PC - 2444 - Sessão: 23/10/2018 às 16:00

RELATÓRIO

Cuida-se de prestação de contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO REDE SUSTENTABILIDADE (REDE), apresentada na forma da Lei n. 9.096/95, regulamentada pela Resolução TSE n. 23.464/15 e por disposições processuais da Resolução TSE n. 23.546/17, abrangendo a movimentação financeira do exercício de 2016.

A equipe técnica do TRE-RS emitiu parecer conclusivo pela desaprovação das contas (fls. 677-684), diante da constatação do recebimento de recursos de fonte vedada, no montante de R$ 200,00, e da existência de receitas de origem não identificada, no importe de R$ 2.040,00.

Concedida vista à Procuradoria Regional Eleitoral, que opinou pela desaprovação das contas e determinação de recolhimento de R$ 2.240,00, ao Tesouro Nacional, correspondentes à soma das quantias provenientes de fontes vedadas e de origem não identificada, acrescida da multa de 20%, bem como pela suspensão das quotas do Fundo Partidário pelo período de um ano (fls. 690-695v.).

Os prestadores foram intimados para a apresentação de defesa, tendo o prazo transcorrido sem manifestação (fl. 701).

É o relatório.

 

VOTO

A Secretaria de Controle Interno e Auditoria, após analisar os esclarecimentos e a documentação apresentados pelo Diretório Regional do Partido REDE, constatou a existência de irregularidades ensejadoras da desaprovação das contas, consistentes no recebimento de recursos oriundos de fontes vedadas, na quantia de R$ 200,00, e de receitas sem origem identificada, no valor de R$ 2.040,00, totalizando o montante de R$ 2.240,00.

Antes de adentrar no mérito do feito, destaco que esta Corte, em 12.12.2017, definiu que a nova redação dada ao art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, pela Lei n. 13.488/17, denominada Reforma Eleitoral, não se aplica às doações realizadas antes da vigência do normativo, ou seja, 06.10.2017:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. PRELIMINAR. MANUTENÇÃO DOS DIRIGENTES PARTIDÁRIOS NO POLO PASSIVO. ILEGITIMIDADE NÃO CONFIGURADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. PERMITIDA A CONTRIBUIÇÃO DE FILIADOS. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE IRREGULARIDADE DA DOAÇÃO. REDUÇÃO DO PRAZO DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar rejeitada. O art. 38 da Resolução TSE n. 23.432/14 prevê que deverá ser determinada a citação do órgão partidário e dos responsáveis para que ofereçam defesa sempre que houver impugnação ou constatação de irregularidade no parecer conclusivo. A integração dos dirigentes na lide é consectário da responsabilização prevista na Lei dos Partidos Políticos. Manutenção dos dirigentes partidários para integrarem o polo passivo. Ilegitimidade passiva afastada.

2. Constituem recursos oriundos de fontes vedadas as doações a partidos políticos realizadas por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta que detenham condição de autoridades, vale dizer, que desempenhem função de direção ou chefia.

3. A Lei n. 13.488/17, publicada em 06.10.17, alterou a redação do art. 31 da Lei n. 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos -, excluindo a vedação de doação de pessoa física que exerça função ou cargo público demissível ad nutum, desde que filiada ao partido beneficiário.

4. Inaplicabilidade ao caso concreto. Incidência da legislação vigente à época dos fatos. Prevalência do princípio da segurança jurídica e da paridade de armas no processo eleitoral, em detrimento da aplicação pontual da retroatividade in bonam partem. Manutenção do juízo de irregularidade das contribuições advindas de cargos demissíveis ad nutum, ainda que os contribuintes sejam filiados à agremiação.

5. Incontroverso o recebimento de recursos de fontes vedadas, em valor correspondente a 65,79% das receitas do partido, impõe-se a desaprovação das contas. Redução, entretanto, do prazo de suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário para quatro meses.

6. Provimento parcial. Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(RE 14-97, Relator Dr. Luciano Andre Losekann.) (Grifei.)

Dessarte, passo ao mérito da contabilidade seguindo esse entendimento.

Com efeito, o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 proíbe o recebimento de doações procedentes de autoridades públicas, como se verifica por seu expresso teor:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

II - autoridade ou órgãos públicos, ressalvadas as dotações referidas no art. 38;

O conceito de autoridade pública abrange os detentores de cargos em comissão que desempenham função de chefia e direção, conforme assentou o TSE na Resolução n. 22.585/07, editada em razão da resposta à Consulta n. 1428, cuja ementa está assim vazada:

Partido político. Contribuições pecuniárias. Prestação por titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta. Impossibilidade, desde que se trate de autoridade.

