RE - 2374 - Sessão: 29/10/2018 às 17:00

RELATÓRIO

Trata-se de recurso interposto pelo PARTIDO PROGRESSISTA (PP) de ARROIO GRANDE contra sentença que desaprovou as contas da agremiação referentes à movimentação financeira do exercício de 2016, em virtude do recebimento de valores oriundos de fontes vedadas e de origem não identificada, determinando o recolhimento de R$ 15.770,72 ao Tesouro Nacional e a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário por um ano (fls. 228-235).

Em sua irresignação (fls. 238-240), o recorrente sustenta que os contribuintes detentores de cargos ou funções demissíveis ad nutum são, em realidade, de coordenação, sem qualquer amplitude de poderes, não podendo ser considerados fontes vedadas. Quanto ao cargo de Procurador-Geral do Município, afirma que se trata de função de assessoria jurídica, excluída da proibição legal. Alega que está demonstrada a identificação de cada doador, com seu respectivo CPF, no demonstrativo de recursos recebidos, no extrato bancário e nos demais documentos juntados aos autos. Ressalta que as contribuições auferidas de filiados ocorreram de forma espontânea. Pugna pela aplicação da Lei n. 13.488/17, que conferiu nova redação ao art. 31 da Lei n. 9.096/95, passando a admitir a obtenção de recursos provenientes de pessoas detentoras de cargo ou função demissíveis ad nutum, desde que filiadas a partido, ao fundamento de ser mais benéfica. Requer a reforma da sentença, com a aprovação das contas.

Nesta instância, os autos foram com vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou, preliminarmente, pela nulidade da sentença, em razão da não aplicação da multa de 20% prevista no art. 37 da Lei n. 9.096/95, com a redação conferida pela Lei n. 13.165/15. No mérito, manifestou-se pelo desprovimento do recurso e pela aplicação, de ofício, por este Tribunal, da multa aludida (fls. 272-280).

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo e deve ser conhecido.

Inicialmente, a Procuradoria Regional Eleitoral suscitou a preliminar de nulidade da sentença, por ter se omitido em aplicar e fundamentar a pena de multa de até 20% sobre a importância irregular, nos termos do disposto no art. 37, caput, da Lei  n. 9.096/95.

De fato, até o advento da Lei n. 13.165/15, o art. 37, § 3º, da Lei n. 9.096/95 estabelecia a sanção de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário por um período de 1 a 12 meses:

Art. 37. A falta de prestação de contas ou sua desaprovação total ou parcial implica a suspensão de novas cotas do Fundo Partidário e sujeita os responsáveis às penas da lei.

[…].

§ 3º A sanção de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, por desaprovação total ou parcial da prestação de contas de partido, deverá ser aplicada de forma proporcional e razoável, pelo período de 1 (um) mês a 12 (doze) meses, ou por meio do desconto, do valor a ser repassado, da importância apontada como irregular, não podendo ser aplicada a sanção de suspensão, caso a prestação de contas não seja julgada, pelo juízo ou tribunal competente, após 5 (cinco) anos de sua apresentação

Após a edição da Lei n. 13.165/15, houve a modificação da sanção legal incidente na desaprovação das contas, passando a cominar a pena de devolução da importância considerada irregular acrescida de até 20%:

Art. 37. A desaprovação das contas do partido implicará exclusivamente a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento).

A jurisprudência definiu que essa nova sanção deverá ser aplicada às prestações de contas relativas ao exercício financeiro de 2016 e seguintes, conforme definiu o Egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

SEGUNDOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2009. DESAPROVADA PARCIALMENTE. AUSÊNCIA DE VÍCIOS. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS.

1. QUESTÃO DE ORDEM. As alterações promovidas no caput do art. 37 da Lei nº 9096/1995, reproduzidas no art. 49 da Res.-TSE nº 23.464/2015, são regras de direito material e, portanto, aplicam-se às prestações de contas relativas aos exercícios de 2016 e seguintes. Entendimento contrário permitiria que contas das agremiações partidárias relativas a um mesmo exercício financeiro fossem analisadas com base em regras materiais diversas, o que não se pode admitir. É preciso conferir tratamento isonômico a todos os partidos políticos, sem alterar as regras aplicáveis a exercícios financeiros já encerrados, em razão do princípio da segurança jurídica. O Plenário do TSE, analisando a questão relativa à alteração legislativa promovida pela mesma lei ora em análise na Lei das Eleições quanto ao registro do doador originário nas doações, assentou que "a regra constante da parte final do § 12 do art. 28 da Lei nº 9.504/97, com a redação conferida pela Lei nº 13.165/2015, não pode ser aplicada, [...] seja porque a lei, em regra, tem eficácia prospectiva, não alcançando fatos já consumados e praticados sob a égide da lei pretérita" (ED-REspe nº 2481-87/GO, rel. Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 1º.12.2015). A modalidade de sanção em decorrência da desaprovação de contas prevista na nova redação do caput do art. 37 da Lei nº 9.096/1995, conferida pela Lei nº 13.165/2015, somente deve ser aplicada às prestações de contas relativas ao exercício de 2016 e seguintes.

[...]

5. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE, Prestação de Contas n. 96183, Acórdão, Relator Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Volume , Tomo 54, Data: 18.3.2016, pp. 60-61.)

Considerando que a aplicação da multa de até 20% é decorrência lógica da desaprovação das contas, deve ser anulada a sentença recorrida, por ausência da observância dos seus consectários legais imperativos e de ordem pública.

Nessa linha, estão os precedentes deste Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. PRELIMINAR SUSCITADA PELA PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL. SENTENÇA OMISSA. AUSENTE A DETERMINAÇÃO DA APLICAÇÃO DE MULTA DE ATÉ 20% SOBRE O VALOR IRREGULAR. ART. 37 DA LEI N. 13.165/15. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. NULIDADE.

Preliminar de nulidade da sentença. A decisão de primeiro grau desaprovou as contas do partido referentes à movimentação financeira do exercício de 2016, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional e a suspensão das quotas do Fundo Partidário após a vigência da Lei n. 13.165/15, que passou a cominar a sanção de devolução dos valores considerados irregulares acrescidos de multa de até 20%. Regramento a ser aplicado nas prestações de contas relativas ao exercício financeiro de 2016.

Nulidade da sentença por omissão em aplicar os consectários legais decorrentes da sua conclusão. Restituição ao juízo de origem.

(TRE/RS, RE 105.34.2017.6.21.0148, Rel. Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos, sessão de 16.7.2018.)

Ressalta-se que não é possível adotar o entendimento de que a questão está madura para julgamento, determinando a aplicação da multa, de ofício, por este Tribunal, com fundamento na disposição contida no art. 1.013, § 3º, inc. III, do CPC, conforme requerido pelo órgão ministerial, em razão da supressão de instância no tocante à dosimetria da penalidade, em violação ao princípio do duplo grau de jurisdição.

Dessa forma, impõe-se o reconhecimento da nulidade da sentença, devendo os autos retornar ao juízo de origem para que nova decisão seja proferida, com a observância das disposições legais vigentes após a edição da Lei n. 13.165/15 e aplicáveis ao exercício financeiro de 2016, de acordo com a Resolução TSE n. 23.464/15.

Ante todo o exposto, VOTO por anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem, nos termos da fundamentação.