebida de pessoa física acima de R$ 1.064,10, realizada por meio de depósito em espécie na conta-corrente de campanha, diferentemente da opção “transferência eletrônica” bancária, em afronta ao disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15.

Dessa maneira, é incontroverso que houve o recebimento de doação via depósito direto em espécie na conta-corrente de campanha, no valor de R$ 1.083,04, em inobservância ao art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, verbis:

Art. 18. (...)

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação.

A exigência normativa de que as doações de campanha sejam feitas por meio de transferência eletrônica, visa coibir a possibilidade de manipulações e de transações ilícitas, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação.

Entretanto, no caso em tela, o candidato traz aos autos justificava, manifestando a razão pela qual acabou por efetuar a operação em desconformidade com os preceitos normativos para este tipo de transação financeira. Assim, explica que o valor depositado em espécie foi exatamente aquele correspondente ao necessário para o encerramento e a finalização da prestação de contas.

Compulsando os autos, é possível verificar a existência do comprovante de depósito bancário com a indicação do CPF da doadora (fls. 9), corroborado pelo recibo eleitoral da folha 8, ambos datados de 25.10.2016. Assim, realizado o depósito identificado, transparecendo a origem imediata dos valores.

Ademais, a doadora exerce a profissão de advogada, atividade laboral que viabiliza ganhos compatíveis com o valor doado, indicando sua capacidade econômica, sendo possível concluir que o valor repassado à campanha integrava seu patrimônio.

Desta forma, o candidato logrou acostar elementos aptos a demonstrar a procedência lícita e imediata dos recursos, tudo de forma a assinalar sua boa-fé.

E, ainda que assim não se entendesse, o reduzido valor absoluto da irregularidade (R$ 1.083,04) somado as evidências de boa-fé do prestador permitem a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, em especial quando considerada como parâmetro a importância de R$ 1.064,10, que o próprio legislador elegeu como baliza para dispensar a contabilização de gasto realizado pelo eleitor em favor de candidato, nos termos do art. 27 da Lei n. 9.504/97.

Portanto, trata-se de uma irregularidade que compreende montante não significativo (R$ 18,94) e que foi efetivamente utilizado pelo prestador para encerrar sua conta, cabendo entender, assim, pela aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade.

A propósito, em caso semelhante, decidi em igual sentido:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. PRELIMINARES AFASTADAS. POSSIBILIDADE DE APRESENTAÇÃO DE NOVOS DOCUMENTOS COM O RECURSO. NEGATIVA DE VIGÊNCIA A PRECEITO NORMATIVO NÃO PROCEDENTE. MÉRITO. DOAÇÕES ESTIMADAS EM DINHEIRO. COMPROVADA A ORIGEM DOS VALORES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Preliminares afastadas. 1.1. A apresentação de novos documentos com o recurso, especialmente em sede de prestação de contas de campanha, não representa prejuízo à tramitação do processo, principalmente quando se trata de documentos simples capazes de esclarecer irregularidades apontadas e que visam salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha. 1.2. Negativa de vigência ao art. 19 e ao art. 26 da Resolução TSE n. 23.463/2015. Razões de mérito a serem analisadas com relação a eventual recurso de origem não identificada. Prevalência ao disposto no art. 4º do Código de Processo Civil, que expressamente dá preferência ao exame de mérito das demandas. 2. Recebimento de recurso estimável em dinheiro com observância ao disposto no art. 19 da Resolução TSE n. 23.463/15. Demonstrado que o veículo cedido pelo doador constituía bem de sua propriedade. 3. Os bens ou serviços estimáveis em dinheiro, doados por pessoas físicas e jurídicas, devem constituir produto de seu próprio serviço ou de sua atividade econômica. Doação em desconformidade com o citado regramento. Considerada a possibilidade de identificação da doadora e de sua atividade econômica, bem como o diminuto valor envolvido, plausível o uso dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas. Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n 498-21, Acórdão de 18.01.2018, Relator(a) Des. Eleitoral Eduardo Augusto Dias Bainy, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 10, Data 24.01.2018, Página 13) (Grifei.)

Nesses termos, em juízo de verossimilhança, é possível concluir que os fatos correspondem à realidade, em consonância com as alegações trazidas nas razões de recurso, cabendo afastar a irregularidade inicialmente verificada, de acordo com os precedentes deste Tribunal.

Quanto ao pedido do representante ministerial, para alterar a condenação em relação ao destinatário do valor recebido, isto é, em vez de ocorrer a restituição dos valores ao doador, que fosse determinado o recolhimento da quantia de R$ 1.083,04 ao Tesouro Nacional, registre-se que esta Corte vem, com frequência, sendo bastante tolerante quando o prestador de contas, malgrado não tenha seguido à risca os ditames legais e regulamentares, consegue, ao menos, demonstrar a origem imediata da doação, circunstância que tem eximido os jurisdicionados do recolhimento dos valores. Nesse sentido, trago precedente deste Egrégio:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Bens ou serviços estimáveis em dinheiro. Art. 19 da Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Os bens ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas e jurídicas devem constituir produto de seu próprio serviço ou de sua atividade econômica. Doação em desconformidade com o citado regramento. Considerando o valor doado de pequena monta, e a possibilidade de identificação do doador, plausível fazer uso dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

Provimento parcial.

(Recurso Eleitoral n 15123, ACÓRDÃO de 11.5.2017, Relator(a) DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 80, Data 15.5.2017, Página 4-5)

Por corolário, uma vez que a questão foi esclarecida nesta instância, resta afastada a conclusão pela existência de recursos de origem não identificada e a determinação de recolhimento de valores, não cabendo a restituição ao doador nem o recolhimento dos mesmos ao Tesouro Nacional.

Destarte, não subsistindo nenhuma das falhas que embasaram o juízo de desaprovação e não havendo outras incorreções a comprometer a regularidade e a confiabilidade das contas, devem essas ser aprovadas com ressalvas.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas, com fulcro no art. 68, inc. II, da Resolução TSE n. 23.463/15, afastando a ordem de recolhimento.