Resposta à consulta, nesses termos. Não é permitido aos partidos políticos receberem doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, desde que tenham a condição de autoridades.

Reproduzo, por oportuno, trechos da referida Consulta:

O recebimento de contribuições de servidores exoneráveis ad nutum pelos partidos políticos poderia resultar na partidarização da administração pública. Importaria no incremento considerável de nomeação de filiados a determinada agremiação partidária para ocuparem esses cargos, tornando-os uma força econômica considerável direcionada aos cofres desse partido.

[...]

As autoridades não podem contribuir. E, no conceito de autoridade, incluímos, de logo, nos termos da Constituição, os servidores que desempenham função de chefia e direção. É o artigo 37, inciso V.

[…]

O Tribunal responde à consulta apontando que não pode haver a doação por detentor de cargo de chefia e direção.

Busca-se, assim, manter o equilíbrio entre as siglas partidárias, haja vista o elevado número de cargos em comissão preenchidos por critérios políticos, resultando em fonte extra de recursos com potencial para malferir a paridade de armas entre os partidos,  que não contam com tal privilégio.

O Ministro Cezar Peluso, redator da consulta, ao examinar o elemento finalístico da norma que veda as doações de autoridades, assim se posiciona:

A racionalidade da norma para mim é outra: desestimular a nomeação, para postos de autoridade, de pessoas que tenham tais ligações com o partido político e que dele sejam contribuintes.

(…)

Quem tem ligação tão íntima e profunda com o partido político, que é contribuinte do partido, pela proibição, evidentemente, não impede, mas, enfim, desestimula de certo modo.

Nesse sentido, sobreveio a Resolução TSE n. 23.464/15, que, em seu art. 12, inc. IV e § 1º, disciplinou o assunto:

Art. 12. É vedado aos partidos políticos e às suas fundações receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

[...]

IV – autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se como autoridades públicas, para os fins do inciso IV do caput deste artigo, aqueles, filiados ou não a partidos políticos, que exerçam cargos de chefia ou direção na administração pública direta ou indireta.

A vedação imposta pela referida Resolução do TSE não tem outro objetivo exceto o de obstar a partidarização da administração pública, principalmente diante dos princípios da moralidade, da dignidade do servidor e da necessidade de preservação contra o abuso de autoridade e do poder econômico.

Assim, pelo menos desde 2007, quando da publicação da resposta à Consulta n. 1428, o Tribunal Superior Eleitoral  estabeleceu que não é permitido aos partidos políticos receber doações ou contribuições de titulares de cargos demissíveis ad nutum da administração direta ou indireta, que é o caso dos autos.

E a jurisprudência deste Regional seguia o mesmo entendimento, consoante colacionado no julgado que segue, lavrado em 2012:

Recurso. Prestação de contas. Exercício 2010. Desaprovação no juízo originário.

Expressiva parte da receita partidária oriunda de doações de pessoas físicas, ocupantes de cargos em comissão, na condição de autoridade. Prática vedada pelo disposto no artigo 31, incisos II e III, da Lei n. 9.096/95.

Provimento negado.

(Recurso Eleitoral n 1997, ACÓRDÃO de 30.7.2012, Relator DR. EDUARDO KOTHE WERLANG, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 138, Data 01.8.2012, Página 4.) (Grifei.)

Na situação em análise, os valores objeto de apontamento são provenientes de detentores de cargos de chefia e direção, todos considerados fonte vedada, nos termos da argumentação explicitada. Ressalto que as receitas oriundas de detentores de função de assessoramento não foram consideradas no montante apurado, conforme detalhamento realizado pela unidade técnica na planilha à fl. 679.

Como consequência, a quantia irregularmente arrecada, no valor de R$ 200,00, deve ser recolhida ao Tesouro Nacional.

Além disso, após a análise de toda a documentação apresentada, o órgão técnico concluiu que as receitas obtidas por meio de depósito com a indicação do CNPJ do próprio partido, nos dias 09.8.2016, 23.8.2016, 14.9.2016 e 04.10.2016, na soma de R$ 2.040,00, devem ser consideradas como de origem não identificada, uma vez descumprida a determinação contida no art. 7º da Resolução TSE n. 23.464/15, que estabelece a obrigatoriedade da indicação do CPF/CNPJ da contraparte.

Reproduzo o teor do dispositivo:

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte, ou no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

Destaca-se que a indicação do CNPJ do próprio partido como sendo o doador dos recursos não supre a formalidade exigida pela normatização eleitoral, porquanto impossibilita a atuação fiscalizatória no tocante à real origem das receitas.

Por conseguinte, incide a obrigação de recolhimento ao Tesouro Nacional dos aludidos recursos.

No que se refere ao comprometimento da regularidade das contas, tendo em vista que as falhas apuradas, conjuntamente consideradas, totalizaram apenas 3,41% dos recursos recebidos pela agremiação (R$ 65.502,59), revela-se possível a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para conduzir à aprovação das contas com ressalvas, e não à sua desaprovação. Do mesmo modo, afastar a penalidade de suspensão de quotas do Fundo Partidário e a imposição de multa de até 20% da quantia considerada irregular.

Nesse sentido:

AGRAVOS. RECURSOS ESPECIAIS. PRESTAÇÃO DE CONTAS PARTIDÁRIAS. EXERCÍCIO DE 2012. DESAPROVAÇÃO. RECURSO DE FONTE VEDADA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. VALOR IRRISÓRIO. SUSPENSÃO DE COTAS. FUNDO PARTIDÁRIO. PROPORCIONALIDADE. RAZOABILIDADE. PROVIMENTO DO RECURSO DO PARTIDO.

1. Autos recebidos no gabinete em 21/3/2017.

2. No caso, é possível aprovar com ressalvas as contas, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois a soma de valores das falhas constatadas - R$ 47.277,35 - corresponde a aproximadamente 6,5% da receita, não comprometendo o controle financeiro pela Justiça Eleitoral. Precedentes.

3. Recurso especial parcialmente provido para aprovar com ressalvas as contas. Prejudicado o recurso do Parquet.

(TSE - RESPE: 724220136210000 Porto Alegre/RS 67842016, Relator: Min. Antonio Herman De Vasconcellos E Benjamin, Data de Julgamento: 10.4.2017, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico - 02.5.2017 - Página 99-102.) (Grifei.)

 

AGRAVO NOS PRÓPRIOS AUTOS. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. PDT. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2014. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE FONTE VEDADA. ART. 31, II, DA LEI Nº 9.096/95. AUTORIDADE PÚBLICA. OCUPANTES DE CARGO DE CHEFIA E DIREÇÃO. PRECEDENTES. PERCENTUAL DIMINUTO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICAÇÃO. APROVAÇÃO COM RESSALVA. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL MANTIDA. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.

(TSE - AI: 865520156210000 Porto Alegre/RS 40712017, Relator: Min. Luiz Fux, Data de Julgamento: 03.10.2017, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico - 20.10.2017 - Página 77-81.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2015. DOAÇÕES RECEBIDAS. DOAÇÃO DO DIRETÓRIO NACIONAL DO PARTIDO. REGULAR. DOAÇÃO ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. AUSÊNCIA DE RECIBOS ELEITORAIS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Doação proveniente do Diretório Nacional da agremiação devidamente identificada com data, origem e CNPJ do doador. Evidenciada regularidade da doação. Afastado recolhimento do numerário ao Tesouro Nacional.

2.Recebimento de doação de origem não identificada, em desacordo com a previsão contida nos arts. 7º, caput, e 8º, § 2º, da Resolução TSE n. 23.432/14. Situação que acarreta o recolhimento ao Tesouro Nacional. Quantia de pequena expressão, que representa 6,8% do montante integral. Aprovação com ressalvas.

Provimento parcial.

(TRE-RS, RE 6-64 – Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira – J. 04.12.2017.)

 

O juízo de aprovação com ressalvas, entretanto, não exime o órgão partidário do dever de recolhimento do valor recebido de forma ilícita. Isso porque a determinação não é uma penalidade ou efeito decorrente da desaprovação das contas, mas consequência específica e independente, consoante se extrai do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.464/15, a seguir transcrito:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 desta resolução sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º desta resolução, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput deste artigo também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 5º do art. 11, os quais devem, nesta hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

Logo, embora as contas mereçam ser aprovadas com ressalvas, é imperativa a determinação do recolhimento do valor arrecadado de forma irregular ao Tesouro Nacional.

Ademais, revela-se pertinente a recomendação para que a agremiação, nos exercícios subsequentes, envide seus esforços para o regular cumprimento das normas eleitorais, em especial as concernentes à movimentação de seus recursos, a fim de evitar a reincidência das irregularidades identificadas e das impropriedades apontadas pela unidade técnica.

 

Ante o exposto, VOTO pela aprovação das contas, com ressalvas, do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO REDE SUSTENTABILIDADE (REDE), relativas ao exercício financeiro de 2016, determinando o recolhimento, ao Tesouro Nacional, da quantia de R$ 2.240,00 (provenientes de fontes vedadas e recursos de origem não identificada), nos termos da fundamentação.